Acórdão nº 1922/07.3TBPMS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 03 de Maio de 2011

Magistrado ResponsávelMOREIRA DO CARMO
Data da Resolução03 de Maio de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I – Relatório 1. J (…), residente em ..., intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra A (…), com sede em ..., pedindo: A) Seja admitido o chamamento do Banco (…); B) Seja a ré condenada a pagar ao chamado Banco (…) o montante que se encontrar em divida na data da sentença, relativamente ao mútuo contraído pelo autor e pela falecida esposa; C) Seja a ré condenada a indemnizar o A. no valor do montante pago pelo mesmo ao Banco (…), entre 31 de Outubro de 2004 e a presente data, no montante de 22.680 €, ou noutro que se apurar nos termos do disposto no artigo 569º do Código Civil; D) Seja a ré condenada a indemnizar o A. no valor do montante pago pelo mesmo ao Banco (…) entre a presente data e até efectivo e integral pagamento pela ré ao Banco (…) do montante pedido em B), acrescido de quaisquer responsabilidades contingentes ao mesmo mútuo também pagas pelo autor (taxas, impostos, juros, etc.), em montante a liquidar a final; E) Condenar-se a ré a indemnizar o A. no valor do montante pago pelo mesmo à própria ré desde a data do acidente até a presente data, no montante de 643,83 €; F) Condenar-se a ré a indemnizar o autor no valor do montante pago pelo mesmo, a titulo de seguro de vida adstrito ao mútuo bancário, entre a presente data e a data da sentença, em valor a liquidar a final; G) Ser a ré condenada a pagar ao autor os juros moratórios devidos sobre as quantias ilíquidas pedidas nas alíneas C) e D).

Alegou para tanto, e em suma, que: no ano 2000, e no âmbito de construção da casa onde reside actualmente com os seus filhos menores, nomeadamente por força do mútuo contraído perante o então Banco (…), S.A., (actualmente no Banco (…) e com o número ...) para essa mesma construção, o autor e a sua esposa contrataram duas apólices, ambas de seguro de vida; a apólice que aos autos importa, em que era segurado e pessoa segura a sua esposa R (…), foi celebrada por contrato outorgado em 19-01-2000, com o nº (...), e sempre foram pagos tempestivamente os respectivos prémios, sendo o capital seguro o montante de 99.759,58 €; o seguro de vida garante o pagamento ao beneficiário Banco (...) do montante que se encontrar em dívida à data do óbito ou invalidez absoluta e definitiva, por um período de 30 anos, devendo o remanescente ser pago ao autor e, na sua falta, aos filhos do casal; o Banco (…) foi adquirido pelo Banco (…) S.A., pelo que, actualmente, o (…) é o beneficiário de tal apólice; no dia 31 de Outubro de 2004, cerca das 03h00, o autor ficou a fechar o bar que explorava com a mulher, e a arrumar o mesmo, enquanto a sua falecida esposa, bem como uma amiga com quem estavam, C (…), saíram imediatamente para o local onde moram, (...), em ...; a estrada de ligação entre a (B...) e (...) é a E.N. 1, distando as localidades cerca de 2 km, e a estrada é, na sua maioria, uma recta, sendo que nos dias precedentes, foram realizadas obras de repavimentação nesse local, pelo que o piso estava muito alto comparativamente à berma da estrada; por razoes não apuradas, o veiculo conduzido pela falecida R (…), ao fim de poucas centenas de metros de ter iniciado a condução, terá resvalado para a berma do lado direito, no sentido de marcha em que seguia, o que a levou a mudar bruscamente de direcção, sendo que por força do piso estar muito molhado, o carro entrou em despiste e acabou por embater nos rails de protecção do lado contrário ao do seu sentido de marcha; o veículo capotou, imobilizou-se fora da faixa de rodagem, sendo que R (…) foi cuspida do automóvel e sofreu graves lesões na coluna e na cabeça, acabando por falecer no Hospital de (...), em (...), para onde foi transportada; o autor participou o acidente à ré, prestou a esta todas as informações, e a mesma informou o autor que não era sua intenção proceder ao pagamento da quantia segurada por haver um crime e se verificar a situação de exclusão prevista no artigo 3º das Condições Especiais; a apólice em questão, prevendo o pagamento da quantia, respeitante ao mútuo do (…), que se encontrasse em dívida na data do óbito da pessoa segura, assegurava àquele o ressarcimento integral do seu crédito, e ao autor e filhos, a desoneração da casa de morada de família e do pagamento mensal da prestação devida; a ré, ao não proceder ao pagamento dessa quantia, tem provocado danos ao autor, concretamente, tudo o que pagou e continua a pagar ao B (…), desde a data do óbito da esposa, a título de prestações do mútuo, as despesas contingentes a este (impostos, taxas diversas e juros), e o próprio seguro de vida do autor, também outorgado com a ré, com o mesmo fim e nas mesmas condições; desde a data do óbito da esposa, relativamente ao mútuo supra referido, encontrava-se em dívida a quantia de 102.984,75 €, sendo que o autor já pagou, até à presente data, quantia não inferior a 22.680 €, que nunca teria pago se a ré tivesse assumido as suas responsabilidades, e pagou ainda, relativamente ao seu seguro de vida, a quantia global de 643,83 €; o beneficiário designado no contrato de seguro de vida foi o Banco (…), pelo que sendo deferida a presente acção, é àquele que a ré terá que pagar o capital de indemnização, no que diz respeito ao seguro de vida, tendo aquela instituição bancária interesse no resultado da demanda.

