Acórdão nº 469/10.5TBCVL-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Novembro de 2010

Magistrado ResponsávelANTÓNIO BEÇA PEREIRA
Data da Resolução23 de Novembro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra I A...

L.

da instaurou, na comarca da Covilhã, a presente providência cautelar de restituição provisória da posse, contra B...

L.

da, pedindo que se condene esta: a) a restituir, imediatamente, à requerente a posse do prédio identificado nos artigos 7.º e 9.º deste articulado; b) a repor os canhões de todas as fechaduras que removeu do prédio atrás aludido, nomeadamente os da porta da entrada principal, das portas das lojas e de quaisquer outras dependências a cuja substituição haja procedido; a restituir à requerente, ou a quem esta confira poderes para o efeito, todos os exemplares das chaves das fracções do edifício de que se apropriou; a reprogramar os automatismos dos portões das garagens nos termos em que os mesmos se encontravam em 29/3/2010, quando procedeu à desactivação da programação que então apresentava – tudo no prazo máximo de 24 horas a contra da data em que for notificada da decisão que vier a decretar a presente providência; c) a abster-se de, por qualquer forma, ocupar o prédio atrás aludido, a nele permanecer, directa ou indirectamente, através de representantes ou colaboradores seus ou de terceiros a seu mando; d) a abster-se de, por qualquer forma, impedir ou perturbar, total ou parcialmente, a posse da requerente sobre o prédio aludido nas alíneas precedentes; e) a abster-se de aceder ao dito prédio, incluindo às zonas de estacionamento exterior, sem prévio consentimento da Requerente, prestado por escrito; f) a respeitar integralmente as condutas aludidas nas alíneas precedentes, sob pena de, não o fazendo, incorrer, bem como os seus administradores, na prática do crime de desobediência qualificada.

Alegou, em síntese, que adquiriu o lote de terreno, sito na ..., Lote ..., na freguesia de ..., concelho da ..., então inscrito na respectiva matriz sob o artigo ...e descrito na competente Conservatória do registo Predial sob o nº ..., com o objectivo de nele construir um edifício destinado a comércio, serviços e habitação e de o constituir em propriedade horizontal e proceder à revenda das respectivas fracções autónomas.

Para o efeito, celebrou com a requerida um contrato, que denominaram de Contrato de Empreitada – ... – ...

, datado de 2 de Julho de 2007, nos termos do qual esta obrigou-se a construir naquele lote de terreno um edifício, destinado a habitação e comércio, incluindo um piso destinado a parqueamento de viaturas, zonas de estacionamento exterior, acessos pedonais e de viaturas, zonas verdes e demais arranjos exteriores das áreas envolventes, em conformidade com os respectivos projectos aprovados, com o caderno de encargos e memória descrita de acabamentos acordados, com as alterações que a dona da obra, porventura, viesse a introduzir-lhe, com todas as fracções e partes comuns devidamente preparadas e concluídas para os fins a que se destinam e com todas as vistorias, licenciamentos, certificações e demais documentação necessários à obtenção da licença de utilização e celebração das escrituras de transmissão das respectivas fracções autónomas obtidas em resultado do seu fraccionamento através da sua constituição em propriedade horizontal.

Foi estabelecido o preço de 3.736.750 € e a requerida obrigou-se a concluir a obra no prazo máximo de 18 meses. Posteriormente, o contrato foi modificado por acordo das partes, no que concerne às obras a executar, a algumas soluções construtivas, a materiais e acabamentos e ao preço inicialmente convencionado.

A requerida construiu o edifício, dando a obra por concluída a 3 de Abril de 2009, e a requerente procedeu à participação fiscal das diversas fracções do mesmo, apresentando para o efeito em 24 de Novembro de 2009 a respectiva declaração modelo 1 de IMI, que foi recepcionada no competente Serviço de Finanças em 25 de Novembro de 2009. Por escritura pública celebrada em 26 de Novembro de 2009, a requerente constituiu em propriedade horizontal o edifício, fraccionando tal prédio em 83 fracções e promoveu subsequentemente o registo destas.

No dia 29 de Março de 2010 deslocaram-se ao prédio o encarregado da requerida e uma viatura da "C...

", com dois homens, que, por indicações daquele, procederam à mudança do canhão da fechadura da porta de entrada, forçando e removendo o que até então aí se encontrava colocado. E, quando a vendedora da requerente, que se encontrava no stand de vendas que esta tinha instalado no edifício, pretendeu aceder às fracções habitacionais do edifício, foi impedida de o fazer por aquele encarregado, que lhe disse que estava proibida de entrar no prédio. Nesse dia, a requerida comunicou à requerente, via fax que na sequência do incumprimento de todas as datas previstas para a realização das escrituras referentes aos contratos promessa de compra e venda (…) os quais constavam do acordo de regularização da dívida, por nós celebrado em 17 de Agosto de 2009 (…) vimos pelo presente considerar sem qualquer efeito o referido acordo.

(…) Mais informamos que tendo em consideração o valor em dívida para com esta empresa, procedemos ao exercício do direito de retenção sobre a obra por nós executada, sem prejuízo, obviamente da cobrança coerciva do valor em divida nesta data.

A requerida disse então ter "confiscado" todas as chaves das fracções habitacionais do prédio, desprogramou os mecanismos de abertura do portão de acesso à cave, mudou os canhões das portas das diversas fracções comerciais, colocou no edifício um segurança, que mantém a porta de entrada fechada e impede, desde então, o acesso ao edifício à requerente, aos seus colaboradores, aos promitentes compradores das fracções e ao adquirente da fracção "K", que nesse mesmo dia 29 de Março a tinha comprado.

Produzida a prova oferecida pela requerente, foi proferida decisão com o seguinte teor: Pelo exposto, e sem necessidade de maiores considerações, ao abrigo das disposições legais citadas e ainda do disposto no art.º 394º do Código de Processo Civil, ordena-se que a Requerida, no prazo de 24 horas a contar da notificação: a. Restitua à Requerente a posse do prédio identificado na alínea H) dos factos indiciariamente dados como provados.

  1. Reponha os canhões de todas as fechaduras removidas do referido prédio, nomeadamente os da porta da entrada principal, das portas das lojas e de quaisquer outras dependências a cuja substituição haja procedido.

  2. Restitua à Requerente todos os exemplares das chaves das fracções do edifício de que se apropriou.

  3. Reprograme os automatismos dos portões das garagens nos termos em que os mesmos se encontravam em 29/03/2010, quando procedeu à desactivação que então apresentava.

  4. Se abstenha de, por qualquer forma, ocupar o prédio referido, a nele permanecer, directa ou indirectamente, através de representantes ou colaboradores seus ou de terceiros a seu mando.

  5. Se abstenha de, por qualquer forma, impedir ou perturbar, total ou parcialmente, a posse da Requerente sobre o referido prédio.

  6. Se abstenha de aceder ao dito prédio, incluindo às zonas de estacionamento exterior, sem prévio consentimento da Requerente, prestado por escrito.

  7. Respeite integralmente as condutas supra aludidas, sob pena de, não o fazendo, incorrer, bem como os seus administradores, na prática do crime de desobediência qualificada.

    Após ser citada, a requerida deduziu oposição, onde, em síntese, afirma que, a 29 de Março de 2010, a obra que lhe tinha sido confiada e de que tinha a posse, não estava concluída, nem tinha havido a sua entrega e aceitação. Mais alegou que a requerente não tinha a posse do imóvel, nem dele foi esbulhada. Afirma ainda ter exercido o direito de retenção e termina pedindo que se determine a revogação e o levantamento do procedimento cautelar de restituição provisória da posse.

    Procedeu-se então à produção da prova oferecida pela requerida e terminada esta decidiu-se: Assim sendo, invocando-se tais fundamentos, julgo totalmente improcedente a presente oposição e mantenho a providência decretada.

    Inconformada com tal decisão, a requerida interpôs recurso, que foi recebido como de apelação, com subida imediata, em separado e efeito meramente devolutivo, findando a respectiva motivação, com as seguintes conclusões:

  8. O que está em causa pode resumir-se em meia dúzia de palavras: a Recorrente exerceu no dia 29 de Março de 2010, o seu direito de retenção sobre a obra que estava a construir para a Recorrida, por existência de dívidas por parte desta; b) Em 5 de Maio de 2010, e por força de providência cautelar de restituição provisória da posse proposta pela Recorrida contra a Recorrente, é decretada a providência em causa, sem audição da Recorrente, sendo que, após a Oposição da Recorrente, e mais de 38 dias depois da sua decretação pelo Tribunal a quo, a providência é mantida; é dessa Sentença que agora se recorre; c) A decretação da providência cautelar e a sua manutenção pela Sentença recorrida não tem qualquer sustentabilidade quer na prova documental e testemunhal que foi feita, nem no Direito adjectivo e substantivo em vigor; d) Alcançando o “ambiente” que precedeu a decretação da providência cautelar, e o que precedeu a audiência final, após a Oposição da Recorrente, entende-se a razão pela qual não pode a Sentença Recorrida manter-se nos termos em que foi decretada; e) Na produção da prova testemunhal, que ocorreu antes da decretação da providência, violaram-se todas as regras processuais em vigor, designadamente aquelas que obrigam o Tribunal a quo a questionar a razão de ciência e as circunstâncias em que as testemunhas conhecem os factos, nos termos do art. 638.º, do CPC; f) Não é possível aceitar o testemunho de alguém que, não estando presente no dia 29 de Março de 2010, em determinado local, depõe como tendo tido conhecimento directo dos factos, sem que nunca se pergunte a razão de ciência acerca dos mesmos; g) A Sentença em que se decreta a providência chega a dar como provada a existência de contratos-promessa de compra e venda que só posteriormente na Oposição são...

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