Acórdão nº 3655/20.6T8GMR-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelJOSÉ FLORES
Data da Resolução02 de Junho de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM OS JUÍZES NA 3ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES: I – Relatório Recorrente(s): Caixa ..., S.A.; - Recorrido/a(s): V. L..

*Nos presentes autos de oposição à execução mediante embargos de executado que V. L., melhor identificada nos autos, move contra Caixa ..., SA., com os sinais dos autos, a embargante peticiona que se julgue procedente a oposição, devendo ser extinta a execução, ou, caso assim se não entenda, deve a penhora e a hipoteca serem reduzidas proporcionalmente.

Tendo sido proferido despacho liminar, a exequente veio apresentar contestação que culminou pedindo que a oposição à execução mediante embargos de executado deduzida seja julgada improcedente.

A embargante respondeu às excepções invocadas, alegando, em síntese, que a sentença proferida no apenso de reclamação e graduação de créditos da devedora originária não constitui quanto a si caso julgado, impugnando a restante factualidade alegada.

Foi proferido despacho saneador, julgando-se a instância válida e regular, improcedentes as alegadas excepções dilatórias de caso julgado e ilegitimidade alegadas pela embargante, relegaram-se para final o conhecimento das restantes excepções invocadas, fixando-se o objecto do litígio e enunciando-se os temas da prova (fls. 320/333).

A final, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, julgo a presente oposição à execução parcialmente procedente e, em consequência, declaro o prosseguimento da execução relativamente ao valor de € 10.553,22 (dez mil quinhentos e cinquenta e três euros e vinte e dois cêntimos) – artigo 732º, nº 4, do CPC.

Custas pela embargante e embargada, na proporção do decaimento.”*Inconformados com tal decisão, dela interpuseram os Embargantes o presente recurso de apelação, em cujas alegações formulam as seguintes conclusões: I. A douta decisão recorrida não deve manter-se pois não consagra a justa e correta aplicação das normas legais e dos princípios jurídicos aplicáveis.

  1. Os Embargos apresentados resultam da ação executiva intentada pela aqui Recorrente contra a adquirente de uma das frações hipotecadas, por força do direito de sequela de que goza a hipoteca constituída a seu favor (cf. n.ºs 2 e 3 do art. 54.º do Código de Processo Civil).

  2. Os argumentos expendidos pela sentença determinam que a fração da Recorrida hipotecada a favor da Recorrente responda, não pela totalidade do crédito exequendo, mas pelo montante exequendo, calculado em proporção à sua permilagem, considerada aquando da propriedade horizontal estabelecida.

  3. Ou seja, da quantia exequenda, manter-se-á apenas a garantia correspondente à quota parte respeitante à fração da Recorrida, atenta a sua permilagem.

  4. O que significa uma renúncia do Banco Exequente à indivisibilidade da hipoteca, que não ocorreu e que configura uma imposição de redução da sua garantia real que a Recorrente não pode aceitar, que configura uma violação expressa do disposto nos artigos 686º, 691º, 696º, todos do Código Civil.

  5. A indivisibilidade da hipoteca consubstancia-se no facto de a hipoteca se estender a toda a coisa onerada, a cada uma das suas partes e, no caso de pluralidade de coisas, a todas elas indiscriminadamente.

  6. A garantia conserva, assim, o seu objeto originário, ainda que se verifique divisão da coisa ou de crédito, ou este se encontre em parte extinto, e ainda que, sendo oneradas várias coisas, cada uma delas responde pela dívida inteira.

  7. A indivisibilidade da hipoteca não obsta, assim, à divisão da coisa onerada, mas cada fracção, resultante da divisão, ficará a garantir a dívida na totalidade.

  8. Houve distrate de algumas das fracções, mas tal aconteceu em data anterior ao incumprimento do contrato pela devedora originária.

  9. E foram todas autorizadas pela Recorrente em data anterior ao incumprimento.

  10. As vendas de imóveis hipotecados à Recorrente realizadas após o incumprimento deram-se todas no âmbito da liquidação de bens apreendidos no processo de insolvência da sociedade mutuária.

  11. No âmbito do processo de insolvência não subsiste outra opção ao credor hipotecário senão anuir à venda das verbas apreendidas a favor da massa insolvente pelo valor de avaliação de cada um dos imóveis (que define o valor base e mínimo de venda dos bens) e, bem assim, ao produto de venda que seja possível obter através da alienação judicial dos imóveis.

  12. Não existiu qualquer acordo com a devedora, muito menos relativamente ao distrate de qualquer fração por valor algum após o incumprimento da sociedade mutuária.

  13. Nem da concordância do credor hipotecário na venda judicial dos bens por um determinado valor num processo de insolvência dos imóveis hipotecados se pode retirar um qualquer acordo quanto à divisibilidade da hipoteca, bem pelo contrário.

