Acórdão nº 1346/11.8TBCVL-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Abril de 2013

Magistrado ResponsávelALBERTINA PEDROSO
Data da Resolução09 de Abril de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório 1. MA (…), por apenso à execução para entrega de coisa certa que lhe foi movida por MI (…), deduziu a presente oposição, pedindo que a mesma seja julgada procedente e, em consequência, seja absolvida do pedido por absoluta falta de título executivo.

Mais requereu a suspensão imediata do despejo ou o diferimento da desocupação do imóvel, porquanto é pessoa doente e não tem outra casa para habitar.

Para o efeito alegou, em síntese, que: A exequente não é parte legítima, já que o seu nome não consta do contrato de arrendamento, nem prova que seja proprietária, comproprietária ou usufrutuária do imóvel em causa.

Por outro lado, a oponente é casada com F..., desde 16 de Março de 2009, pessoa com quem vive há mais de sete anos, sendo que o marido não foi notificado para o despejo e, como tal, a executada é parte ilegítima desacompanhada do marido, porquanto lhe é comunicável o direito ao arrendamento.

Acresce que o contrato de arrendamento, de prazo inferior a cinco anos, é um contrato sem duração limitada, que se rege pelas regras aplicáveis aos contratos de duração indeterminada, pelo que só pode ser denunciado de acordo com os arts. 68º, 69º, 70º e 71º do RAU.

Assim, é nula a notificação que foi feita à executada, pelo que inexiste título executivo para produzir efeitos a cessação do contrato de arrendamento e o consequente despejo.

Para além disso, tal cessação e despejo sempre seria ineficaz por o marido da executada, também titular do arrendamento não ter sido notificado para a cessação do contrato e despejo.

  1. A exequente contestou, referindo ter legitimidade enquanto cabeça-de-casal da herança aberta por óbito de António Sequeira Fernandes, seu marido, e que a executada é parte legítima já que a mesma celebrou o contrato de arrendamento, em 2001, enquanto solteira, e tendo casado em 2009 fê-lo no regime da separação de bens.

    Mais alega que, ao contrato de arrendamento aplica-se o NRAU, que entrou em vigor em Agosto de 2006, o qual criou novos títulos executivos, sendo por isso eficaz, como título executivo, os documentos dados em execução para os fins pretendidos, concluindo, assim pela improcedência da presente oposição.

  2. Foi elaborado despacho saneador (fls. 48 e ss.), onde foram julgadas improcedentes as excepções dilatórias de ilegitimidade activa e passiva, e procedente a insuficiência do título executivo, por não ter sido efectuada a comunicação a ambos os cônjuges e o arrendado constituir a casa de morada de família, determinando-se, em consequência, a extinção da instância executiva.

  3. Inconformada com esta decisão a Exequente/Oponida interpôs o presente recurso de apelação que finalizou com as seguintes conclusões: (…) 5. Pela Recorrida foram apresentadas alegações que encerrou nos seguintes termos: (…) 9. Dispensados os vistos, cumpre decidir.

    ***** II. O objecto do recurso[1].

    O presente recurso de apelação e ampliação do respectivo objecto, suscitam, pela ordem lógica de apreciação, as questões essenciais de saber se: - o contrato de arrendamento se comunicou ao cônjuge da arrendatária; - a oposição à renovação do contrato tinha que ser comunicada ao ora cônjuge da arrendatária; - em caso negativo, se a acção executiva tinha que ser instaurada contra a arrendatária e respectivo cônjuge; - existe ou não título executivo validamente constituído.

    ***** III – Fundamentos III.1. – De facto: Na decisão recorrida foram considerados assentes os seguintes factos: 1. Nos autos de execução a que os presentes correm por apenso, foi dada à execução: i) Um documento, reduzido a escrito, assinado pelos contraentes, denominado “Contrato de Arrendamento”, no qual A (…), na qualidade de senhorio, cedeu a MA (…), na qualidade de arrendatária, o prédio urbano sito em ..., inscrito na matriz predial sob o artigo ... mediante a renda anual de 360.000$00, a pagar em duodécimos de 30.000$00, ao senhorio na respectiva residência, no primeiro dia do mês anterior a que respeitar, pelo prazo de um ano, com início em 1.05.2001 e com termo em 1.5.2002, considerando-se prorrogado por sucessivos períodos iguais e nas mesmas condições, caso não seja denunciado por qualquer das partes nos termos da lei.

  4. MI (…), na qualidade de «cabeça-de-casal da herança de (…)», por intermédio de advogado, remeteu a MA (…), carta registada, datada de 19 de Maio de 2008, na qual comunica-lhe, para além do mais, o seguinte (a qual juntou aos autos de execução): “Assunto: denúncia do contrato de arrendamento – habitação própria”.

    “É intenção da minha cliente, por si e na qualidade de cabeça-de-casal da herança aberta por óbito de (…), opor-se à renovação do contrato de arrendamento para fins habitacionais outorgado em 28 de Março de 2011, cujos efeitos produzir-se-ão a partir de 30 de Abril de 2011.

