Acórdão nº 1068/21.1T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 27 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelAFONSO CABRAL DE ANDRADE
Data da Resolução27 de Outubro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I- Relatório A. S.

& FILHOS, S.A.

, NIPC ………, com sede na Rua …, n.

º …, Vila Nova de Famalicão, intentou a presente acção de processo comum contra CONSTRUÇÕES G. C.

, S.A.

, NIPC ………, com sede na Rua …, n.

º …, Vila Nova de Famalicão e X – ENGENHARIA, S.A.

, NIPC ………, com sede na Rua …, n.

º …, pedindo: i) seja a 1.

ª ré condenada a restituir à autora a garantia bancária número ...........49, emitida pelo Banco ...

, S.A., assim como comunicar à instituição bancária o seu cancelamento; ii) seja a 1.

ª ré condenada ao pagamento dos encargos suportados até à data, com a manutenção indevida da garantia bancária n.

º ...........49, no valor de € 721,00 (setecentos e vinte euros); iii) seja a 2.

ª ré condenada a restituir à autora a garantia bancária número ................50, emitida pelo Banco ...

, S.A., assim como comunicar à instituição bancária o seu cancelamento; iv) seja a 2.

ª ré condenada ao pagamento dos encargos suportados até à data, com a manutenção indevida da garantia bancária n.

º ...........49, no valor de € 721,00 (setecentos e vinte euros); v) sejam as rés condenadas ao pagamento da indemnização pelos danos de natureza não patrimonial no montante nunca inferior a € 2.000,00 (dois mil euros); vi) acrescidos a todos os montantes supra referidos os juros de mora calculados à taxa legal, com custas e procuradoria.

Para tanto alegou a autora, em síntese, que celebrou um contrato de subempreitada com as rés, no âmbito do qual prestou, a solicitação destas, duas garantias bancárias on first demand para garantia do cumprimento das obrigações contratuais, não tendo as rés devolvido à autora as preditas garantias, apesar de concluída a obra executada pela autora e de ter a mesma sido definitivamente recepcionada.

As rés contestaram, excepcionando o cumprimento defeituoso do contrato pela autora, invocado a verificação de defeitos e anomalias nos trabalhos executados pela autora, que a mesma não corrigiu, apesar de interpelada para o efeito, não tendo ainda ocorrido a recepção definitiva da obra, mantendo-se ainda as garantias bancárias prestadas pelas rés ao dono da obra, não se verificando, por conseguinte, as condições para a liberação pelas rés das garantias bancárias prestadas pela autora.

A autora respondeu, pugnando pela improcedência da matéria de excepção arguida pelas rés.

Foi proferido despacho saneador, onde se aferiu da verificação da totalidade dos pressupostos processuais, identificou-se o objecto do litígio e enunciaram-se os temas da prova.

Realizou-se a audiência final, com observância das formalidades legais, conforme emerge das actas respectivas.

A final foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente e em consequência absolveu as rés do pedido.

Inconformada com esta decisão, a autora dela interpôs recurso, que foi recebido como de apelação, a subir imediatamente nos próprios autos, com efeito meramente devolutivo (artigos 629º,1, 631º,1, 637º, 638º,1, 644º,1,a), 645º,1,a) e 647º,1 do Código de Processo Civil).

Termina a respectiva motivação com as seguintes conclusões: I.

Na verdade, a Recorrente entende, e salvo o devido respeito por melhor opinião, qua a matéria de facto e de Direito sujeita a exame pelo Tribunal recorrido merece outra apreciação, no que toca à verificação dos pressupostos para a liberação pelas rés das garantias bancárias prestadas pela Autora, pelo que, atendendo às declarações prestadas pelas testemunhas em sede de audiência e julgamento e a prova documental apresentada impunha-se uma decisão diferente, conforme se procurará demonstrar.

II.

A Apelante impugna, nos termos do art.º 640.º do CPC, a decisão que recaiu sobre a matéria de facto constante: 1. Dos Factos Provados: (Factos alegados pelas rés) “16) Aquando da vistoria pelo dono de obra realizada a 14.03.2017, verificaram-se as seguintes anomalias nos trabalhos realizados pela autora na referida obra na Escola ...: ● No Bloco D – Piso 0 – IS – Masculino, verifica-se um escorrimento de água por trás do urinol; ● Na sala D.O.21, existe uma ruptura de água na bancada; ● As caixas de extintores fornecidas pela autora não foram aprovadas.

19) A autora, após verificação no local das referidas anomalias não procedeu à sua reparação.” 2.

Dos Factos Não Provados (Factos alegados pela autora)

  1. Já ocorreu a recepção definitiva da empreitada na qual foram realizados os trabalhos pela autora mencionados em 2) dos factos provados.

    III.

    Ao contrário do decidido como facto provado, em particular o ponto 16) “As caixas de extintores fornecidas pela autora não foram aprovadas”, o tribunal recorrido deveria ter determinado como não provado esse ponto porque a escola em 2012 entrou em funcionamento com as caixas de extintores aplicadas.

    IV.

    Desde 2012 que a escola entrou em funcionamento a caixas de extintores não foram substituídas, como tal não podem ser consideradas como um defeito/anomalia e muito menos da responsabilidade da Autora.

    V.

    A Recorrente entende que ocorreu uma recepção tácita da obra pelo dono da obra, visto que tomou definitivamente posse dela e a colocou ao serviço da finalidade para que foi construída, remodelada - uma escola (Neste sentido, Staphane Branconnier, apud Jorge Andrade da Silva, Regime Jurídico das Empreitadas…, cit., pág. 636, nota 615; no mesmo sentido, Vaz Serra, BMJ 145, pág. 168).

    VI.

    Por um lado nos termos do disposto no artigo 1208.º do Código Civil (doravante CC) cabe ao empreiteiro executar a obra em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios.

    VII.

    Por outro lado, o artigo 1218.º do CC o dono da obra deve verificar, antes de a aceitar, VIII.

    O dono de obra tem de demonstrar a sua gravidade, de molde a afectar o uso ou a acarretar uma desvalorização da coisa.

    IX.

    Ao empreiteiro cabe a prova de que a obra foi realizada de acordo com critérios superiores ao padrão médio, não havendo, como tal, uma diminuição da qualidade ou do valor da obra.

    X.

    As caixas de extintores continuam a existir desde o dia do funcionamento da escola, ou seja, desde Setembro de 2012.

    XI.

    E assim, conseguiu a Recorrente afastar a presunção de culpa do art. 342.º, n.º 1 e 799º, n.º 1, ambos do CC.

    XII.

    O empreiteiro tem uma obrigação de resultado, e tem-se admitido que, após a entrega da coisa, a natureza da responsabilidade do empreiteiro enquadra-se numa situação de garantia.

    XIII.

    Quando o Tribunal a quo refere, “Por sua vez, os factos assentes em 16) e 19) , alegados pelas rés a título de excepção, além de não terem sido alvo de impugnação especificada pela autora (cfr. Artigos 574.º, n.º 2, e 587.º, n.º 1, ambos do Código Processo Civil), antes expressamente assumindo a autora que verificou no local tais anomalias e não procedeu à sua reparação ou eliminação (vide artigo 29.º da resposta que apresentou nos autos a 06.09.2021) – a Recorrente impugna e não concebe o que se refere, XIV.

    Porquanto, percorrendo o articulado de resposta da Autora, sobretudo nos artigos 20, 21., 22, 24, 25, 26, XV.

    Verifica-se que houve impugnação especificada pela autora, nos termos dos art. 574.º, n.º 2 e 587.º, n.º 1 do CPC.

    XVI.

    O ónus de impugnação especificada é cumprido quando o impugnante apresente uma versão dos eventos essencialmente contraposta à da outra parte.

    XVII.

    E a Recorrente no artigo 29.º do seu articulado de resposta refere que: ”29. A autora, após a verificação no local dos “defeitos e anomalias” não procedeu à sua reparação ou eliminação, conforme alegam, porque não se enquadravam no âmbito da sua especialidade e responsabilidade, conforme o anteriormente relatado e comprovado pelos documentos juntos.” XVIII.

    A recepção da obra objecto da empreitada é uma decorrência da natureza sinalagmática do contrato, concretizando a contraprestação do empreiteiro que, por isso, recebe um preço. Constitui, portanto, o modo natural e normal de extinção do contrato – o seu cumprimento.

    XIX.

    A assistência do empreiteiro é apenas promovida no sentido da defesa dos seus interesses.

    XX.

    O prazo de garantia de cinco anos terá que contar-se a partir da entrega da obra – veja-se artigo 1225.º n.º 1 do Código Civil (doravante CC) – entendendo-se esta entrega como a efectiva incorporação em obra dos trabalhos realizados pelo subempreiteiro. (cfr. Ac. Tribunal da Relação de Guimarães, Proc. n.º 1473/09.1TBBRG – G1) XXI.

    Importa considerar que o Código Civil, nos arts. 1220.º n.º 1, 1224.º e 1225.º estabeleceu prazos de caducidade para a denúncia dos defeitos da obra e para o exercício dos direitos que são conferidos ao dono da obra. Não se trata de prazos de prescrição (Cf. Pedro Romano Martinez, Direito das Obrigações…, cit., pág. 493).

    XXII.

    Se assim não fosse, os direitos do dono da obra poder-se-iam protelar no tempo, com o inconveniente da insegurança jurídica que adviria para o empreiteiro. Aliás, esses prazos de caducidade, curtos, foram estabelecidos no interesse do empreiteiro, a fim de os desvincular das responsabilidades emergentes dos defeitos da obra no caso de inércia do dono da obra.

    XXIII.

    Decorre do art. 1225.º n.º 2 do CC que se após a aceitação se o dono da obra nela detectar defeitos deve denunciá-los ao empreiteiro no prazo de um ano a contar sua da descoberta.

    XXIV.

    Nos termos do art. 1225. nº 2 do CC que “…a indemnização deve ser pedida no ano seguinte à denúncia.”.

    XXV.

    Por outro lado, não foi alegado e provado que, durante o período da garantia, a Recorrida tivesse invocado qualquer direito de crédito sobre a Recorrente (defeito ou anomalia), no exercício da mesma garantia, tendo esta caducado, pelo decurso do prazo.

    XXVI.

    Nos termos do n.º 1 do artigo 1225.º do CC no caso de imóveis destinados a longa duração, o prazo de garantia de 5 anos inicia-se a contar da entrega ou do decurso do prazo de garantia convencionado. E, por isso, ainda que se considerasse que não seria possível o cômputo do prazo de garantia convencionado pela inexistência do acto formal de recepção definitiva (o que não se concede), sempre o prazo de...

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