Acórdão nº 630/08-2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 05 de Junho de 2008

Magistrado ResponsávelMARIA LUÍSA RAMOS
Data da Resolução05 de Junho de 2008
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães A…..e mulher, M……, vieram propor a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo ordinária contra E… e mulher, M…, pedindo que seja declarado nulo e sem efeito o contrato promessa celebrado em 19/11/1997 e junto aos autos, condenando-se os réus a devolverem aos autores a importância de Esc. 2.000.000$00 que a autora mulher entregou ao réu marido, acrescida de juros à taxa legal, desde 10.03.1998, até efectivo e integral pagamento.

Alegam, para tanto e em síntese, que a autora mulher subscreveu juntamente com o réu marido um contrato promessa de compra e venda de uma fracção de um prédio urbano, tendo aquando da sua assinatura a primeira entregue ao segundo uma quantia a título de sinal; o referido contrato não contém reconhecimento presencial das assinaturas nem a certificação notarial da existência de licença de utilização da fracção prometida vender, motivo pelo qual é nulo, o que pedem que seja declarado.

Regularmente citados vieram os Réus contestar, por impugnação e por excepção, invocando a ilegitimidade da ré mulher, por não ser dona do imóvel ou interveniente no contrato celebrado, invocando a existência de um acordo no sentido de renunciarem à invocação das nulidades ora arguidas pelos autores, e, a verificação de abuso de direito decorrente da invocação da nulidade do contrato promessa.

Mais deduzem reconvenção, pedindo a condenação dos Autores a pagarem ao Réu a quantia de Esc. 500.000$00 acrescida de juros, correspondente ao valor que os reconvintes pagaram de juros do valor do empréstimo a que tiveram que recorrer em consequência da omissão e incumprimento dos autores.

Foi oferecida réplica, mantendo os autores a posição assumida na petição inicial.

Foi proferido despacho saneador, que julgou a Ré mulher parte ilegítima, e foi fixada a matéria de facto assente e a base instrutória.

O Réu deduziu reclamação nos termos do n.º2 do art.º 511º do Código de Processo Civil.

Por ter ocorrido o óbito do autor foi instaurado incidente de habilitação, tendo os seus legítimos sucessores sido habilitados na respectiva posição processual.

Realizado o julgamento foi proferida sentença a julgar a acção totalmente procedente por provada e totalmente improcedente por não provada a reconvenção : I) declarando nulo, por inobservância da forma legal, o contrato-promessa identificado nas al. a) e b) dos factos provados, celebrado entre a Autora, Maria Dolores Acklé e o Réu, e, em consequência, condenando o Réu a restituir aos Autores a quantia de € 9 975.96 (nove mil novecentos e setenta e cinco euros e noventa e seis cêntimos), acrescida de juros à taxa legal a cada momento devida desde 10.03.1998 até efectiva e integral restituição da referida quantia; II) absolvendo os autores/reconvindos do pedido reconvencional contra si deduzido pelo reconvinte.

Inconformado, veio o Réu interpor recurso de apelação da sentença proferida nos autos, que assim julgou a acção.

O recurso foi recebido como recurso de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.

Nas alegações de recurso que apresenta, o apelante formula as seguintes conclusões: 1 - Por despacho ditado para a Acta de Audiência de Julgamento, foi indeferida a Reclamação apresentada pelo Apelante sobre a selecção da matéria de facto, não tendo sido dados como assentes nem como controvertidos os factos alegados nos números 23.1, 23.2 e 23.3 da Contestação/Reconvenção, facto que prejudicou, fatalmente, a defesa do Apelante; 2 - O qual, tendo a sua actividade probatória delimitada pelos factos incluídos na Base Instrutória, se viu impossibilitado de, nos termos do n.º1 do artigo 394º do Código Civil, apresentar prova testemunhal sobre os citados factos; 3 - Mostrando-se tais factos pertinentes para dirimir a questão do Abuso de Direito e consequentemente demonstrar a ilegitimidade dos Apelados em invocar a nulidade do contrato-promessa e não tendo os mesmos sido objecto de averiguação por parte do douto Tribunal a quo, considera o Apelante, indispensável, a ampliação da matéria de facto; 4 - A decisão da 1ª Instância ao, simultaneamente, dar como assentes e como não provados os factos contidos no quesito 3º da douta Base Instrutória, encontra-se inquinada pelo Vício da Contradicio; 5 - Nessa medida e dada a importância de tais factos para a sustentabilidade da posição jurídica assumida pelo Apelante na sua Contestação/Reconvenção, entende o mesmo que a decisão ora recorrida deve, ao abrigo do disposto no artigo 712º do Código de Processo Civil, ser reapreciada pelo Tribunal Superior; 6 - Se atentarmos na dinâmica dos factos com interesse directo para a questão em apreço, concluiremos no sentido da existência de circunstâncias susceptíveis de paralisar os efeitos jurídicos próprios da celebração de um contrato-promessa nulo; 7- Desde logo, face ao conteúdo do contrato e às circunstâncias que rodearam o seu cumprimento, facilmente concluiremos não terem os Apelados sofrido qualquer lesão situada no âmbito dos interesses da norma do n.º 3 do artigo 410º, designadamente, quanto a uma actuação precipitada ou irreflectida ou quanto ao interesse de evitar que o promitente-comprador seja ludibriado com a celebração de promessas atinentes a prédios ilegais ou clandestinos; 8 - Acresce que, face à conduta assumida pelos Apelados desde a outorga do contrato¬promessa, nomeadamente, o facto de os mesmos terem por duas vezes consecutivas requerido a prorrogação do prazo para outorga da escritura definitiva e o facto de terem solicitado e recebido os documentos necessários à realização de tal acto, sempre os mesmos deram a entender que o contrato-promessa estava destinado ao cumprimento; 9 - Pelo que, ao invocar a nulidade do redito contrato incorreram os Apelados numa situação de "venire contra factum próprio", a qual se traduz, precisamente, no exercício de uma posição jurídica em contradição com o comportamento assumido anteríormente pelo exercente; 10 - Face a tal comportamento, claramente ilícito e atentatório de boa-fé, e atendendo, ainda, ao facto dos escopos que levaram à imposição das exigências formais estatuídas pelo n.º 3 do artigo 410º se encontrarem, in casu, assegurados, não se justifica que a preterição de tais formalidades seja sancionada com a radicalidade típica da nulidade; 11 - Ao invocar a nulidade do contrato-promessa os Apelados violaram valores que, em projecção das tendências de socialização, de ecticização e funcionalização do Direito, são hoje característicos do nosso Sistema Jurídico; 12 - Valores bem presentes no artigo 334º do Código Civil cujo conceito de boa-fé tem um sentido ético que, no dizer do Prof. Almeida Costa, in "Direito das Obrigações", se exprime, precisamente, na virtude de manter a palavra dada e a confiança de cada uma das partes proceder honesta e lealmente"; 13 - Pelo que, se efectivamente os Apelados estivessem de boa-fé e se realmente quisessem cumprir o contrato, quando se aperceberam...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT