Acórdão nº 500/06.9TBTND.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 19 de Outubro de 2010

Magistrado ResponsávelGONÇALVES FERREIRA
Data da Resolução19 de Outubro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Relatório: J (…), casado, residente (…) concelho de Tondela, intentou acção declarativa comum, com forma de processo ordinário, contra Companhia de Seguros (…), SA, com sede (…) Porto, alegando, em resumo, que: No dia 21 de Fevereiro de 2004, pelas 15H00, quando tripulava o seu motociclo de matrícula ....LU, na EN n.º 228, foi embatido pelo veículo automóvel ....DB, segurado na ré, do que lhe sobrevieram danos vários, patrimoniais e não patrimoniais, que descreve e quantifica.

Coube ao condutor do DB a responsabilidade pela produção do acidente, por ter guinado abruptamente a sua viatura para a esquerda, no preciso instante em que o autor o estava a ultrapassar.

Concluiu pela condenação da ré no pagamento da quantia de € 183.275,00, acrescida de juros legais até integral pagamento.

Regularmente citada, a ré contestou, imputando, por um lado, ao autor a culpa pela eclosão do sinistro, por se ter abalançado a ultrapassar o DB quando este efectuava uma manobra de mudança de direcção para a esquerda e impugnando, por outro, a existência e o valor dos danos.

Terminou pela absolvição do pedido.

(…)Companhia de Seguros, SA, com sede (…), em Lisboa, deduziu o incidente de intervenção principal espontânea, alegando ser-lhe devido o montante de € 30.367,57, acrescido de juros vencidos e vincendos, que pagou ao autor, no âmbito de processo emergente de acidente de trabalho, que correu seus trâmites no 2.º Juízo do tribunal do Trabalho de Viseu.

O incidente foi admitido sem oposição, não obstante a ré ter contestado a versão do acidente dada pela interveniente.

No despacho saneador foram declaradas a validade e a regularidade da lide.

A selecção da matéria de facto (factos assentes e base instrutória) foi alvo de reclamação por parte da ré, parcialmente atendida.

Realizada a audiência de julgamento, no decurso da qual a interveniente ampliou o pedido em € 7.091,80, e fixada, sem reparos, a matéria de facto, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e condenou a ré a pagar ao autor as quantias de € 39.190,61 e de 21.520,00, de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescidas de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal, desde a citação e da data da sentença, respectivamente, até integral pagamento, e à interveniente a importância de € 14.980,90, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal, desde a notificação do articulado de intervenção até efectivo pagamento.

Inconformados com a decisão, dela interpuseram recurso o autor e a ré, que concluíram assim as respectivas alegações: A. Autor: 1) O veículo DB pretendia entrar numa rua de terra, com 3,50 metros de largura, situada do lado esquerdo da Estrada Nacional 228, atento o sentido de marcha Campo de Besteiros/Vouzela, de forma ascendente e obliquamente para sudoeste e dificilmente visível para quem seguisse aquele sentido; 2) O autor iniciou a manobra de ultrapassagem e passou a circular pela metade esquerda da faixa de rodagem momentos antes de o condutor do DB iniciar a manobra de mudança de direcção para a esquerda; 3) A viatura DB invadiu a meia faixa de rodagem esquerda por onde o autor já circulava, tendo feito um ângulo de cerca de 180º, para contornar o cotovelo que resulta do ponto 8 dos factos provados; 4) O autor não via o DB, que estava tapado pelo veículo que se interpunha entre ambos, não via o caminho térreo, tinha de retomar o mais breve possível a sua direita e não contava com a manobra daquele; 5) O condutor do DB estava obrigado a facultar a ultrapassagem, pelo que foi dele a culpa pela produção do acidente; 6) Ao não entender assim, violou o tribunal o disposto nos artigos 44.º, n.º 1, 38.º, n.º 3 e 39.º, n.º 1, todos do Código da Estrada; 7) Não seguindo o tribunal este caminho, deveria, pelo menos, lançar mão do preceituado no artigo 506.º, n.º 2, do Código Civil, declarando igual a culpa de ambos os condutores; 8) A decisão deve ser revogada e substituída por outra que julgue a acção totalmente procedente ou declare igual a culpa dos condutores dos veículos LU e DB.

  1. Ré: 1) O condutor do DB, pretendendo virar à esquerda no entroncamento que se aproximava, fez sinal de pisca – pisca para esse lado, diminuiu a velocidade e, depois de se ter certificado de que não havia trânsito em sentido contrário nem estava a ser ultrapassado, iniciou a manobra; 2) Quando estava prestes a concluir a manobra, ocupando, então, apenas cerca de um metro da metade esquerda da faixa de rodagem, foi embatido pelo LU, que seguia a não menos de 90 quilómetros por hora, apesar de a velocidade máxima permitida para o local ser de 60 quilómetros por hora; 3) O embate ocorreu junto da berma esquerda e a cerca de 6 metros da berma direita, atento o sentido de marcha de ambos os veículos; 4) No local, a estrada tem 6,60 metros de largura, desenha-se em linha recta e as duas meias faixas que a compõem estão separadas por um traço descontínuo; 5) A culpa pela produção do acidente coube ao autor, por conduzir sem atenção ao trânsito (tanto assim que se não apercebeu do DB a concluir a manobra de mudança de direcção para a esquerda), a velocidade superior à permitida (razão por que não conseguiu parar o respectivo veículo no espaço livre e visível à sua frente) e de forma imperita (de tal modo que não logrou passar pelos cerca de 2,30 metros livres da metade esquerda da faixa de rodagem); 6) A sentença recorrida violou o disposto nos artigos 483.º, 505.º e 570.º do Código Civil e os preceitos estradais.

7) A decisão deve ser revogada e substituída por outra que julgue a acção totalmente improcedente.

A interveniente contra-alegou, de molde a sustentar a manutenção do julgado.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

Em conformidade com o teor das conclusões das alegações dos recorrentes, que delimitam o âmbito do recurso, são duas as questões a resolver:

  1. A responsabilidade pela produção do acidente; b) O montante indemnizatório.

    1. A matéria de facto: Na sentença apelada foram dados por assentes os seguintes factos: 1) No dia 21 de Fevereiro de 2004, pelas 15.00 horas, na Estrada Nacional n.º 228, ao Km 39,350, em Caparrosa, área desta comarca, ocorreu um embate entre o motociclo de matrícula ....LU, conduzido pelo autor J (…), seu proprietário, e o veículo ligeiro de mercadorias de matrícula ....DB, conduzido por E (…) residente em Caparrosa – A).

      2) Nas circunstâncias de tempo e lugar aludidas em A), o motociclo LU e o veículo DB circulavam no sentido Campo de Besteiros – Vouzela – B).

      3) O veículo DB circulava à frente do motociclo LU, interpondo-se entre ambos um outro veículo – C) e 1º.

      4) Cerca de 50 metros depois do cruzamento que liga Caparrosa e Boaldeia, o autor iniciou a ultrapassagem do veículo que o precedia, bem como do veículo DB – 2º.

      5) O condutor do DB pretendia virar à sua esquerda no entroncamento que se aproximava e seguir pela rua Chão de Cima – 17º.

      6) Para o efeito, o condutor do DB fez sinal de pisca-pisca para a sua esquerda, diminuindo de velocidade – 18º.

      7) A rua para onde o veículo DB pretendia seguir tem aproximadamente 3,50m de largura e, à data do embate, o pavimento era de terra – 7º e 8º.

      8) Tal rua não fica perpendicular à Estrada Nacional n.º 228, situa-se do lado esquerdo, atento o sentido Campo de Besteiros – Vouzela, de forma ascendente e obliquamente para sudoeste, sendo dificilmente visível para quem segue em tal sentido – 9º e 10º.

      9) Ao chegar ao entroncamento, local para onde pretendia virar, sempre com o sinal de pisca-pisca ligado, o condutor do DB abrandou mais a velocidade – 19º.

      10) Depois de se certificar que não havia trânsito em sentido contrário nem estava a ser ultrapassado, o condutor do DB decide que poderia virar para a sua esquerda, iniciando, pouco depois, a respectiva manobra – 20º.

      11) O autor, condutor do LU, iniciou a manobra de ultrapassagem e passou a circular pela metade esquerda da estrada, considerando o seu sentido, momentos antes do condutor do veículo DB iniciar a manobra de viragem à esquerda – 23º.

      12) O veículo DB invadiu a faixa de rodagem esquerda por onde o motociclo conduzido pelo autor, momentos antes, iniciara a circulação – 4º.

      13) Nas circunstâncias de tempo e lugar aludidas em A), o motociclo LU seguia a velocidade não inferior a 90Km/h, sendo certo que, no local do acidente, a velocidade máxima permitida é de...

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