Acórdão nº 6099/16.0T8VIS-L.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Julho de 2018

Magistrado ResponsávelARLINDO OLIVEIRA
Data da Resolução10 de Julho de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra “ A..., Lda.”, com sede em Rua (...) , ao abrigo do disposto no artigo 125.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (diploma a que pertencem as demais normas sem indicação de origem), intentou a presente de impugnação da resolução em benefício da massa insolvente, contra a Massa Insolvente de B...., Lda.

, pedindo, a título principal, que a resolução realizada pela Administradora da Insolvência seja declarada caduca por violação do prazo previsto no artigo 123.º, subsidiariamente, que seja declara procedente a exceção dilatória de litispendência, ou que seja julgada procedente a exceção de abuso de direito, ou que a resolução seja declarada nula e de nenhum efeito, por falta de motivação da declaração resolutiva, uma vez que não concretiza os factos constitutivos do direito que pretendeu exercer, ou que seja declarada a ilegalidade da resolução por inexistência dos motivos que a fundamentaram.

Alega, em síntese, que em 18 de julho de 2017 foi notificada da resolução em benefício da massa insolvente da compra e venda do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o n.º B...., do trespasse do estabelecimento comercial composto por uma farmácia com o alvará n.º B.... emitido pelo Infarmed – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, IP, bem como a transferência de todos os bens móveis, utensílios, mercadorias, licenças, alvará e todos os demais direitos que integram o referido estabelecimento, que as resoluções foram efetuadas na pendência das ações que constituem o apenso H e não respeitaram o prazo de seis meses previsto no artigo 123.º a contar do conhecimento dos negócios em causa. Apesar de considerar que não releva a data do conhecimento dos pressupostos resolutórios, acrescenta que decorreu o prazo de seis meses a contar deste conhecimento. Alega ainda que se verifica a exceção e litispendência com a ação que constituía o apenso H, que a conduta da Sr.ª Administradora da Insolvência em usar de modo repetido os seus poderes de resolução é abusiva, que não concretiza em que se traduziu o prejuízo e que as dificuldades atravessadas pela insolvente originaram exclusivamente de razões de mercado.

Contestou a ré referindo que a insolvente tinha como gerentes os pais do interveniente nos negócios em causa nos autos, que é considerado como pessoa especialmente relacionada com os gerentes da insolvente, que celebrou um negócio consigo próprio em prejuízo da satisfação dos créditos dos credores da insolvência, existindo má fé da insolvente e autora, que a administradora da insolvência exerceu um direito e dever de salvaguarda do interesse dos credores. Acrescenta que o termo do prazo de resolução não poderá ser anterior à nomeação da atual administradora da insolvência, que os negócios resolvidos apareceram pela primeira vez na assembleia de credores de 7 de fevereiro de 2017 e que a notificação foi efetuada no prazo de seis meses a contar da mesma. Defende ainda que não se verificam os requisitos da exceção dilatória de litispendência e que inexiste falta de motivação ou concretização dos factos que “conduzem à invalidade dos negócios objeto de resolução em benefício da massa insolvente”.

Conclui pela improcedência das exceções e da ação.

A autora pronunciou-se nos termos constantes do requerimento de fls. 74 a 75.

Dispensada a realização da audiência prévia foi proferido despacho saneador, onde foi julgada improcedente a exceção de litispendência.

Foram ainda proferidos despachos a identificar o objeto do litígio, a enunciar os temas da prova, de que reclamou a ré, sem sucesso, cf. despacho de fl. 88 e v.º.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento com observância do legal formalismo e com recurso à gravação dos depoimentos prestados, finda a qual foi proferida a sentença de fl.s 253 a 275 v.º, na qual se seleccionou a matéria de facto dada como provada e não provada e respectiva fundamentação e a final se decidiu o seguinte: “Nestes termos: 3.1. Julgo procedente a exceção de caducidade invocada pela autora e, em consequência, declaro a caducidade da resolução em benefício da massa insolvente dos contratos em causa nos autos, referidos nos artigos vigésimo (compra e venda) e vigésimo primeiro (trespasse) dos factos provados, ficando a mesma sem efeito.

3.2. Condeno a ré nas custas da ação, sem prejuízo do, eventual, benefício de apoio judiciário.

3.3. Dispenso o pagamento do remanescente da taxa de justiça em relação ao valor da causa que excede o montante de €275.000,00 (duzentos e setenta e cinco mil euros) nos termos do artigo 6.º, n.º 7 do Regulamento das Custas Processuais, atendendo à natureza da ação, à conduta das partes, ao trabalho desenvolvido, ao princípio da proporcionalidade, sendo certo que a consideração de valor superior seria desproporcional.”.

