Acórdão nº 253033/11.8YIPRT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 02 de Julho de 2013

Magistrado ResponsávelTELES PEREIRA
Data da Resolução02 de Julho de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – A Causa 1.

Através do requerimento injuntivo de fls. 2/3, apresentado em 07/10/2011 no Balcão Nacional de Injunções[1], pretendeu a empresa de trabalho temporário, T…, Lda.

[2] (Requerente e A.

na acção declarativa sucedânea desta injunção, e Apelada neste recurso), pretendeu esta empresa, dizíamos, realizar o valor global de €10.177,15 (capital: €9.289,84; juros: €785,31), contra a sociedade K…, Lda.

(Requerida e R.

e aqui Apelante)[3].

1.1.

Tendo a Requerida deduzido oposição à referida injunção (v. fls. 6/16)[4], foi o requerimento injuntivo apresentado à distribuição no Tribunal da Marinha Grande, originando-se a presente acção conexa com essa injunção a qual veio a ser julgada procedente – e é disso que aqui tratamos – nos termos constantes da Sentença de fls. 151/159, constituindo esta, pois, a decisão objecto do presente recurso[5].

1.2.

Inconformada, reagiu a R. apelando a esta instância, formulando a rematar o respectivo recurso as seguintes conclusões: “[…] II – Fundamentação 2.

Relatado o essencial do iter processual que conduziu à presente instância de recurso, cumpre apreciar os fundamentos da apelação, tendo em conta que as conclusões formuladas pela Apelante – transcrevemo-las no item 1.2.

supra – operaram a delimitação temática do objecto do recurso, isto nos termos dos artigos 684º, nº 3 e 685º-A, nº 1 do Código de Processo Civil (CPC)[6]. Com efeito, fora das conclusões só valem, nesta sede, questões que se configurem como de conhecimento oficioso (di-lo o trecho final do artigo 660º, nº 2 do CPC). Paralelamente, mesmo integrando as conclusões, não há que tomar posição sobre questões prejudicadas, na sua concreta incidência no processo, por outras antecedentemente apreciadas e decididas. E, enfim – esgotando a enunciação do modelo de construção do objecto de um recurso –, distinguem-se os fundamentos deste (do recurso) dos argumentos esgrimidos pelo recorrente ao longo da motivação, sendo certo que a obrigação de pronúncia do Tribunal ad quem se refere àqueles (às questões-fundamento) e não aos diversos argumentos jurídicos convocados pelo recorrente nas alegações.

Está em causa no recurso, com uma evidente expressão nas conclusões, a matéria de facto fixada na primeira instância, pretendendo a empresa Apelante obter um julgamento-outro da acção com base na eliminação do elenco dos factos provados dos itens 4, 5 e 9 (veja-se a conclusão 20) e com base na transferência para os factos provados dos itens 1, 2 e 3 do rol dos factos que o Tribunal julgou não provados (veja-se, neste caso, a conclusão 21). Alicerça-se esta pretensão da Apelante no accionar do dispositivo de acesso à matéria de facto pelo Tribunal da Relação, previsto no artigo 712º, nºs 1 e 2 do CPC (no caso ocorreu gravação da prova testemunhal[7]), sendo com base nesta recomposição fáctica que a Apelante pretende que a acção seja, depois, julgada improcedente.

2.1.

Os factos considerados (os factos positivamente fixados) na instância precedente foram os seguintes: “[…] 2.1.1.

Adicionalmente, elenca a sentença os seguintes factos como não provados (e, como vimos, todos estes são postos em causa no presente recurso): “[…] 1. O contrato celebrado entre a Requerida e a Requerente expressamente previa os valores de retribuição dos serviços prestados, não tendo nunca contratualizado com aquela o pagamento de valores a título de diferenças salariais devidas retroactivamente.

2. A requerente à data da celebração dos contratos com a requerida conhecia quais os valores constantes das tabelas salariais do IRCT aplicável ao sector.

3. A requerente celebrou contratos de prestação de serviços com conhecimento de que os montantes pagos aos trabalhadores se encontravam abaixo do montante mínimo.

2.2.

Na concretização do controlo dos factos que ora empreendemos convergem duas incidências respeitantes à dinâmica probatória: a reapreciação da prova produzida (da prova documental e da prova testemunhal) em si mesma; a aplicação das regras substantivas e adjectivas atinentes à prova. Quer isto dizer que o acesso deste Tribunal da Relação à prova produzida na primeira instância (no caso da prova testemunhal através do registo áudio desta), enfim, o controlo dos factos nesta instância, pressupõe tanto a apreciação dos factos face à prova, como a apreciação desses mesmos factos face às regras de prova, ou seja, face às regras de direito probatório material.

2.2.1.

