Acórdão nº 965/15.8T8PTM.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Setembro de 2018
Magistrado Responsável | ANTÓNIO CARVALHO MARTINS |
Data da Resolução | 18 de Setembro de 2018 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
43Procº nº 965.15.8T8PTM.C1 2ª Secção - (Cível) Apelação - Acordam, em Conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I - A Causa: B (…), S.A.
com sede (…), Lisboa, veio propor a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra V (…)com residência em (…) Figueira da Foz, C (…) com residência (…)Barcelos, V (…), com residência (…), Faro e J (…) com residência em (…), Albufeira, pedindo que seja: reconhecido e declarado o incumprimento e resolução do contrato de mútuo celebrado entre a Autora e o primeiro Réu; reconhecida e declarada a propriedade da Autora sobre a viatura de marca “BMW”, modelo “Série 7”, de matrícula “XX” e determinado o registo de propriedade exclusivamente a seu favor, junto da Conservatória do Registo de Automóveis, com eliminação das demais inscrições existentes. Caso o Tribunal entenda que não pode declarar, desde já, a plena propriedade da Autora sobre a viatura referida nos autos, deve ser ordenada a reposição da situação registral que existia em momento anterior ao da “falsificação” (cancelamento da reserva de propriedade) de modo a permitir à Autora o accionamento daquela reserva de propriedade junto da Conservatória, transformando-a, por força do incumprimento contratual, em propriedade plena. Mais peticiona que se ordene a apreensão da viatura pelas autoridades policiais competentes e que a mesma seja entregue à Autora.
Como fundamento para a sua pretensão alegou, em súmula, que: - em Março de 2007 recebeu, através do fornecedor C (…) Lda, uma proposta para celebração de um contrato de mútuo, no qual seria mutuário V (…) e avalista D (…); - a proposta previa o financiamento à aquisição, pelo mutuário, de um veículo automóvel, de marca “BMW”, modelo “Série 7”, com a matrícula “XX” e o crédito concedido seria no valor de € 32.000, a reembolsar nos termos e condições do contrato de mútuo, cuja cópia se junta; - com vista à instrução de tal proposta, o referido fornecedor enviou à A. documentos relativos quer à viatura, quer ao mutuário; após análise dos documentos recebidos, a proposta veio a ser aprovada e, em consequência, o contrato de mútuo que se junta foi formalizado; - a A. adquiriu a referida viatura e procedeu ao pagamento ao fornecedor, da quantia de € 31.508,00, correspondente ao valor financiado (€ 32.000) deduzido do montante recebido directamente pelo vendedor/fornecedor do cliente/mutuário; - foi ainda feita a inscrição da propriedade da viatura em nome do mutuário, tendo sido efectuado o competente registo de reserva de propriedade a favor da Autora (como garantia de pagamento); - na vigência do contrato apenas foram pagas trinta prestações até Setembro de 2009; em face do incumprimento (e da insolvência dos Mutuário e Avalista – Processo 2610/11.1 TBFIG, (extinto) 3º Juízo da Figueira da Foz), a Autora procurou averiguar a situação registral da viatura, sobre a qual detinha uma reserva de propriedade, no sentido de, resolvendo o contrato por incumprimento, accionar tal reserva, fazendo sua a viatura para dela poder dispor; - ao verificar a situação registral da viatura de matrícula XX, sobre a qual detinha uma reserva de propriedade, a A. constatou que, sem que nunca tivesse cancelado a reserva de propriedade ou autorizado ou mandatado fosse quem fosse para que o fizesse, foi cancelada a reserva de propriedade de que era beneficiária sobre a viatura de matrícula XX, passando a ser, assim, propriedade plena do “mutuário” (AP YY); - as assinaturas constantes no documento de extinção de registo, não foram efectuadas por qualquer representante da A., ou por alguém que a vinculasse na qualidade de seu procurador, nomeadamente, o (…) nunca foi procurador da A. e a (…) informou tratar-se de (mais uma) falsificação da sua assinatura; - através da ap. 7260, do mesmo dia, a viatura foi “vendida” a C (…); 20 dias depois, através da ap. 4819, a viatura foi “vendida” a V (…) e em 12 de Maio de 2014, através da ap. 6946, a viatura foi “vendida” a J (…) - a Autora foi vítima de procedimentos fraudulentos, logrando os agentes do crime transferir para terceiros a propriedade da viatura de que a Autora é a única proprietária – por força da existência de uma reserva de propriedade e por força do incumprimento e resolução contratuais; - tendo a Autora suportado o preço integral do financiamento, e nunca a tendo “vendido”, esta é sua plena e exclusiva propriedade, tanto mais que o contrato foi, nos termos contratuais, resolvido, e a Autora era a detentora de uma reserva de propriedade sobre a viatura (que se vê agora impedida de accionar).
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Regularmente citado para o efeito o réu C (…) alegou, em síntese, que adquiriu de boa-fé ao primeiro réu a viatura em questão dando em troca outro veículo de marca Jaguar.
