Acórdão nº 971/08.9TBLSA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Fevereiro de 2013

Magistrado ResponsávelALBERTINA PEDROSO
Data da Resolução26 de Fevereiro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório 1. Banco A..., SA, instaurou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo sumário contra J (…), pedindo a condenação do réu a pagar-lhe a quantia de 20.023,89 €, respeitante ao capital em dívida, aos juros de mora vencidos até à data da entrada da petição inicial e, bem assim, os juros moratórios vincendos, calculados à taxa legal de 4 %, até ao dia do efectivo e integral reembolso do capital.

Para o efeito alegou, em síntese, que: No âmbito das relações comerciais existentes entre as partes, o réu solicitou ao banco autor o desconto bancário de uma letra de câmbio por ele sacada e com aceite de Casa (…), Ld.ª, com vencimento em 10.04.2005; o Banco autor colocou à disposição do réu a importância correspondente ao valor inscrito no título levado a desconto - 17.500,00 € -, creditando-lhe em 18.01.2005, a conta aberta em seu nome e da sua mulher com tal quantia que foi utilizada pelo réu; chegada a data do vencimento, e apesar das várias diligências efectuadas pelo autor, nem o réu, nem a aceitante da letra procederam ao pagamento do capital.

  1. O réu contestou, invocando a excepção de caso julgado e litispendência relativamente à execução instaurada pelo banco com base na mesma letra, à qual o réu deduziu oposição que já foi julgada procedente; reconhecendo a invocada operação de desconto da letra, mas referindo que não pagou nem tinha que pagar a quantia aposta na letra, uma vez que a quantia não se destinou a enriquecer o seu património; que não solicitou qualquer financiamento ao banco, nem procedeu ao levantamento e à utilização da aludida quantia de 17.500,00 €; que naquela época executava a pedido da sociedade aceitante da letra diversos trabalhos de decoração; que a letra a que se reporta a petição inicial deriva da reforma de uma outra emitida em 30.09.2004 com o valor de 15.300,00 €, sacada pelo réu a solicitação da sócia gerente daquela sociedade que lhe pediu que sacasse a esta letras de favor para regularizar as dívidas com o banco; foi o banco que no mesmo dia debitou da conta do réu, através da operação designada por “devolução de efeito” aquela quantia de 15.300,00 €; a referida reforma serviu também para a Casa (...) proceder ao pagamento ao réu de 1.268,89 € em relação a trabalhos prestados aos clientes daquela sociedade que ainda não se encontravam pagos; toda a operação fora negociada entre a aceitante e o banco autor, em proveito destes e sem benefício para o réu, pois sempre se trataram de saques de favor; não existe qualquer relação subjacente provocada pelo demandado que justifique a emissão da letra que possa oferecer respaldo à pretensão da demandante em relação ao réu contestante.

  2. O Banco autor respondeu à contestação, pugnando pela improcedência das excepções invocadas.

  3. Foi elaborado despacho saneador (fls. 105 e ss.), onde foi fixada a matéria assente e a base instrutória, o qual foi objecto de reclamação e pedido de nulidade ou reforma, tendo esta sido desatendida e aquela julgada parcialmente procedente, com aditamento de novas alíneas à matéria de facto assente, tudo nos termos do despacho de fls. 131 a 135.

  4. Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, tendo o tribunal respondido aos artigos da base instrutória conforme despacho constante de fls. 198 e ss dos autos, o qual não mereceu qualquer reclamação.

6. Seguidamente foi proferida sentença onde se decidiu julgar a presente acção parcialmente procedente e, em consequência, condenar o réu J (…) a pagar à autora Banco A (...) , SA, a quantia de 2.200,00 (dois mil e duzentos euros), acrescida de juros vencidos e vincendos à taxa de 4 % desde 10.04.2005, até integral pagamento.

7. Inconformado com esta decisão o Autor interpôs o presente recurso de apelação que finalizou com as seguintes conclusões: «(…) 9. Dispensados os vistos, cumpre decidir.

***** II. O objecto do recurso[1].

O presente recurso de apelação e ampliação do respectivo objecto, suscitam, pela ordem lógica de apreciação, as questões essenciais de saber se: - o Banco Autor podia intentar esta acção com fundamento no contrato de desconto da mesma letra de câmbio que constitui o título executivo da execução que havia instaurado contra o ora Recorrido e a Aceitante; - o caso julgado formado pela decisão da oposição à execução deduzida pelo ora réu na execução contra si instaurada pelo autor com base na letra de câmbio, determina a sua absolvição do pedido na presente acção; - em caso negativo, se o réu deve ser condenado no valor global do desconto bancário, ou no valor declarado na sentença recorrida.

***** III – Fundamentos III.1. – De facto: Na decisão recorrida foram considerados assentes os seguintes factos: 1) O autor é um Banco comercial que se dedica às operações comerciais de crédito e o réu, em 2005, executava as funções de decoração de casas particulares de forma remunerada, por conta própria. (C) 2) O ora Réu celebrou com o Banco Autor um contrato de abertura de conta. (E) 3) No âmbito desse Contrato, entre o Banco Autor e o ora Réu foram efectuadas, ao longo do tempo, diversas operações de comércio bancário, as quais se reflectiram na referida Conta de depósitos à ordem aberta para o efeito, operações essas traduzidas em operações de crédito e débito. (F) 4) As operações comerciais efectuadas eram fruto de uma relação de confiança existente entre as partes, sendo certo que a conta poderia, a todo o momento, evidenciar um saldo positivo ou negativo. (G) 5) O réu fora naquela época convidado a estabelecer relações jurídicas provenientes da sua actividade na efectivação de decoração para clientes da sociedade comercial Casa (…) Lda., ao que acedeu (resposta quesito 2) 6) Os trabalhos que o réu executava a pedido desta sociedade directamente aos respectivos clientes foram normalmente pagos em dinheiro ou através de cheques (resposta ao quesito 3).

7) Através da sua sócia gerente (…), aquela sociedade mantinha relações comerciais regulares com o autor (resposta quesito 4).

8) No âmbito de relações comerciais existentes, o R. solicitou ao Banco Autor o desconto bancário de uma letra de câmbio por ele sacada e aceite de Casa (…), Lda., com vencimento em 10.04.2005. (A) 9) A operação de financiamento solicitada mereceu a aprovação do Banco que, em consequência da aprovação da citada operação de desconto, colocou à disposição daquele a importância correspondente ao valor inscrito no título levado a desconto, creditando-lhe, em 18.01.05, a conta de Depósitos à Ordem Aberta sob o n.º 50462020, aberta em seu nome e esposa na Sucursal do Autor sita na (...) em Coimbra. (B) 10) O A. debitou na conta do réu, através de operação designada por “Devolução de Efeito”, a quantia de € 15 300,00. (D) 11) A A. instaurou acção executiva para pagamento de quantia certa contra o ora réu e a sociedade comercial “Casa (…) Lda”, que correu termos na 2ª Secção da Vara Mista de Coimbra sob o nº 39/06.2TBCBR, tendo apresentado como título executivo a letra junta aos autos como documento nº 2 (H).

12) O ora réu deduziu oposição à execução, no âmbito da qual, foi proferida sentença, datada de 04/04/2006, transitada em julgado, pela qual se decidiu: “Perante o exposto, julga-se a oposição procedente e absolve-se do pedido exequendo J (…), com a consequente extinção da execução quanto a ele”. (I).

Dos documentos juntos aos autos resulta ainda que[2]: 13) A referida oposição à execução teve por fundamento a invocação pelo ora réu da falta de protesto da letra que, atenta a sua qualidade de sacador na cadeia de obrigados cambiários, determinaria a extinção da possibilidade de o accionar; e o facto de a letra dada à execução ser uma letra de favor, o que era do conhecimento do banco exequente e conduziria à procedência da oposição.

14) Na sentença proferida na oposição à execução, a mesma foi julgada procedente com fundamento na verificação da excepção peremptória decorrente da falta de protesto da letra, tendo-se julgado prejudicada a apreciação com base na invocação de se tratar de uma letra de favor.

15) O preenchimento da letra dada à execução referida em 11) foi efectuado nos seguintes termos: No local destinado ao sacador consta a identificação e morada do ora réu e, no local destinado ao nome e morada do sacado consta “Casa (…), Lda. (...) Coimbra, sendo que no lado esquerdo da letra, transversalmente na mesma consta abaixo de “aceite” o carimbo da empresa, com a indicação de “Gerência” e assinatura manuscrita.

***** III.2. – O mérito do recurso Atento o teor das contra-alegações do Réu/Recorrido, através das quais o mesmo procedeu à ampliação do âmbito do recurso nos termos consentidos pelo artigo 684.º-A do Código de Processo Civil[3], e considerando a natural ordem lógica da respectiva apreciação, a primeira questão que importa dilucidar é a de saber se o Banco Autor podia intentar esta acção com fundamento no contrato de desconto da mesma letra de câmbio que constitui o título executivo da execução que havia instaurado contra o ora Recorrido e a sociedade comercial Casa (…), Ld.ª, a qual se entrecruza com a de saber se o caso julgado formado pela sentença proferida no processo de oposição à execução abrange ou não os fundamentos da presente acção.

Alegou para o efeito o Recorrido que «veio na rubrica “Por Excepção”, nos artigos 2º a 9º da sua contestação arguir factos que demonstrados que fossem obstavam à apreciação do mérito da acção, ou pelo menos impediam o direito invocado pelo Autor Banco, o que julga ter demonstrado.

E de facto, como os autos demonstram o Banco portador do título executivo, optou, como lhe permitia a lei, em instaurar a acção executiva contra o sacador e a aceitante ou principal pagadora, nos autos a que corresponde o Processo nº 39/06.2TBCBR, da 2ª Secção da Vara Mista de Coimbra, onde o sacador veio, defender-se por petição de oposição e o processo correu os seus termos no Processo nº 39/06.2TBCBR-A.

E, nestes...

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