Acórdão nº 3476/11.7TBBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 27 de Fevereiro de 2012

Magistrado ResponsávelMANUEL BARGADO
Data da Resolução27 de Fevereiro de 2012
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam nesta Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I - RELATÓRIO …Empreiteiros de Canalizações, Lda.

intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra …Sociedade de Construções, S.A.

, pedindo que seja declarado o incumprimento contratual da ré e se condene esta no pagamento das seguintes quantias: - € 70.775,20 decorrentes dos trabalhos realizados no âmbito do contrato e respectivos juros vencidos até à data da propositura da acção no valor de € 17.652,56 e juros vincendos até integral pagamento ; - € 12.856,65 a título de indemnização pelos prejuízos causados pela não emissão dos respectivos autos de medição, em tempo; - € 10.000,00 a título de indemnização de danos não patrimoniais.

Fundamentando a sua pretensão, alega a autora, em síntese, que celebrou com a ré um contrato de subempreitada nos termos do qual esta lhe adjudicou a realização de todos os trabalhos inerentes ao fornecimento e montagem de todos os elementos respeitantes às instalações de águas e esgotos necessários à execução integral do projecto «Montijo - Construção do Retail Park», com o fornecimento de todos os materiais e mão-de-obra, equipamentos e ferramentas necessários para a realização daqueles trabalhos, mediante o pagamento – em regime de preço global – do montante de € 314.347,17, e através da modalidade de “pagamento por medição”.

A este contrato foram feitos três aditamentos, mantendo-se em todos eles o pagamento em regime de preço global e a mesma modalidade de pagamento, sendo que a autora realizou todos os trabalhos acordados entre as partes, não tendo a ré, porém, emitido os autos de medição correspondentes aos 2º e 3º aditamentos, o que impede a autora de emitir as correspondentes facturas e, consequentemente, de receber a quantia de € 70.775,20 correspondente aos trabalhos realizados (€ 59,52 relativos ao 2º aditamento e € 70.715,28 referentes ao 3º aditamento).

Por sua vez, a não emissão de auto de medição está a causar (e já causou) diversos prejuízos à autora, os quais resultam de custos bancários da não provisão das contas bancárias da autora durante os anos de 2008 a 2011, de descontos de livranças subscritas pela Autora durante os anos de 2008 a 2010 para fazer face a despesas correntes e de despesas de letras subscritas pela autora durante os anos de 2008 a 2009 para fazer face a dívidas a fornecedores, no valor total de € 12.856,65.

A ré contestou, aceitando parte da factualidade alegada pela autora e impugnando a restante, contrapondo ter emitido em tempo os autos de medição, o que fez em conjunto com a autora, sendo que todos os trabalhos realizados pela autora foram contratados ao abrigo do contrato de subempreitada outorgado, sem que alguma vez a ré quisesse outorgar qualquer aditamento àquele contrato, nomeadamente os três aditamentos invocados pela autora, nada devendo por isso a esta.

Deduziu ainda a ré reconvenção, pedindo que a autora seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 78.160,13 a título de multas contratuais por incumprimento dos prazos de execução dos trabalhos, acrescida de juros vencidos no montante de € 17.599,46 e vincendos até integral, bem como na quantia de € 10.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais.

Houve réplica, opondo-se a autora à procedência do pedido reconvencional e concluindo como na petição inicial.

A ré apresentou tréplica, concluindo como na contestação/reconvenção.

Findos os articulados foram as partes notificadas para se pronunciarem sobre a eventual incompetência material da Vara de Competência Mista do Tribunal Judicial de Braga para conhecer da presente acção.

A autora pronunciou-se no sentido da competência dos tribunais comuns para conhecer do presente litígio.

Já a ré, por seu turno, defendeu que em face das pretensões das partes e o quadro fáctico que lhe serve de suporte, é a acção passível de enquadramento na previsão da alínea f) do artigo 4º do ETAF, o que determina a incompetência absoluta, ao abrigo do artigo 101º e seguintes do Código de Processo Civil, e a absolvição da Ré da instância (cfr. artigo 105º, n.º 1, do CPC). Ou caso, assim não se entenda e como o conhecimento do objecto da presente acção depende de questões relacionadas com o Decreto-Lei 59/99, de 2 de Março, para o que é objectivamente competente o Tribunal Administrativo, devem tais questões prejudiciais ser levantadas junto do tribunal administrativo competente, sendo neste último caso, aplicável o artigo 97º do CPC, correndo os autos os demais trâmites legais.

Foi proferido despacho saneador que, julgando inadmissível a reconvenção, absolveu a autora da instância reconvencional. Mais se decidiu julgar o Tribunal incompetente em razão da matéria para conhecer do pedido e, em consequência, absolveu-se a ré da instância.

