Acórdão nº 1/08.0TJVNF-EW.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA JOÃO MATOS
Data da Resolução21 de Abril de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência (após corridos os vistos legais) os Juízes da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, sendo Relatora - Maria João Marques Pinto de Matos; 1.º Adjunto - José Alberto Martins Moreira Dias; 2.ª Adjunta - Alexandra Maria Viana Parente Lopes.

*ACÓRDÃO I - RELATÓRIO 1.1.

Decisão impugnada 1.1.1.

  1. F.

    , residente na Rua …, Vila das Aves, em Santo Tirso, propôs a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra A. C.

    , residente na Avenida …, em Oliveira e Santa Maria, e Outros, e contra Massa Insolvente de O. F., S.A.

    (representada pelo respetivo Administrador da Insolvência – A. T., com domicílio profissional na Rua …, em Joane), pedindo que: · fosse declarado que ela própria é credora da massa insolvente pelo valor de € 27.548,43 (sendo € 25.245,75 a título de compensação pelo seu despedimento, e € 2.302,67 a título de salários de Maio, Junho e parte de Julho de 2008), e respectivos juros de mora, sendo os Réus condenados a reconhecê-lo; · fosse declarado que este seu crédito sobre a massa insolvente deveria ser graduado em paridade com os créditos dos Réus exequentes (em três acções executivas por eles propostas contra a massa insolvente) e dos Réus reclamantes (que naquelas reclamaram créditos); · fossem os Réus condenados a reconhecer que este seu crédito sobre a massa insolvente gozaria de privilégio mobiliário e imobiliário especial sobre os bens da massa insolvente e sobre o produto da sua venda; · fosse a ré Massa Insolvente condenada a pagar-lhe este seu crédito e os respectivos juros de mora.

    Alegou para o efeito, em síntese, ter sido trabalhadora, desde 01 de Março de 1966, de O. F., S.A.; e, tendo a mesma sido declarada insolvente em 02 de Janeiro de 2008, ter reclamado em 03 de Março de 2008 os seus créditos sobre ela (€ 1.280,68 de salários em atraso, e € 25.245,75 relativos à compensação por eventual e futura cessação do seu contrato de trabalho, mercê do encerramento da empresa).

    Mais alegou que, tendo o dito encerramento ocorrido em 30 de Outubro de 2008, por decisão do Administrador da Insolvência, somou € 2.302,67 aos créditos já reclamados, e depois por ele reconhecidos, relativos aos seus salários de Maio, Junho e parte de Julho de 2008.

    Alegou ainda ser o crédito relativo à compensação por cessação do contrato de trabalho um crédito sobre a massa insolvente, e não sobre a insolvência - ao contrário do entendimento seguido pelo Administrador da Insolvência -, uma vez que a dita cessação resultou de um acto praticado por ele; e o mesmo sucedendo com o crédito relativo a salários vencidos após a declaração de insolvência, por a manutenção do seu contrato de trabalho ter sido igualmente decidida por ele.

    Por fim, alegou que, tendo outros trabalhadores intentado acções para verificação ulterior de créditos (o que considerou ser desnecessário no seu caso pessoal, por terem sido reconhecidos todos os que reclamou nos prévios autos de insolvência), viram o relativo à compensação por cessação dos respectivos contratos de trabalho ser aí reconhecido como sendo sobre a massa insolvente; e, por isso, correr agora ela o risco de vir a ser prejudicada face àqueles (a manter-se o entendimento seguido nos autos de insolvência, de que o seu crédito análogo seria sobre a insolvência), desse modo se violando o princípio da igualdade dos credores.

    1.1.2.

    Regularmente citados, os Réus vieram contestar.

    1.1.2.1.

    A Massa Insolvente, na sua contestação, pediu que a acção improcedesse quanto a si.

    Alegou para o efeito, em síntese, ter sido o crédito reclamado pela Autora reconhecido, nos termos do art. 129.º, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (1).

    Mais alegou que, atento os prazos para as reclamações de créditos, para as acções de verificação ulterior de créditos, e para as acções relativas a dívidas da massa insolvente, o crédito aqui reclamado há muito que se encontraria prescrito.

    1.1.2.2.

  2. C.

    e Outros, na sua contestação conjunta, pediram que se julgassem procedentes as excepções nela invocadas e a acção improcedente, por não provada.

    Alegaram para o efeito, em síntese, ter a Autora (B. F.) reclamado os mesmos créditos que aqui invoca em três acções executivas pendentes, de que igualmente são partes, propostas contra a Massa Insolvente, verificando-se assim a excepção de litispendência; e terem sido citados primeiro nestes autos, pelo que deduziram naqueles outros a dita excepção, sem prejuízo de (prevenindo outro entendimento do Tribunal a quo) a invocarem igualmente aqui.

    Mais alegaram que, tendo a Autora (B. F.) reclamado o crédito relativo à compensação por cessação do seu contrato de trabalho como crédito da insolvência (nos autos respectivos), não poderia agora pretender alterar a qualificação que livremente lhe atribuiu então.

    Alegaram ainda que, estando em causa créditos laborais, a acção com vista ao reconhecimento da sua existência deveria ter sido intentada no ano seguinte a contar da data da cessação do contrato de trabalho, nos termos do art. 337.º, n,º 1, do Código do Trabalho (2); e, por isso, já se encontraria não só caduco, como prescrito, o direito que a Autora (B. F.) aqui pretenderia exercer.

    Por fim, alegaram não se encontrar a Autora (B. F.) em condições análogas às suas (inexistindo o risco de qualquer violação do princípio da igualdade dos credores), uma vez que a mesma reclamou na insolvência o seu crédito relativo à compensação por cessação do seu contrato de trabalho como tendo origem no singelo encerramento da empresa, enquanto eles próprios o radicaram num despedimento ilícito (que desse modo impugnaram, em acção intentada expressamente para o efeito, no ano seguinte à sua verificação).

    1.1.3.

    A Autora (B. F.) respondeu, pedindo que as excepções deduzidas pelos Réus fossem julgadas não provadas e improcedentes.

    Alegou para o efeito, sempre em síntese, que, tendo reclamado nas três execuções pendentes, propostas por outros contra a Massa Insolvente, o seu crédito, pediu ainda o respectivo reconhecimento, nos termos do art. 792.º, do CPC (prevenindo a hipótese de se vir a entender aí que não tinha título executivo); e, não tendo ainda obtido resposta por parte da Executada, intentou a presente acção nos 20 dias seguintes, por forma a evitar a caducidade do requerimento respectivo (conforme al. a), do n.º 7, do art. 792.º citado), Defendeu, por isso, inexistir a excepção de litispendência invocada.

    Mais alegou: não lhe ser exigível que invocasse a ilicitude do despedimento levado a cabo pelo Administrador da Insolvência, uma vez que, estando apenas em causa a qualificação do crédito compensatório devido pela cessação do seu contrato de trabalho, essa questão seria unicamente de direito; a qualificação do dito crédito como sendo sobre a insolvência violaria o princípio da igualdade (tratando de forma distinta, sem qualquer justificação, os vários trabalhadores da Insolvente, sendo apenas alguns deles pagos com os únicos bens apreendidos em acções executivas por eles intentadas para o efeito); e, tendo o dito crédito sido inclusivamente reconhecido pelo Administrador da Insolvência, não lhe era exigível que intentasse qualquer acção ulterior onde pedisse aquele reconhecimento. Defendeu, por isso, inexistir qualquer prescrição, ou caducidade, do direito que aqui invoca.

    1.1.4.

    Foi proferido saneador-sentença, julgando procedente a excepção peremptória de prescrição, lendo-se nomeadamente no mesmo: «(…) Decisão Pelo exposto, a) julgo procedente a exceção peremtória de prescrição, declarando extinto o direito de crédito reclamado pela Autora B. F. no que respeita aos créditos laborais constituídos após a declaração de insolvência.

    b)Em consequência, absolvo os RR dos pedidos contra os mesmos deduzidos nos presentes autos.

    Custas pela A- artigo 527º, nº1 e 2 CPC.

    Registe e notifique.

    (…)»*1.2. Recurso 1.2.1. Fundamentos Inconformada com esta decisão, a Autora (B. F.) interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que se revogasse a sentença recorrida.

    Concluiu as suas alegações da seguinte forma (aqui se reproduzindo as respectivas conclusões ipsis verbis): 1 - A Recorrente tem direito a compensação pela cessação do contrato de trabalho ao abrigo do disposto no artigo 347 do C.T. levado a cabo por iniciativa do Sr. Administrador de insolvência.

    2 - Pelo que a questão que se coloca nos presentes autos prende-se, apenas, quanto à natureza do crédito da Recorrente.

    3 - Ou seja, entende a Recorrente que se trata de uma mera questão de direito.

    4 - O crédito foi reconhecido na sua totalidade pelo Sr. Administrador de insolvência pelo que não se aplicam as disposições conjugadas dos artigos 337 e 381 do Código de Trabalho.

    5 - Os contratos de trabalho mantêm-se em vigor até ao encerramento definitivo do estabelecimento, não implicando, pois, a declaração de insolvência a cessação imediata dos contratos de trabalho por caducidade, os quais subsistem após essa declaração e até àquele encerramento, sendo certo que o encerramento do estabelecimento confere aos trabalhadores o direito a uma compensação.

    6 - Constituindo um ato de administração da massa insolvente a manutenção da empresa em laboração, as dívidas respeitantes a salários e demais contraprestações do trabalho prestado pelos trabalhadores da insolvente, após a declaração de insolvência, são qualificadas pelo art.º 51º, n.º 1, c), do CIRE, como dívidas da massa insolvente.

    7 - Os créditos da Recorrente, trabalhadora da insolvente cujo contrato de trabalho cessou por acto (de gestão e administração) do administrador de insolvência, são dívidas da massa insolvente, independentemente de tal ter ou não sido reconhecido em acção judicial (por tal resultar expressamente do CIRE).

    8 - Trata-se de divida emergente de acto de administração da massa insolvente nos termos do artigo 51º. Nº.1 c) do CIRE e também resultante da actuação do administrador da insolvência no exercício das suas funções (artº 51º, nº1 d) do CIRE).

    9 - A Recorrente não pode ser prejudicada...

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