Acórdão nº 659/08.0TBFND.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Janeiro de 2011
Magistrado Responsável | TELES PEREIRA |
Data da Resolução | 25 de Janeiro de 2011 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – A Causa 1.
Emergiu o presente recurso de um processo de expropriação por utilidade pública, no qual o estatuto de entidade expropriante foi assumido – após Declaração de Utilidade Pública (DUP) referida ao edifício denominado “Cine-Teatro …” – pelo Município do … (doravante indicado como Expropriante e, no contexto deste recurso, como Apelante).
A tramitação judicial desta expropriação foi induzida pelo requerimento de fls. 2/4, apresentado em 29 de Outubro de 2008[1] pelos interessados (Expropriados) M… e marido, J… (doravante mencionados como Expropriados[2] e Apelados), aí requerendo estes o seguinte: “[…] nos termos da alínea e) do nº 2 do artigo 42º do Código das Expropriações[[3]] que as funções de Entidade Expropriante passem a caber a V. Exa. Exmo. Juiz desta Comarca onde se situa o imóvel a expropriar, devendo por isso […] o Município do ...remeter-lhe o processo de expropriação ou o mesmo ser imediatamente avocado uma vez que o fundamento para V. Exa. passar a exercer as funções de entidade expropriante é o facto objectivo de o Município ter conferido carácter de urgência à expropriação (v. artigos 15º e alínea e) do nº 2 do artigo 42º e nº 4 do mesmo artigo do Código das Expropriações)” (transcrição de fls. 4).
Refere-se a expropriação, como antes se disse, ao edifício identificado como “Cine-Teatro …”, na cidade do …, decorrendo o acto expropriativo da Declaração de Utilidade Pública nº 202/2008, de 24 de Abril de 2008, emitida pela Assembleia Municipal do …, publicada no Diário da República – 2ª Série – nº 103, de 29 de Maio de 2008 (Parte H, p. 24105), cuja cópia consta de fls. 6 destes autos.
1.1.
No decurso da tramitação (judicial) da expropriação – e prescindimos aqui de descrever as inúmeras e confusas vicissitudes processuais que pautaram a atribulada marcha dos autos, na sequência do referido “requerimento inicial” de fls. 2/4[4] –, no decurso dessa tramitação, dizíamos, em 15/12/2008 (v. fls. 59), foi proferido pela Exma. Juíza, ao tempo titular do processo, o seguinte despacho (que foi suscitado pelo requerimento dos Expropriados constante de fls. 56/57[5]), cujo teor aqui transcrevemos dada a relevância que apresenta na economia decisória deste recurso: “[…] Sem prejuízo da decisão que vier a ser proferida quanto à questão da legitimidade activa, notifique-se o Município do … a fim de dar cumprimento ao disposto no artigo 54º, nº 2 do CE, remetendo o processo para decisão quanto ao incidente de reclamação e arguição de nulidades do auto de vistoria.
Acresce que, atento o disposto no nº 9 do artigo 21º do CE e ainda [no] artigo 54º do mesmo Diploma legal, não pode o Município do … proceder à posse administrativa e iniciar obras, devido à reclamação apresentada na «vistoria ad perpetuam rei memoriam» e respectivo relatório, e até que seja decidido o respectivo incidente.
[…]” [transcrição de fls. 59] 1.1.1.
Mais tarde, em 12/03/2009, apresentou o Expropriante o requerimento de fls. 161/162, no qual, depois de sublinhar a natureza urgente da expropriação e de indicar a paralisação durante longos meses desta, concluiu nos seguintes termos: “[…] Requer-se, pois, a V. Exa. Se digne devolver à entidade expropriante o processo de expropriação enquanto ao Tribunal não for possível tomar qualquer decisão, de forma a que, a aqui requerente possa a vir a impulsioná-lo, seguindo os trâmites legais, sem prejuízo da decisão que este Tribunal vier a tomar nesta sede.
[…]” [transcrição de fls. 162] 1.2.
Entretanto – no decurso da marcha do processo –, apresentaram os Expropriados acima indicados, em 26/07/2010, o requerimento que consta de fls. 290/292, do qual aqui se transcreve o seguinte trecho expositivo final (o qual viria a gerar a decisão aqui recorrida): “[…] [C]onsiderando que a constituição do colégio arbitral não foi efectuada nem notificada a todos os interessados no prazo de um ano após a Declaração de Utilidade Pública, requer-se aqui e expressamente, de acordo com o nº 3 do artigo 13º do Código das Expropriações que seja imediata e automaticamente declarada a caducidade da declaração de utilidade pública […] referente ao edifício denominado «Cine-Teatro …» […].
[…]” [transcrição de fls. 291/292] 1.2.1.
Originou este requerimento – que foi reiterado a fls. 295/296 pelos mesmos Expropriados – o despacho de fls. 333/351 – consubstancia este a decisão objecto do presente recurso –, o qual, atendendo a pretensão dos aludidos Expropriados, considerou “[…] verificada a invocada caducidade da declaração de utilidade pública nº 202/2008, publicada em Diário da República, 2ª Série, em 29/05/2008” (transcrição de fls. 350, sendo o sublinhado aqui acrescentado).
