Acórdão nº 1386/21.9T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Julho de 2022

Magistrado ResponsávelPEDRO MAURÍCIO
Data da Resolução13 de Julho de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACÓRDÃO (1) ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES, * * *1. RELATÓRIO 1.1. Da Decisão Impugnada O Requerente F. B.

intentou a presente acção especial de acompanhamento de maior contra M. L.

, pedindo que seja «decretado o Acompanhamento de M. L., aplicando-se-lhe as medidas de representação geral e administração total de bens (artigo 145.º n.º 2 al. b) e c) do Código Civil)», alegando, essencialmente, o seguinte: «é filho da Requerida, que tem atualmente 87 anos, apresenta diagnóstico de demência, com desorientação no tempo e no espaço, que se tem agravado recentemente, que vem acompanhado de comportamento desadequado e discurso pouco coerente, não conseguindo fazer face aos cuidados básicos diários; a Requerida encontra-se impossibilitada para exercer plena e conscientemente os seus direitos e cumprir os seus deveres, pelo que se torna indispensável que beneficie de medidas de acompanhamento imediatas».

Por despacho de 10/03/2021, para além do mais, foi determinada a notificação do Requerente «para, em 10 dias, formular pedido de suprimento judicial da autorização da Requerida para a propositura da presente acção ou, em alternativa, demonstrar que tal autorização foi concedida ou judicialmente suprida».

Na data de 23/03/2021, através de requerimento, para além do mais, o Requerente formulou pedido de «suprimento de autorização judicial do beneficiário».

Citada, a Requerida contestou, pugnando por «a) não ser suprida a não autorização da Requerida, julgando-se procedente a excepção por ilegitimidade (artigo 141.º, do CC), indeferindo-se o requerido através do requerimento de referência Citius 38356958, e absolvendo-se a Requerida da instância; Sem prescindir, b) ser a acção julgada improcedente, por não provada; Caso assim não se entenda, e sem prescindir, c) ser designado como Acompanhante e para representação geral e administração geral dos bens o seu filho J. F., nascido a -.02.1957, portador do cartão de cidadão n.º ……, Empresário, residente na Rua … Calendário; d) Deverá ainda ser adoptado um tipo de publicidade diverso do decretado pelo Tribunal, que não seja tão lesivo da honra e reputação da Requerida, da sua família, e da Sociedade …, S.A., e ordenado que sejam retirados os editais eventualmente já afixados», fundado a sua defesa, essencialmente, no seguinte: «o Requerente carece de legitimidade para instaurar a acção porque a Requerida nunca deu, não dá e não dará a sua autorização no sentido de o acompanhamento ser requerido e não estamos perante um caso em que a “beneficiária” “não possa livre e conscientemente dar” a sua autorização, ou em que exista “um fundamento atendível” que justifique o suprimento da sua autorização pelo Tribunal; a Requerida não apresenta nenhum “diagnóstico de demência, com desorientação no tempo e no espaço, que se tem agravado recentemente”, “comportamento desadequado e discurso pouco coerente”, incapacidade de reconhecer o dinheiro, e, muito menos, incapacidade de “fazer face aos seus cuidados básicos diários”».

Na data de 28/06/2021, foi proferido o seguinte despacho: “Solicite ao GML a realização de exame pericial à Requerida, nos termos e com as finalidades previstas nos artigos 897.º e 899.º, do Código de Processo Civil, e, ainda, para apurar da verificação dos pressupostos do suprimento do seu consentimento para a propositura da acção, previstos no art.º 141.º, n.º 2, do Código Civil”.

Na data de 13/10/2021, foi junto aos autos o relatório pericial no qual está consignado: “… Exame do estado mental e observação psicopatológica A examinada compareceu acompanhada pelo Sr. L. M. (Diretor financeiro) ao exame. O biótipo é pícnico. Higiene e vestiário adequados ao seu nível sociocultural. Idade aparente igual com a sua idade real. Bem acordada. Atenta. A examinanda tem conhecimento do motivo da realização do exame pericial. O estado mental da examinanda permitiu que compreendesse a natureza, propósito e metodologia do presente exame pericial. Vigil, orientada no tempo, espaço e pessoa, colaborante, calma. Discurso lógico e coerente. Verbaliza desavenças com um filho por causa do património da empresa. Reconhece o valor facial e económico das notas e moedas em curso, sendo capaz de fazer trocos. Consegue realizar operações aritmética. Autónoma para as atividades da vida diária: higiene, vestiário e alimentação. Sabe utilizar o multibanco e o telemóvel. Humor neutro e sem oscilações do humor. Modulação afetiva normal. Não se apuram alterações da senso-perceção. Não se mencionaram alterações da líbido. Sono controlado. Apetite conservado. Juízo crítico e insight conservados… G. DISCUSSÃO A examinada não apresenta psicopatologia de relevo que comprometa a sua capacidade de administrar a sua pessoa, património e bens. Mantem o contacto regular com a sua empresa familiar. No âmbito de direitos pessoais e conteúdo de acompanhamento, do ponto de vista médico-legal, cumpre esclarecer que e função do supra descrito, á examinanda mantem a capacidade de decidir se aceita o recusa tratamentos que medicamente sejam indicados e propostos, mantem capacidade de elaborar testamento vital, mantem a capacidade para o adequado exercício das responsabilidades parentais, mantem a capacidade para cuidar e educar os filhos, tem capacidade para perfilhar ou adotar, tem a capacidade mínima para exercer as funções de tutor, tem capacidade para casar ou constituir situações de união, deverá manter o direito de fixar domicílio e residência, mantem o direito de se deslocar sozinha no pais ou no estrangeiro, tem o direito de escolher profissão, relativamente à presença em Tribunal tem capacidade para testemunhar ou dar uma opinião. No âmbito dos negócios da vida corrente e gestão do património, do ponto de vista médico-legal, cumpre esclarecer que a examinanda tem capacidade de administrar o seu património e celebrar negócios da vida corrente.

H. CONCLUSÕES A examinada não apresenta anomalia psíquica nem psicopatologia de relevo que afete a sua capacidade de administrar a sua pessoa, património e bens…”.

Notificado do relatório pericial, na data de 29/10/2021, o Requerente apresentou requerimento com o seguinte teor: “… tendo sido notificado do teor do Relatório Pericial elaborado pelo Instituto Nacional de Medicina Legal, requer a V. Exa., nos termos do artigo 485.º do CPC, se digne ordenar a notificação do Sr. Dr. D. R., Perito de Psiquiatria, para que venha esclarecer e fundamentar, por escrito: 1.

Na página 3 do relatório pericial é expressamente referido que examinada “trabalhou na indústria das carnes”. Cumpre esclarecer se tal informação lhe foi transmitida pela Examinada como se tratando, conforme escreve no próprio relatório, de uma ação ocorrida no passado, e que já não ocorre no presente.

  1. Na página 3 do relatório pericial é expressamente referido que “A examinada compareceu acompanhada pelo Sr. L. M. (Diretor Financeiro)”.

    Não tendo sido requerida por qualquer das partes que a perícia fosse assistida por assessor técnico, nos termos do artigo 480.º do CPC, não se compreende por que razão a Requerida, aparentemente, entrou acompanhada do Sr. L. M., Diretor Financeiro.

    Cumpre, portanto, esclarecer por que razão a Examinada entrou acompanhada na realização do Exame de Psiquiatria Forense, se para se apoiar a andar, se para ser apoiada a pensar... Mais, a que propósito foi entrevistado o referido Sr. L. M. (cfr. metodologia – entrevista ao acompanhante)??? Para dar as respostas a que a examinada não conseguia responder? O que foi dito pelo mesmo para justificar a qualidade de acompanhante? Esteve presente em todo o exame?? 3.

    Na página 3 do relatório pericial é expressamente referido que a Examinada se apresenta: “Vigil, orientada no tempo, espaço e pessoa, calma. (…) “Reconhece o valor facial e económico das notas e moedas em curso, sendo capaz de fazer trocos. Consegue realizar operações aritmética. Autónoma para as atividades da sua vida diária: higiene, vestiário e alimentação. Sabe utilizar o multibanco e o telemóvel. Humor neutro e sem oscilações do humor. Não se menciona alterações da líbido. Apetite conservado” Cumpre esclarecer: Quais os comportamentos e testes realizados, concretas questões colocadas e concretas respostas prestadas pela Examinada (ou se as respostas foram dadas pelo acompanhante, Sr. L. M., Diretor Financeiro) que fundamentaram o entendimento de que esta: (i) Reconhece notas e moedas e é capaz de fazer trocos; (ii) Consegue realizar operações aritméticas; (iii) É capaz de tomar banho, vestir-se e alimentar-se sozinha; (iv) É capaz de utilizar o multibanco e o telemóvel; (v) Apresenta humor neutro e sem oscilações do humor. Não se menciona alterações da líbido. Apetite conservado.

    É de facto notável, não só a plenitude de coisas que a examinada é capaz de fazer, como ainda a qualidade com que o consegue fazer, sendo claramente de atribuir os méritos ao acompanhante, que como bom diretor financeiro, sempre conseguiu fazer umas contas e desenvolver o raciocínio... Afinal, a examinada estava certa ao escolher um assessor financeiro ao invés de um assessor do ramo da medicina, como por exemplo o seu médico...

  2. Na página 4 do relatório pericial é expressamente referido que a Examinada “tem capacidade mínima para exercer funções de tutor”. Cumpre esclarecer o que entende, o Sr. Perito, por capacidade mínima para o efeito que referem. Mais, quem falou em tutor? Quem perguntou ou explicou quais as funções exercidas por um tutor? 5.

    Por último, na página 4 do relatório pericial é referido que a Examinada “tem capacidade de administrar o seu património e celebrar negócios da vida corrente”.

    Cumpre esclarecer: O que entende o Sr. Perito por “negócios da vida corrente”? Comprar pão? Do exame que realizou consegue concluir que a Examinada tem capacidade psíquica para gerir uma empresa com média dimensão e cerca de duzentos funcionários? No seu entendimento, o ato de gestão de empresas é um ato de gestão de negócios corrente...

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