Acórdão nº 2960/21.9T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelPAULO REIS
Data da Resolução07 de Abril de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I.

Relatório A. C.

intentou ação declarativa, sob a forma comum, contra o Fundo de Garantia Automóvel e B. M.

, pedindo a condenação dos réus a pagar à autora as quantias seguintes: a) 5.000,00 € a título de indemnização por danos sofridos pelo seu pai; b) 40.000,00 € a título de indemnização pela perda do direito à vida; c) 15.000,00 € a título de indemnização por danos não patrimoniais sofrido com a morte de seu pai.

A autora formula o aludido pedido a título de indemnização por danos sofridos em virtude de acidente de viação ocorrido a 07-11-2011, pelas 17h20, na Rua …, freguesia de …, concelho de Barcelos, no qual, em resultado de embate entre o veículo ligeiro misto de matrícula CL, conduzido pelo 2.º réu, e um velocípede conduzido por F. M. - pai da autora -, este sofreu lesões que causaram a sua morte, imputando ao 2.º réu a culpa exclusiva na produção do embate e alegando que não se encontrava transferida para qualquer seguradora a responsabilidade civil emergente de danos causados a terceiros pelo veículo por este conduzido, como tudo melhor consta da petição inicial.

Citados, ambos os réus contestaram.

O réu Fundo de Garantia Automóvel impugnou parte da factualidade alegada pela autora.

O réu B. M., por seu turno, arguiu a prescrição do direito de indemnização invocado pela autora e impugnou parte da factualidade pela mesma alegada.

Por despacho de 09-09-2021, foi concedido à autora o prazo de 10 dias para, querendo, responder à matéria da exceção invocada, vindo esta apresentar articulado de resposta à exceção deduzida na contestação apresentada pelo 2.º réu.

Após, por despacho de 04-10-2021 (Referência Citius 175324080), foi dispensada a realização da audiência prévia (1), fixado o valor da causa e proferido saneador-sentença julgando procedente a exceção de prescrição, o qual se transcreve na parte dispositiva: «Pelo exposto, julgo procedente a exceção da prescrição invocada pelo réu B. M. e, em consequência, absolvo os réus do pedido formulado pela autora - cfr. artigo 576.º, n.º 3, do C.P.C..

***Custas pela autora.

Registe e notifique.» Inconformada com a decisão proferida, veio a autora interpor recurso, terminando as alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem): «A – DA INEXISTÊNCIA DA AUDIÊNCIA PRÉVIA E NULIDADE DO SANEADOR-SENTENÇA 1.ª - A sentença proferida em sede de primeira instância pelo Mmo. Juiz, ao não proceder ao agendamento da audiência prévia, entendendo não existir razão para o fazer, dispensando-a contraria o disposto nos identificados arts. 591º, n.º 1, al. b) e 593º, n.º 1, a contrario, sendo, por isso, contra legem, ao que acresce que não leva em consideração a alteração legislativa introduzida ao CPC pela Lei n.º 41/2013, de 26/06, onde foi manifesto ensejo do legislador tornar a realização da audiência prévia obrigatória, mesmo naqueles casos em que anteriormente possibilitava a respetiva dispensa; 2.ª - No caso em que se proponha conhecer do mérito da causa, o juiz apenas pode dispensar a realização de audiência prévia depois de auscultar as partes sobre essa dispensa, mediante recurso aos mecanismos de gestão processual e de adequação formal, em conformidade com o disposto nos arts. 6º e 547º do CPC, e quando permita às partes que se pronunciem, por escrito, sobre as questão de mérito que se propõe conhecer, nos mesmos termos em que o iriam fazer oralmente, em sede de audiência prévia, caso esta tivesse lugar, sendo ainda que outra doutrina e jurisprudência defende que o juiz apenas pode dispensar a realização de audiência prévia no âmbito do dever de gestão processual, a título de adequação processual, quando conclua que a matéria a decidir foi objeto de suficiente debate entre as partes nos articulados, devendo, contudo, ouvir aquelas quanto ao seu propósito de dispensar a realização audiência prévia, nos termos do disposto nos arts. 6º, n.º 1 e 3º, n.º 3 do CPC 3.ª - Sempre que o Juiz se proponha conhecer, de imediato, em sede de saneador, total ou parcialmente do mérito a causa, tem obrigatoriamente de convocar audiência de partes, e quando não o faça, omite uma formalidade processual prescrita por lei, por ser suscetível de influir no exame ou na decisão da causa, o que determina a nulidade do saneador-sentença que venha a proferir, nos termos do disposto no art. 195º nº 1 do Código de Processo Civil.

“..Apesar de se estar perante uma nulidade processual, na medida em que esta se encontra coberta por um despacho do juiz, mais concretamente pelo saneador-sentença, em que conheceu do mérito da presente causa, sem realizar a audiência previa, preterindo assim uma formalidade legal obrigatória prescrita pela lei processual civil, e com isso violou o princípio do contraditório, na sua dimensão positiva”, Termos em que como flui do supra exposto o saneador-sentença encontra-se inquinado da nulidade processual secundária a que se refere no art. 195º nº1, a qual desde já se invoca para todos os efeitos legais, atento o facto de não ser de conhecimento oficioso do tribunal.

