Acórdão nº 3257/11.8TJCBR-B.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Maio de 2013

Magistrado ResponsávelALBERTINA PEDROSO
Data da Resolução28 de Maio de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Recurso próprio, tempestivo e recebido no efeito devido, nada obstando ao respectivo conhecimento.

****** Considerando a simplicidade da questão a decidir, a mesma será julgada sumariamente pela Relatora nos termos dos artigos 700.º, n.º 1, alínea c), e 705.º, ambos do Código de Processo Civil[1].

I – RELATÓRIO 1. Por apenso aos autos em que foi declarada insolvente E (…) Ld.ª, pendentes no 4.º Juízo Cível de Coimbra, o Administrador da Insolvência e o Ministério Público, apresentaram parecer no sentido de se mostrar verificado o preenchimento das situações previstas no artigo 186.º, n.º 2, alínea a), e n.º 3, alíneas a), e b), do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas[2], concluindo que a insolvência dos autos deve ser qualificada como culposa, devendo ser afectados pela qualificação da insolvência os sócios-gerentes A (..) e J (…) .

  1. Notificada a devedora e citados os referidos sócios-gerentes, apenas a sócia-gerente A (…) deduziu oposição à referida qualificação da insolvência, aduzindo que foi nomeada como membro do órgão social a 17 de Agosto de 2011 e renunciou à gerência em 14 de Setembro de 2011 e que no ano de 2011 foram intentadas duas acções em que era requerida a insolvência da dita sociedade, nas quais ocorreu a desistência da instância. Adianta que à data da declaração de insolvência não eram conhecidos quaisquer bens e que o próprio administrador de insolvência reconheceu que para o não depósito das contas dos exercícios dos anos de 2009 e 2010 poderá ter contribuído a eventual renúncia do técnico oficial de contas. Acrescenta que as viaturas identificadas nos autos têm mais de dez anos e grande desgaste, ainda estão registadas em nome da insolvente. Conclui que nada permite determinar o momento a partir do qual deveria ser requerida a insolvência, ou qualquer comportamento que tenha criado ou agravado a situação de insolvência, pelo que pugna pela improcedência da qualificação da insolvência como culposa.

  2. Foi proferido despacho saneador tabelar no qual se consideraram verificados os pressupostos processuais, não se tendo procedido à selecção da matéria de facto assente e da base instrutória.

  3. Realizou-se a audiência de julgamento com observância do formalismo legal, tendo a matéria de facto merecido a resposta constante da respectiva acta, que não mereceu qualquer reclamação, e em seguida foi proferida sentença com o seguinte segmento decisório: «- Qualificar a insolvência de “E (…), Lda.” como culposa; - Declaro afectados por tal qualificação A (…) sócia e ex-gerente da insolvente, residente (…) Coimbra e J (…) gerente da insolvente, residente (…) Setúbal; - Decreto a inibição dos referidos AA (…) e J (…)para o exercício do comércio, para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de actividade económica, empresa pública ou cooperativa, pelo período de 3 (três) anos; - Determino a perda de quaisquer créditos sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente detidos pelos mencionados A (…) e J (…) e a sua condenação na restituição dos bens ou direitos já recebidos em pagamento desses créditos».

  4. Inconformado com a sentença proferida J (…) interpôs o presente recurso de apelação formulando as respectivas conclusões, invocando, em síntese, que sendo manifesto que o Recorrente não era gerente, à data dos factos que fundamentaram a qualificação da insolvência como culposa, não pode ser afectado por tal qualificação. 6. O Ministério Público não apresentou contra-alegações.

  5. Tudo visto, cumpre decidir.

    ***** II. O objecto do recurso[3].

    A única questão submetida a apreciação no presente recurso de apelação, é a de saber se, em face da matéria de facto dada como provada, a insolvência deve ou não qualificar-se como culposa relativamente ao Recorrente J (…) ***** III – Fundamentos III.1. Questão prévia Junção de documento: Invocando que a Mm.ª Juiz a quo imputou ao ora Recorrente comportamentos que o mesmo não praticou, e que fundaram a decisão que o considerou afectado pela qualificação da insolvência, requereu o Apelante a junção aos autos de cópia de um contrato de trabalho para atestar que não foi o mesmo quem o celebrou em representação da requerida.

    Vejamos, pois, se tal documento deve ou não ser admitido.

    É consabido que os documentos são meios de prova cuja exclusiva função é a de demonstrar os factos (artigo 341.º do Código Civil), daí que a sua junção, em regra, deva ser efectuada na fase instrutória da causa, como decorre do disposto no artigo 523.º do CPC.

    Porém, tal junção também é passível de ser efectuada no âmbito do recurso de apelação em que nos movemos, quando se verifique alguma das situações prevenidas no artigo 693.º-B do CPC, do qual resulta que “as partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excepcionais a que se refere o artigo 524.º, no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância e nos casos previstos nas alíneas a) a g) e i) do n.º 2 do artigo 691.º”.

    Este preceito foi aditado pelo DL n.º 303/07, de 24 de Agosto, vigorando para os processos instaurados a partir de 01-01-2008, pelo que, é aplicável aos presentes autos (artigos 11.º e 12.º, n.º 1, do citado DL).

    Considerando que a situação em apreço não se insere na previsão final do preceito, a junção dos documentos apenas será admissível no caso de se verificar uma das situações excepcionais previstas no artigo 524.º do CPC, ou de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido em primeira instância.

    Nestes termos, a situação em apreço é semelhante àquela a que anteriormente se referia o artigo 706.º, cujo n.º 1, 2.ª parte, continha disposição em tudo idêntica à actual, que apenas permitia às partes juntarem documento com as alegações “no caso de a junção apenas se tornar necessária em virtude do julgamento proferido na 1.ª instância”, no âmbito da qual era entendimento pacífico que os documentos oferecidos pela parte na fase de recurso só seriam atendíveis se fossem destinados à prova de factos fundamentais da acção, e a sua junção tempestiva não tivesse sido possível; se fossem destinados à prova de factos que se tivesse tornado necessário demonstrar em consequência de ocorrência ou evento posterior aos articulados; ou ainda se pela fundamentação da sentença ou pelo objecto da condenação, só então se tivesse tornado necessário demonstrar factos com cuja relevância processual a parte não podia razoavelmente contar antes de a decisão ser proferida, mormente quando a decisão assentasse em meio probatório não oferecido pelas partes, ou em fundamento jurídico com cuja aplicação ou interpretação estes não podiam ter contado[4].

    Na verdade, este entendimento do preceito tem por fundamento a consabida constatação de que os recursos visam reapreciar, com vista a confirmar, modificar, revogar ou anular, as decisões recorridas e não a criar decisões sobre matéria nova, razão pela qual, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, o tribunal de recurso se debruça apenas sobre as questões que já foram submetidas à apreciação do Tribunal recorrido.

    Por isso mesmo, o recurso não é o meio próprio para juntar documentos aos autos, já que a sede própria para a instrução da causa é o tribunal de primeira instância, donde resulta a natureza excepcional da admissão de documentos nesta sede, uma vez que a referida reapreciação das decisões deve ser efectuada em função dos meios de prova constantes dos autos no momento em que as mesmas foram proferidas, e não avaliar da sua bondade ou desconformidade em função de outros documentos novos que poderiam ter sido tomados em conta, mas não o foram no momento próprio por não terem sido presentes para apreciação do julgador da primeira instância, isto apesar de a parte saber, ou pelo menos dever saber, que os mesmos se destinavam a provar factos que estavam sujeitos a prova.

    Este entendimento não sofreu alteração relevante no âmbito da actual redacção do artigo e, como tal, mantém-se actual para as situações que não foram objecto de inovação[5].

    Assim, ao abrigo do disposto no artigo 693.º-B, do CPC, apenas é admissível a junção de documentos no âmbito das alegações de recurso de apelação nestes tipos de situações: - quando não tenha sido possível a sua apresentação até ao encerramento da discussão em primeira instância; - quando a apresentação se tenha tornado necessária apenas por virtude do julgamento proferido pela primeira instância; - finalmente, quando se impugnem decisões previstas nas alíneas a) a g) e i) a n) do n.º 2 do artigo 691.º CPC, situação que não importa ao caso em apreço porquanto a decisão sob recurso se subsume ao n.º 1 do preceito em referência.

    Assim, vamos cingir-nos a avaliar se a situação sub judice se enquadra em alguma das outras referidas situações.

    Quanto à primeira das invocadas possibilidades - documentos cuja junção não tenha sido possível até ao encerramento da discussão em primeira instância, ou seja, no caso dos autos e tendo havido audiência de julgamento, até ao momento das alegações orais sobre a matéria de facto[6] - o preceito abrange quer a superveniência objectiva do documento, quer a superveniência subjectiva decorrente, por exemplo, do desconhecimento da existência do documento, ou mesmo da junção de documentos que tenham sido formados posteriormente àquele momento temporal[7].

    No entanto, os documentos supervenientes a que o preceito se refere, não podem ser todos e quaisquer documentos que se reportem a factos já constantes da instrução da causa.

    Na verdade, considerando que os recursos se destinam ao controle da decisão impugnada, hão-de admitir-se apenas os que tenham relevância processual quanto a factos supervenientes estranhos ao objecto da lide ou que se destinem a pôr-lhe termo...

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