Acórdão nº 1688/21.4T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Julho de 2022
Magistrado Responsável | VERA SOTTOMAYOR |
Data da Resolução | 13 de Julho de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na Secção Social da Relação de Guimarães APELANTES: UNIVERSIDADE X e S. M.
APELADAS: S. M. e UNIVERSIDADE X Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo do Trabalho de Braga -J1 I – RELATÓRIO S. M., residente na Rua …, em Braga, instaurou a presente acção declarativa com processo comum contra UNIVERSIDADE X, com sede no Largo …, em …, pedindo que se: A. A ré seja condenada a reconhecer a existência de um contrato de trabalho com a autora com efeitos a partir do dia 2 de Fevereiro de 2004 e a antiguidade reportada a esta data; B. Seja declarada a nulidade das cláusulas 1ª nº1 e 3 e 5ª nº1 do contrato de trabalho por tempo indeterminado que foi celebrado; C. Seja estabelecida a retribuição mensal da autora no montante líquido de € 1.694,65 ou, caso assim não seja entendido, a retribuição base de € 1.824,54; D. A ré seja condenada a pagar à autora a diferença entre a retribuição mensal que tem vindo a pagar após a celebração do contrato de trabalho e a que venha a ser estabelecida; E.A ré seja condenada a pagar à autora a quantia de € 38.757,58, a título de subsídios de férias e de Natal relativos ao período entre o dia 2 de Fevereiro de 2004 e o dia 31 de Janeiro de 2020; F.A ré seja condenada a pagar os juros de mora sobre estas quantias; G.A ré seja condenada atribuir à autora a categoria profissional de assessor, consultor, auditor.
Para tanto, alega a Autora em resumo que no âmbito do Programa de Regularização Extraordinária dos Vínculos Precários na Administração Pública (PREVPAP) foi reconhecido que exercia funções que correspondiam a uma necessidade permanente da ré e que o vínculo precário ao abrigo do qual exercia estas funções devia ser regularizado. A regularização do vínculo foi realizada através da celebração de um contrato individual de trabalho por tempo indeterminado. A ré atribuiu-lhe a retribuição base mensal de 1.268,57€ o que se traduz numa diminuição do montante que auferia em data anterior à da celebração do contrato de trabalho e reconheceu a antiguidade a partir de 1 de Dezembro de 2014, quando esta deveria reportar a data anterior.
A Ré contestou alegando que a retribuição base mensal e a antiguidade da autora respeitam os termos do Programa de Regularização Extraordinária dos Vínculos Precários na Administração Pública (PREVPAP) e que não ocorreu qualquer diminuição de retribuição, já que o regime em causa não determina que se considere que toda a relação contratual que existiu com o beneficiário da actividade é uma relação laboral. Apenas impõe o reconhecimento, imediatamente e para a frente, da existência de um contrato de trabalho.
Prosseguiram os autos os seus regulares termos e por fim foi proferida sentença, que terminou com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, decido julgar a presente acção parcialmente procedente e, em consequência: 1.Condeno a ré a reconhecer a existência de um contrato de trabalho com a autora com efeitos a partir do dia 2 de Fevereiro de 2004 e a antiguidade reportada a esta data; 2.Condeno a ré a estabelecer a retribuição mensal ilíquida da autora no montante de € 1.694,65; 3.Condeno a ré a pagar à autora a diferença entre esta retribuição mensal e a que tem vindo a pagar após a celebração do contrato de trabalho; 4.A esta quantia acrescem juros de mora a calcular à taxa legal supletiva desde a data em que devia ter sido paga cada retribuição até integral pagamento; 5.Condeno a ré a pagar à autora os subsídios de férias e de Natal relativos ao período entre o dia 2 de Fevereiro de 2004 e o dia 31 de Janeiro de 2020, os quais devem ser calculados por referência à quantia que recebia mensalmente enquanto bolseira em cada um dos anos em que devia ter ocorrido o pagamento, mas sujeita ao tratamento fiscal e para a Segurança Social que é aplicável aos trabalhadores; 6.A esta quantia acrescem juros de mora a calcular à taxa legal supletiva desde a data em que deviam ter sido pagos cada um dos subsídios de férias e de Natal até integral pagamento; 7.No mais, absolvo a ré dos pedidos contra si formulados.
Custas a cargo da autora e da ré na proporção do decaimento.
Registe e notifique.” Inconformada com esta sentença, dela veio a Ré interpor recurso de apelação para este Tribunal da Relação de Guimarães, apresentando alegações que terminam mediante a formulação das seguintes: “CONCLUSÕES: A.
A Recorrente, enquanto fundação pública sujeita ao regime de direito privado, está obrigada a observar os princípios constitucionais respeitantes à administração pública, nomeadamente a prossecução do interesse público e os princípios da igualdade, imparcialidade, justiça e proporcionalidade.
B.
A Recorrente, não obstante ter poder para celebrar contratos de trabalho sujeitos ao direito privado, nomeadamente ao Código do Trabalho, está obrigada a observar um procedimento público, imparcial e escrutinável de selecção de candidatos a cada posto de trabalho que pretenda preencher.
C.
O PREVPAP (criado pela Lei 112/2017, de 29 de Dezembro) permitiu à Recorrente celebrar contratos de trabalho sem observância do procedimento imparcial e escrutinável de selecção de candidatos a cada posto de trabalho que pretenda preencher, desde que observados os limites e requisitos ali vertidos.
D.
O PREVPAP destina-se a regularizar os vínculos contratuais existentes, passando a ser qualificados como contratos de trabalho, das pessoas a que se refere o n.º 1 do artigo 2.º da Lei 112/2017, de 29 de Dezembro. que. exerçam ou tenham exercido as funções em causa no período entre 1 de janeiro e 4 de maio de 2017, ou parte dele, e durante pelo menos um ano à data do início do procedimento concursal de regularização; E.
O regime de excepção à exigência de procedimento concursal (ainda que simplificado) a que a Recorrente está sujeita que é o PREVPAP impõe à mesma que a mesma celebre contratos de trabalho de acordo com as circunstâncias levadas a apreciação na CAB e pela mesma qualificadas como contrato de trabalho a regularizar.
F.
Por conseguinte, as funções e categoria profissional, e a retribuição a figurar no contrato de trabalho a celebrar no âmbito do PREVPAP devem ter por referência o período temporal avaliado pela CAB, ou seja, o ano de 2017.
G.
Nos casos em que o vínculo existente, previamente à regularização via PREVPAP, não é um vínculo laboral, a definição da retribuição deve obedecer ao disposto no artigo 14.º/3 da Lei 112/2017, de 29 de Dezembro.
H.
No caso dos autos, a determinação da retribuição da Recorrida por referência à retribuição anual da mesma no ano de 2017 obedece às normas e princípios vindos de observar, I.
Sendo assim inatacável a fixação de uma retribuição que corresponde à divisão por 14 do incremento patrimonial da Recorrida no ano de 2017 no âmbito do contrato de prestação de serviços.
a.
Caso se entenda que o valor a considerar seria o do valor da bolsa mensal recebida pela Recorrida entre 01/01/2017 e 01/05/2017 concluir-se-á o que o máximo devido será de €1.630,00.
J.
Ao contrário do vertido na douta sentença, tal decisão não corresponde à diminuição da retribuição da Recorrida, uma vez que a mesma não tinha vínculo contratual laboral com a Ré no ano de 2020, sendo antes uma bolseira.
K.
Por violar o disposto no artigo 14.º/3 da Lei 112/2017, de 29 de Dezembro, e no artigo no artigo 134.º n.ºs 1 e 2 da Lei n.º 62/2007 de 10 de Setembro, requer-se seja revogada a douta sentença de que se apela quanto aos pontos 2, 3 e 4 do dispositivo.
L.
Não existe equiparação entre a antiguidade reconhecida à Recorrida no âmbito do contrato de trabalho celebrado na sequência do PREVPAP e a existência de um contrato de trabalho desde o início dessa antiguidade.
M.
O regime jurídico do PREVPAP não pretende que sejam retiradas tais consequências da regularização do vínculo, pelo contrário: a.
nos casos em que a antiguidade apresenta relevo jurídico, o legislador disse-o, como foi o caso do artigo 13.º da Lei 112/2017, de 29 de Dezembro.
b.
Nos termos da Lei 112/2017, de 29 de Dezembro, a regularização produz efeitos de natureza laboral para diante; havendo a possibilidade do tempo anterior à regularização ter influência na carreira do trabalhador.
N.
Entendimento distinto violaria a igualdade entre os trabalhadores da Recorrente: os opositores do PREVAP, sem lei que o preveja claramente, são qualificados como trabalhadores dependentes, sem sujeição a concurso, sem escrutínio, sem comparação com os demais candidatos, em período de tempo não considerado no PREVPAP, com a consequência de receberem subsídios de férias e de Natal.
O.
Já os trabalhadores da Recorrente, que foram sujeitos a concurso, que viram os seus salários serem fixados por referência a uma tabela (aplicável face à sua categoria profissional – o que não aconteceu com prestadores de serviços, como é o caso da Recorrida) recebem valores inferiores.
P.
Não são assim devidos subsídios de férias e subsídios de Natal respeitantes ao período de tempo em que entre a Recorrente e a Recorrida vigoraram contratos de bolseira..
Q.
Pelo exposto, atenta a violação do artigo 14.º da Lei 112/2017, de 29 de Dezembro, e o princípio da igualdade (artigo 13.º da CRP) e o princípio de que todos os cidadãos têm o direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso (artigo 47.º/2 da CRP), requer-se seja revogada a douta sentença a quo, relativamente aos pontos 5 e 6 do dispositivo, e que em consequência seja a Recorrente absolvida do correspondente pedido.
R.
O entendimento de que à Recorrida deveria ter sido assegurada uma antiguidade respeitante a um período de tempo que não foi alvo de avaliação por parte da CAB [pois, note-se, no limite, a CAB pôde pronunciar-se sobre a realidade contratual da Recorrida que se encontra em vigor no intervalo de tempo que mediou entre 01/01/2017 e 01/05/2017], cai no vazio jurídico, logo, na violação do artigo 47.º, número 2 da CRP, que prevê que todos os cidadãos têm o direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e...
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