Acórdão nº 69/17.9GCSAT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Julho de 2018
Magistrado Responsável | BELMIRO ANDRADE |
Data da Resolução | 10 de Julho de 2018 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam, em conferência, na 4ª Secção, Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra I - RELATÓRIO Nos autos de processo comum, tribunal singular, em referência, após realização da audiência de discussão e julgamento com exercício amplo do contraditório, foi proferida a sentença com o seguinte DISPOSITIVO: 1) Decide-se julgar totalmente procedente a acusação pública deduzida e, consequentemente, condenar o arguido A… pela prática de um crime de furto qualificado, na forma tentada, previsto e punido pelos artigos 203º, n.º1 e 204º, n.º1, al.c), do Código Penal, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão; e 2) Totalmente procedente o pedido de indemnização cível deduzido contra o arguido, condenando-o a pagar à B... a quantia de € 500,00.
*Inconformado com tal sentença, dela recorre o arguido.
Na motivação do recurso são formuladas as seguintes CONCLUSÕES: 1. O ora Recorrente vem interpor recurso, em virtude da violação e errada aplicação pelo Tribunal a quo dos arts. 23º, nº 3 e 50º do Código Penal.
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O recorrente admitiu ter-se dirigido à B…, munido de uma chave de fendas, com a intenção de, do interior do sacrário sito na ala lateral esquerda, por baixo da imagem de Nossa Senhora E..., retirar e fazer seu aquilo que julgava ali se encontrar guardado.
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Contudo, o recorrente nada retirou do interior do referido sacrário em virtude do mesmo se encontrar vazio.
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Resultou do depoimento prestado pela testemunha F..., pároco da C... há cerca de 12 anos, que aquele sacrário está sempre vazio, nada ali sendo guardado, e que tal facto é do conhecimento da generalidade das pessoas, nomeadamente da população da C....
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Verifica-se, assim, que o recorrente nunca teria logrado alcançar o seu objectivo, uma vez que o sacrário em causa está sempre vazio.
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A inexistência do objecto essencial à consumação do crime era, segundo as circunstâncias particulares do presente caso e segundo o critério da generalidade adaptado à realidade da comunidade onde o agente actuou e atendendo às regras da experiência comum dessa comunidade, manifesta, pública e evidente.
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Assim, contrariamente ao entendimento defendido pelo Tribunal a quo, o caso dos presentes autos configura uma tentativa manifestamente impossível, em virtude da inexistência de objecto, a qual, nos termos do disposto no nº 3, do art. 23º da C. Penal, não é punível.
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Pelo que, devia o Tribunal a quo ter absolvido o arguido recorrente do crime de furto qualificado, na forma tentada, de que vinha acusado.
Sem prescindir, 9. Discorda-se do entendimento do Tribunal a quo ao não ter suspendido a pena de prisão aplicada ao recorrente, atendendo às necessidades de prevenção e reprovação criminal.
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A douta Sentença não relevou, como deveria, a conduta do recorrente posterior ao crime, com ausência de cometimento de outros crimes, assumindo o significado e consequências do seu comportamento.
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O recorrente confessou desde o primeiro momento, em fase de inquérito, os factos, demonstrando que reconheceu o desvalor da sua conduta e a pretensão de assumir, como efectivamente assumiu, em pleno as responsabilidades e as consequências da mesma.
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O recorrente demonstrou, ainda, estar arrependido e ter vontade e capacidade de mudar e de viver segundo os valores ético-sociais juridicamente protegidos.
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O recorrente está inserido num meio familiar estável e encontra-se a procurar integração profissional.
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O Tribunal a quo não aplicou a norma constante do artigo 50º, do Código Penal.
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Ao caso concreto, é suficiente a ameaça da prisão, para a realização das finalidades de prevenção geral e especial.
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Daí que, se entenda poder aplicar-se o instituto da suspensão da execução de pena de prisão.
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A douta Sentença recorrida deve, assim, suspender a execução da pena de prisão de um ano e seis meses, por se verificarem preenchidos os pressupostos constantes do artigo 50º do Código Penal.
TERMOS EM QUE, E pelo que mais doutamente por V/Exas. será suprido, Deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser a douta Sentença recorrida revogada e substituída por outra que absolva o arguido do crime de que vem acusado.
*Notificado da fundamentação do recurso, respondeu-lhe o digno magistrado do MºPº junto do tribunal recorrido, sustentando, em síntese conclusiva: 1. Nos termos do disposto no artigo 23.º, n.º 3, do Código Penal, a tentativa impossível não é punível quando for manifesta a inaptidão do meio empregado pelo agente ou a inexistência do objeto essencial à consumação do crime.
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A inexistência é manifesta quando a mesma é evidente, num juízo ex ante, de prognose póstuma, do ponto de vista do observador normal, colocado nas concretas circunstâncias do agente.
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No caso concreto destes autos, qualquer homem mediano, colocado nas concretas circunstâncias do arguido/recorrente, acreditaria que, no interior de um sacrário de uma Igreja, se encontrariam objetos relacionados com o culto religioso, de valor superior a 102,00€ (cento e dois euros).
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E isto ainda...
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