Acórdão nº 2644/08-2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Março de 2009
Magistrado Responsável | ESTELITA DE MENDON |
Data da Resolução | 02 de Março de 2009 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam os Juízes da Relação de Guimarães: TRIBUNAL RECORRIDO : Tribunal Judicial de Braga – (Instrução n.º 679/08.5TABRG-A).
RECORRENTE : S.P.A. Sociedade Portuguesa de Autores RECORRIDO : Ministério Público OBJECTO DO RECURSO : A S.P.A. Sociedade Portuguesa de Autores veio interpor recurso do despacho proferido nos autos (constante de fls. 52 a 54 do presente apenso), o qual decidiu indeferir a requerida constituição como assistente da S.P.A. com relação ao crime de burla denunciado nos autos e p. e p. pelo art. 217 n.º 1 C. Penal.
A recorrente pede a revogação de tal despacho, apresentando para tal as seguintes conclusões: 1. 0 Meritíssimo Juiz de instrução entendeu que a recorrente não tem legitimidade para se constituir assistente, dado que não é titular do interesse que constitui o objecto imediato da infracção; 2. 0 Meritíssimo Juiz de Instrução, ao basear a sua decisão no conceito estrito, imediato e típico de ofendido, não respeitou a jurisprudência dominante nos tribunais superiores, relativamente à extensão do conceito de “ofendido”; 3. 0 Acórdão 1/2003 do Supremo Tribunal de Justiça decidiu que o vocábulo “especialmente”, previsto no artigo 68° al. a) do CPP não deve ser compreendido como “exclusivamente”, mas sim como ‘particularmente”. Deste modo, a mesma norma pode abranger interesses relativos a mais do que apenas um ofendido; 4. No caso vertente, para além dos burlados, a recorrente é titular de um interesse que especificamente a norma procurou proteger; 5. São elementos típicos integrantes do crime de burla 1) a prática de um acto por determinado agente que, 2) propositadamente, e 3) com intenção de obter enriquecimento ilegítimo, 4) engana outra pessoa, 5) de modo a causar-lhe, a si ou a terceiro, um prejuízo patrimonial; 6. Olhando para o tipo de crime de burla previsto e punido nos termos do artigo 217° CP, dúvidas não restam que o legislador procurou acautelar o património, não só do burlado, como também de algum terceiro que, como consequência directa do engano provocado pelo agente sofra um prejuízo patrimonial; 7. Caso se chegue à conclusão que o acto enganoso, provocado pelos denunciados junto dos diversos usuários teve como consequência directa a prática de um acto que causou um prejuízo patrimonial à recorrente, então terá, igualmente, que se concluir que esta tem legitimidade para apresentar a queixa, e, consequentemente, constituir-se assistente; 8. Os denunciados abordavam os diversos responsáveis por estabelecimentos comerciais (usuários), informando-os que representam uma entidade de gestão colectiva de direito de autor — a D… —, que prossegue os mesmos objectivos da recorrente; 9. Para que os usuários pudessem difundir, nos seus estabelecimentos, obras intelectuais protegidas, estavam obrigados a pagar direitos de autor. Estes direitos poderiam ser pagos, ou à D…, ou à recorrente, pelo que se pagassem à D…, não pagariam à recorrente; 10. A recorrente sofre um prejuízo directo e provocado pelo erro em que, astuciosamente, os denunciados fazem incorrer os diversos usuários com quem contactam; 11. Os denunciados não se apresentam perante os usuários apenas como representantes de uma entidade de gestão colectiva de direitos de autor que, tal como a recorrente, gere obras intelectuais; 12. Os denunciados aliciam os usuários a pagar-lhes direitos de autor, porque os valores cobrados são mais baixos do que aqueles que são praticados pela recorrente; 13. Os denunciados convencem os diversos usuários que, caso os direitos de autor sejam pagos à entidade de gestão de direitos de autor que representam, estão dispensados de pagar qualquer quantia, a título de direitos de autor, à recorrente; 14. 0 erro que os denunciados provocam aos diversos usuários consubstancia-se na afirmação de que a D… gere os mesmos direitos de autor que a recorrente, o que não é verdade, dado que os titulares de direitos autorais que são representados pela recorrente não o são pela D… e o contrário também é verdade; 15. Os usuários pagam à D…, na crença de que obtêm uma autorização exactamente igual à que conseguiriam junto da recorrente, para a utilização de obras intelectuais protegidas a um custo mais baixo; 16. Ao provocarem este erro junto dos usuários, os denunciados fazem-no astuciosamente, porque sabem que a autorização que estão a conceder, não só não dispensa a obtenção da autorização junto da SPA, como o número de titulares de direitos de autor representados pela D… é infinitamente inferior àquele que é representado pela recorrente; 17. Os denunciados não se limitam a obter um proveito ilícito, para si, pelo erro intencionalmente criado, nem pretendem apenas atingir o prejuízo patrimonial de quem lhes paga injustificadamente; 18. Os denunciados procuram, e conseguem, provocar um prejuízo à recorrente, que decorre, directamente, da sua conduta; 19. A mensagem que é transmitida aos usuários é a seguinte: se pagarem direitos de autor à D…, não paguem à Sociedade Portuguesa de Autores, porque, a autorização emitida pela D… é exactamente igual à que é concedida pela SPA; 20. 0 mesmo acto ilícito pode provocar prejuízo a uma pluralidade de pessoas, e, portanto, provocar vários ofendidos; 21. 0 prejuízo provocado pelos denunciados a recorrente não é indirecto e reflexo, mas decorre, directamente, da conduta dos denunciados; 22. Os denunciados dizem aos usuários “paguem à D… e não paguem à SPA, porque o pagamento à D… dispensa-os de fazerem o mesmo à SPA.
23. Com a mesma conduta, os denunciados provocam um duplo comportamento dos usuários: por um lado, convencem-nos a pagar à D…, e, por outro, de uma forma directa e automática, a não pagar à recorrente; 24. 0 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido a 7 de Outubro de 1999, já se pronunciou nesse sentido. Afirma-se...
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