Acórdão nº 243/06.3TBFND-B.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 22 de Março de 2011

Magistrado ResponsávelTELES PEREIRA
Data da Resolução22 de Março de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – A Causa 1.

Teve início a instância de oposição à execução da qual emergiu o presente recurso em 23 de Julho de 2008. Refere-se ela a uma execução para prestação de facto [artigo 933º e seguintes do Código de Processo Civil (CPC)], sendo que essa execução havia sido instaurada, por sua vez, em 9 de Maio de 2008[1] pretendendo os Exequentes concretizar, através dela, como explicitaremos na subsequente exposição, a prestação de facto correspondente à eliminação de umas janelas determinada pela Sentença do Círculo Judicial da Covilhã, que transitou em julgado e consta de fls. 204/213 do respectivo processo (constituiu tal acção declarativa de condenação a matriz de todos os outros processos aqui em causa e que viriam a ser apensados a essa acção numa relação sequencial de dependência).

Foi a mencionada execução instaurada por M… e J..

(os AA. no mencionado processo-matriz, posteriormente Exequentes, ocupando no presente contexto a posição de Apelados) contra o Município do ...(R. na acção declarativa – aí condenado a eliminar umas janelas num seu prédio –, Executado, Opoente à execução e, no presente contexto, Apelante).

Na oposição – e é dela, relacionando-a com o que a originou, que aqui importa falar – invocou o Município, enquanto Opoente à pretensão executiva, ter cumprido integralmente, após o trânsito dessa condenação, a injunção comportamental que lhe foi imposta pela Sentença apresentada como título executivo, tapando efectivamente as janelas mandadas suprimir nessa decisão[2], devendo ser julgada extinta pelo cumprimento essa mesma execução. 1.1.

Os Exequentes, enquanto destinatários da oposição, contestaram, pugnando pela improcedência desta, invocando que a Sentença permanece incumprida pelo Executado, na parte em que o obrigava a refazer a parede do seu prédio que dava para o prédio dos Exequentes, permanecendo nessa parede as janelas – rectius, o que do exterior parecem janelas –, não obstante a colocação de “tapumes” (a expressão é dos Executados) vedando as aberturas correspondentes[3].

1.2.

Teve lugar o julgamento documentado a fls. 92/96, decidindo o Tribunal a oposição através da Sentença de fls. 97/106 – esta constitui a decisão objecto do presente recurso –, julgando-a improcedente, considerando incumprida a Sentença correspondente ao título executivo e, nesse sentido, subsistente o fundamento para a execução.

1.3.

Inconformado com este resultado da oposição, interpôs o Executado Município do ...o presente recurso, recebido – adequadamente recebido, com efeito – a culminar as vicissitudes relatadas na nota 2, supra. Foi, pois, o recurso motivado a fls. 190/207 e rematado com as conclusões que aqui se transcrevem: “[…] [transcrição de fls. 199/207] II – Fundamentação 2.

Relatadas que estão as circunstâncias que originaram o recurso, importa apreciá-lo. Ora, tratando-se de indicar, enquanto ponto de partida imprescindível, o respectivo âmbito temático, teremos em conta que essa delimitação resulta das conclusões com as quais o Apelante rematou a sua motivação (é o que decorre da conjugação dos artigos 684º, nº 3 e 685º-A, nº 1 ambos do CPC).

Os factos a considerar – a matéria de facto provada, como qualifica a Sentença o resultado da dimensão do julgamento que antecedeu e possibilitou a operação subsuntiva – correspondem ao elenco inserido a fls. 99/101, que transcreveremos de seguida: “[…] 1.

Correu termos no Tribunal Judicial da Comarca do Fundão a acção de processo ordinário n.º 243/06.3TBFND, na qual foram AA. M… e J… e R. o aqui oponente Município do ....

  1. No referido processo foi proferida sentença, no dia 11 de Setembro de 2007, pelo Círculo Judicial da Covilhã, na qual foi decidido que: Atento todo o exposto e o mais de Direito, decidimos julgar parcialmente procedente a acção e, em consequência, condenamos o R. Município do ...a:

    1. Reconhecer a propriedade dos autores sobre o prédio urbano descrito nos artigos 1.° e 2.° da petição inicial.

    2. Proceder imediatamente ao fecho e tapagem das todas as janelas que abriu na parede traseira do prédio urbano referido nos artigos 11.° e 12.° da petição, que confina e deita directamente para o prédio dos AA. referido no artigo 1.° dessa mesma petição, refazendo essa parede por modo a que fique sem quaisquer aberturas.

    3. Indemnizar os autores no montante de €5.000,00, absolvendo-o do restante pedido.

    4. Julgar improcedente o pedido reconvencional formulado pelo R/Reconvinte contra os AA.

    5. Custas da acção na proporção de 1/5 para a autora e 4/5 para o R., sendo as do pedido reconvencional a suportar pelo réu/reconvinte.

  2. Os ali AA. intentaram acção com processo executivo contra a ali R./Reconvinte.

  3. É título executivo na referida execução a sentença mencionada em 1.