1.3.
Inconformado, apresentou-se o Expropriante a interpor o presente recurso (fls. 353), motivando-o a fls. 354/368, formulando as seguintes conclusões: “[…] [transcrição de fls. 365/368] 1.3.1.
Os Expropriados/Apelados responderam a fls. 372/382, indicando previamente – pugnando aí pelo não conhecimento do recurso – que consideravam que a decisão recorrida já teria transitado ao tempo da interposição da apelação, isto pressupondo um prazo de 15 dias para tal efeito.
1.3.2.
Foi o recurso admitido a fls. 386/391 – e muito bem, sublinha-se, apreciando desde já essa questão prévia suscitada pelos Apelados, dado sempre estar em causa um prazo para recorrer de 30 dias [artigo 685º, nº 1 do Código de Processo Civil (CPC)], ter o recurso sido interposto nesse prazo e não se tratando de processo urgente na tramitação aqui em causa [v. o artigo 44º do Código das Expropriações (CE)], sendo a decisão recorrida caracterizável pelo efeito de pôr termo ao processo (artigo 691º, nºs 1 e 5, este a contrario, do CPC).
II – Fundamentação 2.
Importa proceder à apreciação do recurso – assente, como se acabou de indicar, ser ele admissível e ter sido interposto tempestivamente –, sublinhando-se que a incidência temática da impugnação resulta da delimitação operada pelo Apelante através das conclusões transcritas no item 1.3., supra. É o que decorre da conjugação dos artigos 684º, nº 3 e 685º-A, nº 1, ambos do CPC.
Os factos a considerar – e tratam-se eles, fundamentalmente, de incidências processuais documentadas e comprovadas ao longo dos autos – são os seguintes, reproduzindo-se aqui o bem sistematizado elenco inserido no texto da decisão apelada: “[…] [1] – Em 29.05.2008 foi publicada em Diário da República, 2ª série, a Declaração n.º 202/2008, correspondente à declaração de utilidade pública em causa nos autos; [2] – Em 29.10.2008 M… e marido J…, nos termos da al. e) do n° 2 do artigo 42 e artigo 15º do Código de Expropriações, vieram requerer que as funções de Entidade Expropriante passem a caber ao Juiz desta Comarca onde se situa o imóvel a expropriar, fundando tal pretensão no facto objectivo de o Município ter conferido carácter de urgência à expropriação; [3] – Por despacho de 5.11.2008 determinou-se o cumprimento do disposto no artigo 42º, nº 3 do Código das Expropriações – Lei nº 168/99, na versão que resulta da 4.ª alteração, introduzida pela Lei nº 56/2008 de 4 de Setembro; [4] – Em 7.11.2008 M… e marido J… apresentaram neste juízo e junto do Município do …reclamação da vistoria ad perpetuam rei memoriam, invocando a sua nulidade; [5] Por despacho de 15.12.2008, decidiu-se que «Sem prejuízo da decisão que vier a ser proferida quanto à questão da legitimidade activa, notifique-se o Município do … a fim de dar cumprimento ao disposto no artigo 54º, nº 2 do CE, remetendo o processo para decisão quanto ao incidente de reclamação e arguição de nulidades do auto de vistoria.
Acresce que atento o disposto no nº 9 do artigo 21º do CE e ainda artigo 54º do mesmo diploma legal, não pode o Município do ...proceder à posse administrativa e iniciar as obras, devido à reclamação apresentada na "Vistoria ad perpetuam rei memoriam» e respectivo relatório, e até que seja decidido o respectivo incidente»; [6] – Em 18.12.2008 foi solicitado pela Mma. Juiz à Câmara Municipal do ...o envio de cópia certificada do processo de expropriação; [7] – Em 30.12.2008 pela Câmara Municipal do … foi enviado para este Tribunal cópia certificada do original do processo de expropriação, até à primeira marcação da vistoria ad perpetuam rei memoriam para o dia 22 de Outubro de 2008, cujo original foi remetido ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, no âmbito do Processo n° 353/08.2BECTB (Acção administrativa especial de pretensão conexa com actos administrativos, a qual foi julgada improcedente) e o original do processo administrativo a partir daquele ponto; [8] – Posteriormente e por despacho de 6.02.2009 decidiu-se formular «convite que dirijo aos requerentes, concedendo-se o prazo de 15 dias, e com advertência de que não sendo respeitado, os requerentes serão considerados parte ilegítima, com a consequente absolvição da entidade expropriante desta instância judicial, e remessa do processo novamente para a entidade expropriante – CM …»; [9] – A 27.02.2009 a sociedade A…, Lda. veio, nos termos do disposto no nº 3 do artigo 42° do Código das Expropriações, também requerer que as funções de Entidade Expropriante passem a caber ao Juiz desta Comarca; [10] –...
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