Acórdão nº 359/06GVCRM.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 25 de Maio de 2009
Magistrado Responsável | ANSELMO LOPES |
Data da Resolução | 25 de Maio de 2009 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Após conferência, acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: TRIBUNAL RECORRIDO Tribunal Judicial de Vieira do Minho ARGUIDOS/RECORRIDOS José; Tiago; Rui; e Luís RECORRENTE O Ministério Público OBJECTO DO RECURSO O MºPº acusou os arguidos, imputando: .- aos arguidos Tiago e José, em co-autoria, cinco crimes de furto qualificado, previsto e punível, pelos art. 203º/1 e 204º/2 /e) do CP; .- ao arguido Rui, em co-autoria, três crimes de furto qualificado, previsto e punível, pelos art. 203º/1 e 204º/2/e ) do CP; .- ao arguido Luís, em co-autoria, um crime de furto qualificado, previsto e punível, pelos art. 203º/1 e 204º/2 e) do CP.
No final, veio a ser decidido o seguinte: Pelo exposto, acordam os Juízes que constituem o Tribunal Colectivo na Comarca de Vieira do Minho em julgar improcedente, por não provada, a acusação e nessa conformidade absolver os arguidos José, Tiago, Rui, Luís, dos crimes pelos quais vinham acusados - furto qualificado p.p. pelo art. 203º e 204º/2 /e ) do CP.
É desta decisão que vem este recurso, no qual a Digna recorrente invoca a errónea interpretação da disposição legal constante no artigo 129.º e erro notório na apreciação da matéria de facto, nos termos dos artigos 127.º e 410.º, n.º 2, alínea c), todos do Código de Processo Penal.
MATÉRIA DE FACTO - Na noite de 12 para 13 de Novembro de 2006, durante a noite, pessoa ou pessoas, não concretamente identificadas, dirigiram-se à loja de ocupação de tempos livres, sita no Centro de Camionagem, pertencente à Câmara Municipal, com o objectivo de se apropriar de bens e valores que encontrassem no seu interior; - Partiram o vidro da montra, criando uma abertura para aceder ao interior da loja; - Do interior da loja retiraram e levaram, fazendo seus: (…) - Na mesma noite na residência do Pároco, sita no lugar de Igreja, freguesia de X, Braga pessoa não concretamente identificada partiu a porta da entrada, entrou na residência e retirou, levando consigo os seguintes objectos: (…).
- O dano na porta ascendeu ao montante de € 50,00; - Na mesma noite pessoas não concretamente identificadas dirigiram-se à residência do pai de Rosa, sita na freguesia de X e fazendo uso de um formão, partiram uma janela e entraram na habitação, retirando e fazendo seus os seguintes objectos: (…) - No dia 15 de Novembro de 2006, cerca das 10.00 horas, pessoa não concretamente identificada dirigiu-se à padaria denominada "Pacal", pertencente a Paulo, sita em Y com o propósito de se apoderar de dinheiro e de quaisquer objectos que se encontrassem no seu interior e que conseguisse transportar consigo; - Partiu uma janela existente a cerca de dois metros do solo, até à qual escalou, tendo acedido ao interior do referido estabelecimento; - No interior do estabelecimento, desferiu pontapés numa porta, arrombando-a, acedendo a uma divisão onde se encontravam diversos objectos, que retirou e fez seus e que consistiram em: (…) - A recuperação do mini cofre, do computador HP Pavillion e da caixa OPS do computador, bens que se encontravam no estabelecimento de Paulo, ocorreu na sequência de informação fornecida pelo arguido José.
- - O arguido José insere-se numa família de condição social humilde; o pai do arguido é surdo-mudo e a mãe tem uma deficiência física que a obriga a movimentar-se em cadeira de rodas; (…) - - Factos não provados - Na noite de 12 para 13 de Novembro de 2006 os arguidos Tiago, José, Rui e Luís em execução de plano previamente gizado por todos fizeram-se transportar no veículo automóvel pertencente ao arguido Rui ao Centro de Camionagem e, uma vez nesse local, enquanto este último ficou a aguardar no interior da viatura, os outros dirigiram-se para a Loja de Ocupação de Tempos livres; - Os arguidos Tiago, José e Luís fracturaram o vidro da montra criando, deste modo, uma abertura que lhes permitiu aceder ao seu interior de onde retiraram: (…) - Na posse desses objectos os arguidos José e Tiago foram ao encontro do arguido Rui que auxiliou à sua colocação no veículo automóvel onde os aguardava e no qual todos abandonaram o local em direcção à cidade de Braga; - Na mesma noite, já de regresso à Vila de Vieira do Minho e fazendo uso do mesmo automóvel, os arguidos Tiago, José e Rui dirigiram-se à residência do Pároco, a fim de se apoderarem de objectos e dinheiro que encontrassem no seu interior.
- Os arguidos partiram a porta e retiram da residência levando consigo: (…) - Os objectos foram levados do local, no veículo automóvel do arguido Rui no qual os arguidos se fizeram transportar até à cidade de Braga.
- Após terem regressado a Vieira do Minho, os arguidos José e Tiago, acompanhados de um outro cuja identidade não se logrou apurar mas que os transportou na sua viatura automóvel, ainda, na noite de 12 para 13 de Novembro de 2006, dirigiram-se à residência pertencente a Sousa, a fim de se apropriarem de objectos e valores que aí encontrassem.
