Acórdão nº 925/22.2T8GMR-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Outubro de 2022
Magistrado Responsável | CONCEIÇÃO SAMPAIO |
Data da Resolução | 06 de Outubro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I – RELATÓRIO M. J. e A. B. intentaram a presente ação contra X Portugal - Companhia de Seguros de Vida, S.A., formulando os seguintes pedidos: 1. ser declarada nula, por ser abusiva e contrária à boa fé contratual, o segmento da cláusula 1.3. do contrato de seguro de vida, na parte em que exige para a verificação da cobertura “invalidez total e definitiva”, a necessidade de recorrer, de modo contínuo à assistência de uma terceira pessoa para efetuar os atos normais da vida diária, devendo ser considerada como não escrita e, em consequência, ser a demandada X condenada: a) a reconhecer a situação de invalidez total e definitiva da Demandante M. J., por doença, com data de 2 de setembro de 2008 ou outra que se venha a fixar, e que a mesma se encontrava garantida pela apólice de seguro associada ao contrato de mútuo celebrados pelos Demandantes com o banco ...; b) a pagar à instituição de crédito ..., S.A., beneficiária do contrato de seguro, o montante que se encontrar em dívida, correspondente ao capital seguro, à data 2 de setembro de 2008 ou outra data que se venha a fixar para a verificação da invalidez total e definitiva; c) a reembolsar os demandantes, nos valores que que se venham a apurar, a título de prémio de seguro, que pagaram à Demandada X, desde a data da declaração de invalidez total e definitiva da Demandante M. J. até à assunção da responsabilidade, acrescida de juros legais a contar da interpelação da demandada para pagamento e, dos juros vincendo a contar da citação.
d) a reembolsar os demandantes de todas as prestações (capital, juros, comissões) para liquidação e amortização do empréstimo que pagarem ao ..., desde a data da declaração de invalidez total e definitiva da Demandante M. J. até à assunção da responsabilidade, acrescida de juros legais a contar da interpelação da demandada para pagamento e, dos juros vincendo a contar da citação.
A Ré apresentou contestação, impugnado os factos alegados e deduziu o incidente de intervenção principal provocada de Banco ..., S.A. invocando, para o efeito, ser este titular de interesse igual ao dos autores, fundamentando que em face dos factos alegados pelo Autor e pela Ré, o banco é o beneficiário dos contratos de seguro dos autos e, portanto, o capital seguro, a ter que ser entregue por força de um sinistro, terá que o ser àquela instituição bancária. Conclui requerendo intervenção principal provocada do banco, por ser este titular de interesse igual ao dos autores.
Apreciando o incidente de intervenção de terceiros, o tribunal proferiu o seguinte despacho: «Na esteira da jurisprudência consagrada nos Acs RP de 12/7/2017 e da RG de 19/10/207 (ambos in www.dgsi.pt)., é de admitir a intervenção da citada seguradora, não como interveniente principal do lado passivo, mas como parte acessória dos Réus, convolação a que se procede.
Pelo exposto, decide-se deferir parcialmente o incidente, admitindo-se a intervir nos autos de Banco ..., S.A mas como parte acessória da Ré Seguradora– artigo 321º CPC.
Custas a cargo da Ré.
Notifique e cite a chamada (artigo 323º, nº1 CPC).»*É deste despacho que o interveniente Banco ..., S.A. vem recorrer, formulando as seguintes conclusões (transcrição): i. O presente recurso vem interposto do douto despacho proferido pelo Tribunal a quo melhor identificado nos autos pela referência 178992547 do processo electrónico, o qual deferiu a intervenção da ora Recorrente na qualidade de parte acessória da Ré; ii. Convolando, assim, a intervenção principal do lado activo que havia sido peticionada pela Ré; iii. Trata-se de um despacho do qual – por pôr termo a incidente processado autonomamente – cabe apelação autónoma, nos termos da alínea a) do número 1 do artigo 644.º do Código de Processo Civil; iv. E tem a ora Recorrente legitimidade para dele interpor recurso porquanto, mesmo não tendo sido parte no incidente, é por ele directa e efectivamente prejudicada; v. O despacho recorrido, na sua fundamentação, invoca dois arestos sem proceder à sua individualização de forma inequívoca; vi. Enfermando, pois, do vício da ininteligibilidade, por um lado, e da falta de fundamentação, por outro.
vii. Aludindo, aliás, ao facto de ser a interveniente ora Recorrente uma seguradora quando, na realidade, se trata de um banco; viii. Enfermando, pois, do vício de contradição entre os fundamentos e a decisão; ix. Motivo pelo qual enferma o despacho recorrido de nulidade, nos termos das alíneas b) e c) do número 1 do artigo 615.º, aplicável ex vi número 3 do artigo 613.º, ambos do Código de Processo Civil; x. Sem conceder e por cautela de patrocínio, admitindo-se que o despacho recorrido não enferma de nulidade, o mesmo padece de erros de direito que suscitam a necessidade da sua substituição; xi. Aparenta assentar, ainda que, como visto supra, sem certezas, o despacho recorrido no entendimento de que, à semelhança do que sucede com os seguros facultativos de responsabilidade civil, nos quais, segundo os arestos que se reputam por invocados, o segurador assume a posição de parte acessória dos réus, a ora Recorrente deveria assumir idêntica posição nos autos, ficando como parte acessória da Ré seguradora; xii. No desenho que autores e Ré nos presentes autos fizeram da relação jurídica controvertida, a ora Recorrente assume-se como titular do direito a receber da Ré seguradora uma prestação pecuniária em caso de sinistro; xiii. Assumindo-se enquanto beneficiária irrevogável do seguro de vida que constitui causa petendi dos presentes autos; xiv. Sendo, com efeito, titular de interesse igual ao do autor; xv. E, estando em discussão nos autos a existência ou não da obrigação da Ré seguradora de cobrir dada situação fáctica alegada pelos autores, é necessária, para que a decisão regule definitivamente a situação concreta das partes relativamente ao pedido formulado, a intervenção da ora Recorrente; xvi. Existindo, pois, uma situação de litisconsórcio necessário activo, nos termos dos números 2 e 3 do artigo 33.º do Código de Processo Civil; xvii. E, mesmo que se entenda que a situação sub judice consubstancia tão-só litisconsórcio voluntário, é outrossim de se reconhecer à Ré a possibilidade de, tal como o fez, de proceder ao chamamento da ora Recorrente para intervir na lide ao lado dos autores, nos termos da alínea b) do número 3 do artigo 316.º do Código de Processo Civil; xviii. Inexistindo, em todo o caso, porquanto não alegado por Autores e Ré nos articulados, qualquer direito de regresso contra a ora Recorrente, motivo pelo qual nunca seria de se aplicar a intervenção acessória, nos termos do número 1 do artigo 321.º do Código de Processo Civil; xix. Tendo, portanto, o Tribunal a quo violado, na sua decisão, os artigos 33.º, 311.º, 316.º e 321.º, todos do Código de Processo Civil; xx. Devendo, pois, ser revogado o despacho recorrido e ser concomitantemente substituído por decisão que defira a intervenção principal da ora Recorrente no lado activo da instância.
*Não foram apresentadas contra-alegações.
*Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar e decidir.
*II – DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO As questões decidendas a apreciar, delimitadas pelas conclusões do recurso, são as seguintes: i) da nulidade da decisão; ii) no âmbito de um contrato de seguro de grupo contributivo, deduzido o incidente de intervenção de terceiros, em que qualidade deve intervir o banco tomador do seguro: intervenção acessória ou...
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