Acórdão nº 297/08.8GACBC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Abril de 2012

Magistrado ResponsávelANTÓNIO CONDESSO
Data da Resolução11 de Abril de 2012
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães * I- Relatório Abílio F... foi condenado pela prática de um crime de um crime de burla qualificada previsto pelos arts. 217.

º, n.

º 1 e 218.

º, n.

º 2, al. a) na pena de 3 anos de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período de tempo, na condição de este entregar à ofendida a quantia de € 15.000,00 no prazo de 1 ano, a contar do trânsito em julgado da sentença e comprovando o mesmo nos autos.

Mais foi condenado pela prática de um crime de falsificação de documentos do art. 256.

º, n.

º 1, al. a) e 3 do Código Penal na pena de 250 dias de multa à taxa diária de € 5,00 que perfaz a quantia de € 1.250,00.

Foi ainda julgado parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido pela demandante Ana C... e, em consequência, condenado o arguido/demandado Abílio F..., a título de danos patrimoniais, no pagamento de € 44.500,00, a que acrescem juros de mora desde 23.06.2008 até integral e efectivo pagamento, e a título de danos não patrimoniais na quantia de € 800,00, acrescida de juros de mora desde a data da sentença até integral pagamento.

Inconformado recorre o arguido, rematando a respectiva motivação com as seguintes conclusões que se transcrevem: I- Por sentença proferida nos autos, o Tribunal “a quo” decidiu condenar o arguido, Abílio F..., pela prática em autoria material de um crime de burla qualificada previsto nos artigos 217º, n.º1 e 218º, n.º, alínea a) na pena de 3 anos de prisão suspensa na sua execução pelo mesmo período de tempo, na condição de o mesmo entregar à ofendida a quantia de 15.000,00€ no prazo de um ano a contar do trânsito em julgado da sentença e um crime de falsificação de documentos previsto no artigo 256º, n.º1, alínea a) e n.º3 todos do Código Penal, na pena de 250(duzentos e cinquenta) dias de multa à taxa diária de 5,00€ (cinco euros) o que perfaz a quantia global de 1.250,00€ (mil duzentos e cinquenta euros).

II- Pela prática do crime de burla qualificado, mediante o disposto nos artigos 217º, n.º1 e 218, n.º2, alínea a) ambos do Código Penal, o arguido incorre numa pena de prisão de dois a oito anos.

III- Perante a personalidade do arguido, as suas condições pessoais mormente ter mais de 60 anos de idade e apenas contar com uma condenação por factos posteriores aos factos em apreço nestes autos, e bem ainda porque é uma pessoa que se encontra familiar e socialmente inserida e a sua conduta anterior ao crime em questão (agente primário), o Tribunal “a quo” entendeu que a simples censura do facto e ameaça da pena de prisão realizam de forma adequada as finalidades da punição.

IV- No caso em apreço, conforme matéria provada em sede de sentença, o arguido recebe 550,00€ de reforma e vive só, em casa arrendada, pela qual paga a quantia mensal de 150,00€, não tem outras fontes de rendimento e gasta mensalmente um quantia entre 150,00€ e os 180,00€, com medicação para problemas pessoais de saúde.

V- Assim, o arguido aufere 550,00€ a título de reforma, mas tem despesas mensais no valor de 350,00€, pelo que dispõe de um valor aproximado de 200,00€ por mês para prover à sua alimentação, vestuário e outras despesas, necessitando por vezes do auxílio de terceiros.

VI- Ao determinar a suspensão da execução da pena de prisão subordinando-a ao cumprimento do dever do arguido entregar a quantia de 15.000,00€ à ofendida no prazo de um ano a contar do trânsito em julgado da sentença, o Tribunal “a quo” violou o disposto no artigo n.º51, n.º2 do Código Penal.

VII- Atentou por isso, frontalmente contra o fim das penas, pondo em causa todo e qualquer objectivo daquela sanção que deverá ser sempre o de ressocializar o arguido, pois o incumprimento do dever imposto originará provavelmente a revogação da suspensão da pena de prisão e seu consequente cumprimento.

VIII- Apesar de o arguido ter sofrido uma condenação pela prática de um crime de falsificação de documento, esses factos são posteriores aos dos autos, pelo que entendemos que não existe má formação da sua personalidade.

IX- Por isso, o Tribunal “a quo” ao condicionar a suspensão da execução da pena de prisão ao cumprimento do dever de entregar a quantia de 15.000,00€ à ofendida no prazo de um ano a contar do trânsito em julgado por considerar que essa sanção era necessária ás finalidades da punição, não acautelou a possibilidade de cumprimento do dever imposto perante a capacidade económico financeira do arguido e reintegração do arguido na sociedade, em especial a considerações de socialização do arguido X- Por todo o exposto, deve ser dado provimento ao recurso interposto pelo Recorrente e, em consequência, ser revogado o dever imposto como condição da suspensão da execução da pena de prisão por representar para o arguido obrigações cujo cumprimento não seja razoavelmente de lhe exigir e em sua substituição ser aplicado dever cujo cumprimento seja viável.

O Ministério Público junto do tribunal recorrido respondeu ao recurso, pugnando pela manutenção do julgado, invocando, entre o mais, o seguinte: “… entendemos que não assiste qualquer razão ao arguido.

Acompanhando de muito perto o recente Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11.05.2011 (disponível em www.dgsi.pt) diremos, tal como ali melhor se disse que, nos termos do nº 1 do art.º 50 do Código Penal, em caso de aplicação de pena de prisão não superior a 5 anos o Tribunal suspenderá a sua execução se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

Os deveres que podem onerar/condicionar a suspensão da execução da pena destinam-se a reparar o mal provocado pelo crime cometido e estão exemplificativamente enumerados no art. 51º: dentre esses deveres conta-se o de “pagar dentro de certo prazo, no todo ou na parte que o Tribunal considerar possível, a indemnização devida ao lesado…” – nº 1, al. a).

Com a aplicação de uma pena suspensa o Tribunal limita-se, digamos assim, a enunciar o crime e a culpa do agente no seu cometimento. Talvez por isso esta pena seja sentida, tantas e tantas vezes pelo destinatário e pela população em geral, como uma absolvição.

Por razões de justiça e equidade deve o Tribunal, por vezes, nos casos em que a suspensão da pena se impõe, ir mais além e usar este dever de indemnizar como adjuvante da finalidade da punição: «o pagamento da indemnização como condicionante da suspensão da execução da pena, na medida em que representa um esforço ou implica até sacrifício da parte do arguido no sentido de reparar as consequências danosas da sua conduta, funciona não só como reforço do conteúdo reeducativo e pedagógico da "pena de substituição", mas como elemento pacificador, neutralizando o efeito negativo do crime e apresentando-se como meio idóneo de dar satisfação suficiente às finalidades da punição, respondendo, nomeadamente, à necessidade de tutela dos bens jurídicos e estabilização contra fáctica das expectativas da comunidade».

Na realidade, as consequências sofridas pela ofendida resultaram do crime cometido: então, a reparação deste mal será, ainda e também, uma das suas consequências.

Não podemos esquecer que o arguido, com a sua conduta, ficou com todas as poupanças (de uma vida!) da ofendida e que eram a forma de a mesma fazer face às suas despesas pessoais, familiares e profissionais. Ao que acresce o facto de não ter reparado o prejuízo causado, nem parte dele.

Mas será que o pagamento daquela quantia afronta o princípio da proporcionalidade, invocado pelo arguido, na base do disposto no art.º51, nº 2 do Código Penal, que determina que os deveres impostos não podem em caso algum representar...

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