Acórdão nº 4019/16.1T8VIS.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Maio de 2018

Data15 Maio 2018
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Apelação n.º 4019/16.1T8VIS.C2 2.ª Secção – Cível Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: ***I – Relatório C (…), com os sinais dos autos, intentou ação declarativa de condenação, com a forma de processo comum, contra “BANCO (…) S. A.

”, também com os sinais dos autos, pedindo que:

  1. Seja o R. condenado a pagar à A. o capital e juros vencidos e garantidos, perfazendo a quantia de € 57.000,00, bem como os juros vincendos, desde a citação até efetivo e integral pagamento; ou, assim não se entendendo, b) Seja declarado nulo qualquer eventual contrato de adesão que o R. invoque para ter aplicado os € 50.000,00 que a A. lhe entregou, em obrigações subordinadas K... Rendimento Mais 2004; c) Seja declarada ineficaz em relação à A. a aplicação que o R. tenha feito desses montantes; d) Seja condenado o R. a restituir à A. € 57.000,00 que ainda não recebeu dos montantes que entregou ao R. e de juros vencidos à taxa contratada, acrescidos de juros legais vincendos, desde a data da citação até efetivo e integral cumprimento; e) Seja, em qualquer caso, o R. condenado a pagar à A. a quantia de € 3.000,00, a título de dano não patrimonial.

    Para tanto, alegou, em síntese, que (() Segue-se, no essencial, por economia de meios, a síntese da decisão recorrida.

    ): - sendo a A.

    cliente do R.

    , com conta à ordem, em outubro de 2004 o gerente do R. da agência de V… disse-lhe que tinha uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo e com capital garantido pelo Banco J... e com rentabilidade assegurada, sabendo ele que a A.

    não possuía qualificação ou formação técnica que lhe permitisse à data conhecer os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar os riscos de cada um deles, sendo que sempre aplicara o seu dinheiro em depósitos a prazo; - porém, € 50.000,00 foram colocados em obrigações K... Rendimento Mais 2004, sem que a A.

    soubesse em concreto o que era, desconhecendo que a K... era uma empresa, radicando o motivo da sua autorização no facto de lhe ter sido dito pelo gerente que o capital era garantido pelo banco R.

    , com juros semestrais e que poderia levantar o capital e respetivos juros quando assim o entendesse, bastando avisar a agência com a antecedência de três dias; - agiu a A. na convicção de colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as características de um depósito a prazo (produto com risco exclusivamente do banco), o que nunca aceitaria se soubesse tratar-se de um produto de risco e sem capital garantido pelo Banco J...; - em novembro de 2015, o R. deixou de pagar os juros respetivos, sendo que nunca o contrato lhe foi lido ou explicado, tão pouco lhe foi entregue cópia que contivesse cláusulas sobre obrigações subordinadas K...; - a existirem eventuais documentos, serão contratos de cláusulas gerais, cujas assinaturas não têm validade, por os contratos serem nulos, além de que não correspondem à vontade da A.; - o R.

    não lhe restituiu o montante confiado, nem tem cumprido o pagamento dos juros acordados, uma vez que contratou uma taxa de 4,5% ao ano ilíquida e foram pagos juros a taxa inferior, sendo que a A.

    ficou impedida de usar o seu dinheiro e num permanente estado de preocupação, tristeza e ansiedade, com o receio de não o reaver.

    O R. contestou, concluindo pela improcedência da ação, para o que alegou, quanto ao que ora importa: - ocorrer ineptidão da petição inicial e a exceção da prescrição (por o negócio dos autos constituir um ato de intermediação financeira, tendo o R. cumprido ordens da cliente, com prescrição consumada, pelo decurso de mais de 2 anos); - ter a A. desde sempre mostrado apetência por investimentos em aplicações financeiras, ainda que de baixo risco, o que mostra que, não tendo formação específica em área financeira, tinha conhecimentos e experiência suficientes para um tal tipo de investimento, com conhecimento da respetiva natureza, riscos e maior rentabilidade face a depósitos a prazo; - sendo que o produto dado à subscrição da A. era seguro, resultando o seu incumprimento de circunstâncias imprevisíveis e anormais – o risco da aplicação era semelhante ao de um depósito a prazo no próprio banco; - à A. foram explicadas, total e exaustivamente, as condições do produto, aliás de forma acompanhada com a respetiva nota técnica, sabendo ela que não se tratava de um depósito a prazo, nunca a R. tendo dito que o banco garantiria o cumprimento ou incumprimento das obrigações da K....

    A A., no exercício do princípio do contraditório, pugnou pela total improcedência a matéria de exceção.

    Realizada audiência prévia, saneado o processo, enunciados o objeto do litígio e os temas da prova, procedeu-se depois à audiência final, com produção de provas, seguida de sentença – incorporando decisão de facto e de direito –, pela qual foi a ação julgada parcialmente procedente, com condenação do R. a pagar à A. as quantias de “€ 50.000,00 (cinquenta mil euros), acrescida dos respectivos juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, contados desde o dia 25 de Outubro de 2014 até efectivo e integral pagamento” e “€ 3.000,00 (três mil euros), a título de indemnização de danos não patrimoniais”.