Inconformada com a mesma, interpôs recurso a ré, “Massa Insolvente de B...., L.da, recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 332), rematando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões:

  1. Surgem as presentes alegações no âmbito do recurso de apelação de prazo reduzido, interposto da sentença com a referência ...., datada de 15/04/2018, a qual julgou sem efeito a resolução extra-judicial efectuada pela administradora de insolvência por carta e por notificação judicial avulsa e, com base numa pretensa caducidade do direito de resolução, em consequência julgou a acção de impugnação procedente e com o que a Recorrente não se pode conformar.

  2. Conforme claramente consta do art. 120º do CIRE e, aliás, é definido em termos substantivos, na sentença recorrida, a possibilidade de resolução em benefício da Massa Insolvente dos actos prejudiciais à mesma massa tem como critério, integrador de tal noção, a satisfação dos interesses dos credores da insolvência pois a prejudicialidade do acto em relação à massa traduz-se em o mesmo diminuir, frustrar, dificultar, pôr em perigo ou retardar a satisfação dos credores da insolvência.

  3. E de acordo com o art. 120º nº 4, a resolução pressupõe má fé de terceiro, a qual se presume quanto a actos cuja pratica ou omissão tenha ocorrido dentro dos dois anos anteriores ao início do processo de insolvência em que tenha participado ou de que tenha aproveitado pessoa especialmente relacionada com o insolvente.

  4. No caso concreto, foram resolvidos, primeiro por carta registada com aviso de recepção de 19.06.2017 e posteriormente por notificação judicial avulsa interposta a 29.06.2017, em razão da devolução da carta registada enviada, os seguintes actos: a) Contrato de compra e venda celebrado por escritura pública de 07.04.2016 outorgada no cartório notarial de C...; b) Trespasse do estabelecimento comercial composto por uma farmácia com o alvará B.... emitido pelo Infarmed – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saude, IP – bem como a transferência de todos os móveis, utensílios, mercadorias, licenças, alvará e todos os demais direitos que integram o referido estabelecimento, celebrado também por escritura pública do mesmo dia 07.04.2016 e outorgada igualmente no mesmo cartório notarial.

  5. Tendo tais escrituras sido celebradas a 07.04.2016, esses mesmos actos foram realizados 3 meses antes da apresentação da insolvente a PER, o que ocorreu a 06.07.2016 (facto provado em 23) e nove meses antes da declaração da insolvência declarada por sentença de 21.12.2016, transitada em julgado (facto provado em 24) pelo que tais actos encontram-se perfeitamente abrangidos pelo prazo de 2 anos, previsto no já referido art. 120º do CIRE.

  6. Por outro lado, e de acordo com o que consta nos factos provados em 20 e 21, as escrituras resolvidas foram celebradas por D..., que actuou, simultaneamente, como procurador e em representação da sociedade agora insolvente B..., Lda. e igualmente na qualidade de sócio gerente da sociedade beneficiária A... Lda., o qual de acordo com o facto provado em 19, é o mesmo D…. filho dos sócios gerentes registados à altura das escrituras resolvidas da insolvente, o que o torna como pessoa especialmente relacionada com o devedor, subsumindo-se assim na qualidade que releva para a má fé do acto.

  7. De acordo com o facto provado em 12, logo a seguir a tais escrituras, concretamente a 12.05.2016, foi registada a deliberação de 07.04.2016 em que a sociedade B... Lda. designa para seu gerente Q.... o qual e segundo o facto provado no ponto 43 e 44 da sentença proferida no apenso G não só não era conhecido no meio empresarial das farmácias, como estava ligado ao ramo da Imobiliária e Construção Civil.

  8. E sobre a transferência dos bens em benefício da sociedade detida e gerida por D…., filho dos gerentes da insolvente, nem é relevante o facto provado no ponto 48 de pagamento do contrato de locação financeira porquanto não fora esse pagamento, não podia a recorrida, gerida à data da celebração dos negócios por D... (ponto 52 dos factos provados), celebrar com a A... Lda., o contrato de transmissão do imóvel, já sem encargos e em benefício desta, acrescendo que o já tão referido D…, na qualidade de legal representante da A... , fez um contrato de cessão de exploração a favor da insolvente, que tinha por objecto social a exploração de farmácia (ponto 2 dos factos provados) no momento em que a insolvente, sem alvará e sem estabelecimento, já não podia exercer qualquer actividade.

  9. Por outro lado, a primeira Senhora Administradora nomeada, Dra. N... , no seu relatório elaborado nos termos do art. 155º do CIRE, expressamente referiu que a sociedade insolvente não tinha, pelo menos, desde Outubro de 2016, qualquer acto de negócio ou actividade, o que significa que até o acto de cessão de exploração acabou por ser um acto simulado, sem qualquer objecto, dada a situação de facto da insolvente, sem património e sem qualquer hipótese de a insolvente proceder ao mínimo pagamento.

  10. Quanto aos credores, é clara...

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