Começando por esta última incidência – a respeitante à aplicação do direito probatório –, sublinharemos que “[o]s factos” (rectius, os factos provados) e os “[f]actos não provados” incluídos no trecho de fls. 152/155 da Sentença, correlacionados com a fundamentação que se lhes segue no texto da própria Sentença a fls. 155/156 (a análise crítica da prova prevista no nº 2 do artigo 653º do CPC, nesta espécie processual matizada pelo nº 7 do artigo 4º do regime anexo ao Decreto-Lei nº 269/98, de 1 de Setembro), pressupõem, na Sentença, após o julgamento da matéria de facto previsto no indicado artigo 653º – e citamos José Lebre de Freitas anotando o artigo 659º do CPC –, “[…] o apuramento de todos os factos da causa que, tidos em conta os pedidos e as excepções deduzidas, sejam relevantes para o preenchimento das previsões normativas, sejam elas de normas processuais, sejam de normas de direito material. Na anterior decisão sobre matéria de facto […], foram dados como provados os factos cuja verificação estava sujeita à livre apreciação do julgador […]. Agora, na sentença, o juiz deve considerar, além desses, os factos cuja prova resulte da lei, isto é, da assunção dum meio de prova com força probatória pleníssima, plena ou bastante […], independentemente de terem sido ou não dados como assentes na fase de condensação[[8]] […]. Ao fazê-lo, o juiz examina criticamente as provas, mas de modo diferente de como fez o julgador da matéria de facto: não se trata já de fazer jogar a convicção formada pelo meio de prova, mas de verificar atentamente se existiram os factos em que se baseia a presunção legal (lato sensu) e delimitá-los com exactidão para seguidamente aplicar a norma de direito probatório. Nomeadamente, o documento, o objecto da declaração confessória e o articulado de resposta no seu conjunto hão-de ser interpretados para se determinar o âmbito concreto dos factos abrangidos pela sua força probatória. […]”[9].

Interessam estas considerações em função da asserção que foi incluída pela Senhora Juíza a quo como item 1. dos factos não provados[10], quando existia no processo prova documental, anteriormente estabelecida e consolidada no seu valor [v. o artigo 376º, nº 1 do Código Civil (CC)], quanto ao exacto conteúdo dos contratos (não do contrato como se disse na Sentença) de utilização de trabalho temporário[11] celebrados entre a A., como empresa de trabalho temporário[12], e a R., como utilizadora deste[13].

Ora, a existência dessa prova, previamente estabelecida, quanto ao conteúdo exacto do clausulado contratual operante entre as aqui Requerida e Requerente – entre as partes nesses contratos e aqui partes nesta acção –, tira sentido, mesmo enquanto asserção negativa – não provada –[14], a uma suposta estatuição contratual que, inteiramente à margem do texto, parece querer dizer, passe a redundância, o que “diz” o texto do contrato quando este, verdadeiramente, o não “diz”.

Note-se que esta questão, aparentando pouca relevância prática, induziu na fundamentação jurídica do Tribunal a quo uma menor clareza, tributária de um certo enviesamento argumentativo referido à dedução da decisão final de uma suposta alocação do ónus da prova do conteúdo dos contratos à Requerida (v. o parágrafo do texto da Sentença iniciado no fim de fls. 158 e continuado a fls. 159 até à “decisão”)[15], quando o texto dos contratos à luz do regime legal dos contratos de utilização de trabalho temporário fornece – quer-nos parecer que fornece – a base factual suficiente, restando, apenas, a “questão de direito” da interpretação dos contratos. Com efeito, tenha-se presente que o conteúdo dos contratos juntos como documentos 1 a 7 pela A., os diversos contratos de fls. 49/67 (v. a acta de fls. 132), foi expressamente aceite pela R. ora Apelante no ponto 2 do requerimento de fls. 136, valendo quanto a esses documentos, em função desta particular incidência, o disposto no artigo 376º, nº 1 do CC. Reconhece(u) a R., pois – e reconhece a A. que apresentou esses documentos –, que esses contratos incluíram – incluíram todos eles – cláusulas com o exacto conteúdo, por exemplo, das cláusulas 4ª e 5ª do contrato de fls. 62/63 aqui indicado como mero modelo[16].

Significa isto a imprestabilidade de uma asserção de facto como a indicada na Sentença no item 1 dos factos não provados (mesmo como facto não provado, no sentido em que essa localização pressupõe que se pudesse fazer prova positiva dele) e, consequentemente, o fracasso da pretensão da Apelante de passar tal asserção para o rol dos factos provados. Todavia, por razões de completude e de coerência lógica do elenco fáctico positivamente fixado pelo Tribunal, existindo o item 2 dos factos acima transcrito, deve a redacção deste ser aprimorada/completada (v. o artigo 712º, nº 2 e nº 4, este a contrario[17], do CPC) com a indicação de que os contratos celebrados entre a A. e a R. têm o conteúdo dos...

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