A ré A (…) contestou, invocando, em síntese que: celebrou com R (…) um contrato de seguro de vida individual, com o número de apólice indicado e na data referida; a ré solicitou que lhe fosse remetido certificado de óbito, auto de ocorrência e declaração do credor hipotecário com valor em dívida à data do sinistro, sendo que lhe foi remetido o despacho de arquivamento de inquérito, do qual resulta que a análise toxicológica efectuada ao sangue da condutora do veículo e pessoa segura revelou uma taxa de alcoolemia de 1,47 g/l; a ré informou o autor que se verificava uma causa de exclusão do pagamento do capital segurado, em virtude da R (…) ter conduzido veículo em estado de embriaguez em via pública, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l, o que consubstanciou, pelo simples perigo presumida de lesão, um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292º do Código Penal; o falecimento da R (…) resultou da prática de um acto criminoso pela própria, pelo que nos termos do artigo 3º das Condições Gerais do contrato, a cobertura de risco da morte da pessoa segura fica excluída, não estando a ré obrigada a efectuar o pagamento do capital seguro nem dos demais danos e respectivos juros moratórios reclamados pelo autor; no mais, a ré impugnou os factos alegados pelo autor e concluiu pela improcedência da acção.

Admitida a intervenção principal activa do Banco (…), o mesmo ofereceu o seu articulado e alegou, em síntese, que: tendo interesse na vigência das condições de capital e juros estipuladas no contrato de mútuo celebrado com o autor e que o interesse deste pressupõe exactamente a extinção daquele contrato, não pode o chamado intervir como associado do autor mas antes como associado da ré A (…); impugnou os factos deduzidos pelo autor na petição inicial, sendo que a dar-se como provado que a acidentada tinha ingerido álcool e que não se coibiu se aumentar exponencialmente o risco de acidente, a verificação de uma taxa de álcool no sangue superior à criminalmente estabelecida no artigo 292º do Código Penal constitui acto criminoso para efeitos de aplicação da cláusula terceira das condições especiais da apólice; concluiu pela improcedência da acção.

Na réplica, o autor veio sustentar que a ré A (…) teria que provar, se tivesse alegado factos nesse sentido, que a consequência morte e o próprio acidente foram causa directa e necessária de R (…) conduzir em estado de embriaguez, pelo que não o tendo feito não procede tal excepção.

* A final foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência: - Condenou a ré A (…) a pagar ao Banco (…) ou à instituição que o represente ou lhe tenha sucedido no referido contrato de mútuo) e com referência à apólice n.º (...)1, o valor de 99.759,58 €; - Condenou a ré A (…) a pagar ao autor a totalidade dos valores por este liquidados ao Banco (…) S.A. a partir da data da concretização do risco previsto na apólice (31 de Outubro de 2004) acrescidos de juros legais, que vierem a ser liquidados.

No mais julgou a acção improcedente, absolvendo a ré do demais peticionado.

* 2. A Ré Alico interpôs recurso, apresentando as seguintes conclusões: (…) 3. Não houve contra-alegações.

II – Factos Provados 1. O autor foi casado com R (…), a qual faleceu em 31/10/2004, nos termos constantes do assento de óbito junto a fls. 22 dos autos e que se dá por reproduzido.

  1. A ré é uma companhia de seguros.

  2. No âmbito de construção da casa onde o autor reside actualmente, por força do contrato de mútuo contraído perante o Banco (…), S.A., actualmente no B (…) com o n.º ..., para essa mesma construção, o autor e R (…) contrataram duas apólices de seguro de vida.

  3. Por escrito particular datado de 19/01/2000, que R (…) e a ré denominaram de seguro de vida individual, foi celebrada a apólice n.º (...), nos termos, com as condições gerais, especiais e particulares constantes de fls. 11 a 17, e que se dão por reproduzidas, com o capital seguro de € 99.759,58, o segurado e a pessoa segura R (…).

  4. O autor e R (…) sempre pagaram tempestivamente os prémios, nomeadamente no ano de 2004.

  5. O escrito indicado em 4. garante o pagamento, ao beneficiário Banco (…), S.A., do montante do capital em divida referente ao mútuo indicado em 3. à data do óbito ou invalidez absoluta e definitiva, por um período de 30 anos, devendo o remanescente ser pago ao autor e, na sua falta, aos filhos do casal.

  6. O Banco (…), S.A. foi adquirido pelo Banco (…), S.A., actualmente B (…) tendo o último substituído o primeiro em todos os seus direitos e obrigações.

  7. Por força da gravidade das lesões sofridas por R (…) na sequência de embate de viação...

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