Acórdão nº 788/09.3TBMGR-C.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Fevereiro de 2011

Magistrado ResponsávelFRANCISCO CAETANO
Data da Resolução01 de Fevereiro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: 1.

Relatório No processo especial de insolvência n.º 788/09.3TBMGR pendente no Tribunal Judicial da comarca da Marinha Grande foi declarada a insolvência de “A..., Lda.”.

Convocada a assembleia de credores para discussão e votação da proposta de plano de insolvência apresentado pelo administrador da insolvência e após votação contra o plano, dos credores Caixa B...

, Instituto da Segurança Social, IP (ISS) e Fazenda Nacional (FN), foi o mesmo aprovado.

Finda a votação, o credor ISS requereu, em acta, invocando o disposto no art.º 215.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), a recusa oficiosa da homologação do plano, com fundamento em falta de harmonização com o regime geral de regularização de dívidas à Segurança Social, designadamente com a Lei Geral Tributária (LGT – DL n.º 398/98, de 17.12) e com o DL n.º 411/91, de 17.1.

Após publicação da deliberação, foi proferida sentença a homologar o plano.

Inconformados com a decisão, o M.º P.º, em representação da FN e o ISS recorreram, em cujas alegações formularam, as seguintes resumidas conclusões: A) – O Ministério Público a) – O plano de insolvência homologado contempla um perdão de créditos fiscais e um regime de moratória e prestacional contrários ao estabelecido nas normas aplicáveis aos créditos fiscais; b) – Estipula o n.º 2 do art.º 103.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) que “os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes” e o art.º 165.º, n.º 1, alín. i), que a “criação de impostos e sistema fiscal e regime geral das taxas e demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas” é da competência da Assembleia da República; c) – A norma contida nos art.ºs 192.º n.º 1 e 196.º do CIRE é material e organicamente inconstitucional, por violação dos art.ºs 103.º, n.º 2 e 165.º, n.º1, alín. i), da CRP, na interpretação de que a mesma pode afastar as normas imperativas e especiais de natureza fiscal, tanto mais que não consta da Lei n.º 39/2003, de 22.8, que autoriza o Governo a legislar sobre insolvência, qualquer norma cujo sentido e extensão sejam os de derrogar a obrigatoriedade de constituição de garantias de pagamento de impostos de modo prestacional (art.º 199.º do CPPT), considerar o aumento do número de prestações para além dos limites impostos (n.º 5 do art.º 196.º do CPPT), derrogar as consequências da falta de pagamento de qualquer das prestações (art.º 200.º do CPPT), reduzir ou eliminar o montante da prestação dos impostos (art.º 30.º, n.º 2, da LGT) e derrogar proibição da concessão de moratórias no pagamento de impostos, ou de juros compensatórios que integram a prestação tributária (art.º 36.º, n.º 3, da LGT); d) – É ilegal a sentença de homologação do plano de insolvência por terem sido aplicadas e interpretadas normas que ofendem o princípio da reserva absoluta da lei formal e a legalidade tributária, constantes dos art.ºs 103.º, n.º 2 e 165.º, n.º 1, alín. i), da CRP; e) – Deveria ter sido oficiosamente declarada a não homologação do plano de insolvência por violação não negligenciável das normas fiscais referidas, como dispõe o art.º 215.º do CIRE.

Concluiu pela revogação da sentença e substituição por decisão que denegue a homologação do plano de insolvência.

* B) – O Instituto da Segurança Social, IP a) – Pela Segurança Social foram reclamados créditos sobre a insolvência devidamente reconhecidos no processo, provenientes de contribuições e respectivos juros de mora, do período de mediou entre Janeiro de 2004 e Maio de 2009, no valor global de € 110.264,56, sendo o montante de € 109.939,56 privilegiado, nos termos dos art.ºs 10.º e 11.º do DL n.º 103/80, de 9 de Maio, atendendo à limitação prevista no art.º 97.º, n.º1, alín. a), do CIRE; b) – Do plano de insolvência aprovado constam condições de regularização da dívida à Segurança Social que violam normas imperativas, nomeadamente o estabelecido no DL n.º 411/91, de 17.10 e a LGT; c) – O perdão total de juros vencidos e vincendos não se harmoniza com o grau de disponibilidade dos créditos públicos, violando, por isso, as normas aplicáveis em matéria de regularização de dívidas ao Estado, o mesmo acontecendo quanto à regularização de dívidas à Segurança Social, onde se não acede à concessão de períodos de carência, bem como a insolvente não demonstrou poder oferecer garantia idónea susceptível de assegurar o pleno cumprimento das dívidas (art.º 5.º do DL n.º 411/91 e n.º 2 do Desp. Normativo n.º 220/92, de 25.11); d) – A sentença recorrida padece de excesso de pronúncia quando se pronunciou sobre questão que lhe não foi colocada, retirando dessa pronúncia consequências na decisão no que diz respeito à tentativa de demonstração de que o plano aprovado é mais benéfico aos interesses da Segurança Social do que a liquidação; e) – O direito à segurança social encontra-se consagrado no art.º 63.º da CRP e é essencial, com vista a efectivar tal direito, que os beneficiários e as entidades patronais cumpram com as suas obrigações, principalmente o pagamento pontual da taxa social única, fonte de financiamento da Segurança Social essencial para a atribuição das prestações sociais nas eventualidades garantidas pelo sistema; f) – Atendendo aos interesses em causa, constitucionalmente protegidos, o legislador ordinário teve que criar normas específicas que actuam como desincentivo suficientemente penoso para os agentes incumpridores, assentando todo o sistema da Segurança Social em normas de carácter público, imperativo que, por isso, não pode ser modificado pela simples vontade das partes, nem sequer da própria Segurança Social fora do quadro restrito que o legislador impos, traduzindo-se num dever imposto a todos, a fim de alcançar uma meta constitucional; g) – À semelhança do que sucede com a relação tributária há, assim, uma dupla vinculação nos princípios da legalidade e igualdade, princípios esses que estão enunciados nos art.ºs 13.º, 103.º e 104.º, todos da CRP, e que têm como consequência a indisponibilidade dos direitos a ele conexos - Ac. RP de 7.4.08; h) – Conforme salienta o legislador no preâmbulo do DL n.º 103/80, de 9.5, “o presente diploma fará desaparecer quaisquer expectativas de que a Previdência se manterá inactiva ou benevolente…”, uma vez que as empresas, subvertendo o sistema previdencial e as regras da concorrência, ao não procederem ao pagamento pontual das suas obrigações contributivas, financiam-se à conta da Segurança Social; i) – Refere ainda que “tal situação e a experiência colhida aconselham à tomada de medidas que permitam reconduzir a função financiadora das empresas para outras sedes (…)...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT