Acórdão nº 1786/12.5TBTNV.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Outubro de 2013

Magistrado ResponsávelBARATEIRO MARTINS
Data da Resolução01 de Outubro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório “A..., Lda.”, com os sinais dos autos, veio requerer processo especial de revitalização.

Nomeada administradora judicial provisória, cumprida a demais tramitação e concluídas as negociações, veio a ser aprovado por credores representativos das maiorias legalmente exigidas (mais de dois terços da totalidade dos votos emitidos e mais de metade dos votos emitidos correspondentes a créditos não subordinados) plano de recuperação conducente à sua revitalização; tendo votado contra, entre outros, o Instituto da Segurança Social, a Administração Fiscal e o Banco B....

Remetido o plano de recuperação aprovado ao tribunal, este, conclusos os autos, proferiu decisão a homologar tal plano de recuperação (prevendo a revitalização da devedora através da reestruturação do passivo – moratória, modificação dos prazos de vencimento, perdão e redução dos juros e perdão dos créditos subordinados).

* Inconformados com tal decisão homologatória, vieram o Instituto da Segurança Social, o Ministério Público em representação da Fazenda Nacional e o Banco B...

interpor recurso, visando a sua revogação e a sua substituição por outra que recuse a homologação do plano de recuperação aprovado, alegando, em síntese, que o plano contende com o regime geral de regularização das dívidas à Segurança Social e das dívidas de impostos, nomeadamente com a indisponibilidade de tais créditos; e, ainda, o Banco B..., invocando, em síntese, que o plano não pode conduzir à desoneração dum terceiro garante.

Terminaram as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. – A Segurança Social – Centro Distrital de Santarém: 1º O CDS apresentou requerimento, expondo, nos termos do artigo 215º do CIRE, que estavam reunidas as condições para a não homologação oficiosa do PER, alicerçadas, nomeadamente, em que o plano apresentado não se coaduna com o regime geral de regularização de dívidas à Segurança Social, violando normas imperativas.

  1. O Meritíssimo Juiz julgou válido o PER e homologou-o por sentença.

  2. De acordo com artigo 215º do CIRE, “O juiz recusa oficiosamente a homologação do plano de insolvência aprovado em assembleia de credores no caso de violação não negligenciável (…) das normas aplicáveis ao seu conteúdo (…)” 4º Ora, no caso no caso em apreço, houve violação das regras imperativas que resultam, nomeadamente, do n.º 2 do artigo 30º da LGT que dispõe “O crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária”.

  3. O n.º 3 do mesmo preceito, com a redacção introduzida pela Lei n.º 55 –A/2010, de 31/12, estipula que o aludido n.º 2 prevalece sobre qualquer legislação especial.

  4. Por seu turno, o artigo 125º da referida Lei n.º 55 –A/2010, veio estipular que o disposto no n.º 3 do artigo 30º da LGT é aplicável, designadamente aos processos de insolvência que se encontrem pendentes e ainda não tenham sido objecto de homologação, sem prejuízo da prevalência dos privilégios creditórios dos trabalhadores previstos no Código do Trabalho sobre quaisquer outros créditos.

  5. Ora, este regime jurídico é aplicável ao caso sub judicie, considerando a natureza tributária dos créditos da Segurança Social.

  6. Acresce referir que nas situações excepcionais para a regularização da dívida previstas no Decreto-Lei n.º 411/91, de 17 de Outubro e no artigo 190º do Código Contributivo, nunca é permitida a redução da dívida de contribuições, mas apenas o diferimento do seu pagamento, para além de considerar como indício da inviabilidade económica do contribuinte o incumprimento do pagamento das contribuições mensais desde a data da entrada do requerimento.

  7. Por outro lado, o artigo 203º do Código Contributivo estipula que “As dívidas à Segurança Social podem ser garantidas através de qualquer garantia idónea, nos termos do Código Civil” e não foi constituída nenhuma.

  8. A situação da Segurança Social, enquanto credor, ao abrigo do plano é previsivelmente menos favorável do que a interviria na ausência de qualquer plano, nos termos do art. 216º do CIRE, uma vez que poderia recorrer ao processo executivo.

  9. O PER ao estabelecer taxa de juros vencidos não legal e não estando a cumprir a obrigação contributiva viola os princípios que norteiam a Segurança Social e todas as normas supra citadas, aplicáveis ao caso em análise, e que não foram consideradas pela decisão judicial que se limitou às normas do CIRE, errando na aplicação das normas jurídicas.

  10. Assim, o despacho sub judicie devia ter sido proferido no sentido da recusa oficiosa da homologação do Plano de Insolvência em conformidade com o citado artigo 215º do CIRE, aplicável por força do nº 5 do artigo 17º-F do mesmo diploma.

  11. Não obstante não terem sido invocadas normas derrogadas no Plano nos termos do artigo 195º do CIRE, tem de se interpretar que quando o CIRE admite a derrogação, trata-se de normas do próprio Código e não de legislação aplicável aos credores e em particular à segurança social. As disposições invocadas da LGT e no Código Contributivo sobrepõem-se ao CIRE.

  12. Acresce que a Meritíssimo Juiz mesmo que não recusasse a homologação, devia ter considerado o Plano ineficaz em relação à Segurança Social, de forma a não se verificar violação de lei.

  13. A douta decisão violou, além do mais, o disposto nos artigos 195º, 207º, 214º, 215º e 216º do CIRE, os artigos 3º e 30º da LGT, o artigo 125º da Lei n.º 55 –A/2010, de 31/12, o artigo. 3º do Decreto – Lei n.º 73/99, de 16 de Março, com a redacção dada pelo artigo 165º da Lei n.º 3-B/2010, de 28 de Abril, o Aviso n.º 17289/2012 e os artigos 190º e 203º Código Contributivo.

  1. – O Ministério Público, em representação da Fazenda Nacional: 1. Nos presente processo especial de revitalização, o Estado/Fazenda Nacional veio reclamar, tendo-lhe sido reconhecidos créditos no montante de € 29.430,30 correspondentes a IRS, IRC, coimas e encargos com processos de contra-ordenação, custas e juros de mora à taxa legal; 2. Nos termos do artigo 30.°/2 da LGT, o crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária, prevalecendo esta disposição sobre qualquer legislação especial, de acordo com o seu n.º 3; 3. A indisponibilidade do crédito tributário é aplicável, nos termos do artigo 125.° da Lei n.° 55-A/2010, de 31 de Dezembro, aos processos de insolvência; 4. Salvo lei expressa nesse sentido, não é possível ao Estado conceder perdões ou moratórias no pagamento dos créditos tributários, conforme artigos 103.°/2 da CRP, 85.° do CPPT, e 30.°/2 e 36.°/3, ambos da LGT; 5. Tendo em conta que o plano de recuperação aprovado prevê o pagamento da dívida à Fazenda Nacional num número de prestações superior ao previsto na Lei Geral Tributária, estabelece uma moratória e não oferece quaisquer garantias do pagamento daquela dívida, violando as normais legais previstas nos artigos 30.°/2 e 3 e 36.°/3 da LGT, os artigos 85.°/3, e 196.° e 199.° do CPPT, prevalecendo estas disposições legais sobre quaisquer outras provenientes de legislação especial, não deveria o mesmo ter sido homologado; 6. Apesar de o artigo 17.°-F do CIRE estabelecer que a homologação do plano de recuperação por votação favorável majoritária vincula os credores, mesmo que não hajam participado nas negociações, não se pode considerar que tal se aplique ao Estado/Fazenda Nacional, exactamente por estas disposições não prevalecerem sobre as regras estabelecidas na Lei Geral Tributária e no Código de Processo e Procedimento Tributário, por via do artigo 125.° da Lei n.° 55-A/2010, de 31 de Dezembro; 7. Assim, deveria o Tribunal, nos termos do artigo 215.° do CIRE, ter recusado a homologação do plano de revitalização uma vez que se verifica uma violação das regras procedimentais e das normas aplicáveis ao seu conteúdo, como são as disposições acima citadas; 8. Deste modo, a douta decisão de homologação do plano de recuperação proferida deve ser substituída por outra que recuse a homologação do plano apresentado pela devedora nos presentes autos, relativamente aos créditos fiscais, de acordo com o disposto no artigo 215.° do CIRE; 9. O princípio da igualdade, ínsito no artigo 13.° da CRP, reporta-se a uma igualdade material e não meramente formal, concretizando-se na proibição do arbítrio e da discriminação, devendo tratar-se por igual o que é essencialmente igual e desigualmente o que é essencialmente desigual; 10. O artigo 17.°-F, números 3 e 6 do CIRE determinam que todos os credores do devedor que apresentou o seu plano de recuperação estejam num plano de igualdade, independentemente de terem participado ou não nas negociações e independentemente do seu sentido de voto, na medida em que ficam todos vinculados ao resultado das negociações efectuadas no âmbito do processo de revitalização; 11. A Fazenda Nacional, não é um credor exactamente igual a qualquer outra entidade particular que tenha um crédito sobre o devedor, pela própria natureza do crédito que está em causa, isto é, o pagamento do crédito ao perseguir objectivos de interesse público faz com que o Estado seja diferente de todos os outros credores privados, devendo ser tratado na medida desta diferença.

  2. Isto implica que o plano de recuperação, ainda que aprovado por maioria, não possa vincular a Fazenda Nacional na medida em que não cumpre com as regras estabelecidas na Lei Geral Tributária e no Código de Processo e Procedimento Tributário, que, justificadamente, definem qual a forma de pagamento bem como de prestação de...

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