  14. o credor hipotecário apenas anuiu (nem lhe era juridicamente possível qualquer oposição) às alienações de todas as frações que cumpriam o requisito de, comprovadamente, serem os valores máximos que era possível obter, escrutinado o mercado, pelo produto da venda daqueles bens.

  15. Uma vez que estas são alienadas pelo valor de avaliação ou, pelo menos, pelo valor máximo que for possível obter no âmbito das várias tentativas de alienação que vão sendo realizadas no processo.

  16. A Recorrente não tinha conhecimento do contrato que foi celebrado entre a devedora originária e a Recorrida, nada consta no título executivo quanto a qualquer possibilidade de divisão de hipoteca e nada se convencionou quanto a esta matéria, não tendo sido feito qualquer compromisso sobre a incidência do valor de cada imóvel de acordo com uma permilagem.

  17. As vendas foram todas negociadas caso a caso, por acordo entre as partes, num contexto muito diferente a uma cobrança coerciva de créditos.

  18. Até à presente data, não foi pago qualquer valor à Recorrente pela aquisição da fração aqui em causa.

  19. Alterando-se as circunstâncias decisivas da autorização para quaisquer vendas e consequente emissão de distrate, obviamente que qualquer acordo do credor com terceiros celebrado há vários anos em circunstâncias claramente diferentes jamais poderá ser extensível ao caso em apreço.

  20. O distrate emitido pela Recorrente em casos distintos significa tão só uma normal redução do valor da dívida.

  21. A convenção em contrário à indivisibilidade, a que alude o disposto no artigo 696º, do CC, não diz respeito nem se confunde com os distrates para libertar frações hipotecas, à medida do recebimento pelo credor.

  22. Ficou expressamente convencionado entre as partes no título executivo que a hipoteca sobre o imóvel originário incide sobre todas as construções e benfeitorias que se venham a realizar no imóvel, o que, aliás, consta dos factos provados na sentença.

  23. A nível registral, a hipoteca constituída a favor da Exequente foi registada em momento anterior à aquisição da propriedade, quer por parte da Recorrida, quer por parte dos anteriores adquirentes.

  24. O registo predial tem um efeito essencialmente concernente à publicidade e boa-fé dos negócios, uma vez que permite averiguar o cadastro de transmissões e proprietários de determinado bem.

  25. Assim, as hipotecas (necessariamente registadas) são válidas e eficazes “inter partes” e “erga omnes”.

  26. É sobre os compradores que, a cada momento, cumpre averiguar qual a real e efetiva situação hipotecária.

  27. A indivisibilidade mantém-se ainda que haja cumprimento parcial do crédito garantido.

  28. O afastamento do princípio geral da indivisibilidade da hipoteca tem de ser sempre convencionado, e essa convenção tem de ser expressa ou, pelo menos, inequívoca, ou seja, constar escritura hipotecária ou, sendo dada em momento ulterior, constar de um qualquer documento, por exemplo, alterando-se no registo predial o valor máximo garantido pela hipoteca, o que não aconteceu.

  29. Não há nada que permita concluir que houve acordo, sequer tacitamente, do credor quanto à divisibilidade da hipoteca.

  30. Na escritura não consta essa convenção em contrário à indivisibilidade mas precisamente o contrário.

  31. O princípio da indivisibilidade da hipoteca impede que se admita a expurgação desta unilateralmente e sem o consentimento do credor quando não seja paga a totalidade da dívida.

  32. A hipoteca constituída a favor da Recorrente e que incide sobre a fração autónoma que é propriedade da Recorrida garante o pagamento da totalidade da quantia exequenda atualmente em dívida, já que, enquanto subsistir o crédito, ela habilita o seu titular a atingir a coisa onde esta se encontrar.

  33. Por força do direito de sequela, assistia à Recorrente, o direito de reclamar judicialmente o seu crédito e obter o seu ressarcimento através do produto da venda do imóvel, o que legitimamente fez.

  34. A Recorrente nunca assumiu qualquer obrigação, face à devedora originária ou a qualquer terceiro, a obrigação de libertar as frações oneradas com a referida hipoteca sem que para tal recebesse o crédito total por estas garantido.

  35. O Banco Exequente não aceitou a divisibilidade da hipoteca em apreço, antes foi reduzindo voluntariamente a hipoteca em relação a determinadas frações, à medida que foi recebendo parcialmente o seu crédito, em data anterior ao incumprimento, sendo certo que nada recebeu em data ulterior.

  36. Enquanto subsistir dívida garantida e enquanto se mantiver válida e subsistente a hipoteca - o que se verifica nestes autos - assiste ao Banco o direito de exigir o pagamento do crédito ainda em dívida, coberto pela garantia devidamente registada a seu favor, pelo produto da venda da fração penhorada nos autos.

  37. O crédito exequendo encontra-se garantido por hipoteca constituída e devidamente registada sobre a fração autónoma propriamente dita, contendo um valor concreto de capital e de montante máximo garantido.

  38. Assim, o Tribunal a quo, ao ter julgado parcialmente procedentes os embargos de...

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