Acórdão nº 558/11.9TNCBR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Setembro de 2013

Magistrado ResponsávelEMÍDIO SANTOS
Data da Resolução10 de Setembro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra No despacho saneador proferido na presente acção declarativa, o Meritíssimo juiz do tribunal a quo julgou improcedente a excepção de prescrição arguida na contestação pela ré A...

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A ré não se conformou com esta decisão e interpôs recurso de apelação. No requerimento de interposição do recurso alegou que beneficiava da isenção de custas prevista no artigo 4º, n.º 1, alínea f), do Regulamento das Custas Processuais [RCP]. Justificava, assim, a não apresentação de documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida pela interposição do recurso.

O Meritíssimo juiz do tribunal a quo entendeu que a ré não beneficiava da isenção de custas. Em consequência, ordenou a notificação da demandada para proceder ao pagamento da taxa de justiça devida pela interposição do recurso. Justificou a decisão nos seguintes termos: “O artº 4º, n.º 1, al. f) do R.C.P. isenta de custas as pessoas colectivas privadas, sem fins lucrativos, quando actuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelo respectivo estatuto ou nos termos da legislação que lhes seja aplicável”.

“Nesta norma cabem, muito especialmente, as instituições particulares de solidariedade social que, dadas as funções altamente relevantes que desempenham na sociedade, devem beneficiar de um especial estatuto em matéria tributária”.

“Tal como refere Salvador da Costa, in “Regulamento das Custas Processuais”, anotado e comentado, 4ª ed.ª, pág 188, “a isenção em apreço é motivada pela ideia de estímulo ao exercício de funções públicas por particulares que, sem espírito de lucro, realizam tarefas em prol do bem comum, o que á comunidade aproveita e ao Estado incumbe facilitar, pelo que lhe subjaz o desiderato de tutela do interesse público.” “A norma sob exame faz depender a isenção subjectiva em matéria de custas, no tocante às pessoas colectivas privadas sem fins lucrativos, da verificação de dois pressupostos de legitimidade processual: 1. Quando actuem exclusivamente no âmbito das suas especiais Atribuições; 2. Para defender os interesses que lhes estão especialmente conferidos pelo respectivo estatuto ou nos termos da legislação que lhes seja aplicável” “Daqui resulta desde logo que o legislador, no dispositivo legal citado, restringiu essa isenção a apenas algumas situações, donde se conclui que as referidas pessoas colectivas, não estão sempre isentas de custas”.

“Estamos, portanto, perante uma isenção de custas com características condicionais, desde logo, na medida em que somente funciona em relação a processos concernentes às suas especiais atribuições das entidades abrangidas pela isenção ou para defesa dos interesses conferidos pelo respectivo estatuto ou, ainda, pela própria lei. Nesta perspectiva, a examinada isenção não abrange, nomeadamente, as acções que tenham por objecto obrigações ou litígios derivados de contratos que estas entidades celebrem com vista a obter meios para o exercício das suas atribuições (cfr. ob.cit, p. 188/189; no mesmo sentido Acórdão da Relação de Coimbra de 13-12- 2011, in www.dgsi.pt)”.

“Tal isenção está condicionada à actuação no âmbito das especiais atribuições da pessoa colectiva em causa ou da defesa dos seus interesses estatutários, pelo que a isenção “só funciona em relação aos processos concernentes às suas especiais atribuições ou para defesa dos interesses conferidos pelo seu estatuto ou pela lei” (ídem).

“Analisados os estatutos da R. “ A...” constata-se que a mesma tem como fim estatutário facultar serviços ou prestações de segurança social no âmbito da população idosa na região centro do país e prioritariamente à residente no concelho de Coimbra. Para realização destes fins propõe-se manter entre outras as seguintes actividades: lar para idosos e centro de convívio. Poderá ainda prosseguir actividades de prestação de cuidados de saúde, nomeadamente através da sua secção hospitalar “casa de Saúde de Coimbra” (cf. art.ºs 2º a 4º dos Estatutos a fls. 493”).

“Por sua vez, nos presentes autos discute-se da responsabilidade dos RR. por alegada negligência médica nos cuidados prestados ao A., sendo que relativamente à R, “ A...” a mesma é apenas demandada porque o acto médico em causa foi realizado nos serviços cirúrgicos da mesma, tendo ainda sido internado nos serviços daquela.” “Conforme resulta da contestação da R. a sua intervenção cingiu-se à prestação de assistência hospitalar ao A. excluindo serviços médicos e cirúrgicos os quais foram contratados e suportados pela R. Estamos, portanto, perante contratos de prestação de serviços hospitalares com terceiros”.

“A sua intervenção nos presentes autos remete-nos para uma actividade acessória daquelas que fundamentam o seu estatuto de IPSS, antes reconduzindo-se a uma actividade por esta prestada para obter meios para o exercício das suas atribuições”.

“Em face do exposto, entendemos, salvo melhor opinião, que perante o objecto do processo, não obstante a qualidade da R., é manifesto que a mesma não actua, nem exclusivamente, no âmbito das suas especiais atribuições que estão expressas no respectivo estatuto, nem está em juízo em defesa dos interesses que lhe estejam por esse mesmo estatuto, ou por lei, especialmente conferidos”.

A ré não se conformou com este despacho e interpôs o presente recurso de apelação, pedindo se revogasse e substituísse a decisão recorrida por outra que desse o devido andamento ao recurso.

Os fundamentos do recurso expostos nas conclusões foram os seguintes: 1. Ao decidir como decidiu, o despacho recorrido errou na interpretação e na aplicação das competentes normas legais, designadamente, violando o disposto no artigo 4.º, n.º 1, alínea f), do Regulamento das Custas Processuais.

  1. A recorrente encontra-se isenta de custas no presente processo, de acordo, ademais, com decisão que se não pode deixar de considerar tomada previamente nesta acção.

  2. Conforme melhor resulta da declaração de registo, publicada no D.R., 3.ª série, n.º 293 (vd doc. n.º 1 junto com a contestação da ora recorrente), “a fundação tem por objectivos facultar serviços do âmbito de acção social e de saúde”; 4. É nestes mesmos termos que a ré se encontra registada como IPSS (e, por conseguinte, pessoa colectiva privada sem fins lucrativos e pessoa de utilidade pública), sendo que existe, enquanto tal, para prestar, também, cuidados de saúde, como sucede no caso presente; 5. O facto de ser actividade acessória da realização das finalidades estatutárias ou o de constituir suporte financeiro do desenvolvimento dos objectivos estatutários não afastam a actividade de prestação de cuidados de saúde ora em causa do âmbito de aplicação da sobredita isenção, antes a impõem, na justa medida em que a realização de tais fins depende e é também garantida pela dita actividade da Recorrente; 6. Nem a afasta o facto de em causa estar um contrato de “prestação de serviços hospitalares com terceiros”, “com vista à obtenção de meios para o exercício das suas atribuições”, 7. Sendo certo que é falso, rotundamente falso, que “os serviços médicos e cirúrgicos (…) foram contratados e suportados pela R.”, como o é que tal resulte da contestação da recorrente, pelo que se impõe substituir a decisão recorrida no que se refere ao suposto circunstancialismo.

  3. Veja-se o caso dos contratos de prestação de serviço celebrados, seja expressa, seja tacitamente, com os utentes das respostas sociais e serviços de cuidados continuados desenvolvidos pela Recorrente no contexto das suas atribuições, no âmbito são fixadas comparticipações familiares, pagas pelos utentes e famílias pela utilização das ditas respostas sociais; essas comparticipações constituem receitas da Recorrente, destinadas à consecução dos objectivos estatutários, logo, são celebrados, também esses contratos, “com vista a obter meios para o exercício das suas atribuições”, logo, são instrumentais; absurdo seria, s.m.o., que, por aplicação do raciocínio defendido no...

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