- Para o efeito, de forma não concretamente apurada, arrombaram o portão da garagem tendo daí acedido ao interior da habitação de onde retiraram: (…) - Ao actuar da forma descrita causaram um dano na porta da garagem no valor de € 120,00.
- Na mesma noite e na freguesia de Mosteiro os arguidos José e Tiago, acompanhados de pessoa não identificada, partiram uma janela da residência do pai de Rosa, usando um formão que haviam retirado da residência de Sousa e da referida habitação retiraram e fizeram seus: um aparelho de televisão de marca Sanyo, de 82 cm de écran, de cor preta e um leitor de mp3 digital de marca " Denver "; - O leitor mp3 tinha o valor de € 50,00; - Os arguidos causaram danos na porta no valor de € 470,00; - Os objectos retirados destas duas últimas residências foram sendo colocados no veículo automóvel facultado por pessoa não identificada, no qual todos abandonaram o local, novamente em direcção a Braga; - No dia 15 de Novembro de 2006, cerca das 10.00 horas os arguidos José, Tiago e Rui dirigiram-se e entraram na padaria " Pacal ",; - No seu interior desferiram pontapés numa porta e da divisão onde entraram retiraram e fizeram seus os seguintes objectos: (…) - Estes objectos foram transportados do local no veículo automóvel do arguido Rui; - Os arguidos José, Tiago, Rui e Luís agiram de forma livre e deliberada, bem sabendo que os objectos de que se apropriavam não lhes pertenciam e que agia contra a vontade do respectivo proprietário, com plena consciência da censurabilidade penal da sua conduta.
MOTIVAÇÃO/CONCLUSÕES São formuladas as seguintes conclusões: 1. O Tribunal a quo não efectuou uma correcta subsunção do disposto no artigo 129.º do Código de Processo Penal, uma vez que entendeu que a confissão do arguido José, da prática dos factos ocorridos na padaria “Pacal”, no dia 15 de Novembro de 2006, perante a testemunha Paulo Freitas, não pode ser valorada como meio de prova, nos termos do artigo 129.º do Código de Processo Penal e, por esse motivo, não pode ser atendida para a prova dos factos.
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O artigo 129.º do Código de Processo Penal não é aplicável à situação da referida testemunha que depõe sobre a conversa que manteve com o arguido e sobre o seu conteúdo, pois tal situação não cai no âmbito da norma em causa, uma vez que a testemunha viveu e assistiu a essa realidade, pelo que o seu depoimento é directo e não indirecto, pois que o que o legislador quis afastar com a referida disposição legal foi o depoimento de ouvir dizer a outra pessoa.
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Assim, o Tribunal a quo deveria ter considerado que o artigo 129.º, n.º 1, do Código de Processo Penal não tem aplicabilidade ao depoimento da testemunha Paulo, que relatou a conversa mantida com o arguido, na qual este lhe confessou que foi o autor do furto ocorrido no seu estabelecimento e lhe indicou o local onde entregou um dos objectos que dali retirou.
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Ainda que consideremos, de forma circunspecta, que o que interessa saber não é tanto se o arguido efectivamente confessou à testemunha Paulo que praticou os factos relativos ao furto ocorrido na padaria e indicou a casa onde um dos objectos furtados foram deixados, mas antes apurar se efectivamente o arguido praticou tal furto, sendo que relativamente a esta situação poderíamos considerar que existe uma prova indirecta, pois apesar do arguido o ter confessado à testemunha, esta não presenciou tal facto assim relatado, caberia assim, ainda que em hipótese, aplicar o regime previsto no artigo 129.º do Código de Processo Penal 5. Nesse caso, harmonizando as finalidades do direito penal e as garantias constitucionais e processuais do arguido, o tribunal deveria ter interpretado tal dispositivo legal no sentido de que o tribunal pode valorar livremente os depoimentos indirectos de testemunhas que relatem conversas tidas com o arguido que, podendo depor, voluntariamente se furta à presença em audiência de julgamento (quando regularmente notificado) ou se recusa a fazê-lo no exercício do seu direito ao silêncio, sendo que tal interpretação não atinge de forma intolerável e desproporcionada o direito à defesa e à não incriminação do arguido, o princípio do contraditório e da imediação.
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No caso concreto, no acórdão recorrido deu-se como provado, relativamente ao factos ocorridos no dia 15 de Novembro de 2006, na padaria “Pacal”, sita Y, que a recuperação do mini cofre, do computador HP Pavillion e da caixa OPS do computador, bens que se encontravam no estabelecimento de Paulo Freitas, ocorreu na sequência de informação fornecida pelo arguido José (9.º parágrafo dos factos provados).
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Sendo estes os elementos probatórios recolhidos, os quais foram levados aos factos provados, a consequência lógica a retirar e de acordo com as regras da experiência comum é a de que o arguido indicou os locais onde havia deixado tais objectos pois foi ele que os retirou da padaria e mais tarde os deixou nesses local.
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Efectivamente, nestas circunstâncias é razoável e proporcionado que os depoimentos das testemunhas Paulo e Fernando possam ser valorados como meio de...
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