Acórdão nº 43/08-1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 27 de Março de 2008

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução27 de Março de 2008
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: * "A" deduziu oposição à execução contra si instaurada por “B”, alegando que: a exequente é parte ilegítima; que a exequente vendeu fio têxtil à sociedade “C”; que a executada aceitou as letras dadas à execução para permitir à exequente, com a qual não celebrou qualquer negócio, efectuar o desconto bancário das mesmas e assim receber a quantias que lhe eram devidas pela a sociedade "C”; que a aceitação das letras dadas à execução e a respectiva entrega à exequente implica por parte da executada a violação do princípio da especialidade consagrada nos art. 6 do CSC, o que fere de nulidade as referidas “ liberalidades e os aceites prestados pela executada “nos termos do artigo 294º do CC.

Contestou a exequente, que sustentou a sua ilegitimidade; excluiu a aplicação do nº 3 do art. 6 do CSC; porém, alegou todo um relacionamento de dependência entre a sociedade executada e a “C” que justificava o interesse da sociedade executada na emissão das letras.

Foi proferido despacho saneador, que afirmou a validade e regularidade da instância, julgando improcedente a excepção da ilegitimidade, tendo relegado para final o conhecimento da invocada nulidade dos aceites das letras e das liberalidades prestadas.

Procedeu-se à selecção da matéria de facto assente e controvertida, que sofreu reclamações de ambas as partes, deferidas na íntegra.

Efectuou-se, depois, julgamento, que culminou com a decisão de facto, da qual não houve reclamações.

Após o que foi proferida sentença julgou improcedente a oposição e determinou o prosseguimento da execução.

Desta sentença recorreu a exequente que formulou, a final da sua alegação, as seguintes conclusões: “1a) O princípio da especialidade, relativamente à capacidade das sociedades comerciais, encontra-se consagrado, entre outras disposições legais, no artigo 6° nºs 1, 2 e 3 do Código das Sociedades Comerciais, no qual se refere que "a capacidade da sociedade compreende os direitos e as obrigações necessários ou convenientes à prossecução do seu fim (...)", sendo que só "as liberalidades que possam ser consideradas usuais, segundo as circunstâncias da época e as condições da própria sociedade, não são havidas como contrárias ao fim desta" e que "considera-se contrária ao fim da sociedade a prestação de garantias reais ou pessoais a dívidas de outras entidades, salvo se existir justificado interesse próprio da sociedade garante ou se se tratar de sociedade em relação de domínio ou de grupo".

2a) Sendo a executada uma sociedade comercial por quotas que tem por objecto a exploração de uma indústria têxtil e a comercialização dos produtos que fabrica e por fim a obtenção de lucro (ponto 4 dos factos provados), é de concluir que a aceitação das letras dadas à execução e a respectiva entrega à exequente para permitir a esta receber as quantias que lhe eram devidas pela sociedade "C" implicaria, por parte da executada, a violação do princípio da especialidade acima enunciado.

3a) Tanto mais que, como se demonstrou, a oponente não celebrou qualquer negócio com a exequente que pudesse servir de base aos mencionados aceites prestados (ponto 8 dos factos provados).

4a) Assim, as referidas liberalidades e os aceites prestados pela executada sempre seriam nulos, por violação do mencionado principio da especialidade, visto que foram dados contra disposições legais de carácter imperativo (artigo 294º do Código Civil), pelo que a execução deverá ser julgada extinta no seu todo.

5a) Ao contrário do que se refere na decisão recorrida o n. o 3 do artigo 6º do Código das Sociedades Comerciais não se aplica à situação em apreço, visto que esta disposição se refere a situações de prestação de garantias reais ou pessoais a dívidas de outras entidades.

6a) Ora, garantias reais e pessoais são as que constam dos artigos 623º a 761º do Código Civil, ou seja, a prestação de caução, a fiança, a consignação de rendimentos, o penhor, a hipoteca, os privilégios creditórios e o direito de retenção.

7a) Na situação em apreço a executada não prestou qualquer garantia, real ou pessoal, à sociedade "C", antes, como se provou, aceitou as letras dadas à execução para permitir à exequente receber as quantias que lhe eram devidas pela sociedade "C", sendo que, com os aceites das letras, a oponente quis assumir a obrigação de as pagar (pontos 7 e 9 dos factos provados).

8a) Portanto, in caso, a executada não garantiu uma dívida de uma outra entidade, antes tendo oferecido o pagamento dessa dívida, o que é claramente contrário ao princípio da especialidade e, por isso, nulo.

9a) Mas, apesar da inaplicabilidade, na situação em apreço, do n.º 3 do artigo 6º do Código das Sociedades Comerciais, sempre se dirá que, atentos os factos provados, não se vislumbra qual o interesse da executada nos aceites prestados, uma vez...

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