Acórdão nº 776/10.7TJCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Setembro de 2013

Magistrado ResponsávelMOREIRA DO CARMO
Data da Resolução10 de Setembro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I - Relatório 1.

A (...) e mulher B (...), ambos residentes em Belas, intentaram a presente acção declarativa de condenação, contra C (...), Cooperativa de habitação, C.R.L., com sede em Coimbra, pedindo que: -seja declarada nula, ou então anulada, a deliberação da assembleia extraordinária da ré de 16 de Janeiro de 2010, na parte relativa ao ponto 1, onde se decidiu que as transmissões dos Títulos de capital efectuadas para os Senhores A (...) e D (...), são consideradas nulas e sem qualquer validade ou efeito, sendo o autor marido excluído de cooperador com perda das suas acções; -deve ainda a ré ser condenada a pagar aos autores a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, por danos patrimoniais e não patrimoniais, que ainda não é possível aqui liquidar, atento o curto período temporal após a data da deliberação.

Alegaram, em suma, que o autor marido é dono de 38 acções nominais da ré, encontrando-se 32 acções na sua posse efectiva e 6 na posse da cooperativa, ré; que as acções foram adquiridas aos anteriores cooperantes; adquiriu, assim, a qualidade de sócio cooperador da citada cooperativa ré; essas transmissões foram averbadas no livro de registo da cooperativa, aqui ré; a ré convocou os cooperantes, nomeadamente o autor marido, para reunirem em assembleia geral extraordinária para o dia 16 de Janeiro de 2010 com a seguinte ordem de trabalhos: Ponto 1: Análise, discussão e votação das medidas a tomar referentes aos títulos de capital em poder dos Senhores A (...) …; a documentação respectiva encontravam-se disponíveis para consulta e entrega aos associados na sede da cooperativa a partir do dia 4.1.2010, às segundas, quartas e sextas-feiras, das 14 às 18 h; na 6ª feira antecedente à reunião, o autor marido deslocou-se às instalações da ré, encontrando-se as mesmas encerradas, tendo-lhe assim sido vedada a análise prévia da documentação relativa à assembleia geral; na assembleia geral de 16.1.2010 foi entregue um conjunto de documentação aos sócios cooperantes, que aí se encontravam presentes, na qual constava uma proposta da direcção, que dizia o seguinte: “Após a análise efectuada pela Direcção e o PARECER dos Advogados … somos a concluir que as transmissões dos Títulos de capital efectuadas para os Senhores A (...) … são consideradas nulas e de sem qualquer validade ou efeito”; essa proposta foi entregue ao autor marido apenas na data da assembleia geral e fazia parte de uma análise efectuada pela direcção da R., a qual, sem conceder o contraditório ao ora requerente, concluía que: 1) O Sr. A (...) não era à data adquirente ou sucessor dos títulos em causa sócio cooperador ou reunindo condições exigidas, solicitar a sua admissão, pelo que Código Cooperativo de 1980 art.º 29º, n.º 2 “A Proposta de admissão tinha que ser subscrita por 2 cooperadores” e no Código Cooperativo de 1996 actualmente em vigor, a qualidade de sócio tem de ser solicitada à Direcção. Ora não existe nenhuma documentação em arquivo em que como tal tenha acontecido; 2) Os títulos de transmissão intervivos opera-se pelo endosso do título a transmitir, assinado pelo transmitente, pelo adquirente e por quem obriga a Cooperativa, sendo averbado no Livro de Registo. Ora aqui também não nos parece que os Títulos que o Sr. A (...) possuiu e que tenham pertencido a outros cooperadores vivos preencham os requisitos exigidos, pois embora inscritos nos Registos da Cooperativa os Títulos endossados em seu nome, não estão assinados pelo transmitente e pelo adquirente, estando sim em muitos dos Títulos averbada a inscrição doadas ao Sr. A (...) e assinado pelo Presidente Sr.

E (...) ou pelo Secretário Sr. D (...); 3) A transmissão mortis causa opera-se por apresentação do documento comprovativo da qualidade de herdeiro ou de legatário e é averbada em Nome do Titular no Livro de Registos e nos Títulos que deveram ser assinados por quem os Títulos em posse do Sr. A (...), tenham sido herdados ou legados, pois nenhum dos títulos em seu poder ou em arquivo obedece aos requisitos de transmissão por mortis causa; colocada à votação, foi deliberado por maioria nessa assembleia geral extraordinária: a aprovação da proposta da direcção, referida antes, deliberando assim que as transmissões dos Títulos de capital efectuadas para os Senhores A (...) … são consideradas nulas e sem qualquer validade ou efeito; o A. marido só tomou conhecimento da acta da deliberação, a 22 de Fevereiro de 2010 quando foi notificado da oposição com documentos nos autos de Procedimento Cautelar apensos à acção; sendo até o A. marido forçado a sair da sala, após a votação. (Doc. nº 1, pag. 5); o A. acabou por ser excluído de sócio e cooperador da Cooperativa, por decisão unilateral da R.; a convocação dessa assembleia e a deliberação tomada nessa reunião, contraria a lei e os estatutos da requerida, pois na convocatória deveria constar expressamente a medida a tomar e não deixar de forma arbitrária a solução de se poder, eventualmente, considerar nulas e em qualquer validade os títulos adquiridos pelo requerente; a deliberação da forma como foi aprovada não constava da ordem de trabalhos, pois não havia uma proposta concreta nesse sentido; para ser excluído como cooperador, a R. deveria ter cumprido os requisitos previstos no art. 37º e seguintes do Código Cooperativo, o que não foi cumprido pela R., sendo, por isso, a deliberação tomada nula; foi também violado o princípio do direito mínimo à informação, consagrado no art. 288º do Código das Sociedades Comerciais, aplicável por força do art. 9º do Código Cooperativo; por outro lado, ao convocar o A. marido para as várias e sucessivas assembleias gerais, nomeadamente para actos eleitorais, está-se perante uma autorização tácita por parte da direcção, que aceitou a solicitação do cooperador, aqui A., tendo havido, pois, uma validação da transmissão; tendo unilateralmente deliberado considerar de nulo efeito as transmissões dos títulos a favor do A. marido, por questões formais a ela imputáveis e considerando toda a matéria comportamental da R., claramente se verificará que a mesma constitui “abuso de direito”, na modalidade de venire contra factum proprium; pretende o A. a condenação da R. a indemnizá-lo por comportamentos antagónicos assumidos num determinado espaço de tempo, causando-lhe significativos danos de ordem patrimonial e não patrimonial; o A. marido sente-se aflito e apreensivo com a conduta da ré, pois foi impedido de continuar na dita reunião da assembleia geral; viu-se desapossado de títulos que adquiriu de boa fé, por uma conduta da R., contrária à Lei, o que o deixou bastante triste e magoado.

Concluíram, assim, que a deliberação tomada pela R. é nula, uma vez que: a) Foi tomada em assembleia geral não convocada, art. 50º, do Código Cooperativo, que diz expressamente que “São nulas todas as deliberações tomadas sobre matérias que não constem da ordem de trabalhos fixada na convocatória, salvo se, estando presentes ou representados devidamente todos os membros da cooperativa no pleno gozo dos seus direitos, concordarem, por unanimidade, com a respectiva inclusão ou se incidir sobre matéria constante do nº 1 do art. 68º, de acordo com o estabelecido no nº 3 do mesmo artigo e art. 56º, nº 1, a), do Código das Sociedades Comerciais; b) O conteúdo dela não está sujeito a deliberação dos sócios (serem consideradas nulas e sem qualquer validade ou efeito as transmissões dos títulos de capital efectuadas para o A. marido, pois não competia certamente à assembleia geral proceder a tal consideração e consequente decisão, pois a análise e decisão deveria ser precedida de análise e consequente decisão judicial).

A deliberação é também anulável, porquanto viola a lei e não foi precedida do fornecimento ao A. marido de elementos mínimos de informação, de acordo com o estabelecido no art. 58º, nº 1, a) e c), do CSC.

A R. contestou, alegando, além do mais, a caducidade da acção principal, já que, por força do art. 59º, nº 2, a), do CSC, aplicável às cooperativas, o prazo para a propositura da acção de anulação é de 30 dias, contados a partir da data em que foi encerrada a assembleia geral. Uma vez que o autor marido teve conhecimento da deliberação tomada a 16.1.2010, pois só saiu da assembleia após a votação da deliberação cuja anulabilidade pede nesta acção, o prazo de caducidade ocorreu em 15.2.2010, tendo os AA apenas interposto esta acção a 4 de Março de 2010; o art. 389, nº 1, a), do CPC, estabelece o regime de caducidade das providências cautelares, mas é absolutamente independente do regime da caducidade da acção principal; que, antes das diversas aquisições de acções, o A. não era sócio cooperador (inicial ou original), e nem tinha solicitado a sua admissão; após aquelas aquisições, também o autor não solicitou a sua admissão como tal, pelo que nunca chegou a adquirir essa qualidade; não sendo sócio-cooperador, não se coloca, sequer, a questão de ter sido excluído dessa mesma posição ou qualidade; na petição inicial os autores não descrevem, com rigor e pormenor, os danos alegadamente sofridos por eles, não existindo elementos suficientes para caracterizar os danos, mas apenas alegações vagas.

A final concluiu pela sua absolvição.

Na resposta os AA alegam que não existe qualquer caducidade da acção de anulação, pois entre a data da entrada do procedimento cautelar em juízo, 26.1.2010 até à apresentação da acta nesses autos, 22.2.2010, a instância cautelar ficou suspensa; o prazo para apresentar a acção principal terminaria a 15.3.2010, pelo que a presente acção está em tempo.

Concluiu, na parte final, como na petição inicial.

Notificados para o efeito os AA quantificaram o prejuízo material em 6.000 € e o dano na mesma importância, que a R. impugnou.

* Foi, depois, proferido despacho saneador-sentença, na qual se julgou procedente a excepção de caducidade da acção no que concerne ao pedido de anulação da deliberação social tomada em 16.1.2010, e se julgou improcedente a acção, absolvendo-se a...

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