Acórdão nº 646/17.8T8CTB.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelPAULA MARIA ROBERTO
Data da Resolução18 de Maio de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam Relatora – Paula Maria Roberto Adjuntos – Ramalho Pinto Felizardo Paiva na Secção Social (6ª secção) do Tribunal da Relação de Coimbra: I - Relatório A…, residente em K…, intentou a presente ação de processo comum contra B…, com sede em K… e C…, com sede em K… alegando, em síntese, que: As Rés emergiram de um processo de cisão, tendo a 1ª ficado com todo o património imobiliário e os trabalhadores continuaram a trabalhar nos mesmos locais e as mesmas funções, sendo ambas solidariamente responsáveis pelo pagamento de todos os créditos emergentes do contrato de trabalho; foi contratada pela C…, nunca tendo recebido qualquer comunicação de alteração da identidade da sua entidade patronal, nem lhe foi feita qualquer comunicação relativa ao motivo da cisão ou ao direito de exigir créditos laborais, só muito mais tarde se apercebeu de que tinha aparecido um 2 na sua designação, pelo que, tal operação de cisão não pode ser considerada para efeitos de desresponsabilização da primeira Ré; tal cisão teve como fundamento frustrar a cobrança dos créditos laborais dos trabalhadores e pretendeu-se encerrar a actividade e preservar o património da sociedade, sem pagar aos trabalhadores os seus créditos, tratando-se de uma situação do mais elementar abuso de direito e que deverá conduzir à responsabilidade solidária das Rés quanto ao pagamento de todos os créditos da A.; mesmo que se considere válida a transmissão do contrato de trabalho da 1ª para a 2ª Ré, aquela terá de continuar a considerar-se responsável pelos créditos já existentes á data da cisão; devido à existência de salários em atraso viu-se obrigada a suspender o contrato por diversas ocasiões até que, por carta de 07/02/2017, comunicou às Rés a sua decisão de resolver o contrato com fundamento na falta culposa do pagamento das suas retribuições e pedindo o pagamento de todos os valores a que tinha direito; à data da cessação do contrato de trabalho era-lhe devida a quantia total de € 8.370,69, a título de salários em atraso, diferenças salariais desde 2012, férias, subsídios de férias e de Natal e subsídio de refeição; tem direito a receber a quantia de € 11.379,60 a título de trabalho extraordinário aos sábados durante os últimos 5 anos; tem direito a receber a quantia de € 1.256,06 relativa a horas de formação não concedidas e, ainda, a uma indemnização por antiguidade que não deve ser inferior a € 9.104,55, resultado dos 10 anos, 4 meses e 12 dias de antiguidade.

Termina, dizendo que a presente ação deve ser julgada procedente, por provada e, em consequência, serem as Rés condenadas solidariamente a reconhecer que a A. rescindiu o contrato com justa causa e a pagar à A. a quantia total de € 30.110,89, nos termos supra discriminados e juros vencidos e vincendos, à taxa legal, até integral pagamento.

* A Ré B… contestou alegando, em sinopse, que: Não existe qualquer coligação entre as Rés; o contrato de trabalho da A. transmitiu-se para a 2ª Ré após a efectivação da cisão simples que se integra na transmissão de empresa ou estabelecimento comercial e, após a mesma, os estabelecimentos passaram a ser explorados pela 2ª Ré o que era do conhecimento da A. que aceitou aquela transmissão e nunca se opôs à cisão; esta deveu-se a motivos económicos e de gestão da empresa; não existe qualquer relação entre a atividade da 1ª e da 2ª Rés; a A. não pode vir reclamar da 1ª Ré qualquer tipo de responsabilidade solidária por obrigações alegadamente vencidas à data da cisão, por extemporânea, tendo caducado o seu alegado direito; a responsabilidade por via da desconsideração da personalidade coletiva é dos sócios mas nunca dos gerentes e ou de outras sociedades comerciais nas quais participem tais sócios; a cisão ocorrida foi lícita, não abusiva e sem qualquer propósito de iludir a lei; considera abusiva e injustificada a invocação de salários em atraso, pois foi a A. e os demais trabalhadores quem paralisou a empresa com greves e suspensão dos contratos de trabalho forçando o encerramento definitivo das unidades de pastelaria, criando as bases para invocar o despedimento por salários em atraso; não reconhece o direito da A. reclamar diferenças salariais com base no CCT invocado, uma vez que esta sempre aceitou os salários que lhe foram pagos e as relações laborais em causa não estão reguladas pelo mesmo; só com a PE nº 49/2017 é que passou a aplicar-se aos empregadores não filiados, pelo que, o CCT nunca pode produzir efeitos retroactivos; a A. nunca trabalhou as horas extraordinárias que alega e, a existir indemnização por antiguidade, deverá ser fixada em 15 dias de retribuição base e diuturnidades.

Termina, requerendo que se considere improcedente por não provada a presente ação e, em consequência, se absolva a Ré dos pedidos.

* Por despacho constante de fls. 126 e segs., foi julgada extinta a instância por inutilidade superveniente da lide, no que respeita à 2ª Ré C…, declarada insolvente, nos termos do disposto no artigo 277.º, e), do CPC.

* Foi proferido o despacho saneador de fls. 132 e segs., identificado o objecto do litígio e enunciados os temas de prova. * Procedeu-se a julgamento conforme consta das atas de fls. 265 e segs..

* De seguida, foi proferida a sentença de fls. 428 e segs. e de cujo dispositivo consta: “Nestes termos, e em face do exposto, decido julgar a ação parcialmente procedente, por provada e, em consequência, decido: I – Reconhecer a licitude da resolução do contrato de trabalho efetuada pela trabalhadora e que por via disso lhe são devidas as seguintes quantias: a) €5.494,33, referentes a indemnização por antiguidade; b) €1.550, referentes a retribuições em atraso; c) €530,00, a título de subsídio de férias (vencidas a 01/01/2017); d) €530,00, a título de férias não gozadas (vencidas a 01/01/2017); e) €61,89, a título de proporcionais de subsídio de Natal; f) €61,89 a título de proporcionais de subsídio de Férias; g) €61,89 a título de proporcional de retribuição das Férias; h) 7.987,52 € a título de trabalho extraordinário prestado aos sábados durante os últimos 5 anos; i) 1.067,50 € a título de formação profissional que a entidade empregadora nunca proporcionou à autora.

O que tudo perfaz o montante global de €17.345,02.

II – Absolver a 1ª ré, a sociedade B…, do pedido de condenação no pagamento das referidas quantias.” * A A.

, notificada desta sentença, veio interpor o presente recurso que concluiu da forma seguinte: (…) * A Ré ofereceu resposta, concluindo que: (…) * O Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu o douto parecer de fls. 519 e segs., no sentido de “que o recurso deve ser parcialmente procedente, nos termos assinalados”.

* A Ré B & F, Ldª veio responder a este parecer concluindo como nas suas alegações.

* Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

* II – Questões a decidir: Como é sabido, a apreciação e a decisão dos recursos são delimitadas pelas conclusões da alegação do recorrente (artigo 639.º, n.º 1, do C.P.C.), com exceção das questões de conhecimento oficioso.

Assim, cumpre apreciar as questões suscitadas pela A. recorrente, quais sejam: 1ª – Alteração da matéria de facto – artigos 2 a 5, 15 a 21 , 25 a 28, 34, 38 a 40, 43, 51, 52 e 61 da p. i. não provados.

  1. – Se entre as Rés existe uma relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo (artigo 334.º do CT).

  2. – Se a transmissão do contrato de trabalho da A. para a 2ª Ré é inválida (artigo 285.º do CT).

  3. – Se a 1ª Ré deve ser responsabilizada por via da desconsideração da personalidade coletiva (artigo 334.º do CC).

  4. – Se a 1ª Ré é responsável pelos créditos existentes à data da cisão (n.º 1 do artigo 122.º do CSC).

  5. – Se a indemnização prevista no artigo 396.º do CT devia ter sido fixada com base em 45 dias de remuneração por cada ano de antiguidade.

    * * III – Fundamentação a) Factos provados constantes da sentença recorrida: (…) * * b) - Discussão Apreciando as questões suscitadas pela A. recorrente: 1ª questão Alteração da matéria de facto – artigos 2 a 5, 15 a 21 , 25 a 28, 34, 38 a 40, 43, 51, 52 e 61 da p. i. não provados.

    (…) 2ª questão Se entre as Rés existe uma relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo (artigo 334.º do CT).

    Alega a A. recorrente que as Rés constituem uma única organização, têm a mesma sede social e são geridas pelas mesmas pessoas, têm uma única estrutura organizativa, têm os mesmos colaboradores no escritório que fazem indistintamente trabalho para ambas, têm a mesma estrutura societária de capital pois pertencem à mesma família, emergiram de um processo de cisão, tendo a 1ª ficado com todo o património imobiliário mesmo os imóveis que continuaram a ser usados na atividade da 2ª Ré, tendo todos os trabalhadores continuado após a cisão a trabalhar nos mesmos locais e a desempenhar as mesmas funções, existindo uma influência e uma subordinação comuns, tendo de se considerar que as duas Rés se encontram abrangidas pela previsão do artigo 334.º do CT, devendo ambas ser consideradas solidariamente responsáveis pelo pagamento à A. de todos os créditos laborais emergentes da cessação do contrato de trabalho.

    Na sentença recorrida entendeu-se que “no caso em apreço, a matéria de facto não traduz, por um lado, essa relação societária de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, entre as Rés, ou, por outro, a existência de uma estrutura organizativa que conduza à aplicabilidade do previsto no artigo 334.º do Código do Trabalho, improcedendo por isso a argumentação a este respeito expendida pela autora.” Vejamos: Resulta do artigo 334.º do CT sob a epígrafe responsabilidade solidária de sociedade em relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo que: >.

    Estamos perante sociedades coligadas e cuja previsão abrange sociedades por quotas, anónimas e em comandita por acções (artigo 481.º, n.º 1, do CSC).

    Na verdade, conforme dispõe o artigo 482.º do mesmo Código, consideram-se sociedades coligadas: as sociedades em relação de...

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