    Inconformado, apelou o R., apresentando alegação e oferecendo as seguintes Conclusões (…) A A. contra-alegou, pronunciando-se sobre as questões suscitadas em sede de recurso e concluindo pela total improcedência da apelação.

    *** O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, tendo então sido ordenada a remessa dos autos a este Tribunal ad quem, onde foi mantido o regime e efeito fixados.

    Nada obstando, na legal tramitação, ao conhecimento do mérito do recurso, cumpre apreciar e decidir.

    ***II – Âmbito do Recurso Perante o teor das conclusões formuladas pela parte recorrente – as quais (excetuando questões de conhecimento oficioso não obviado por ocorrido trânsito em julgado) definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso, nos termos do disposto nos art.ºs608.º, n.º 2, 609.º, 620.º, 635.º, n.ºs 2 a 4, 639.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil em vigor (doravante NCPCiv.), o aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26-06 –, cabe decidir, sobre matéria de facto e de direito, quanto ao seguinte:

  2. Se houve erro de julgamento quanto à decisão da matéria fáctica, implicando a alteração dessa decisão; b) Se está, ou não, o R./Apelante constituído na obrigação de indemnizar; c) Se ocorre prescrição do direito indemnizatório.

    ***III – Fundamentação

    1. Quadro fáctico da causa Na sentença recorrida, foi julgada provada a seguinte factualidade: «1 A A era cliente do Réu, na sua agência de V..., com a conta à ordem nº XXXXX, onde movimentava parte dos dinheiros, realizava pagamentos e efectuava poupanças.

      2 A S (…) S.A., era detentora de 100% do capital do Banco-Réu até à sua nacionalização, em Novembro de 2008.

      3 Em Outubro de 2004 o gerente do Banco Réu da agência de L…, disse à Autora que tinha uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo e com capital garantido pelo Banco J... e com rentabilidade assegurada.

      4 O dito funcionário do Banco Réu sabia que a A não possuía qualificação ou formação técnica que lhe permitisse à data conhecer os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar, por isso, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente.

      5 A Autora tinha um perfil conservador no que respeitava ao investimento do seu dinheiro, ela que até esse data sempre o aplicou em depósitos a prazo.

      6 A Autora ignorava o que eram as “Obrigações K... Rendimento Mais 2004” e que a K... era uma empresa, bem como que “K...” era uma mera denominação de conta a prazo que o Banco Réu utilizava.

      7 A decisão de subscrição, por parte da Autora, fundou-se na circunstância de lhe ter sido dito pelo gerente que o capital era garantido pelo Banco Réu, com juros semestrais e que poderia levantar o capital e respectivos juros quando assim o entendesse, bastando avisar a agência com antecedência não apurada.

      8 Então a Autora aplicou € 50.000,00 em “Obrigações K... Rendimento Mais 2004”.

      9 A Autora actuou convicta de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as características de um depósito a prazo, num produto com risco exclusivamente do Banco, convicção essa que era do conhecimento do gerente e funcionários do Réu.

      10 A Autora sempre esteve convencida que o Réu lhes restituiria o capital e os juros, quando os solicitasse.

      11 A Autora, caso tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de obrigações K... 2004, produto de risco e que o capital não era garantido pelo Banco J..., jamais o autorizaria.

      12 Era do conhecimento do gerente e funcionários do Réu que nunca foi intenção da Autora investir em produtos de risco e o Réu sempre assegurou que a aplicação em causa tinha a mesma garantia de um depósito a prazo, gerando na Autora a convicção plena na segurança da aplicação em causa, ainda reforçada com o pagamento semestral dos juros, tal como o facto da agência nunca a ter alertado para qualquer irregularidade e que manteve até Novembro de 2015, data em que o Banco Réu deixou de pagar os juros respectivos.

      13 Nunca o gerente ou funcionários do Réu, nem ninguém, leu ou explicou à Autora o que eram obrigações, em concreto, o que eram “Obrigações subordinadas K... Rendimento Mais 2004”.

      14 O Réu colheu a assinatura da Autora num subscrito que foi preenchido por funcionário do Réu não identificado, desconhecendo todo o processo de aquisição das obrigações K....

      15 À Autora nunca qualquer contrato lhe foi lido ou explicado, tão pouco entregue cópia que contivesse cláusulas sobre obrigações subordinadas K... nem que contivesse prazos de resolução unilateral pela Autora.

      16 Ainda a Autora nunca conheceu qualquer título demonstrativo de que possuía obrigações K..., não lhe tendo sido entregue documento correspondente.

      17 O prazo de maturidade do produto em causa ocorreu em 25 de Outubro de 2014.

      18 Na data de vencimento contratada o Réu não restituiu o montante que a Autora lhe...

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