Acórdão nº 397/08.4JAAVR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Janeiro de 2011

Magistrado ResponsávelEDUARDO MARTINS
Data da Resolução12 de Janeiro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório: No âmbito do Processo Comum (Tribunal Colectivo) n.º 397/08.4JAAVR que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca do Baixo Vouga, Albergaria-A-Velha – Juízo de Instância Criminal, o arguido J..., por acórdão de 16/7/2010, foi condenado, pela prática, em co-autoria, de um crime de furto qualificado, sob a forma tentada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 22º, 23º, 73º, 203º, nº1 e 204º, nº1, al. a), do Código Penal (ATM da Junta de Freguesia), na pena de 2 anos e 6 meses de prisão; pela prática, em co-autoria de um crime de furto de uso de veículo, na forma consumada, p. e p. pelo artigo 208º, n.º1. do Código Penal, na pena de 1 ano de prisão, e pela prática, em autoria material, na forma consumada, de um crime de resistência e coacção sobre funcionário, p. e p. pelo artigo 347.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 2 anos de prisão, o que deu origem, em cúmulo jurídico, à pena única de 4 anos de prisão.

**** Inconformado com parte da decisão (a relativa ao crime p. e p. pelo artigo 347.º, n.º 1, do C. P.), dela recorreu o arguido, em 6/10/2010, defendendo que deve ser alterada a matéria de facto dada como provada nos pontos 20 a 23 do acórdão ora em análise, de acordo com o depoimento prestado pela testemunha JF..., daí decorrendo, necessariamente que deve ser absolvido da prática do crime de resistência e coacção sobre funcionário, extraindo da respectiva motivação do recurso as seguintes conclusões: 1. Foram indevidamente dados como provados os factos descritos nos pontos 20 a 23 da matéria de facto dada como provada; 2. Do depoimento da testemunha JF…, resulta que tais factos foram, na sua essencialidade, indevidamente dados como provados; 3. A aludida testemunha apresenta uma versão dos factos diferente da que consta da acusação e dos factos que, com base nesse depoimento, foram dados como provados no douto acórdão recorrido; 4. Do essencial do seu depoimento, resulta que o recorrente nunca ameaçou, com as expressões dadas como provadas, nunca o tentou agredir e a testemunha nunca se sentiu ameaçada e muito menos ofendida na sua integridade física e vida; 5. A condenação do recorrente pelo crime de resistência e coacção sobre funcionário deve-se ao facto de ser dado como provada a actuação do arguido tal como vem descrita nos referidos pontos 20, 21 e 22 do douto acórdão recorrido; 6. A punição pelo crime de resistência e coacção sobre funcionário pressupõe que a pessoa sobre a qual é exercida a violência se sinta ameaçada ou seja ofendida a sua integridade física; 7. Do depoimento da aludida testemunha resulta que esta não se sentiu ameaçada nem viu ofendida a sua integridade física; 8. Não foi o facto de o recorrente ter exibido uma suposta arma de fogo que impediu a testemunha de levar a cabo a detenção; 9. A testemunha continuou a tentar deter o recorrente só não o conseguindo fazer porque este conseguiu da mesma libertar-se sem utilizar a suposta arma; 10. Apesar de a testemunha não saber que tipo de arma exibia o recorrente e se esta estava municiada, nunca se sentiu, na altura, minimamente ameaçada; 11. O Acórdão recorrido, ao condenar o recorrido, fez assim uma errada interpretação e aplicação do artigo 347.º, n.º 1, do Código Penal; 12 Em função da prova efectivamente produzida, deveria o arguido ser absolvido do aludido crime por não se encontrarem preenchidos todos os elementos objectivos e subjectivos da respectiva infracção..

