Acórdão nº 3090/20.6T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelFERNANDO BARROSO CABANELAS
Data da Resolução02 de Junho de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório: M. O., residente na Rua …, freguesia de …, concelho de Guimarães, intentou a presente Ação de Anulação de Deliberação Social contra X – COMÉRCIO, IMOBILIÁRIA, TRANSPORTES E CONSTRUÇÕES, LDA., pessoa coletiva n.º ………, com sede na Rua dos …, Edifício …, Bloco .., entrada …, sala …, …, freguesia de …, concelho de Vila Nova de Famalicão, pedindo que seja declarada a anulabilidade das deliberações sociais tomadas e devidamente identificadas nos pontos dois e três da ordem de trabalhos da Assembleia Geral realizada a 6 de março de 2020.

Citada, a R. apresentou contestação pugnando pela improcedência do pedido.

Por sentença prolatada em 27 de maio de 2021 foi decidido o seguinte: Termos em que decidindo pela total procedência da ação, anulo as deliberações tomadas relativas aos pontos dois e três da ordem de trabalhos da Assembleia Geral realizada a 6 de março de 2020. (…).

Inconformada com a decisão, a ré apelou, formulando as seguintes conclusões: a. O presente recurso é interposto da douta sentença proferida em 26/05/2021 em que o tribunal a quo deu razão à recorrida tendo decidido da seguinte forma; “Termos em que decidindo pela total procedência da ação, anulo as deliberações sociais tomadas relativas aos pontos dois e três da ordem de trabalhos da Assembleia-geral realizada a 6 de março de 2020.” b. Fundamentando a sua decisão da seguinte forma: “Em suma e interpretando desta forma a disposição estatutária em causa, concluímos estar perante um verdadeiro direito especial à gerência que foi atribuído aos sócios M. O., S. G., M. J. e J. M. e apenas a estes.”, e “Não podiam, por isso, os sócios da sociedade R. ter deliberado a alteração do n.º 2 do artigo 4.º do Pacto Social e a destituição da A. do cargo de gerente sem o seu consentimento” e “É certo que neste momento, porque todos os sócios da sociedade R. são exatamente aqueles que constam da disposição estatutária, a mesma tem a aparência de um direito geral atribuído aos sócios e não de um direito especial. Contudo, a vida das sociedades não é estática, mas sujeita a diversas alterações ao longo do tempo. A qualquer momento, as quotas da sociedade R. podem ser transmitidas. E aí sobressairá a natureza especial do direito à gerência concedido, porquanto os novos sócios não terão direito à gerência só por serem sócios, a qual permanecerá atribuída aos que estão nomeados na disposição estatutária e que mantiverem essa posição.” c. Expressamente renunciando a doutrina interpretativa dominante, nomeadamente quando refere: “Parte da doutrina portuguesa não parece aceitar direitos especiais (ou pelo menos de igual conteúdo) de todos os sócios: assim, entre outros, Brito Correia, Pereira de Cfr. Ferrer Correia, Estudos Jurídicos, II, pág. 96 e Pinto Furtado, Deliberações dos Sócios, pág. 261 In Código das Sociedades Comerciais em Comentário, Volume I, 2ª edição, Almedina, pág. 431 Almeida, Carlos Olavo, Pinto Furtado (numa primeira fase), Olavo Cunha (embora este último autor considere que podem ser atribuídos a todos os sócios direitos só derrogáveis com o respetivo consentimento).

  1. A proposta de alteração que foi decidida constava da ordem de trabalhos da deliberação que foi anulada pelo Tribunal a quo e foi votada por maioria qualificada.

  2. Não consta do pacto social expressamente vertido o princípio da inderrogabilidade dos direitos especiais, consagração essa que seria necessária ser vertida, atento que todos os sócios tinham tal direito especial.

  3. Devemos atender que a interpretação de cláusulas de pacto social constitui matéria de direito por ter de ser efetuada de harmonia com os critérios legais definidos nos artigos 236.º n.1 e 238.º n.1 do Código Civil, e em matéria de interpretação de estatutos sociais não são atendíveis elementos estranhos aos próprios estatutos e não referidos por estes.

  4. Os direitos dos sócios, como tal, podem ser gerais e especiais. Os primeiros competem por igual a todos os sócios; os segundos conferem aos seus titulares uma vantagem especial, um privilégio, uma posição de supremacia frente aos demais associados (cfr. Ferrer Correia, Estudos Jurídicos, II, pag.

    96 e Pinto Furtado, Deliberações dos Sócios, pag.

    261).

  5. Quanto a esta última espécie (direitos especiais), refere aquele primeiro Autor (ob.

    e loc.

    citados) que se trata de direitos de uma feição singular, pois não se mostram ao serviço de valores sociais ou de interesse comum a todos os sócios, mas de interesses próprios e exclusivos de um ou alguns deles. São, por certo, direitos estatutários, mas a sua função é tutelar o interesse do sócio a quem competem já em relação ao dos outros sócios, já em face do próprio interesse da sociedade.

  6. A disciplina fundamental dos direitos especiais é objeto do art. 24º do CSC, de que se destaca o direito especial à gerência.

  7. A Recorrida. não concretiza qual o seu interesse protegido concretamente, já que tal interesse em boa verdade não existe uma vez que todos os sócios tinham esse mesmo direito entre eles, e se todos têm direito, a questão é que interesse pretendiam acautelar em relação à própria sociedade.

  8. A verdade é que, a respeito das sociedades por quotas, se tem doutrinado que se a interpretação objetiva é de exigir no tocante às cláusulas que visam a proteção dos terceiros sociais, mas essa exigência se não...

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