Mais alegou que o primeiro réu entregou-lhe a declaração de venda e a declaração de extinção de reserva de propriedade toda preenchida e com a assinatura devidamente reconhecida. Não sabe, nem tem forma de saber quem representa a autora, pelo que, tendo actuado de boa-fé, devem improceder os pedidos formulados pela autora, sob pena de se colocar em causa todo o sistema de comércio.
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Regularmente citado para o efeito o réu J (…)apresentou contestação e deduziu reconvenção.
Alegou, em síntese, que viu um anúncio na internet onde era publicitada a venda do veículo matrícula XX, e chegou a acordo pelo valor de 13.000,00€ com o (…), que era a pessoa que apareceu a negociar o veículo e que tinha na sua posse uma declaração de venda assinada pelo V (…), tendo o R. pago aquele valor em dinheiro por exigência do vendedor; a verificação da documentação e a transferência de propriedade foram efectuadas por intermédio do Automóvel Clube de Portugal, na agência de Faro, tendo estado presente o referido (…); o R. adquiriu legitimamente o veículo em causa a V (…), verificando os registos automóveis que estavam todos regulares, não existindo na altura da compra pelo R. qualquer reserva de propriedade registada, desconhecendo e não tendo obrigação ou sequer possibilidade de conhecer se no passado ocorreu alguma irregularidade ao nível dos registos automóveis ou das respectivas transacções; sem conceder, importa considerar todas as despesas com a conservação e melhoria das condições da viatura adquirida pelo R. e ser este ressarcido pelas mesmas, a título de benfeitorias, dos custos de legalização da propriedade da viatura no valor global de 334,00€ (trezentos e trinta e quatro euros) e dos custos de manutenção com a viatura no valor global de 10.221,56€ (dez mil e duzentos e vinte e um euros e cinquenta e seis cêntimos).
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A Autora apresentou réplica pugnando pela improcedência da reconvenção, argumentando, em síntese, que nada do requerido são benfeitorias e que é o Réu/reconvinte quem beneficia e frui a viatura, sendo contrário ao direito e à justiça a procedência do peticionado.
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Regularmente citado para o efeito o Réu V (…)não apresentou contestação.
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Não foi possível concretizar a citação pessoal do Réu V (…), tendo-se procedido à sua citação edital. Citado o Ministério Público e o Administrador de Insolvência não foi apresentada qualquer contestação.
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Foi dispensada a realização da audiência prévia.
Foi admitida a reconvenção e proferido despacho saneador. Foi identificado o objecto do litígio, sendo dispensada a enunciação dos temas de prova.
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Procedeu-se à realização da audiência final com respeito pelo legal formalismo.
* Mantêm-se os pressupostos que presidiram à prolação do despacho saneador.
* Oportunamente, foi proferida decisão onde se consagrou que: «Pelo exposto, o Tribunal julga procedente a presente acção e totalmente improcedente a reconvenção e, em consequência:
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Reconhece e declara a resolução do contrato de mútuo celebrado entre a Autora e o primeiro Réu V (…) b) Reconhece e declara a propriedade da Autora sobre a viatura de marca “BMW”, modelo “Série 7”, de matrícula “XX” e determina o registo de propriedade a seu favor, junto da Conservatória do Registo Automóvel, com a eliminação/cancelamento das inscrições existentes a favor dos aqui Réus.
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Determina, após trânsito, a apreensão do veículo matrícula “XX” pelas autoridades policiais para a sua entrega/restituição à Autora.
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Absolve a Autora do pedido formulado pelo Réu/reconvinte J (…) Custas da acção a cargo dos Réus e custas da reconvenção a cargo do Réu J (…) – artigo 527.º do Código de Processo Civil.
Registe e notifique.
Após trânsito, comunique a presente decisão à Conservatória do Registo Automóvel».
J (…), R. nos autos à margem identificados, não se conformando com a sentença final, veio dela interpor recurso de Apelação, com reapreciação da prova gravada, alegando e concluindo que: (…) Legal e tempestivamente notificado, B (…) S.A, , veio apresentar as suas CONTRA-ALEGAÇÕES, por sua vez concluindo, que: (…) * II. Os Fundamentos: Colhidos os Vistos legais, cumpre decidir: Matéria de Facto assente na 1ª Instância e que consta da sentença recorrida: Com interesse para a decisão encontram-se provados os seguintes factos: 1. A Autora B (…), S.A. é uma sociedade comercial sob a forma anónima, cujo objecto social compreende, designadamente, a celebração de contratos de mútuo (financiamentos para aquisições a crédito), financiando a pedido e no interesse dos particulares ou empresas que assumem a posição de mutuários, a aquisição, junto de determinados fornecedores, de bens de consumo/equipamentos, nomeadamente, veículos automóveis e motociclos.
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Em Março de 2007 recebeu, através do fornecedor C (…)Lda, uma proposta para celebração de um contrato de mútuo, no qual figuraria como mutuário V (…) e avalista D (…).
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A proposta previa o financiamento à aquisição pelo mutuário de um veículo automóvel, de marca “BMW”, modelo “Série 7”, com a matrícula “XX” e o crédito concedido seria no valor de € 32.000,00 (trinta e dois mil euros), a reembolsar em 84 (oitenta e quatro) prestações mensais, no valor de €559,77 (quinhentos e cinquenta e nove euros e setenta...
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