Acórdão nº 7266/07.3TBLRA-H.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Janeiro de 2011

Magistrado ResponsávelPEDRO MARTINS
Data da Resolução25 de Janeiro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra os juízes abaixo assinados: No dia 27/11/2007 iniciou-se um processo de insolvência contra o casal R (…) e H (…).

Cerca de onze meses antes, em 18/12/2006, este casal tinha vendido dois prédios seus, que valiam 827.869€, por 170.000€, a (…) Investments, LLC.

Em 29/04/2008 foi decretada a insolvência do casal e em 30/10/2008 a administradora da insolvência resolveu aquele contrato de compra e venda, por ter sido prejudicial para a massa falida.

A 29/05/2009, a (…) Investments, LLC, intentou a presente acção contra a massa insolvente do casal impugnando a resolução do contrato.

Alega para tanto - em síntese - que à data da compra desconhecia e não tinha a obrigação de conhecer a situação precária dos insolventes ou as suas dívidas (mas mais à frente diz que os imóveis comprados se encontravam onerados com garantias cuja montante era avultado…) e que a massa insolvente recebeu o preço da compra, pelo que não foi prejudicada, sendo que as obrigações assumidas pela contraparte não eram excessivamente desproporcionadas às suas.

A massa insolvente contestou, dizendo que a venda apenas teve como objectivo dissipar o património dos insolventes, obstando a que os mesmos fossem apreendidos nos autos de insolvência, bem sabendo das avultadas dívidas daqueles; e que a ter de facto existido a venda, o prejuízo teria decorrido do valor bastante inferior ao real pelo qual os prédios teriam sido vendidos; acrescentou que o negócio se presume celebrado de má fé por os insolventes terem uma relação especial com a adquirente dos bens na medida em que intervieram em determinados negócios como seus avalistas, para além do insolvente ter actuado como seu representante.

Depois do julgamento foi proferida sentença em que se julgou a acção improcedente.

A (…) recorre desta sentença, com o fim de a mesma ser revogada, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: A) A sentença recorrida enferma de nulidade, nos termos do disposto no art. 668º/1d) do Código de Processo Civil (= CPC), por excesso de pronúncia, pois conheceu de questões que não foram invocadas por qualquer das partes, em violação dos arts. 264º/2 e 664º do CPC.

B) O tribunal a quo invoca na fundamentação da sentença recorrida o art. 121º/d) do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (= CIRE), para julgar improcedente a impugnação das declarações de resolução dos contratos de compra e venda dos imóveis alienados à recorrente pelos insolventes.

C) No entanto, os únicos actos resolvidos em benefício da massa insolvente pela Sra. administradora de insolvência foram os aludidos contratos de compra e venda, tendo a recorrente impugnado a declaração de resolução destes mesmos actos.

D) A Sra. administradora de insolvência fundamenta a resolução dos referidos contratos de compra e venda no art. 121º/h) do CIRE, que se refere a actos a título oneroso realizados pelo insolvente no ano anterior à data de início do processo de insolvência.

E) A garantia pessoal prestada pelos insolventes a favor da ora recorrente não foi resolvida em benefício da massa insolvente pela Sra. administradora de insolvência.

F) Pelo que o tribunal a quo não pode fundar a decisão de improcedência da impugnação da resolução dos contratos de compra e venda supra aludidos, com sustento no art. 121º/d) do CIRE, ou seja, invocando a prestação do referido aval pelos insolventes.

G) Trata-se, além de um manifesto erro de julgamento, de um vício de excesso de pronúncia, uma vez que nenhuma das partes do processo solicitou ao tribunal a quo que se pronunciasse sobre a existência, validade e eficácia da constituição do aval pelos insolventes, mas tão só e apenas que se pronunciasse sobre validade da resolução efectuada pela Srª administradora de insolvência dos contratos de compra e venda em causa nos presentes autos.

H) A sentença recorrida é, portanto, nula.

I) Constitui um erro grosseiro e manifesto de aplicação do direito o facto de a decisão recorrida considerar que a prestação de uma garantia a favor da ora recorrente pelos insolventes e o facto de o insolvente ter representado a recorrente num negócio, cria uma especial relação entre as partes, para os efeitos previstos no art. 120º/4 do CIRE, nomeadamente, para decidir que se verifica a presunção de má fé da ora recorrente na celebração dos dois contratos de compra e venda dos imóveis alienados à recorrente.

J) A presunção de má fé da recorrente é inexistente, uma vez que esta não é pessoa especialmente relacionada com o insolvente, requisito exigido pelo art. 120º/4 do CIRE para operar a presunção de má fé do terceiro adquirente.

K) Em primeiro lugar, porque a ora recorrente não integra qualquer das situações elencadas no art. 49º do CIRE, que define o critério e o âmbito de pessoa especialmente relacionada com o insolvente, pelo que se deverá concluir pela não aplicação da presunção prevista no artigo 120º/4 do CIRE.

L) Em segundo lugar, porque o facto de os insolventes terem representado o recorrente num concreto acto negocial, não implica uma especial relação entre a recorrente e os insolventes, nem tão pouco faz presumir a existência de tal especial relacionamento.

M) Não se encontram, assim, preenchidos os requisitos previstos na al. h) do art. 121º do CIRE.

N) As obrigações assumidas pelos insolventes no âmbito dos contratos de compra e venda dos imóveis não foram manifestamente excessivas em confronto com as atribuídas à contraparte.

O) Ao invés, o confronto do valor dos imóveis alienados à recorrente com o valor dos ónus e encargos que impendem sobre mesmos reduz o seu valor venal, tal como foi considerado pelos Srs. peritos que avaliaram os imóveis em causa conforme resulta dos documentos 5 e 6 juntos com a p.i. dos insolventes.

P) As obrigações assumidas pela recorrente e pelos insolventes nos contratos de compra e venda foram objectivamente equivalentes, nunca configurando “um desfasamento gritante entre as prestações das partes contratantes” conforme se considerou erradamente na decisão recorrida.

Q) Deve, assim, ser dado provimento ao presente recurso de apelação, pois que o tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, tendo gizado uma incorrecta interpretação dos preceitos legais analisados e aplicáveis ao caso sub iudice, devendo a sentença recorrida ser revogada com todas as devidas consequências legais.

A massa insolvente contra-alegou.

O Sr. juiz signatário da sentença pronunciou-se quanto à nulidade invocada, negando a verificação da mesma.

* Questões que importa decidir: a da nulidade da sentença – ou da verificação do fundamento resolutivo do art. 121º/1d) do CIRE (conclusões A) a H)); a da inexistência da relação especial entre a (…) e os insolventes, impedindo o funcionamento da presunção de má fé – ou da verificação do fundamento resolutivo por prejuízo causado por má fé presumida, do art. 120º/1 e 4 do CIRE (conclusões I) a M)); a da inexistência de prejuízo para a massa insolvente por o valor dos imóveis, diminuído do valor dos ónus e encargos, ser equivalente ao preço pago – ou da verificação do fundamento resolutivo incondicional, do art. 121/1h) do CIRE (conclusões N) a P)).

* Os factos dados como provados foram os seguintes: A) Em 18/12/2006, no Cartório Notarial de Lisboa, os insolventes declararam vender, livre de ónus e encargos, à (…)Investmentes LLC, com sede em (…) Wilmington, (…) Delaware, EUA, o prédio urbano composto por uma parcela de terreno para construção sito na Urbanização X..., Lote ..., freguesia e concelho de ..., descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º x... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ..., com autorização de loteamento registada, pelo preço de 100.000€ que declararam já...

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