Acórdão nº 2879/10.9TBFIG-D.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 19 de Dezembro de 2018

Magistrado ResponsávelFONTE RAMOS
Data da Resolução19 de Dezembro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Por apenso aos autos de inventário instaurados para partilha dos bens na sequência do decretamento de divórcio, sendo requerente D (…) e requerido e cabeça-de-casal A (…), este veio requerer, a 19.01.2018, a citação daquela, formulando pedidos a produzir efeito no referido inventário e nas execuções apensas, nomeadamente: a) a declaração da ineficácia da partilha, aplicando-se as regras gerais dos negócios jurídicos, e, por essa via, que sejam extintos, retroactivamente ao momento do divórcio, os efeitos próprios da partilha, repondo a situação de indivisão; b) face à nulidade de todos os actos praticados nas execuções, deverá ser determinado o arresto nos termos do n.º 2 do art.º 619º do Código Civil (CC) e 391º do Código de Processo Civil (CPC), do imóvel “ Moradia sita na (...) – x (...), que foi implantada no antigo artigo n.º 00 (...) da Freguesia (...), Concelho de x (...)”, efectuando-se a notificação do actual proprietário do arresto e averbando-se na Conservatória do Registo Predial, o arresto e o cancelamento de qualquer registo futuro, até decisão final de todo o processo ou processos que venham a decorrer relativamente a este imóvel.

Referiu, nomeadamente: por mero acaso, no dia 09.01.2018, foi ao Tribunal verificar como estava a situação do processo de inventário e sem qualquer outra explicação, foi-lhe entregue um papel para preencher, para dar o seu IBAN, para lhe restituírem uma pequena quantia do produto da venda, conforme doc. que integra o processo a final; quanto ao inventário, nos termos dos art.ºs 72º do Regime Jurídico do Processo de Inventário, 286º e 289º do CC e 542º n.º 2 alíneas b), c) e d) do CPC, pede a anulação da homologação de sentença de partilha, com efeito suspensivo, e nulidade de todos os actos subsequentes; antes da partilha, a Juíza devia ter feito as diligências necessárias, nomeadamente as consagradas no art.º 239º do CPC e, durante a averiguação da concreta residência para ter a certeza que o requerente seria citado ou notificado, era seu dever suspender a instância nos termos da 1ª parte da al. c) e d) do n.º 1 do art.º 269º CPC; tanto mais que não havia urgência na partilha, porque os bens estavam na posse da requerente, nomeadamente a casa de morada de família e segundo as regras do art.º 1403º e segs. do CC, estavam em regime de compropriedade; também quanto à notificação da sentença homologatória da partilha, tendo o A. residência temporária na Alemanha, deveria ter sido notificado nos termos do art.º 239º do CPC, tanto mais que fez juntar aos autos atestado de residência francesa, desde 16.3.2014; a ex-cônjuge actuou com má fé processual, na vertente de utilização maliciosa e abusiva do processo de inventário; no que concerne à execução do apenso B, o A./ali executado nunca foi citado para nenhuma diligência, sendo que a PSP informou em 10.5.2016 que se encontrava emigrado em França e o MP requereu o arquivamento condicional nos termos do art.º 35º, n.º 6 RCP; relativamente à outra execução pendente, a exequente/aqui Ré requereu a execução de sentença nos próprios autos, sendo incompetente este tribunal; nunca foi citado, nem feita qualquer diligência junto das instâncias Judiciárias, Policiais ou Embaixada Portuguesa para ser citado, em França, onde reside; foi feita a venda do imóvel por pessoa que vive em união de facto com a filha do casal, não foi feita publicidade no Portal das execuções, foi colocado um edital na residência onde estava impedido de ir e nunca foi citado ou notificado para qualquer acto na venda.

A Ré contestou excepcionando a incompetência absoluta do tribunal, em razão da matéria e da hierarquia, a existência de erro na forma de processo e consequente prescrição do direito (porque o A. baseia-se na Lei 23/2013, de 05.3, que não estava em vigor à data do inventário, antes sendo aplicável a Lei 29/2009 de 29.6, concretamente o artigo 64º desta Lei, sendo que o prazo de um ano aí previsto já decorreu, verificando-se a prescrição do exercício do direito) e a utilização abusiva dos tribunais e instâncias judiciárias, nas vertentes de abuso do direito e litigância de má fé (aludindo ao processo 1187/09.2PBFIG - processo crime de violência doméstica contra na altura a sua mulher, aqui Ré, a quem foi atribuído o estatuto de vítima), sendo que o A. esteve presente ou devidamente representado nos autos e nunca veio indicar nova morada. Concluiu pedindo o desentranhamento da petição ou a improcedência da acção.

Por saneador-sentença de 11.6.2018, a Mm.ª Juíza a quo julgou o tribunal competente e julgou a acção improcedente, com a consequente absolvição da Ré.

Inconformado, o A. interpôs a presente apelação formulando as seguintes conclusões: 1ª - Não foi apreciada devidamente a matéria de facto e de direito, nos processos de inventário/Execução/venda e despacho/saneador, estando as sentenças, alicerçadas em nulidades jurídicas, violando grosseiramente o Princípio da Igualdade e Oportunidade, consagrados na CRP e na Lei.

