Acórdão nº 2460/03.9TALRA.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 19 de Outubro de 2010

Magistrado ResponsávelJORGE JACOB
Data da Resolução19 de Outubro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I – RELATÓRIO: Nestes autos de processo comum que correram termos pelo 1º Juízo de Competência Criminal de Leiria, foi interposto recurso da sentença proferida em primeira instância a fls. 195 e ss.. O recurso veio a ser apreciado por acórdão da 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra que, anulando a sentença recorrida (fls. 483 e ss.), decidiu assim: “Termos em que se anula a sentença que -, colmatadas que sejam em nova audiência as deficiências apontadas quanto à gravação da prova oral -, deverá ser substituída por outra em que se proceda ao exame crítico das provas.” Devolvidos os autos à 1ª instância, foi proferido o seguinte despacho, a fls. 501: “ Em estrita obediência ao acórdão da Relação junto aos autos, designo, para realização de audiência de discussão e julgamento, com vista à reinquirição das testemunhas A... e J..., assistente C... e arguido L... (estes últimos apenas quanto aos esclarecimentos finais prestados pelo arguido e assistente, após tais depoimentos), o dia 07-07-09, pelas 14 h.” Notificado do teor deste despacho, o arguido suscitou a respectiva nulidade, indeferida por despacho com o seguinte teor (fls. 523): “Fls. 521-2: Não assiste razão ao arguido na nulidade invocada.

O julgamento nestes autos teve lugar, foi proferida sentença e, após, interposto recurso da sentença.

O tribunal superior decidiu anular a sentença, decidindo que “colmatadas que sejam em nova audiência as deficiências apontadas quanto à gravação da prova oral-, deverá ser substituída por outra [sentença] em que se proceda ao exame crítico das provas”.

Pela Ex.ma colega que presidiu à audiência de julgamento em 1ª instância foi decidido, de resto em obediência ao determinado pelo tribunal superior, que se realizassem os actos de prova indicados no respectivo despacho (fls. 501), a fim de suprir as deficiências apontadas por aquele alto tribunal.

Não se coloca a questão da perda da eficácia da prova – já recolhida -, como alega agora o arguido, uma vez que o tribunal de 1ª instância cumpriu com os prazos e regras da continuidade da prova, importando agora proceder às diligências necessárias, complementares, para atender ao determinado pelo tribunal superior, apenas para efeitos de a sentença recorrida ser substituída por outra onde se proceda ao exame crítico das provas, face à deficiente gravação, o que é coisa diferente de produção de novas provas.

Não foi, portanto, o julgamento que foi anulado, mas sim a sentença dele decorrente.

Indefere-se, assim, a arguida nulidade, inexistente, aguardando os autos a data já designada para a audiência, com a presença dos intervenientes convocados.

Notifique.

D.N.”.

Inconformado, o arguido interpôs recurso deste despacho, retirando da respectiva motivação as seguintes conclusões: 1. A audiência de discussão e julgamento realizada nos presentes autos conheceu duas sessões, em 11 e 18 de Maio de 2005.

  1. Nestas sessões foram ouvidos o arguido, o assistente e quatro testemunhas de defesa.

  2. O aliás douto despacho sob recurso manteve a nova data de audiência de julgamento para o dia 7 de Julho de 2009, restrita aos depoimentos finais do arguido e do assistente e de duas testemunhas de defesa, conforme fora determinado pelo douto acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra.

  3. Entre a data que se designou e as duas sessões do mesmo julgamento mediaram mais de 4 anos.

  4. O que ocorreu em colisão com o disposto no artigo 328.°, n.º 6 do C. Proc. Penal que estatui a impossibilidade da audiência ser adiada por mais de trinta dias, determinando a ultrapassagem de tal prazo a perda da eficácia da prova já realizada.

  5. Tal disposição radica na oralidade e na imediação da prova, tendo que ver apenas com a produção da prova e a concentração no decurso da audiência e até ao encerramento desta: não rege, pois, sobre incidências procedimentais posteriores.

  6. Há fundamento para aplicar ao caso o estatuído no art. 328.°, n.º 6, do CPP, ou seja, a perda da eficácia da prova oral produzida nas duas primeiras sessões de julgamento, porquanto a sentença do tribunal a quo foi anulada em recurso pelo Tribunal da Relação de Coimbra que determinou que o suprimento das nulidades determinava não só o esclarecimento da fundamentação (por incumprimento do art. 374.°, n.º 2, 2.a parte, do CPP), mas nova deliberação do tribunal a quo, pelo que não é indiferente o tempo decorrido desde o encerramento da discussão da causa até à nova data que se designou, em que tal discussão iria ser "retomada".

  7. O artigo 328.°, n.º 6 do Código de Processo Penal é inconstitucional quando interpretado no sentido da não aplicação do prazo de 30 dias a todo e qualquer caso em que a audiência de discussão e julgamento em que haja produção de prova oral venha a ser retomada, ainda que por via de recurso, por violação do n.º 1 do artigo 32.° da Constituição.

  8. A decisão recorrida viola as disposições legais enunciadas nestas conclusões.

  9. Deve-se conceder provimento ao presente recurso e, consequentemente, declarar-se nulo o despacho de fls. 501, devendo-se ordenar a perda da eficácia de toda a prova oral já produzida a qual deverá ser toda repetida, designando-se, para tanto, nova data para a realização da audiência de discussão e julgamento.

    O M.P. respondeu, pronunciando-se pela improcedência do recurso.

    Reaberta a audiência para repetição da prova deficientemente gravada, o arguido formulou requerimento no sentido do respectivo adiamento com base na falta das testemunhas A... e João Justo. Sobre esse requerimento incidiu o seguinte despacho, exarado em acta a fls. 553: “Considerando que as testemunhas J… e A…, cujo depoimento deveria ser gravado em audiência conforme o ordenado no acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, seriam as testemunhas a apresentar pelo arguido considerando a contestação de fls. 115/120, quanto à testemunha A... e verificando-se já a falta da testemunha J… na sessão anterior foi expedida notificação pelo O.P.C. competente para a morada indicada no mesmo rol apresentado pelo arguido. Inexiste, pois, razão para impedir o prosseguimento da audiência, não cabendo ao tribunal indagar da localização das testemunhas, uma vez que os mesmos são apresentados pelo arguido. Assim, e no seguimento do ordenado pelo Tribunal da Relação de Coimbra, apenas será possível proceder à gravação dos esclarecimentos finais prestados pelo arguido e pelo assistente, o que se fará de imediato”.

    Inconformado com este despacho, o arguido interpôs novo recurso, retirando da respectiva motivação as seguintes conclusões: 1. A M.rna Juiza deveria ter adiado a audiência de julgamento tal como preceitua o referido art. 3310 do C. P. Penal, uma vez que era indispensável para a descoberta da verdade ouvir as testemunhas do arguido J… e A... como lhe foi imposto pelo Tribunal da Relação de Coimbra, 2. Deve prevalecer sempre a verdade material em detrimento doutros valores que lhe são hierarquicamente inferiores, como é o caso da celeridade processual, o que não ocorreu com a decisão recorrida, 3. Também, o art. 340.0 n.º 1 do CPP estipula que "o tribunal ordena, oficiosamente ou a requerimento, a produção de todos os meios de prova cujo conhecimento se lhe afigure necessário à descoberta da verdade e à boa decisão da causa" o que se traduz um afloramento, para a audiência, do principio da investigação ou da verdade material que enforma o processo penal.

  10. O Tribunal deveria ter ele próprio, oficiosamente, providenciado para notificar as testemunhas pelos meios legais para as ouvir, para cumprir a ordem do tribunal superior que lhe foi determinada, a fim de puder ter uma visão completa do processo em causa.

  11. O princípio da descoberta da verdade material deve prevalecer sempre em detrimento doutros valores que lhe são hierarquicamente inferiores, como é o da celeridade processual.

  12. Assim, ao não adiar o julgamento e com isso obstar à audição das sobreditas testemunhas, cometeu e tribunal a que a nulidade a que alude o art. 120º, nº 2, d) do C. P. Penal, por omissão de diligência essencial à descoberta da verdade.

  13. A decisão recorrida viola as disposições legais enunciadas nestas conclusões.

  14. O despacho recorrido deve ser substituído por outro que, em face da falta de comparência das testemunhas cuja audição foi determinada superiormente declare nulos os actos posteriores ao despacho de fls. 553 (designadamente, a decisão condenatória) e, em consequência, designe nova data para a audiência a fim de proceder à respectiva inquirição (notificando-as para o efeito nos termos legais e sem prejuízo de repetir toda a prova que, entretanto, perdeu eficácia).

    O M.P. respondeu, pronunciando-se pela improcedência do recurso.

    Entretanto, foi proferida sentença decidindo nos termos seguintes: (…) Assim, e pelo exposto: a) Condeno o arguido L… pela prática de um crime de emissão de cheque sem provisão, crime previsto e punido no artigo 11º, n.º 1, alínea a) e 2 do Decreto-Lei n.º 454/91 de 28 de Dezembro, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 316/97 de 19 de Novembro, na pena única de 300 dias de multa a uma taxa diária de 10, perfazendo um montante global de 3000 euros.

    1. Condeno o arguido e a M… – Metalomecânica, Ld.ª, solidariamente (nos termos do art.º 11,4 DL 454/91), no pagamento do pedido cível contra si deduzido pela assistente U… –, Ld.ª, no valor de 25.502,59 euros, a que acrescem juros legais desde 17-6-03, até integral pagamento, à taxa de juro legal aplicável.

    2. Condeno o arguido, nos termos dos artigos 513º e 514º do Código de Processo Penal, 74º, n.º 1, 85º, n.º 1, alínea b) e 89º do Código das Custas Judiciais, nas custas do processo, fixando em 2 UC’s o valor da taxa de justiça (acrescida de 1%, nos termos do n.º 3 do artigo 13º do Decreto-Lei n.º 423/91 de 30 de Outubro).

    3. Em relação ao pedido cível, custas pelo demandado (cfr. art.º 446 CPC, art.º 520,a) CPP conjugado com o Ac. de fixação de Jurisprudência 3/93 de 27-1 ( DR I-A de 10-3-93), art.º 306,1 CPC, art.ºs 5,1, 13, 1 e 2, 14,e) e 88 CCJ.

    (…) O...

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