Acórdão nº 656/05.8TBPCV.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Fevereiro de 2011

Magistrado ResponsávelISAÍAS PÁDUA
Data da Resolução23 de Fevereiro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam neste Tribunal da Relação de Coimbra I- Relatório 1. O autor, A...

, instaurou (em 15/9/2005), contra a ré, B...

, ambos melhor identificados nos autos, a presente acção declarativa, com a forma de processo ordinário, pedindo a condenação da última: “a) A reconhecer que o autor adquiriu o seu direito de compropriedade (por si e por antepossuidores), por usucapião, sobre os imóveis supra identificados; b) A reconhecer ao autor o seu direito de compropriedade, na proporção de metade, sobre os prédios supra identificados, sobre os bens, equipamentos e utensílios, benfeitorias e veículos automóveis identificados na p.i.; c) A restituir ao autor, na aludida proporção de metade, os bens em questão, não praticando actos que impeçam o exercício do direito de compropriedade por parte daquele; d) ou, assim se não entendendo, a indemnizar o autor pela quantia global conhecida de 997,60 euros e a que vier a ser apurada em sede de prova pericial (face ao desconhecimento dos valores envolvidos, conhecidos integralmente pela ré), correspondente a metade de todas as aquisições, investimentos, melhoramentos, despesas e benfeitorias realizados nos bens em causa, em virtude da acessão industrial imobiliária e mobiliária, assim como de todos os rendimentos e frutos recebidos em virtude de arrendamento e até exploração dos estabelecimentos (de combustível e café), correspondente a 1/2 de tudo o mencionado e também pago pelo autor, acrescido de juros de mora contabilizados desde a citação e até integral pagamento.” Para o efeito, e em síntese, alegou: Ter vivido com a ré em união de facto, como se de marido e mulher se tratassem, tendo, ao longo desse período em que viveram juntos, adquirido um património comum (composto de vários bens móveis e imóveis, que descrimina naquele seu articulado inicial) conseguido com a contribuição de ambos em rendimentos e trabalho.

Cessado que foi tal relacionamento, reclama, por isso, o seu direito de compropriedade (na proporção de metade) sobre tais bens, o que a ré se recusa a reconhecer, já que se afirma a única proprietária dos mesmos.

2. A ré contestou, pugnando pela improcedência da acção e a sua absolvição do pedido, dado que o autor não contribuiu para a aquisição dos aludidos bens - com excepção de duas fracções autónomas que conjuntamente com a ré adquiriu e que ambos depois venderam, sem que o seu produto fosse utilizado a favor da aquisição de património -, sendo que ao longo desses anos de vivência em comum o autor fez sempre questão de manter os seus rendimentos à parte dos rendimentos da ré.

3. Replicou o autor, mantendo a seu versão inicial dos factos e o seu pedido.

4. Foi proferido despacho saneador, no qual se afirmou a validade e a regularidade da instância, elaborando-se depois a selecção da matéria de facto.

5. Procedeu-se, mais tarde, à realização do julgamento – com a gravação dos depoimentos prestados em audiência -, sem que a decisão da matéria de facto tivesse então sido objecto de qualquer censura.

6. Seguiu-se a prolação da sentença que, a final, julgando apenas parcialmente procedente a acção, decidiu condenar a ré a pagar ao autor “a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, correspondendo a metade do valor do estabelecimento de abastecimento de combustíveis identificado na alínea G), ao qual se deduzirá metade da quantia ainda em divida no âmbito do contrato de mútuo referido em P), valor que será acrescido de juros de mora, contabilizados desde a citação e até integral pagamento.” 7. Não se conformando com tal sentença, o autor e ré dela apelaram.

8.

O autor/apelante concluiu as respectivas alegações de recurso que apresentou nos seguintes termos: […] 9. Por sua vez, a ré concluiu as suas alegações de recurso nos seguintes termos: [..] Nestes termos (…) deverá a Sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue improcedente o pedido formulado pelo Autor, dele se absolvendo a Recorrente.

” 10. Nenhuma das partes contra-alegou o recurso da outra.

11. Corridos que foram os vistos legais, cumpre-nos, agora, apreciar e decidir.

*** II- Fundamentação 1.

Do objecto dos recursos.

1. Começaremos por sublinhar que os presentes recursos (de apelação), dada a data da instauração da acção, foram processados e serão julgados à luz das disposições do CPC vigentes à data da reforma que lhe foi introduzida pelo DL nº 303/2007 de 24/8 (artºs 11, nº 1, e 12, nº 1, desse DL) e a cuja versão (anterior a esse DL) pertencerão os normativos daquele diploma que porventura venham doravante a ser indicados.

Constitui entendimento, desde há muito pacífico, que são as conclusões das alegações dos recursos que fixam e delimitam o seu objecto (cfr. ainda artºs 684, nº 3, e 690, nºs 1 e 4, do CPC).

Calcorreando as (extensas) conclusões das alegações dos recursos de apelação (interpostos pelo autora e pela ré), verifica-se que as questões de que importa aqui conhecer e apreciar serão, essencialmente, as seguintes: b) Da impugnação/alteração da decisão da decisão da matéria de facto (referente a ambos os recursos).

  1. Do erro de julgamento de direito - quanto ao mérito da causa - (referente a ambos os recursos).

*** 2.

Quanto à 1ª questão.

2.1 Da impugnação da decisão da matéria de facto.

2.1.1 Questão prévia.

Vem, desde há muito, constituindo entendimento prevalecente que a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto deve ser feita por referência expressa (havendo-a, como sucede no caso dos autos) aos pontos concretos da base instrutória de cuja resposta se discorda, sendo que a falta dessa indicação não impõe, antes da rejeição liminar da impugnação, o prévio convite ao recorrente para proceder à especificação de tais pontos (vidé ainda, por todos, e no sentido defendido, Acs. do STJ de 06/10/2005, in “Rec. Agravo nº 1336/04, 2ª sec.”; de 11/10/2005, de 5/2/2004, de 20/3/2003 e de 9/7/2003 in www.dgsi.pt/jstj, Amâncio Ferreira, in “Manual dos Recursos em Processo Civil, 3ª ed., pág. 466” e Lopes do Rego, in “Comentários ao Código de Processo Civil, pág. 466”).

Já vimos que é pelas conclusões das alegações dos recursos que se fixa e delimita o objecto e o âmbito dos mesmos.

Ora, calcorreando as conclusões de recurso (que neste aspecto estão em sintonia com as alegações que as precedem) do autor/apelante delas se extrai que o mesmo se insurge contra a decisão da matéria de facto.

Todavia, e salvo o devido respeito, fá-lo de uma forma vaga e ambígua, em total desrespeito do artigo 690-A, nºs 1 e 2, do CPC, sendo que o único ponto da base instrutória por si ali expressamente referenciado é o quesito 5º (ali se indicando concretamente o sentido da resposta que defende dever ser-lhe dado – cfr. nº 17 das conclusões, as quais já referiremos estarem, nesse aspecto, em plena sintonia com as alegações que as precedem), pois que quanto ao demais fica este tribunal, desde logo, sem saber os concretos os pontos da base instrutória que se pretende impugnar e o respectivo sentido de resposta.

Desse modo, no que concerne à impugnação da decisão da matéria de facto do A./apelante, apenas se aceitará e considerará a impugnação feita quanto à resposta dada ao ponto ou quesito 5º da base instrutória, rejeitando-se a mesma quanto ao demais.

2.1.2 […] 2.1.3 Dado que a prova foi gravada e uma vez que, no que concerne à impugnação dos aludidos quesitos, foi dado suficientemente cumprimento ao disposto no artº 690-A do CPC, nada obsta a que se reaprecie aquela matéria de facto que foi objecto de impugnação e que se altere a mesma no caso de se vir a concluir que os elementos probatórios produzidos nos autos o justificam plenamente (cfr. artº 712, nºs 1 e 2, do CPC).

Antes, porém, de entrarmos na concreta apreciação da questão em apreço, teceremos umas breves considerações de cariz teórico-técnico que, a esse propósito, se nos afiguram úteis realçar.

Começaremos por salientar que no...

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