2ª - Admitindo a Mm.ª Juíza erro na aplicação do direito, veja-se a fundamentação da decisão do despacho saneador/sentença, na última folha e que se reproduz “Não olvidamos as amplas plausibilidades das questões no nosso direito e, nesta medida, quiçá, o A. até possa vir a encontrar eco para a sua teoria argumentativa. Não foi o nosso caso.” 3ª - Conforme pedido na PI, seja declaro nulo todo o processado, desde a última intervenção no Inventário do Cabeça-de-Casal, ora A.

devendo este regressar à fase da Relação de Bens.

4ª - Devendo assim ser decretada a nulidade do Processo de Inventário/Execuções/Venda e despacho saneador/sentença, por estar em contradição com as normas supra referidas e violar normas jurídico-constitucionais, nomeadamente os art.ºs 13º, n.º 1 da CRP (Princípio da igualdade material), conjugado com os art.ºs 3º n.º 3 e 4º do CPC, bem com o art.º 14º (Portugueses no Estrangeiro), 20º n.º s 1 e 2 (Acesso ao Direito e tutela jurisdicional efectiva), n.º 2 do art.º 202º (Função Jurisdicional), n.º 1 do art.º 266º (Princípios Fundamentais) e n.º 3 do art.º 268º (Direitos e Garantias dos Administrados), da Constituição da República Portuguesa.

5ª - Como consequência determinar o arresto do imóvel na propriedade de quem se encontrar, pois o A. não prescinde do direito de regresso do mesmo ao património, com toda a legitimidade que lhe assiste.

6ª - Requer as diligências solicitadas no pedido da PI, quanto a todos os intervenientes na venda para esclarecimento da verdade material.

A Ré respondeu à alegação de recurso concluindo pela sua improcedência.

Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa apreciar das pretensas “nulidades”, “ilegalidades” e “inconstitucionalidades” da decisão recorrida, sendo que o A./recorrente não cumpriu quaisquer dos requisitos/ónus da impugnação da decisão relativa à matéria de facto previstos no art.º 640º do CPC, com as consequências que a lei claramente prevê.

* II. 1. A 1ª instância deu como provados os seguintes factos: 1) O processo de inventário, que constitui o apenso A, teve início com o requerimento da aqui Ré, com data de 20.5.2011.

2) O A.

[1] foi citado no apenso A, nos termos do então art.º 1340º do CPC, pelo menos a 28.6.2011, na seguinte morada: (…), Alemanha (cf. o A/R de fls. 11 do mesmo apenso, sendo que, por não ter sido aposta a data da citação, se atende à - necessariamente posterior - da entrada do mesmo na secretaria deste tribunal).

3) O aqui A., nomeado cabeça-de-casal nos referidos autos, prestou declarações nessa qualidade a 04.01.2012, a seu pedido, presencialmente neste tribunal, confirmando igualmente a morada referida em 2), como sendo a sua.

4) Na morada referida em 2), o aqui A. foi igualmente notificado para a prestação de declarações.

5) Mediante requerimento de 01.02.2012, no processo de inventário, o A. requereu a junção de procuração outorgada a favor dos Drs. (…) com data de 05.01.2012, nos termos da qual lhes confere poderes “para em seu nome assinarem qualquer transacção, acordo ou desistência do pedido ou da instância, representá-lo em audiência preliminar, conferência de interessados, audiência de partes (…)”.

6) A notificação expedida para o requerente/A. com data de 29.01.2015, remetida para a morada pelo mesmo fornecida – (…)Alemanha - veio devolvida, com a indicação de «desconhecido/endereço insuficiente».

7) Com data de 07.4.2015, foi decidida a reclamação relativamente à relação de bens, onde se determinou, além do mais, o aditamento dos PPR.

8) Na conferência de interessados de 15.6.2015, o Exmo. Mandatário do aqui A./cabeça-de-casal forneceu o endereço electrónico do cliente, além de tentar o contacto telefónico com o mesmo, tendo-se designado nova a fim de lograr a efectiva presença do mesmo.

9) O aqui A. foi notificado da nova data através do endereço electrónico fornecido.

10) Em 14.9.2015, teve lugar a conferência de interessados, na ausência do cabeça-de-casal, que se considerou notificado em vista de todas as tentativas empreendidas e de não ter sido comunicado endereço diferente, encontrando-se presente o seu Exmo. Mandatário com poderes especiais de representação.

11) Na mesma conferência de interessados, foi proferida sentença homologatória do acordo de partilha alcançado.

12) No requerimento do requerido/cabeça-de-casal, de 09.12.2015, o mesmo mantém que a sua residência no estrangeiro é (…)Alemanha.

13) O Exmo. Mandatário do cabeça-de-casal/A., no processo de inventário, renunciou à procuração mediante requerimento de 11.01.2016.

14) No âmbito da execução apensa (2879/10.9TBFIG.1), instaurada a 19.01.2016, foi expedida carta registada de citação do executado - ora A. -, nos termos do art.º 626º n.º 2 do CPC, com data de 23.5.2016, para (…)Alemanha.

15) A referida carta veio devolvida, com a menção «endereço insuficiente/desconhecido».

16) A 11.10.2016, foi enviado email para o executado, na dita execução...

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