Acórdão nº 12/06.0TTLRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 13 de Novembro de 2007

Magistrado ResponsávelFERNANDES DA SILVA
Data da Resolução13 de Novembro de 2007
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em Conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra: I – 1 – A..., casado, residente na Rua de S. Miguel, nº 18, Bairro de S. Miguel, Porto de Mós, instaurou acção declarativa com processo comum, contra o «ESTADO PORTUGUÊS», alegando, no essencial, que, no dia 1 de Setembro de 1997, foi admitido ao serviço da Direcção Regional de Agricultura da Beira Litoral (DRABL) para prestar serviços de inspecção sanitária em carnes frescas de animais de talho, de capoeira e de caça, mediante a retribuição mensal de Esc: 251.460$00.

Para o efeito celebrou um contrato de prestação de serviços por avença.

Sucede que, embora este contrato refira que o mesmo não implicava qualquer subordinação jurídica, a verdade é que sempre actuou sob as ordens e instruções dos seus superiores hierárquicos, quer quanto ao local e tempo de trabalho, quer quanto à forma de execução das tarefas que lhe foram sendo atribuídas.

Assim, desde a sua admissão, foi colocado por ordens superiores, a prestar serviços no matadouro do ‘Mapicentro, S.A.’, em Leiria, das 8:00 às 19:00 horas. Depois, na sequência de uma agressão de que foi vítima nesse matadouro, foi afectado a outros estabelecimentos de abate, desenvolvendo aí a sua actividade de segunda a domingo, das 7h às 17h. E, mais tarde, foi colocado a trabalhar no matadouro da ‘Matreze’, em Pedrógão Grande, das 7h às 18h.

Em qualquer um destes locais, sempre actuou sob as ordens e instruções dos seus superiores hierárquicos, conforme detalhadamente explica, chegando mesmo a ter viatura automóvel atribuída para o desempenho das suas funções. Aliás, quando se deslocava em viatura própria, eram-lhe pagas as ajudas de custo tal como aos demais trabalhadores subordinados do R.

Por outro lado, a sua remuneração, embora mensal, reflectia o mesmo valor que era pago a um Técnico Superior de 2ª classe da função pública, o que era mais um ponto de semelhança.

Defende, assim, em suma, que executou para o R. um contrato de trabalho subordinado. E, como tal a denúncia deste seu contrato, equivale a um despedimento ilícito, na medida em que não foi precedido de qualquer processo disciplinar.

Pretende, pois, que o R. seja condenado a pagar-lhe a correspondente indemnização por antiguidade, acrescida de uma outra indemnização por danos não patrimoniais, tudo no valor de €: 15.014,72 e ainda as retribuições vencidas até ao trânsito em julgado desta sentença, bem como os juros moratórios desde a data da citação até integral pagamento.

2 – Tentada, sem êxito, a conciliação, na Audiência de Partes, o R. contestou defendendo a tese oposta.

Alegou, em breve síntese, que o A. foi contratado como profissional liberal para desempenhar funções em que releva não o trabalho, mas o resultado. Aliás, o A. actuava com total autonomia técnica, sendo livre na escolha dos métodos utilizados. Daí que as instruções mencionadas pelo A. nunca possam ser entendidas como ordens hierárquicas, mas meras orientações que visavam tão-só garantir o cumprimento da legalidade e interesse público que o Estado está incumbido de prosseguir. O mesmo fim tinham os carimbos e a viatura que lhe foram entregues para utilização nessas funções.

Por outro lado, o A. estava sujeito apenas ao horário dos estabelecimentos em que desempenhava a sua actividade, não havendo qualquer controlo dos seus tempos de trabalho ou mesmo da sua assiduidade.

A prova de que assim era é que o mesmo exercia funções em dois outros locais alheios ao contrato que celebrou com o Estado e nunca lhe foi imposto que exigisse autorização para o fazer. E, nem mesmo a circunstância de ter desempenhado tarefas em vários estabelecimentos para o Estado é relevante, na medida em que, para além das razões justificativas que o impuseram, o A. estava contratado para trabalhar em toda a área geográfica da DRABL.

Defende, pois, em suma, que o A. executou para o R. um contrato de prestação de serviços, pelo que a denúncia deste, sendo tempestiva, não lhe confere o direito a qualquer indemnização.

Termina, pedindo, a improcedência da acção e a sua absolvição do pedido.

3 – Discutida a causa, proferiu-se sentença a julgar a acção improcedente, por não provada, com absolvição do R. do pedido.

4 – Inconformado, o A. apelou.

Alegando, concluiu: · A relação de trabalho estabelecida entre o A. e o ‘Estado Português’ consubstancia um contrato individual de trabalho subordinado, sujeito às regras de direito privado; · Esse contrato, porque celebrado em desacordo com o estatuído no D.L. n.º 427/99, é nulo; · O regime da nulidade do contrato de trabalho não é o do Cód. Civil, designadamente o do art. 289.º/1, mas o previsto nos arts. 115.º e 116.º do Código do Trabalho; · À cessação do contrato de trabalho em análise há que atribuir os efeitos de um despedimento ilícito quanto à respectiva indemnização; · O A. trabalhou por conta do ‘Estado’ durante oito anos e três meses, tendo direito, nos termos do disposto no art. 439.º do Código do Trabalho, a uma indemnização equivalente a nove meses de retribuição no total de € 11.288,52; · O ‘Estado’ não pode e não deve ser beneficiado por violar a Lei que ele próprio produz; · A douta sentença sob recurso violou, por erro de interpretação e ou aplicação, o disposto nos arts. 115.º, 116.º e 439.º todos do Código do Trabalho.

5 – O MºPº, em representação do ‘Estado’, contra-alegou, concluindo que, declarado nulo o contrato celebrado entre as partes, por violação de normas imperativas do regime jurídico da sua celebração, a decisão do R. em lhe pôr termo, ainda que anterior à declaração de nulidade pelo Tribunal, não configura um despedimento, e muito menos um despedimento ilícito.

Por isso o A. não tem direito a qualquer indemnização, nenhuma censura merecendo a decisão recorrida.

Recebido o recurso e colhidos os vistos legais devidos, cumpre ora decidir.

___ II – FUNDAMENTAÇÃO.

A – DOS FACTOS.

Vem assente a seguinte factualidade: 1- O A foi admitido ao serviço do R., em 1 de Setembro de 1997, mediante a celebração de um contrato, denominado “CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS POR AVENÇA”, com a Direcção Regional de Agricultura da Beira Litoral (DRABL).

2- Esse contrato, nº 34/97, foi celebrado pelo período de um ano, “considerando-se tacitamente prorrogado, podendo ser denunciado por qualquer das partes mediante aviso prévio de sessenta dias, sem obrigação de indemnização”.

3- Mediante esse contrato, o A. obrigou-se a prestar ao R. serviços de inspecção sanitária das carnes frescas de animais de talho, capoeira e de caça, em matadouros situados na área de intervenção da DRABL.

4- Em contrapartida, o R. comprometeu-se a pagar ao A. prestações mensais de Esc. 251.460$00, acrescidos de IVA.

5- Do aludido contrato ficou a constar que o mesmo não implicava para o A.

“qualquer subordinação jurídica, nem lhe confere a qualidade de agente”.

6- Ao A. foi dado um cartão identificativo, emitido pela Direcção Geral de Veterinária, onde consta que o mesmo é Inspector Higio-Sanitário.

7- Ao A. foi também atribuído um carimbo destinado à marcação das Guias de Transporte de Carnes e certificação da sua assinatura.

8- Desde...

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