Acórdão nº 400/07.5TBVNO-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 29 de Outubro de 2013
Magistrado Responsável | ALBERTINA PEDROSO |
Data da Resolução | 29 de Outubro de 2013 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório 1. E (…) Construções, Ld.ª, por apenso à execução para pagamento de quantia certa que lhe foi movida por A (…), deduziu a presente oposição, pedindo que a mesma seja julgada procedente por provada e, em consequência, a Oponente seja absolvida do pedido.
Para o efeito alegou, em síntese, que: O exequente adulterou a data de pagamento do cheque que a executada emitiu, com violação do pacto de utilização daquele cheque; Efectivamente manteve com o exequente relações comerciais no ano de 2006 e, na sequência dessas relações comerciais para efeito de pagamento de transacção comercial emitiu e entregou àquele, no ano de 2006, no mês de Maio, dois cheques; O primeiro, com o n.º 7254583648 era sacado sobre o M (...) e estava datado para 20 de Maio de 2006; o segundo desses cheques é o dado à execução, sendo que em relação a este refere ter sido a executada que preencheu a totalidade dos elementos nele insertos; A data correcta como sendo aquela que deveria constar no cheque seria a de 31 de Julho de 2006 e não 31 de Agosto de 2006, como ali consta, o que acontece derivado à alteração da data inicialmente nele aposta; Tal alteração é causa de revogação do cheque; Acresce que por via do decurso do prazo previsto no art. 52.º da LUCH o mesmo só pode ser tido como mero quirógrafo da obrigação ainda assim não podendo revestir eficácia executiva pela revogação do mesmo por si operada, em virtude de se ter gorado o negócio inicialmente acordado com o exequente, concluindo nada dever àquele e não poder valer o cheque como título executivo.
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O exequente contestou, pugnando pela não verificação da alegação da executada em todas as vertentes em que esta discorre para fundar a oposição apresentada, concluindo pela respectiva improcedência.
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Foi elaborado despacho saneador (fls. 38), dispensando-se a selecção da matéria de facto, atenta a simplicidade da causa.
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Foi realizada a audiência de discussão e julgamento, após o que a matéria de facto foi respondida nos termos constantes do despacho de fls. 175 a 178, não merecendo qualquer reclamação.
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Seguidamente foi proferida sentença que julgou procedente a oposição e determinou a extinção da execução.
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Inconformado com esta decisão o Exequente/Oponido interpôs o presente recurso de apelação que finalizou com as seguintes conclusões: (…) 7. Pela Recorrida não foram apresentadas contra-alegações.
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Colhidos os vistos, cumpre decidir.
***** II. O objecto do recurso[1].
As questões a decidir no presente recurso de apelação são: - a de saber se deve ser reapreciada a prova produzida e dada como não provada a matéria factual constante dos pontos 3. a 25. sendo, em consequência, a Oposição julgada improcedente prosseguindo a execução os seus termos; - se inexistiu “falta ou vício na formação da vontade” na emissão do cheque.
***** III – Fundamentos III.1. – De facto: Na decisão recorrida foram considerados assentes os seguintes factos: 1. O exequente deu à execução o cheque n.º 7254583745, datado de 31.08.2006, no montante de €10.000,00 sacado sobre a conta n.º 0033058145278549394 domiciliada no M (...), agência de Santarém.
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Apresentado a pagamento por depósito na conta do exequente domiciliada no Banco I (...), agência de Fátima veio o cheque a ser devolvido por mandato do banco sacado.
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A oponente manteve durante o ano de 2006 negócios com o exequente.
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Para efeito de pagamento de transacção comercial a oponente em Maio de 2006 entregou ao exequente dois cheques.
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O primeiro cheque com o n.º 7254583648 era sacado sobre o M (...)e estava datado de 20 de Maio de 2006.
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O segundo desses cheques é o aludido em “1”.
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Foi a gerência da executada que preencheu a totalidade dos elementos insertos no cheque.
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A data indicada pela executada para pagamento do cheque foi 31 de Julho de 2006.
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O exequente alterou a data de pagamento do cheque.
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O que foi feito sem conhecimento e sem consentimento da oponente.
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O exequente não informou a executada sobre o que resolveu escrever na data.
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Durante o ano de 2006 foi convencionado entre o exequente e a executada um negócio nos seguintes moldes: o exequente venderia à executada uma máquina giratória Komatsu PC-240-6LC-Série n.º K30650 pelo preço de €57.475,00; uma máquina giratória Komatsu PC-240-6LCSérie n.º K30465 pelo preço de €63.525,00 e um cilindro AMMANN AV 26 Série 50000309 pelo preço de €12.1000,00.
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O pagamento pela executada seria feito da seguinte forma: a entrega de uma máquina de rastos Fiat-Allis ( FD20 ); a entrega de um veículo Mercedes E270 cdi no valor de €25.100 e o resto do pagamento €80.000,00 seria feito através de um leasing que o exequente se obrigou a obter.
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Posteriormente, não estando ainda o leasing aprovado e estando já o exequente na posse dos bens da executada a mesma entregou a máquina giratória Komatsu PC-240-6LC-Série n.º K30650.
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Solicitou o exequente que a executada lhe entregasse dois cheques no valor de €10.000,00 cada que seriam devolvidos à executada logo que fosse aprovado o leasing.
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O que esta fez.
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O primeiro dos cheques foi datado para uma semana depois da entrega da máquina e outro datado para 31 de Julho de 2006.
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Em Junho de 2006 o exequente informou a executada que tinha vendido para Angola a máquina giratória Komatsu PC-240-6LC-Série n.º K30465.
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Perante o que exequente e executada combinaram alterar os termos do negócio.
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Para efeito de acerto de contas e de regularização do negócio em Junho de 2006 exequente e executada combinaram a entrega do cilindro contra a entrega de €6.475,00.
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E a devolução do cheque datado para 31 de Julho de 2006.
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Quando a executada tentou proceder ao levantamento do cilindro e do cheque datado para 31 de Julho de 2006 o exequente exigiu, para além do cheque na sua posse o pagamento de mais €20.000,00.
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Na sequência do que a executada transmitiu ao exequente a perda de interesse no negócio.
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Posteriormente o exequente informou a executada que tinha novamente a máquina Komatsu PC-240-6LC-Série n.º K30465.
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Perante o que a executada reiterou a perda de interesse no negócio.
***** Porque têm relevância para os termos da causa, devem ainda considerar-se provados por documentos os seguintes factos, que se aditam nos termos do artigo 659.º, n.º 3, do Código de Processo Civil[2], aplicável por força do disposto no artigo 713.º, n.º 2: 26. No requerimento executivo datado de 07-03-2007, 19:15:38, para além do referido em 1. e 2., o exequente aduziu que o cheque “foi preenchido, datado, assinado e entregue pela executada ao exequente para pagamento de máquinas a este adquiridas”, e que “a executada deve ao exequente a importância de 10.000,00€, escrita no dito cheque”.
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A data de 31-08-2006 aposta no cheque dado à execução, encontra-se rasurada, tendo os números correspondentes ao dia e mês um círculo à volta de cada um[3].
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Conforme carimbo aposto no verso do referido cheque, junto a fls. 8 da execução, este foi devolvido na compensação em 07-09-2006, constando como motivo: “falta ou vício na formação da vontade”.
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Tal motivo havia sido transmitido ao Banco pela Executada por documento remetido em 20-07-2006.
***** III.2. - O mérito do recurso III.2.1. – Reapreciação da matéria de facto (…) ***** III.2.2. Da revogação do cheque Em face da não alteração à matéria de facto nos termos pretendidos pelo Recorrente, a única questão que importa ainda apreciar é a de saber se, como pretende o Exequente, a revogação do cheque foi infundada e em data anterior àquela em que expirou o prazo de apresentação a pagamento e, por tal, nunca poderia produzir efeitos em relação àquele.
Dir-se-á, desde já, que também neste aspecto não lhe assiste razão.
Efectivamente, como é bom de ver, a alegação de que a Executada não tinha fundamento para proceder à revogação do cheque, constitui uma invocação de que a mesma, com tal determinação, incorreu em responsabilidade civil, ao impossibilitar o pagamento do cheque pela instituição bancária, daí que peça agora em execução o pagamento do valor de 10.000,00€ aposto no cheque que, desta feita, sempre valeria como título executivo.
Para o efeito, considera que o cheque foi apresentado a pagamento no prazo legal, já que, encontrando-se datado de 31-08-2006 mercê de solicitação da executada nesse sentido, foi apresentado a pagamento em 07-09-2006, tendo sido devolvido com a referida menção de haver sido revogado com justa causa por falta ou vício na formação da vontade.
Acontece, porém, que ao invés do que havia alegado, o Exequente não demonstrou que tinha havido uma alteração posterior do pacto de preenchimento, configurando um novo pacto entre ele e a executada quanto ao preenchimento da data inicialmente aposta no cheque e que era o dia 31 de Julho de 2006.
Pelo contrário, a executada demonstrou que a data inicialmente aposta no cheque foi o dia 31-07-2006, tendo sido alterada pelo exequente para 31-08-2006, sem o seu conhecimento nem consentimento, e ainda, com vista a demonstrar que o seu comportamento ao revogar o cheque que havia entregue ao exequente não foi ilícito, a executada aduziu factos tendentes a justificar por que razão não tinha que proceder ao pagamento do cheque dado à execução.
Portanto, neste conspecto ao invocar que o cheque é título executivo porque foi atempadamente dado à execução e foi ilicitamente revogado, o exequente estriba-se na ilicitude do comportamento da executada para atribuir a este cheque rasurado a força de título executivo que o cheque possui.
Os pressupostos deste tipo de responsabilidade, designada por responsabilidade por factos ilícitos, agrupam-se num elenco de cinco, a saber: a) o facto; b) a ilicitude; c) a imputação do facto ao lesante; d) o dano; e) um nexo de causalidade entre o facto e o dano[4].
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