**** O Ministério Público junto do Tribunal recorrido, em 22/10/2010, apresentou resposta, defendendo a improcedência total do recurso, apresentando como conclusões: 1. Não ocorreu qualquer erro de julgamento dos factos julgados como provados e o Tribunal “a quo” fez um correcto e minucioso exame crítico de toda a prova produzida em audiência de julgamento, na estrita observância do disposto nos artigos 127.º e 374.º, n.º 2, do CPP, pelo que não merece censura o juízo probatório vertido nos factos que permitem condenar o arguido pelo crime de resistência e coacção sobre funcionário, p. e p. pelo artigo 347.º, n.º 1, do Código Pena.; 2. Com efeito, essa prova, produzida, apreciada, ponderada e valorada pelo Tribunal de acordo com os preceitos legais aplicáveis e supra referidos, suporta objectivamente o julgamento de facto havido e impregna o processo decisório de formação da convicção do Colectivo de toda a justeza, correcção e objectividade que tal juízo tem que conter; 3. A decisão recorrida encontra-se devidamente fundamentada, quer de facto, quer de direito, não é possuidora de qualquer vício que inquine a sua validade, substancial ou formal, o Tribunal apreciou criticamente o depoimento do agente da GNR, JF..., que foi claro e objectivo, e, sendo esta a única questão colocada no recurso e não havendo fundamentos para alterar este juízo probatório, terá que necessariamente improceder o presente recurso e o douto Acórdão impugnado deverá ser mantido nos seus precisos termos.

**** O recurso foi, em 26/10/2010, admitido.

Nesta Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu, em 17/11/2010, douto parecer, no qual defende a improcedência total do recurso, acompanhando, na íntegra, a posição assumida pelo Ministério Público em 1ª instância.

Foi cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do CPP, não tendo sido exercido o direito de resposta.

Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos legais, teve lugar conferência, cumprindo apreciar e decidir.

****II. Decisão Recorrida (com relevo para o presente recurso): “(…) II – Fundamentos: Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos: (…) 20. Por seu turno, o militar JF… seguiu no encalço do arguido J..., o qual estava munido de uma arma de fogo, cujas características concretas não se logrou apurar, e deu ordens ao arguido para parar. No entanto, o arguido J... não acatou tal ordem de paragem, seguindo pelos terrenos de cultivo e mato, empunhando a referida arma.

  1. A dada altura da perseguição, quando o militar se encontrava próximo do arguido, este encostou-lhe a arma de fogo à cabeça, no temporal esquerdo, dizendo, em voz alta e em tom sério, “é p´ra matar” e que não tinha nenhum problema em fazê-lo, expressões que repetiu por várias vezes, ao mesmo tempo que pressionava o cano da arma contra a cabeça do dito Guarda.

  2. Após alguns segundos, o arguido desferiu um empurrão no corpo do militar e colocou-se em fuga. Apesar de ter sentido medo pela sua integridade física e vida, o mesmo militar ainda efectuou vários disparos para o ar, para servir de intimidação, contudo, o arguido logrou fugir.

  3. O arguido, ao agir da forma descrita, fê-lo com o intuito de se opor a que o militar da GNR praticasse um acto relativo ao exercício das suas funções de agente policial, evitando que este o detivesse e identificasse.” (…) Convicção do tribunal.

Relativamente aos factos provados.

Diga-se, em primeiro lugar, que apenas os arguidos F..., J… e T... prestaram declarações sobre os factos e para negar a sua prática.

(…) Os factos descritos em 15. a 23., relativos à forma como os arguidos foram perseguidos pela GNR e actuação dos arguidos J...e T..., resultaram provados tendo em consideração os autos de reconhecimento de fls. 29/31, 32/33, 378/380 e auto de exame de fls. 761. Para além disso, tiveram-se em consideração os depoimentos dos agentes da GNR que estiveram envolvidos nas detenções e perseguições, concretamente as testemunhas JC..., JF…, Ta… e TD…, tendo todos prestado depoimentos claros e credíveis, não tendo quaisquer dúvidas sobre a identificação dos arguidos, incluindo dos que não foram detidos na altura por terem logrado a fuga.

(…) Relativamente aos...

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