Acórdão nº 5783/21.1T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA AMÁLIA SANTOS
Data da Resolução30 de Novembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães:*A Autora, P..., LDA., pessoa coletiva n.º ..., com sede em ..., pediu nesta ação: - O seu reconhecimento como dona e legítima proprietária do prédio urbano composto de ..., 1.º e 2.º andares e logradouro, com utilizações independentes, sito na Rua ..., ... – ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial, Comercial e Automóveis ... sob o n.º ...11, da freguesia ..., e inscrito na matriz predial urbana respetiva sob o artigo ...22; e - A condenação do Réu, AA, na restituição à Autora (do referido prédio), devoluto e desocupado de pessoas e bens, em bom estado de conservação e perfeitas condições, e no pagamento de indemnização, prevista no artigo 564.º do Código Civil, correspondente ao montante dos valores, que não devem considerar-se rendas, que se venham a vencer, e relativos ao tempo em que perdurar a ocupação ilegítima por parte do Réu, até à efetiva restituição do prédio, livre e devoluto de pessoas e bens, e cujo montante, calculado com base no valor mensal de € 2.000,00, será liquidado em execução de sentença, assim como eventuais danos causados pela utilização indevida e deterioração do referido prédio, também em quantia a determinar em execução de sentença.

*Alegou a A. em síntese que adquiriu o referido prédio em 2019, e que o Réu era arrendatário do ... do mesmo, tendo a A, por meio de carta registada com AR, datada de 12 de janeiro de 2021, comunicado ao R.

a sua oposição à renovação do contrato, pelo que o mesmo cessou, por caducidade, a 30/09/2021.

Sucede que o Réu mantém uma ocupação ilícita do espaço, continuando a exercer a sua atividade comercial no local arrendado, e a pagar o valor da renda de € 268,50, contra a vontade da Autora, que não pode fazer a exploração devida do prédio, o que lhe causa prejuízos no valor de € 2.000 mensais, que poderiam advir da celebração de um novo contrato de arrendamento.

*O Réu apresentou CONTESTAÇÃO, impugnando, além do mais, o valor da ação, e alegando a ineptidão da petição – por contradição entre o pedido e a causa de pedir -, por não estar em causa o direito de propriedade sobre o prédio, mas apenas o direito de arrendamento do ....

De qualquer forma, não impugna a propriedade do referido ..., nem o envio das comunicações que lhe foram feitas pela A, considerando, no entanto, que foi celebrado com a anterior senhoria um contrato de arrendamento sem duração.

*Foi agendada audiência prévia, tendo-se frustrado a tentativa de conciliação, mas concordando as partes que a decisão se resumia à aplicação do direito, prescindido da prova.

*Foi então proferida a seguinte decisão: “…Pelo exposto, julgo a presente ação improcedente, por não provada, absolvendo o Réu (…) do pedido.

Custas a cargo da Autora (artigo 527.º, n.º 1 do Código de Processo Civil).

Valor: 8.055 € - artigo 298.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.

Registe, notifique e junte ao suporte físico do processo”.

*Não se conformando com a decisão proferida, dela veio a A. interpor o presente recurso de Apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões: “A – Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida em 28/06/2022, que julgou a acção improcedente e absolveu o Réu, aqui Apelado, com a qual a aqui Apelante não se conforma.

B - De acordo com o fundamento basilar das alegações da Autora e do Réu, e do acordo das partes em que a decisão se resumia à aplicação do direito prescindindo da realização da prova, tudo se resumia e resume em decidir se o contrato de arrendamento celebrado em 07/09/1999, se tratava e deveria ser considerado como um contrato de duração limitada ou um contrato de duração indeterminada e qual o meio de cessação adequado, se a oposição à renovação se a denúncia.

C - A Meritíssima Juíza a quo decidiu que o contrato de arrendamento celebrado em 07/09/1999 entre Autora e Réu era um contrato de duração limitada e, por tal, que a oposição à renovação do contrato não era o meio idóneo para a cessação do dito contrato, absolvendo, consequentemente, o Réu dos pedidos formulados.

D - Para fundamentar a sua decisão a Meritíssima Juíza a quo apontou como razão (única, a nosso ver) a circunstância de, no acto da celebração do contrato de arrendamento, as partes nada terem referido expressamente “a respeito da pretendida duração limitada deste” e tendo estipulado um “prazo para o mesmo diferente do de cinco anos”, não poderia sustentar-se estar em causa um contrato de duração limitada, pois que nessas circunstâncias não seria inequívoco que as partes quiseram vincular-se desse modo, invocando e transcrevendo (quase ipsis verbis, neste particular) o Ac. RC de 14/12/2020, p.855/19.5T8LRA, www.dgsi.pt.

E - Com todo o respeito por melhor e mais douta opinião, entende a Apelante que a Meritíssima Juíza a quo julgou mal.

F - Não basta dizer que “não é inequívoco que as partes quiseram vincular-se desse modo”. É necessário demonstrar e fundamentar as razões que levaram a Meritíssima Juíza a quo a entender que possa ter sido outra a intenção das partes, que não a de vincular-se a um contrato de duração limitada.

G - A posição jurisprudencial dominante é a de que a lei não exige que, do próprio texto escrito do contrato conste expressis verbis que as partes pretendem celebrar um contrato de duração limitada, mas tão só, que o prazo conste inequivocamente de uma cláusula contratual.

H - As partes pretenderam celebrar um contrato de duração limitada a um ano, mas que permitia a sua prorrogação por períodos iguais e sucessivos de um ano, se não fosse denunciado por qualquer das partes.

I - Nada existe ou se infere do texto do dito contrato que demonstre, possibilite ou permita intuir que outra foi a intenção das partes.

J - E a melhor demonstração da vontade da primitiva senhoria de que não pretendia constituir um verdadeiro “arrendamento em regime vinculístico”, foi fazer incluir as cláusulas 6ª e 13ª no texto do contrato de arrendamento celebrado, que expressamente referem que “Não é permitido o trespasse do referido estabelecimento.” nem permitia ao inquilino “fazer obras ou benfeitorias, a não ser as de conservação, sem autorização do senhorio, por escrito e devidamente reconhecida (…)”.

L - O Apelado pretende estabelecer uma confusão (para si útil) entre um contrato de arrendamento de duração indeterminada e um contrato de arrendamento celebrado por um ano, prorrogável por períodos iguais e sucessivos, que, no seu entendimento, seria o mesmo que celebrar um contrato de arrendamento sem qualquer limite de tempo, portando, um contrato de duração indeterminada, com o que não se pode concordar.

M - O contrato de arrendamento celebrado em 07/09/1999, consistiu num contrato de duração limitada e não foi por se ter renovado durante vinte anos que se tornou um contrato de arrendamento de duração indeterminada.

N - E, como contrato de duração limitada que é, pode cessar por oposição à sua renovação, que é legítima ao abrigo da legislação aplicável (cfr. Lei nº 6/2006, de 27 de Fevereiro, artº 1097º, nº 1, do Código Civil, aplicável por força do nº 1, do artº 1110º do CC, na redacção anterior à versão da Lei nº 13/2019, de 12 de Fevereiro.

O - No caso sub judice, se, no entender da Meritíssima Juiza a quo, dos termos do contrato celebrado nada permitia concluir, inequivocamente - atento o que fica alegado relativamente ao prazo estipulado ser inferior ao supletivo legal - que as partes quiseram celebrar um contrato de arrendamento de duração limitada, também não se poderá entender que, dos termos do dito contrato - designadamente, pelo respectivo prazo estar nele formalmente plasmado - resulte que as partes não quiseram celebrar um contrato de duração limitada.

P - Se à fundamentação da decisão dos Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra, de 14/12/2020, proferido no Proc. 855/19.5T8LRA e do Tribunal da Relação de Lisboa, de 03/03/2011, proferido no Processo nº 4498/06.5TVLSB.L1-2, foi dada (e merecidamente) tanta importância, que foi quase integralmente transcrito no artº 37º da Contestação do Réu, aqui Apelado, e na fundamentação da sentença de que se recorre, então também deve ser levado em conta que, se em ambos os Acórdãos foi julgado que os contratos de arrendamento em análise deveriam ser considerados como de duração ilimitada ou indeterminada, tal se deveu, decisivamente, à ocorrência e verificação dos chamados “elementos coadjuvantes”, que, considerados à luz do entendimento do declaratário normal, colocado na posição do declaratário real, levariam que os referidos contratos de arrendamento fossem considerados como celebrados com duração ilimitada ou indeterminada.

Q - Se nas cláusulas dos contratos de arrendamento analisados nos Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra, de 14/12/2020, no âmbito do Proc. 855/19.5T8LRA e do Tribunal da Relação de Lisboa, de 03/03/2011, no âmbito do Processo nº 4498/06.5TVLSB.L1-2) foram considerados “elementos coadjuvantes” e decisivos para a decisão de considerar os referidos contrato de arrendamento como de duração ilimitada, então, a existência no contrato de arrendamento inicialmente celebrado em 07/09/1999 de cláusulas que impedem a realização de obras na autorização escrita e reconhecida do senhorio e o trespasse do estabelecimento, devem ser entendidas como “elementos coadjuvantes” no sentido de ter como verificada mais uma manifestação de vontade da primitiva inquilina de limitar a existência (e a duração) do contrato celebrado, que assim se deverá considerar e julgar como celebrado com duração limitada, para todos os efeitos legais.

R - A Apelante entende que a sentença recorrida não especifica os fundamentos de direito que justificam a decisão proferida.

S - Não é suficiente que, para justificar a decisão de considerar o contrato em apreço como de duração ilimitada ou indeterminada, o único fundamento referido seja o da não ser possível afirmar a existência da inequivocidade exigida pelos artºs 98º, nº1 e 117º, nº 1 do RAU e resultante da...

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