Acórdão nº 1035/18.2T8CVL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Dezembro de 2018
Magistrado Responsável | MARIA JOÃO AREIAS |
Data da Resolução | 11 de Dezembro de 2018 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra (2ª Secção): I – RELATÓRIO M (…), e outros, intentam o presente procedimento cautelar comum contra a U (…), requerendo, entre outros pedidos oportunamente indeferidos, a condenação da ré a retirar, do poço da mina de água, a bomba de água e cano acoplado que ali colocou para retirar e utilizar a água. Mais requerem o decretamento da mesma sem prévia audiência da Requerida.
Para tanto, alegam, em síntese: os prédios urbanos de cada um dos Requerentes e o prédio rústico que a Requerida adquiriu aos requerentes no ano de 2003 faziam parte de um único prédio designado por Quinta G (...) ; no prédio hoje da ré situa-se uma mina de água que brota para um poço, onde se encontra colocada uma bomba à qual está acoplado um cano que extrai a água da mina do poço; após as desanexações e autonomizações prediais do prédio mãe, a água da mina do referido poço passou a ser utilizada pelos requerentes; a água da mina do poço sempre foi utilizada pelos requerentes e pelos seus ante possuidores e ante proprietários, nunca tendo a ré, mesmo depois de ter adquirido o seu prédio, praticado qualquer ato impeditivo da utilização da água pelos requerentes, sempre tendo a ré reconhecido que os requerentes tinham direito a uma servidão legal de água; no final do mês de Maio de 2018, o autor (…) constatou que tinha sido colocado pela ré, no poço da mina, uma bomba de água com um cano acoplado submerso a um nível de água mais profundo do que a bomba de água dos autores, sugando, dessa forma, toda a água, o que impede que a bomba de água dos Requerentes consiga trabalhar e recolher água da mina do poço como sempre aconteceu durante mais de 50 anos; Concluem, assim, que o prédio da ré se encontra onerado com uma servidão voluntária de águas constituída por destinação de pai de família, a favor dos prédios dos requerentes, ou subsidiariamente por uma servidão legal de águas, constituída por usucapião.
Procedeu-se à produção da prova oferecida pelos requerentes, após o que foi proferida decisão a julgar parcialmente procedente o presente procedimento cautelar comum, condenando a ré U (…) a retirar do poço da mina de água existente no seu prédio, a bomba e cano acoplado que ali colocou, referidos no ponto 18) da matéria de facto provada.
Citada, veio a ré U (…) deduzir oposição, alegando em síntese: do processo negocial que levou à aquisição da propriedade dos autores pela ré resulta que a compra foi feita “livre de ónus ou encargos”, tanto mais que os autores procuraram excluir os poços e minas da venda, o que levou à perda de interesse pela ré, interesse que a ré só retomou quando os autores abdicaram das condições propostas; sempre será consideravelmente superior para a ré o dano que resulta do decretamento da providência por comparação ao que se pretende evitar com o seu decretamento, uma vez que as utilidades que os autores pretendem acautelar com a água são recentes e construídas após a transmissão da parcela à ré, para além de que os autores têm instalado em cada um dos seus prédios um furo artesiano equipado com bomba submersível, que satisfazem essas necessidades; ao invés, a ré tem no seu prédio uma área de 4.600 m2 plantados que dependem da água existente para serem regados, uma vez que, sem a mesma, tal conduzirá à morte das culturas ou a um custo excessivo para as manter, atendendo ao preço do metro cúbico de água pago pelo consumidor “Estado”.
Conclui pela improcedência da providência, requerendo ainda a condenação dos autores como litigantes de má-fé.
Procedeu-se a audiência final, após o que foi proferida sentença a julgar procedente a oposição, determinando-se o levantamento da providência decretada.
* Inconformados com tal sentença, os Requerentes (…)e outros, dela interpõem recurso de apelação, que termina com as seguintes conclusões: (…)*A Requerida apresentou contra-alegações no sentido da manutenção do decidido, pelos fundamentos que assim sintetizam: (…)*Dispensados que foram os vistos legais ao abrigo do disposto no nº4 do artigo 657º do CPC, cumpre decidir do objeto do recurso.
II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO Tendo em consideração que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso – artigos 635º, nº4, e 639º, do Novo Código de Processo Civil –, as questões levantadas pelos apelantes nas suas alegações de recurso, são as seguintes: 1. Se se achava constituída uma servidão de águas por destinação de pai de família.
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Em caso afirmativo se, com a celebração da escritura de compra e venda, tal servidão se extinguiu.
III – APRECIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO 1. Matéria de facto Os factos, dados como provados na sentença recorrida e que aqui não foram objeto de impugnação, são os seguintes: 1. O prédio urbano sito em Quinta da G (...) , K (...) , composto por edifício de rés-do-chão, com a área descoberta de 4534m2, inscrito na matriz sob o artigo (...) 2, da União de Freguesias de K (...) e Y (...) (extinto artigo (...) 9 da freguesia de W (...) , K (...) ), descrito na Conservatória do Registo Predial da K (...) sob o nº (...) 8/19971212, encontra-se registado a favor dos autores (…) pela Ap. (...) 33, de 1998/03/17, tendo como causa de aquisição “Partilha” e como sujeito passivo (…) casado que foi com (…), em comunhão geral.
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O prédio urbano sito em Quinta da G (...) , K (...) , composto por edifício de rés-do-chão e sótão, com a área descoberta de 3650m2, inscrito na matriz sob o artigo (...) 3 da União de Freguesias de K (...) e Y (...) (extinto artigo (...) 4 da freguesia de W (...) , K (...) ), descrito na Conservatória do Registo Predial da K (...) sob o nº (...) 04/19901115, encontra-se registado a favor de (…) casados em comunhão de adquiridos, pela Ap. (...) 03 de 1990/11/15, tendo como causa de aquisição “Doação” e como sujeito passivo (…) e mulher (…), casados em comunhão geral.
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O prédio urbano sito em Quinta da G (...) , K (...) , composto de edifício do rés-do-chão e 1º andar, com a área descoberta de 3532 m2, inscrito na matriz sob o artigo (...) 99, da União de Freguesias de K (...) e Y (...) (extinto artigo (...) 11 da freguesia de W (...) , K (...) ), descrito na Conservatória do Registo Predial da K (...) sob o nº (...) 77/19950920, encontra-se registado a favor de (…) casado com (…) no regime de comunhão de adquiridos, pela Ap. 31 de 1995/09/20, tendo como causa de aquisição “Compra” e como sujeito passivo (…), casados no regime de comunhão geral.
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O prédio rústico sito em L(...) ou Quinta da G (...) , inscrito na matriz sob o artigo (...) 07 da União de Freguesias de K (...) e Y (...) , descrito na Conservatória do Registo Predial da K (...) sob o nº (...) 009/20020314, encontra-se registado a favor da U (…), pela Ap. 7, de 2004/04/02, tendo como causa de aquisição “Compra” e como sujeito passivo os aqui requerentes e ainda (…) 5. Os prédios referidos em 1) a 4) faziam parte de um único prédio – prédio mãe - conhecido por Quinta da G (...) , propriedade do falecido (…) e esposa (…).
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No prédio mãe referido em 5) situava-se uma mina de água que brotava para um poço construído em pedra delimitado por uma vedação em arame, no qual foi colocada uma bomba à qual está acoplada um cano que extrai a água da mina do poço, e com uma casota de pedra contígua.
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Nessa casota contígua ao poço foram colocados os dispositivos auxiliares da bomba de água, designadamente, balão e tubagem que a encana através de um tubo instalado no subsolo.
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Tal poço em pedra para aproveitamento da água da mina existe há mais de 50 anos, sendo que essa água, proveniente da mina, sempre foi utilizada pelos proprietários e pelos rendeiros/quinteiros do prédio mãe referido em 5) para rega das culturas existentes no prédio, o qual vinha sendo cultivado há pelo menos 40 anos, à vista de toda a gente, sem oposição de ninguém e de forma contínua, mesmo após a divisão do prédio referida em 9).
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O prédio mãe referido em 5) foi atravessado entre 1970 e 1980 pela construção da estrada nacional conhecida como “Variante à K (...) ”, a qual dividiu o prédio em duas partes: uma situada a poente da estrada, correspondente à parcela de terreno que hoje constitui o prédio referido em 4) e a outra correspondente à parcela de terreno que hoje constitui os prédios referidos em 1), 2) e 3).
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Com o atravessamento do prédio mãe pela estrada referida em 9), a mina de água, o poço e a casota referidas em 6) passaram a situar-se na parcela de terreno que hoje constitui o prédio referido em 4).
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O tubo instalado no subsolo do prédio referido em 4) continua no subsolo da estrada nacional “Variante à K (...) ” e chega ao prédio referido em 3) daí derivando por outras tubagens que encanam a água para os prédios referidos em 1) e 2).
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Com a aquisição dos prédios referidos em 1), 2) e 3), os autores continuaram a utilizar essa água para regas de jardins e relvados, para regas de pequenas hortas e lavagens, com a convicção de que o podem fazer, de forma contínua, à vista de toda a gente, sem qualquer oposição, designadamente, da ré, desde que esta adquiriu o prédio referido em 4), o que se manteve até ao referido em 46).
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Contíguo ao poço e à casota referidos em 6) existe um poste em cimento com uma baixada de corrente elétrica para fornecer energia à bomba de extração de água do poço e a todos os dispositivos da bomba de água que se encontram no interior da referida casota, onde também se encontra o contador de energia elétrica.
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Tai baixada de corrente elétrica e o contador para fornecer energia elétrica à bomba de água e dispositivos foram requisitados à EDP há mais de 40-50 anos pelos antigos rendeiros/quinteiros do prédio mãe.
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O contrato de energia elétrica referente ao contador que se encontra instalado na referida casota de pedra, encontra-se atualmente em nome do autor (…) sendo ele quem paga o consumo elétrico.
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No mês de Maio de 2018 o autor (…) testou o sistema de rega de jardim e...
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