Para se concluir pela incompetência material do tribunal escreveu-se no despacho saneador, além do mais, o seguinte: «Ora, no caso “sub judice”, as disposições legais que foram invocadas na petição inicial, como fundamento da acção, são disposições de direito administrativo - art.ºs 203º e 212º, do aludido DL 59/99, de 2.03.

A Autora não se limitou assim a invocar normas substantivas de direito privado e a questão essencial colocada na acção (pagamento do preço e juros de mora) é configurada como uma questão de direito administrativo.

Destarte, no caso em apreço, olhando à forma como foi estruturada a acção intentada pela autora, é de concluir que estamos em presença de uma relação jurídica administrativa, fluindo dos termos da relação jurídico-processual, tal como apresentada em juízo, pelo que em causa não está o conhecimento de questões de direito privado.

(…).

Ora, nos termos em que se apresenta configurada a acção, considerando a pretensão deduzida pela Autora e a causa de pedir em que assenta o respectivo pedido, parece dever concluir-se que está sem dúvida em causa um contrato que as partes quiseram subordinar ao direito administrativo. Para tanto basta nos socorremos da cláusula 33ª do contrato de subempreitada em análise.

Foi neste mesmo sentido que se pronunciou recentemente o Tribunal de Conflitos, no ac. de 22.02.2011, in www.dgsi.pt: “Ainda que se possa questionar a qualificação de determinado contrato como de empreitada de obras públicas, basta, salvo regra excludente, que um qualquer aspecto substantivo relevante do mesmo esteja sujeito a um regime específico de direito público, para que os litígios decorrentes da sua execução compitam aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal - artigos 1.º e 4.º, n.º 1, f), do ETAF”.

Logo, considerando que a competência em razão da matéria se afere em função dos termos em que o Autor fundamenta ou estrutura a pretensão que quer ver judicialmente reconhecida, conclui-se que o Tribunal Comum não tem competência em razão da matéria para apreciar a pretensão que foi deduzida contra a ré.» Inconformado com a decisão que julgou o tribunal incompetente, dela veio a autora interpor recurso para este Tribunal da Relação, apresentando alegações que termina mediante a formulação das conclusões que a seguir se transcrevem: «A. O presente Recurso apresentado pela aqui Recorrente tem por objecto a sentença proferida na Vara de Competência Mista do Tribunal Judicial de Braga datada de 03.11.2011 (“Sentença Recorrida”) que julgou o tribunal incompetente em razão da matéria para conhecer o pedido, absolvendo consequentemente a Ré, ora Recorrida, da instância.

  1. A Sentença Recorrida faz no plano jurídico e factual uma análise incorrecta e distorcida, padecendo de nulidade quer por falta de fundamentação, quer por erro de julgamento, e que, a confirmar-se, em conformidade com a Constituição e com a lei processual civil, viola os legítimos direitos e interesses da Recorrente.

  2. A Sentença Recorrida padece de falta de fundamentação porque, não obstante, a Recorrente ter sido notificada para se pronunciar e de ter, em tempo, apresentado a sua pronúncia, a Sentença Recorrida não refere nem indica quaisquer fundamentos subjacentes à apreciação daquela, o que consubstancia uma nulidade da sentença, nos termos da alínea b) do n.º1 do artigo 668º do Código de Processo Civil.

  3. A Sentença Recorrida ao decidir pela incompetência material do Tribunal e ao absolver a Ré da instância enferma em erro de julgamento, o que deverá determinar a revogação da mesma por esse Venerando Tribunal.

  4. O primeiro erro de julgamento da Sentença Recorrida resulta da alegada subordinação do contrato ao direito administrativo, resultante da Cláusula 33ª do Contrato.

  5. O contrato em questão não se encontra subordinado ao direito administrativo porque, dos termos da pretensão e causa de pedir apresentada pela Autora, ora Recorrente, não resulta que as partes submeteram o contrato ao direito administrativo, resultando ao invés, que as partes submeteram – e quiseram submeter a um regime privado, pois: (i) o Contrato objecto do litígio – contrato de subempreitada – tem natureza privada; (ii) foi celebrado por partes cuja natureza jurídica é totalmente privada, partes essas que não visam a prossecução de fins/interesses públicos, nem se encontram munidas de qualquer prerrogativa/poder público, mas que ao invés se encontram numa posição de paridade; (iii) tem por objecto a realização de uma subempreitada, que se insere no âmbito de uma empreitada privada; (iv) refere-se a uma relação jurídica privada; (v) não foi procedido de qualquer procedimento pré-contratual regulado por normas de direito administrativo mas resultou da livre vontade e autonomia privada das partes prevista no artigo 405º do Código Civil que livremente estabeleceram os seus termos e vinculações.

  6. O ponto 3.1 da Cláusula 33ª do Contrato não pode ser interpretado como uma submissão do Contrato às normas de direito administrativo, pois daquela disposição contratual resulta expressamente que a sujeição a normas de direito público/administrativo previstas no Decreto-Lei n.º 59/99 de 2 de Março – que aprova o regime jurídico das...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT