Acórdão nº 2460/07.0TBFAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Abril de 2012

Magistrado ResponsávelEVA ALMEIDA
Data da Resolução10 de Abril de 2012
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I – RELATÓRIO J. M G. L. e mulher M. A. N. C. intentaram a presente acção declarativa, com processo comum sob a forma ordinária contra (1ºs) J. C. G. L. e mulher M. I. C. C. ; (2ª) V...– Investimentos Imobiliários, Ldª; (3º) e Banco.., S.A., pedindo que os réus sejam solidariamente condenados a pagarem-lhes a quantia de €630.000, acrescida de juros, à taxa legal, desde 25 de Setembro de 2007, ou, pelo menos, a partir da citação, até efectivo pagamento, importando em €600 à data da propositura da acção. Alegam, em síntese: O autor e o réu J.C. tinham participações sociais nas sociedades V - Investimentos Imobiliários Ldª, M.C.C.L. & Filhos, Ldª, A.P. & Irmãos, Ldª, L. - Sociedade de Empreendimentos e Investimentos Imobiliários, Ldª, Transportes L., Ldª e C.L. & L.S., Ldª. Em Março de 2007, acordaram em dividir e separá-las de forma a ficar a segunda e a quinta para os demandantes e filhos e as restantes para os réus pessoas singulares e filhos, com exclusão uns dos outros.

Efectuadas as contas emergentes das transmissões, o demandante e o réu marido acordaram em fixar em €630.000 o montante correspondente ao excesso das participações cedidas a este e seus familiares, o que o mesmo assumiu.

Em 30 de Maio de 2007 o réu emitiu à ordem do demandante um cheque naquele montante duma conta da sociedade V. - Investimentos Imobiliários, Ldª, que lhe ficara a pertencer, o qual não chegou a ser apresentado a pagamento em virtude da sua validade ter caducado em 15 de Março de 2003, tendo sido substituído por outro, da mesma conta, datado de 31 de Maio de 2007.

Apresentado a pagamento, este cheque foi devolvido em 8 de Junho desse ano com fundamento em saque irregular, devido à falta de poderes para, só por si, obrigar a sociedade, sendo, por sua vez, substituído por outro, duma conta da mesma sociedade no Banco.., assinado pelo réu marido e seu filho H.. e datado de 20 de Setembro de 2007.

Este cheque foi apresentado a pagamento pela sociedade M.C.C.L.& Filhos, Ldª, que ficara a pertencer aos demandantes e filhos, na sequência de endosso, sendo devolvido a 25 de Setembro com fundamento em “cheque revogado/vício formação da vontade”.

Em 4 de Outubro foi apresentada reclamação ao réu Banco com nova apresentação do cheque solicitando a sua reapreciação por se tratar de uma excepção pessoal dependente de decisão judicial, mas aquele respondeu dizendo que se limitara a cumprir a ordem, não estando obrigado a investigar ou obter prova da veracidade do motivo e devolveu-o com o mesmo fundamento Alegam que o réu Banco não indicou concretamente os factos integrativos do vício limitando-se a aceitar uma revogação pura e simples, concluindo que se constituiu em responsabilidade solidária.

A ré mulher é responsável por terem sido incorporadas no património do casal as quotas que cederam e a ré sociedade por não ter pago o cheque sacado sobre uma conta sua.

* A ré V. Lda. contestou, contrapondo, em síntese: O montante reclamado diz respeito a um acordo exclusivamente celebrado pelas pessoas singulares, é alheia à sua fixação e assumpção de pagamento, o qual não visou o interesse da sociedade, é alheio ao seu objecto social e não se mostra necessário ou conveniente à prossecução do seu fim.

Refere que o autor, seu sócio e gerente até Março de 2007, conhecia que o acto não respeitava o pacto social. Invoca a nulidade do acto de emissão do cheque nos termos do artigo 6º nº 4 do Código das Sociedades Comerciais por ultrapassar a sua capacidade de gozo.

* Os réus J.C. e esposa contestaram, argumentando: Todos os valores correspondentes às cessões de quotas foram pagos e recebidos e que o montante de €630.000 seria um valor limite a pagar pelo primeiro quando fossem apuradas as contas por si apresentadas, pois o autor utilizara em benefício próprio €590.195 da sociedade V..- Investimentos Imobiliários, Ldª e o réu marido fizera empréstimos à sociedade M.C.C.L& Filhos, Ldª no valor de €601.200.

Todos os cheques emitidos o foram a título de garantia e com o acordo do Autor para serem substituídos, tanto mais que no primeiro cheque é visível a data de validade e este sabia que a sociedade só podia obrigar-se com a assinatura de dois dos gerentes.

* O réu Banco também contestou e em síntese: Admite que a ré V. Lda. tem conta aberta, que dela foi sacado o cheque com data de 20 de Setembro de 2007, no montante de €630.000 à ordem do autor, por si devolvido por duas vezes com a referida menção. Fê-lo devido a comunicação escrita contendo ordem de não pagamento, que acatou.

Acrescenta que, na data de apresentação do cheque a pagamento, a conta não tinha provisão suficiente para o seu pagamento, o mesmo se passando nos oito dias seguintes à que consta como de emissão, pelo que caso não tivesse acatado a ordem de revogação os autores não teriam recebido tal montante.

* Os autores replicaram alegando: As empresas eram constituídas, essencialmente, por dois sectores de actividade, a construção civil e imobiliário, por um lado, vinho e transportes, por outro e, no acordo verbal de separação, celebrado em Julho de 2006, o réu marido escolheu o segundo sector contra o pagamento pelo primeiro de €750.000, tomando posse imediata das empresas e passando a geri-las como suas.

Cerca de uma semana depois, o réu marido contactou o demandante para trocarem as respectivas posições, o que este aceitou mas, como aquele tinha a haver pagamentos de despesas que efectuara, o montante foi reduzido a €630.000, que se obrigou a pagar-lhe quando as separações fossem formalizadas. Tal aconteceu em Março de 2007 e o réu emitiu o cheque e com ele ficavam saldadas entre ambos todas as contas.

A alteração do pacto social da sociedade V. - Investimentos Imobiliários, Ldª foi efectuada pelo réu marido e seus familiares depois da celebração do contrato de cessão de quotas em termos que desconhecem. Salientam que a nova gerência assumiu com a emissão do cheque dos autos em 20 de Setembro de 2007 o respectivo pagamento.

Entendem que a invocação da invalidade da emissão do cheque configura abuso de direito.

Referem que os danos causados pelo Banco réu consistem na privação imposta de dispor de uma certificação verdadeira do incumprimento dos demais Réus que melhor os habilitaria a sustentar contra eles acção para cobrança do montante devido.

Terminam pedindo a condenação dos Réus pessoas singulares e sociedade como litigantes de má fé em multa e indemnização.

* Dispensada a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador que se pronunciou pela validade e regularidade de todos os pressupostos processuais. Seleccionaram-se os factos assentes e controvertidos elaborando-se base instrutória, com reclamações não atendidas.

Procedeu-se a julgamento com observância do legal formalismo, sendo que no início da audiência se ampliou a matéria assente e a base instrutória.

Discutida a causa, decidiu-se a matéria de facto.

Proferiu-se sentença na qual se julgou a acção parcialmente procedente, decidindo-se: I. 1) Absolver o Réu Banco …. do pedido formulado pelos autores J.M. e mulher M.A.; 2) Condenar os Réus J.C. e mulher M.I. e V. – Investimentos Imobiliários, Ldª, solidariamente, a pagar aos autores J.M. e mulher M.A. a quantia de € 630.000, acrescida de juros à taxa legal de 4% desde 25 de Setembro de 2007 até integral e efectivo cumprimento.

  1. Julgar o incidente de litigância de má fé parcialmente provado e procedente condenar o Réu J.C. na multa de vinte UCs.

* Inconformados, os autores e a ré “V. - Investimentos Imobiliários, Ldª” interpuseram recursos, que foram admitidos sob a forma de apelação a subirem de imediato, nos próprios autos e com efeito devolutivo.

Apresentaram alegações em que concluem:

  1. Conclusões da apelação da ré V. - Investimentos Imobiliários, Ldª.

    1. - Em Março de 2007, Recorrido e JC acordaram em dividir e separar as participações sociais que detinham nas sociedades identificadas nas alíneas C.C.f..

    2. - Para execução desse acordo celebrara a 09 de Março os respectivos Contratos de Cessão de Quotas.

    3. - Nos respectivos contratos, e nos termos do referido na alínea C.C.f., todos os valores das cessões foram liquidados.

    4. - Só a 30 de Maio de 2007, passados 3 meses, a Recorrente emitiu o cheque da conta n.º 16000000147 da conta n.º 11.023900200028755 do Banco Santander.

    5. - A Recorrente não interveio nos Contratos de Cessão, sendo alheia aos negócios.

    6. - Quando o cheque foi emitido, já o Recorrido e J.C. tinham liquidado os valores das cessões e assumido nos respectivos contratos que todos os valores tinham sido recebidos.

    7. - O Recorrido não pôs em causa o constante dos Contratos de Cessão, não tendo arguido a nulidade ou invalidade de quaisquer das suas cláusulas, nomeadamente onde é assumido e aceite a quitação dos valores de cessão.

    8. - Contratos que estão dados por assentes.

    9. - Não podia o Tribunal “a quo” face aos documentos dados por assentes, concluir que o cheque no valor de 630.000,00 € foi para liquidar as cessões de quotas.

    10. - Não era à Recorrente ou a J.C. que competia alegar e demonstrar que haviam pago os valores respeitantes às cessões de quotas, pois ele resulta expressamente do texto dos contratos, que não foram colocados em causa pelo Recorrido.

      Sem prescindir 11. - Nos termos do Art.º 6, n.º 1 e n.º 3 do C.S.C. a capacidade de uma sociedade é medida pelo seu fim mediato, que é a obtenção do lucro, pelo que não compreende a prática de actos gratuitos sendo nulos os actos praticados pelos titulares dos órgãos da sociedade comercial que não seja abrangidos pela capacidade desta.

    11. - O valor a que a Recorrente foi condenada a pagar – 630.000,00 € -, pela emissão de um cheque sacado sobre uma conta sua, corresponderá a uma eventual responsabilidade exclusiva do co-Réu J.C., conforme é expressamente referido pelos Recorridos na sua P.I. e dado como assente e provado pelo Tribunal “a quo”.

    12. - Eventual Responsabilidade à qual Recorrente foi e é completamente alheia, quer quanto à fixação...

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