    Para o efeito, nos termos da legislação em vigor, nomeadamente do artigo 1097º do Código Civil, na sequência do aditamento decorrente da Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, serve a presente para comunicar a V. Exa. que se vem opor à renovação do contrato de arrendamento firmado entre ambas as partes em 28 de Março de 2001, devendo desocupar o arrendado a partir da data de 30 de Abril de 2011”.

  5. MA (…) casou com (…) no dia 16 de Março de 2009, sob o regime imperativo da separação de bens.

  6. MA (…) vive, pelo menos desde 2004, com (…) no imóvel identificado em 1.i..

  7. A (…) faleceu às 21 horas e 50 minutos, no dia 21 de Julho de 2005, no estado de casado com MI (…).

    ***** III.2. – O mérito do recurso Insurge-se a Recorrente contra o segmento do saneador-sentença recorrido que julgou procedente a excepção de ilegitimidade passiva da Recorrida/Opoente, considerando que o locado constitui casa de morada de família e, como tal, o cônjuge da arrendatária deveria ter sido notificado da oposição à renovação e, consequentemente, ser parte na presente acção executiva, concluindo que «não tendo sido efectuada comunicação supra mencionada a ambos os cônjuges, é forçoso considerar que não se formou um título executivo válido, que possibilite o prosseguimento da presente execução executiva contra os mesmos.

    Destarte, por impossibilidade de suprimento da aludida omissão em sede executiva, resta julgar a presente oposição procedente, e, consequentemente, julgar extinta a instância executiva (artigo 816.º, ex vi artigo 929.º, n.º 1, e 817.º, n.º 4, do Código de Processo Civil)».

    Em abono da sua pretensão invocou a Recorrente que quando o contrato de arrendamento foi celebrado a arrendatária era divorciada e que apenas teve conhecimento do seu casamento em sede de oposição à execução, o qual, tendo sido celebrado no regime da separação de bens, não possibilita a comunicação do arrendamento ao cônjuge, sendo certo que em momento algum ficou demonstrado que o locado era a casa de morada de família do casal, razão pela qual, não podia o Mm.º Juiz do Tribunal a quo dar como assente tal facto.

    Comecemos, pois, por apreciar se o contrato de arrendamento em apreço se comunicou ou não ao cônjuge da arrendatária.

    ***** III.2.1. Da comunicabilidade do contrato de arrendamento Conforme decorre dos documentos juntos aos autos de execução a que os presentes correm por apenso, foi dado à execução um documento reduzido a escrito, celebrado e assinado pelos contraentes em 28 de Março de 2001, denominado “Contrato de Arrendamento”, no qual A (…) na qualidade de senhorio, cedeu a MA (…), na qualidade de arrendatária, o prédio urbano sito em ..., inscrito na matriz predial sob o artigo ... mediante a renda anual de 360.000$00, a pagar em duodécimos de 30.000$00, ao senhorio na respectiva residência, no primeiro dia do mês anterior a que respeitar, pelo prazo de um ano, com início em 1.05.2001 e com termo em 1.5.2002, considerando-se prorrogado por sucessivos períodos iguais e nas mesmas condições, caso não seja denunciado por qualquer das partes nos termos da lei.

    Em face do ajuizado contrato de arrendamento, não subsistem quaisquer dúvidas de que apenas outorgou no mesmo a ora executada MA (…) na qualidade de arrendatária.

    Não dissentem também as partes quanto a estar demonstrado que MI (…) na qualidade de «cabeça-de-casal da herança de (…), por intermédio de advogado, remeteu a MA (…), carta registada, datada de 19 de Maio de 2008, na qual lhe comunicou, para além do mais, ser sua intenção opor-se à renovação do contrato de arrendamento firmado entre ambas as partes em 28 de Março de 2001, devendo desocupar o arrendado a partir da data de 30 de Abril de 2011.

    Acontece, porém, que entre a comunicação da oposição à renovação do contrato de arrendamento e a data prevista na mesma para a desocupação do imóvel, MA (...) casou com (…) no dia 16 de Março de 2009, sob o regime imperativo da separação de bens, facto que também não se mostra controvertido.

    Terá o casamento da arrendatária, por si só, alguma repercussão na relação arrendatícia, “comunicando-a” ao cônjuge? Dir-se-á, desde já, que não.

    Efectivamente, o contrato de arrendamento foi celebrado em 2001, no domínio da vigência do Regime de Arrendamento Urbano, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de Outubro, o qual expressamente previa no respectivo artigo 83.º[2] a incomunicabilidade do direito ao arrendamento habitacional, independentemente do regime de bens do casamento. No domínio da sua vigência era, pois, pacífico que a posição do arrendatário habitacional não se comunicava ao respectivo cônjuge, fosse qual fosse o regime de bens que estes tivessem adoptado[3].

    No entanto, no decurso do contrato de arrendamento cujos efeitos ora se apreciam, entrou em vigor no dia 28 de Junho de 2006 o Novo Regime do Arrendamento Urbano[4], introduzido pela Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro[5], cujo artigo 3.º introduziu uma norma inovadora, o artigo 1068.º do Código Civil[6], que sob a epígrafe “Comunicabilidade”, veio estatuir que “[o] direito do arrendatário comunica-se ao seu cônjuge, nos termos gerais e de acordo com o regime de bens...

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