B- DO EXCESSO DE PRONÚNCIA – art.º 615, n.º 1, alínea d), do CPC (FALTA DE ALEGAÇÃO DA PRESCRIÇÃO PELO FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL) 4.ª - O Réu B. M. veio invocar a exceção da prescrição.

O Réu Fundo de Garantia Automóvel não invocou qualquer prescrição; O Réu B. M. não possuía seguro, pelo que incumbe ao Fundo de Garantia Automóvel “…a protecção dos terceiros lesados, nas finalidades e objectivos de segurança social do risco de circulação automóvel, quanto à satisfação das indemnizações, ao Fundo de Garantia Automóvel terão de ser aplicáveis as disposições e princípios que disciplinam a responsabilidade das seguradoras, tanto quanto é certo que ele não deixa de desempenhar a mesma função social, correspondente à idêntica necessidade, da obrigatoriedade do seguro do risco da circulação rodoviária automóvel, e, como tal, verdadeira empresa seguradora nos casos em que o Estado não conseguiu assegurar que o lesante celebrasse o obrigatório contrato de seguro de responsabilidade civil (art.º 21 do DL n.º 522/85).

Desta forma, também o FGA tem que ser abrangido pelo âmbito do art.º 497º do CC, e considerado responsável solidário conjuntamente com o lesante nos casos em que se lhe impõe que satisfaça as indemnizações a atribuir. Por isso, o FGA (tal como qualquer seguradora não pode aproveitar da invocação da prescrição feita pelo seu segurado) também não pode beneficiar da invocação pelo responsável civil, da excepção fundada no decurso do prazo prescricional, quando ele próprio a não invocou (e, ademais, quando na altura da citação do FGA, tal prazo ainda não havia decorrido).”, conforme decorre do Acórdão do STJ de 01.07.2004, Revista n.º 296/04 - 7.ª Secção Araújo Barros (Relator) * Oliveira Barros Salvador da Costa Ferreira 5.ª - O reconhecimento da prescrição da obrigação relativamente a algum dos coobrigados não aproveita aos restantes devedores que não tenham deduzido esse meio de defesa, porquanto a prescrição é um meio de defesa pessoal que não pode ser oficiosamente conhecida pelo Tribunal.

C – DA PRESCRIÇÃO DA OBRIGAÇÃO DOS RÉUS No saneador-sentença refere: “Da prescrição da obrigação dos réus: O réu B. M. veio invocar a exceção da prescrição com os seguintes fundamentos: 1.- A 7 de Novembro de 2011 ocorreu de facto um acidente de viação na Rua …, Freguesia da … concelho de Barcelos.

  1. - Foram intervenientes, o aqui Réu e F. M., pai da Autora.

  2. - Em relação ao referido sinistro foi instaurado o competente processo crime, deduzida a acusação a 06/11/2012 e o Réu pronunciado em 22/05/2013.

  3. - Tudo conforme certidão que se junta e se dá por reproduzida. Doc.1 5.- No referido processo a Autora foi admitida a intervir com assistente, e foi notificada para os termos do artigo 77 nº2 do C.P. Penal, ou seja, para querendo deduzir pedido de indemnização cível no prazo de vinte dias, conforme se verifica pela certidão junta como doc.1 6.- O que aquela não fez, vindo agora em separado a fazê-lo.

  4. - Sucede que, e com o devido respeito por opinião diversa, tal direito está prescrito.

  5. - Aceita-se nos autos a aplicabilidade à prescrição invocada do prazo de 5 anos, por força do disposto nas disposições conjugadas dos artigos 498º, nº 3, do CC e 148º, nº 1, e 118º, nº 1, c) do Código Penal.

  6. - No entanto e uma vez iniciado o procedimento criminal com a notícia do crime (de homicídio por negligência e omissão de auxílio), tal prazo começou a correr com o desfecho do inquérito, portanto, com a dedução, em 6-11-2012, da acusação contra o arguido em tais autos.

  7. - Ou, no limite, com a notificação da decisão de pronúncia em 22/05/2013.

  8. - Nos termos do art. 71º do CPP, «O pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respetivo, só o podendo ser em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei», ou seja, tipificados nas várias alíneas do subsequente art. 72º.

  9. - Curando da responsabilidade civil conexa com a criminal, o preceito consagra no nosso ordenamento o princípio da chamada adesão da ação civil à ação penal, mais do que uma mera interdependência das ações: o princípio arrasta consigo o pedido de indemnização civil de perdas e danos para a jurisdição penal.

  10. - Do exposto decorre que, iniciado o inquérito com o acidente ocorrido em 10-07-1998, inquérito que findou com acusação deduzida em 21-06-2001, a prescrição passou a correr contra o lesado decorridos os prazos a que alude o art. 77.º do CPP (…)».

  11. - Neste caso, tendo o Ministério Público exercido a ação penal, deduzindo acusação, a Autora estava em condição de formular o pedido de indemnização cível no processo penal.

  12. - Não o tendo feito e não estando, desde então, impedida de exercer o direito a que se arroga na presente instância cível, o prazo de prescrição conta-se a partir do momento em que poderia deduzir tal pedido no processo-crime, de acordo com o princípio da adesão.

  13. - Tendo-se...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT