Acórdão nº 101/09.0TBTMR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Novembro de 2010

Magistrado ResponsávelFONTE RAMOS
Data da Resolução23 de Novembro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I. C (…) propôs, no Tribunal Judicial de Tomar, contra I (…) acção especial de prestação de contas, pedindo que a Ré preste as contas da sua gerência, referentes às rendas do imóvel identificado no art.º 1º da petição inicial (p. i.) e do período de Novembro de 1998 a 03 de Abril de 2003, montante de que o A. tem direito a metade.

Para além de invocar que a Ré tem em seu poder os documentos referentes às despesas e recebeu dos inquilinos os montantes das rendas, o A. alegou ainda, em síntese, para sustentar o seu direito de exigir a prestação de contas: o A., a Ré e (…)(filho da Ré) foram donos, em comum e partes iguais, até 23.4.2004, do referido prédio que desde a sua construção, no ano de 1984, esteve sempre arrendado quer para habitação quer para o comércio; em 1989 faleceu o irmão do A., (…), co-titular do direito de propriedade sobre o referido imóvel, ficando então acordado entre A. e Ré que a gestão e administração do prédio, quer quanto à sua conservação quer quanto ao recebimento das rendas dos inquilinos, ficaria um ano a cargo do A. e outro ano a cargo da Ré, actuando esta por si e em representação de seu filho (então menor[1]); até ao final do ano de 1998, a Ré passou a habitar o 3.º andar direito, sem consentimento do A. e, conforme acordado, pagou metade da renda ao A. até Novembro de 1998; a partir dessa data, apesar de continuar a habitar a fracção, não procedeu à entrega da sua parte na renda ao A.; a partir do início de 1999, a Ré passou a gerir unilateralmente o imóvel, recebendo as rendas de todas as fracções, colocando novos inquilinos e não prestando quaisquer contas ao A., o que aconteceu até 03.4.2003, data em que o prédio foi dividido; relativamente ao r/c (lojas n.ºs 48 e 52), 1.º Dto., 1.º Esq., 2.º Dto., 2.º Esq., 3.º Dto. e 3.º Esq. do prédio averiguou (quanto aos inquilinos, rendas e períodos de arrendamento) o que refere sob os itens 14º, 16º, 17º, 18º, 19º, 20º, 21º e 22º da p. i..

A Ré contestou por excepção e impugnação, referindo, em resumo, existir ilegitimidade passiva derivada da falta de um comproprietário na presente acção, o referido (…) que se encontra prescrita a obrigação de a Ré prestar contas, atento o regime jurídico previsto nos art.ºs 1406º e segs., 988º, n.º 2 e 310º, alínea g), do Código Civil, porquanto o A. vem pedir contas relativamente a um período terminado há mais de 5 anos; o A. pretende exercer nesta acção um direito que excede manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim económico ou social desse direito; a Ré nunca geriu o imóvel em causa nem se arrogou como administradora do mesmo, habitou o 3.º andar direito com o conhecimento e consentimento do A., a loja n.º 48 foi arrendada à Casa do ... em 1999 com o acordo e o consentimento do A. - que por sua vez arrendou a loja n.º 52 -, existindo um acordo no sentido de a loja n.º 48 vir ser adjudicada à Ré e a loja n.º 52 adjudicada ao A. (o que veio a acontecer), desconhecendo a Ré o demais alegado pelo A.. Concluiu pela procedência da matéria de excepção e pela improcedência da acção.

O A. respondeu à matéria de excepção, considerando-a insubsistente.

Produzidas as provas, foi proferida decisão a julgar improcedentes as excepções de ilegitimidade passiva e da prescrição - relativamente àquela excepção dilatória, condenou a Ré nas “custas do incidente”, fixando em 1 UC de taxa de justiça (art.º 7º, n.º 3 e tabela II do RCP) - e a reconhecer a obrigação de a Ré prestar contas ao A. com respeito aos arrendamentos que celebrou e rendas que recebeu com respeito ao imóvel identificado em 1) dos factos provados[2] desde Novembro de 1998 a 03 de Abril de 2003, e quanto à ocupação por si ocorrida com respeito ao 3.º Dto., nesse período, determinando que a Ré as apresente, no prazo de 20 dias, contados do trânsito em julgado da presente decisão, mediante a forma prevista no art.º 1016º, n.ºs 1 e 2 do CPC, sob pena de, não o fazendo, poder o A.

apresentá-las, não sendo depois permitido à Ré contestá-las, nos termos do disposto no art.º 1014º-A, n.º 5 do CPC.