  4. A Executada/oponente já procedeu ao fecho e tapagem das três janelas existentes na parte traseira do prédio urbano de sua propriedade.

  5. Os materiais utilizados pela Executa/oponente para fecho e tapagem das janelas foram portadas de madeira fixadas à parte exterior da parede do prédio em questão e a construção no interior de uma parede em duas placas de gesso comercialmente conhecido por pladur fixado no meio das duas placas em estrutura metálica.

  6. As obras realizadas pela Executada/oponente impedem totalmente qualquer passagem de ar, luz e vistas.

  7. As construções feitas pela Executada/oponente são inamovíveis e permanentes até e a menos que sejam destruídas.

  8. A parede que confronta com o prédio dos exequentes era uma parede sólida em pedra.

    […]” [transcrição de fls. 99/101] Note-se, ainda a respeito dos factos a considerar, a génese documental processual de parte significativa deles, tratando-se em tais casos de descrever incidências processuais de outras instâncias – rectius, de outros processos – directamente conexionadas com a presente oposição e que a antecederam. Sucede que todas essas incidências são acessíveis a esta Relação, expressam-se em documentos consubstanciadores, no contexto em que apareceram, de actos processuais e estão, enfim, perfeitamente assentes, podendo ser convocadas tais incidências na subsequente exposição, mesmo quando o elenco acima transcrito – e assim se justifica esta advertência – as não enuncie directamente. Referimo-nos, por exemplo, ao teor dos articulados da acção declarativa base, na qual se gerou o título executivo – a Sentença –, que determinou a execução para prestação de facto, à qual a Executada deduziu esta oposição; referimo-nos igualmente a outras passagens dessa mesma Sentença, que, para além do trecho decisório acima indicado pelo Tribunal a quo no item 2. do elenco fáctico, possam vir a ser consideradas relevantes na economia expositiva deste Acórdão.

    Assente isto, enunciaremos então o tema deste recurso (já aludido no final da nota 4, supra) como correspondendo à transposição para esta instância da mesma questão apreciada pelo Tribunal a quo, a saber: determinar se a injunção comportamental estabelecida pela Sentença (fechar e tapar as janelas; refazer a parede deixando-a sem aberturas), que os Apelados apresentaram como título executivo, se pode considerar observada (cumprida) através da eliminação das janelas nos termos que os autos documentam esse procedimento pelo R.

    (que tentámos descrever sem apoio gráfico na mencionada nota 4).

    Neste quadro temático adquire um papel central a interpretação do título executivo, o que aqui corresponde, por encadeamento lógico, à interpretação da própria Sentença. Daí que, na sua essência profunda, seja disso – de como deve ser interpretada uma sentença – que tratará parte significativa do presente recurso.

    2.1.

    No que aqui nos interessa – que é, chamemos-lhe assim, a questão das janelas e da parede –, a expressão decisória empregue na Sentença proferida a culminar a acção declarativa é a seguinte: “[...] [C]ondenamos o R. Município do ...a: […] 2.

    Proceder imediatamente ao fecho e tapagem de todas as janelas que abriu na parede traseira do prédio urbano […] que confina e deita directamente para o prédio dos AA.

    […] refazendo essa parede por modo a que fique sem quaisquer aberturas; [...]” [transcrição de fls. 213 da acção declarativa, sublinhado e destaque aqui acrescentados] Este elemento decisório, que expressou o caso julgado que veio a corresponder ao acertamento do direito dos AA. e se transferiu nessa expressão para o título executivo, fundou-se – e sublinhamos assim um aspecto relevante na economia expositiva deste Acórdão – no seguinte trecho da fundamentação jurídica dessa mesma Sentença: “[…] Dos preceitos legais acima referidos resulta que as frestas, seteiras, ou/e óculos para luz têm apenas a função de permitir a entrada de luz e ar. As janelas, aberturas de maiores dimensões, dispõem de um parapeito que permit[e] desfrutar das vistas que elas proporcionam.

    Assim, e por força do disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 1363º [do CC], no que respeita às frestas, seteiras ou óculos para luz e ar, o proprietário só pode abri-las livremente no seu prédio, a distância inferior a um metro e meio do prédio vizinho, desde que elas não tenham, numa das suas dimensões, mais de 15 cm e se situem, pelo menos, a 1,80 de altura, a contar do solo ou do piso do compartimento que se destinem a servir. Se tais aberturas tiverem dimensões superiores às legais ou se situarem a uma altura inferior à fixada na lei são irregulares ou ilegais, não se devendo qualificar como janelas, pois não deixam de ser frestas, seteiras e óculos para luz, embora irregulares. E, de acordo com o que consideramos ser a posição mais correcta […], entendemos que a abertura de frestas sem as características indicadas no artigo 1363º, nº 2 pode originar a aquisição, por usucapião, de uma servidão predial, já que o proprietário que abra frestas irregulares excede o âmbito dos poderes contidos no seu direito de propriedade e sujeita o proprietário vizinho a um encargo que não lhe pode ser imposto unilateralmente, Consequentemente a este assiste o...

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