Acórdão nº 499/19.1T8AVV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelFERNANDO BARROSO CABANELAS
Data da Resolução30 de Junho de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório: A. M., com sinais nos autos, intentou a presente ação declarativa de condenação sob a forma comum, contra X Seguros, S.A. , pedindo que a Ré seja condenada a reconhecer a existência do contrato se seguro celebrado com a Autora no dia 15.08.2015; a reconhecer que, por via do contrato de seguro que celebrou com a Autora e titulado pela apólice .....68 é responsável pelo ressarcimento dos prejuízos que a Autora teve e decorrentes do sinistro (ventos fortes, precipitação e, consequente, acumulação de água no terreno) ocorrido em 07.11.2018 na sua habitação melhor identificada nos artigos 1º e 2º da petição inicial, mais concretamente, no muro de vedação; a pagar à Autora a quantia de 29.912,00€ a título de indemnização por danos patrimoniais, acrescida de juros de mora calculados à taxa legal desde a data da citação até efetivo e integral pagamento daquela quantia; a pagar à Autora a quantia de 10.000,00€ a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescidos dos respetivos juros legais desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.

Em síntese alegou que, a estrutura do muro de vedação exterior de sua pertença, cedeu no dia 7 de novembro 2018, originando fendas no chão; tal queda ficou-se a dever-se à ação de ventos fortes e precipitação; tal risco encontra-se coberto pelo contrato de Seguro Multirriscos Habitação, o denominado ‘X Plus’, celebrado entre a Autora e a Ré, o qual foi titulado com a Apólice nº .....68; a Autora irá despender, na reconstrução do muro um total de 29.912.00€; o estado atual da situação causou um transtorno enorme à Autora, pois que, por um lado, dificulta-lhe o acesso aquela zona da sua habitação, pois mantém sempre o receio que a estrutura possa ceder e causar, ainda mais, prejuízos, por outro lado, não permite à Autora usufruir daquela parte do seu prédio há quase 1 ano, algo que fazia com carácter de regularidade.

A Ré contestou, impugnando motivadamente os factos alegados pela Autora, alegando, em suma, que a causa da queda do muro em discussão nos autos se deveu a patologias da construção do mesmo e como tal não se encontra obrigada a pagar a quantia peticionada; concluiu pela improcedência da ação, por não provada, com a sua consequente absolvição.

Foi realizado julgamento e prolatada sentença, com o seguinte dispositivo: Pelo exposto, julgo a presente ação totalmente improcedente, por não provada, e, em consequência, decido absolver a Ré do pedido.

Custas a cargo da Autora – artigo 527º, nº. 2, do Código de Processo Civil.

Registe e notifique.

Arcos de Valdevez, 17 de fevereiro de 2022 Inconformado com a decisão, a autora recorreu, formulando as seguintes conclusões: I. O presente recurso tem na sua base o entendimento que a decisão recorrida não traduz corretamente a solução adequada para a questão que se apresenta para julgamento II. E, por se entender, como se entende, que a solução encontrada na douta sentença em crise viola, no caso sub judice, o sentimento ético-jurídico de Justiça que ao caso cabe, e ainda que tal solução na aplicação do direito ao caso concreto pode e deve, eventualmente, ser outra pelo que se suscita e se requer a reapreciação da decisão através do presente recurso.

III. Atenta a prova documental e testemunhal produzida, impunha-se resposta diferente dada pelo Tribunal “a quo” aos pontos 7. e 15. da matéria de facto dada como provada e alíneas a), b), c), d), e), f) e g) da matéria dada como não provada, alteração da resposta á matéria de facto que se requer.

IV. Tendo em consideração a certidão emitida pelo Instituto Português do Mar e da Atmosfera, não impugnado, a resposta ao facto 7 deveria ter sido: “A estrutura do muro de vedação exterior, cedeu no dia 7 de novembro 2018, originando fendas no chão, devido as chuvas e ventos fortes que se fizeram sentir na região dos Arcos de Valdevez, de acordo com o relatório do IPMA junto aos autos, tendo a quantidade de precipitação atingido 46.6 milímetros naquela região.” V. O ponto 15 da matéria de facto dado como provada deveria ter sido: “A queda do muro em questão nos autos ficou a dever-se a fenómenos climatéricos adversos, tendo a estabilidade do muro permanecido inalterável durante 15 anos, sujeitas a intempéries da mesma natureza.” VI. No mesmo sentido, a alínea d) dos factos dados como não provados deveria ser alterada passando a constar nos factos provados que: “A queda do muro envolvente à habitação da Autora, em 07.11.2018 foi proveniente da ação de ventos fortes e precipitação, conforme relatório do IPMA relativo ao mês de novembro.” VII. Valorando os depoimentos das testemunhas da A., S. M., a testemunha da R. J. C., prestados em audiência de discussão e julgamento relativamente a esta matéria em 29/01/2022, que aqui se têm como reproduzidos, assim com o relatório pericial junto aos autos; VIII. A resposta ao facto a) da matéria dada como não provada deveria ter sido dada como provada: “A queda do muro em questão nos autos ficou a dever-se ao volume de precipitação ocorrida no mês de novembro de 2018”.

IX. E a resposta ao facto b) da matéria dado como não provada, deveria ter sido dado como provado e alterado em conformidade para o seguinte: “Antes da ocorrência de 07.11.2018, o muro de vedação do prédio urbano em apreço encontrava-se em adequadas e perfeitas condições, conforme Documento n.º 11 que se encontra a fls. XX junto aos autos.” X. Não desconsiderando a proposta de seguro junta com a P.I., assim como as condições gerais e particulares do seguro X Plus (doc. n. º2), a resposta a alínea c) dos factos dados como não provados deveria ter sido alterado para os fatos como provados com a seguinte redação: “A Autora não tem, pois não lhe foi facultado, qualquer documento contendo as mencionadas condições especiais, cujo conteúdo, de resto, também não lhe foi dado a conhecer nem explicado, juntando o doc. n.º 2 que só teve acesso através das plataformas digitais da R.” XI. Atenta a prova produzida em julgamento, nomeadamente, a prova testemunhal, foram referenciados várias vezes as expressões “chuvas e ventos fortes” e “precipitação elevada”, expressões que descrevem realidades apreensíveis por qualquer pessoa, tendo aquelas palavras uma significação igual em todas as latitudes, descritiva da intensidade da chuva e da força do vento, que se fizeram sentir nas circunstâncias de tempo referidas nos autos.

XII. A expressão “precipitação forte e persistente” é utilizada pelo próprio IPMA, que, afiança que naquela região a precipitação total (milímetros) – foi de 311.1 milímetros e o RRMAX/D Precipitação máxima diária (milímetros) e dia de ocorrência foi de 46.6 milímetros.

XIII. Foi, pois, pertinente o recurso ao depoimento das testemunhas que descreveram o que vivenciaram no próprio local onde aqueles factos naturais ocorreram, no caso, a testemunha A. R..

XIV. A testemunha S. M. e a testemunha J. C., que fizeram as respetivas peritagens cujos relatórios constam de fls. XX a XX, confirmaram que na altura dos factos foi uma altura atípica de ocorrência de tempestades, chuvas e ventos fortes.

XV. A testemunha S. M.

admitiu que “a causa apontada a queda do muro é a pressão exercida pela presença das águas das chuvas que se acumularam naquele local devido à sua intensidade e quantidade. O aluimento assim como o deslizamento de terras são consequência da penetração das águas nos terrenos.” (cfr. o penúltimo parágrafo do “Relatório Pericial”, a fls. XX – Doc. n.º 16).

XVI. A queda do muro como resultado da pressão exercida pelas águas das chuvas acumuladas naquele local, e bem assim o aluimento e o deslizamento de terras como consequência da penetração das águas nos terrenos e da queda do muro, são fenómenos naturais, facilmente observáveis em circunstâncias similares à descrita nos autos, tanto mais que, como observou a filha da A. L. M., o terreno ali «é em declive», o que faz com que as águas atinjam maior velocidade, gerando uma força de intensidade maior sobre qualquer obstáculo que se lhes oponha.

XVII. Pela descrição que consta do relatório a fls. XX – Doc. n.º 16, pelo que foi referido unanimemente pelas testemunhas que foram questionadas, e pelo (bem) que se conhece desta região do Minho, o muro em causa é em “pedra montada”, e já é de construção antiga.

XVIII. É, pois, de presumir que tenha obedecido às melhores regras da arte, até por ter cumprido a sua função até agora, arrostando com dias de tempestade similares e com águas da mesma intensidade. Assim, o muro não terá “sapatas estruturais” que são próprias dos muros em betão, mas terá alicerces, constituídos por pedras grandes e largas, que lhe dão estabilidade, sendo que há uma técnica especial de colocação das pedras nas camadas que se lhe sobrepõem (assentam-se desencontradamente por forma a que umas “travem” as outras). E este tipo de muro não necessita que se lhe pratiquem orifícios de escoamento das águas (como num muro de betão armado), porque eles existem naturalmente - são as fendas, os interstícios, que ficam entre as pedras.

XIX. A testemunha S. M. apresentou à A. o orçamento de valor mais baixo, que a própria Apelante juntou aos autos sob a forma de Doc. 19, declarou que o referido valor é o preço da reconstrução do muro, valor que foi corroborado pelo relatório pericial junto aos autos a fls. XX.

XX. Relativamente aos pontos e) e f), o douto Tribunal “a quo” deveria ter dado atenção ao depoimento da testemunha S. M., que foi a responsável pela reconstrução do muro, assim como ao seu relatório pericial, e não ter dado como provado esses pontos como veio acontecer.

XXI. Em relação à alínea c) dos factos dados como não provados, o que a Apelante alegou foi que no momento da subscrição do contrato de seguro, as condições gerais e particulares, bem como o conteúdo da proposta, não lhe foram comunicadas, nem entregues à A. bem como explicado o seu conteúdo, designadamente quanto as garantias, coberturas e exclusões.

XXII. A...

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