Inconformada com a decisão, a Ré interpôs recurso de apelação apresentando as seguintes conclusões: 1ª - À administração da coisa comum, no que diz respeito à compropriedade, aplicam-se supletivamente todas as normas que regem as sociedades, incluindo o que está previsto para estas relativamente à obrigação de prestar contas.

2ª - O Recorrido e a Recorrente acordaram em efectuar uma administração anual a cargo de cada um deles alternadamente o que implicava necessariamente a obrigação de uma prestação de contas anual.

3ª - O Recorrido veio pedir contas respeitantes ao período de Novembro de 1998 a 03.4.2003, ou seja, a um período terminado há mais de 5 anos, tendo como referência a data da interposição da acção.

4ª - A obrigação de prestar contas anualmente traduz-se numa obrigação periodicamente renovável, pelo que se encontra prescrita - art.º 310, alínea g), do Código Civil.

5ª - Ao não se entender assim, violou-se o disposto nos art.ºs 985º e 988º, n.° 2, do Código Civil.

6ª - Através da procuração junta a fls. 124 a 126 a Recorrente apenas concedeu ao seu pai poderes para dispor de 1/4, que era o seu quinhão, da fracção identificada pela letra “A”, ou seja, da loja arrendada ao “Núcleo ...”.

7ª - Com tal procuração o seu pai só podia exercer os poderes de representação em relação à Recorrente para arrendar 1/4 da fracção mencionada.

8ª - O pai da Recorrente ao arrendar as fracções que não constam na procuração não actuou em representação da Recorrente.

9ª - Os contratos de fls. 88 a 91 não foram assinados pela Recorrente, a procuração em causa não concedia poderes ao seu pai para os assinar e não resulta dos autos que tenham sido ratificados.

10ª - São assim ineficazes em relação à Recorrente e não poderá a sentença condená-la a prestar contas relativamente aos contratos de arrendamento de fls. 88 a 91.

11ª - Ao não se entender assim, violou-se o art.º 268º, n.° 1, do Código Civil.

12ª - Os factos descritos na sentença nos pontos 4 e 13 (parte final) do item “Dos Factos Provados” dizem respeito ao período após Fevereiro de 2008, para depois na decisão condenar-se a Recorrente a prestar contas no que diz respeito aos mesmos factos no período desde Novembro de 1998 a 03.4.2003.

13ª - Existe uma contradição entre os factos dados como provados e a decisão, o que consubstancia uma nulidade da sentença - art.º 668º, n.° 1, alínea c), do CPC.

14ª - Em sede de contestação, ou seja no articulado próprio, a Recorrente arguiu a excepção dilatória de ilegitimidade passiva, que não foi atendida, sendo condenada em 1 (um

  1. UC de taxa de justiça, por se considerar tratar-se de um incidente.

    15ª - A arguição em articulado próprio de uma excepção dilatória não consubstancia um incidente.

    O A. contra-alegou sustentando a improcedência do recurso.

    Atento o referido acervo conclusivo (delimitativo do objecto do recurso nos termos dos art.ºs 684º, n.º 3 e 685º-A, n.ºs 1 e 3, do Código de Processo Civil[3], na redacção conferida pelo DL n.º 303/07, de 24.8), colocam-se quatro questões fundamentais: se ocorre a referida nulidade da sentença; se a obrigação de prestar contas se encontra prescrita; se os contratos de arrendamento de fls. 88 a 91 são “ineficazes” em relação à recorrente; se a arguição da excepção dilatória de ilegitimidade passiva consubstancia um incidente tributável.

    Por despacho de fls. 180, a Mm.ª Juíza a quo rectificou lapso de escrita constante do ponto 4 dos “factos provados” da sentença [aí se referiu o ano de 2008, em lugar de 1998, sendo que não se apreciaram factos ocorridos em 2008…] e, a fls. 188, reafirmando e reportando-se àquele lapso, indeferiu a invocada “nulidade da sentença” (art.º 670º, n.º 1).

    * II. 1. A 1ª instância deu como provados os seguintes factos:

  2. O A. e a Ré e seu (…) eram donos, em comum e partes iguais até 23.4.2004, do seguinte prédio: “Prédio urbano sito em ..., freguesia de ..., concelho de ..., composto de 5...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT