Acórdão nº 3549/21.8T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Março de 2022
Magistrado Responsável | JOSÉ ALBERTO MOREIRA DIAS |
Data da Resolução | 17 de Março de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães no seguinte: I- RELATÓRIO F. C.
e mulher, M. C., residentes na Travessa …, concelho de Barcelos, instauraram a presente ação especial para acordo de pagamento, alegando, em síntese, que, para auxiliarem os filhos nas atividades destes, exercida através de sociedades, e a fim de permitirem a viabilização económica dessas sociedades, aceitaram ser seus avalistas e dar os prédios da sua propriedade de hipoteca às entidades bancárias financiadoras; acontece que fruto do estado de crise financeira, as referidas sociedades começaram a registar incumprimentos no pagamento das suas responsabilidades, o que degenerou na propositura de ações judiciais (que identificam) contra os requerentes, na qualidade de avalistas; não obstante, os requerentes reúnem condições para recuperar, porquanto, os seus ativos imobiliários são superiores ao passivo, estão empenhados em angariar fundos para obviar às suas obrigações e existe disponibilidade dos seus credores em encetarem negociações tendentes a concluir um acordo conducente à revitalização dos requerentes, por meio da aprovação de um plano de pagamento.
Juntaram, entre outros documentos, certidões de nascimento e de casamento, declaração subscrita pelos próprios e pela credora “Cooperativa Agrícola de ..., CRL”, em que manifestam ser sua vontade encetarem negociações conducentes à elaboração de um acordo de pagamento, e lista das ações de cobrança de dívida que pendem contra os requerentes.
Finalmente, requerem que seja nomeado administrador judicial provisório o Senhor Dr. F. J., que melhor identificam.
Por despacho proferido em 24/06/2021, a 1ª Instância proferiu despacho de admissão do presente processo, em que nomeou como administrador judicial provisório o Senhor Dr. F. J., que declarou aceitar essa nomeação.
Em 20/07/2021, o administrador judicial provisório apresentou a lista provisória de créditos, a qual não foi objeto de impugnação.
Por requerimento entrado em juízo em 24/09/2014, os requerentes e o administrador de insolvência requereram a prorrogação do prazo para concluir as negociações em curso, pelo período de um mês.
Em 27/10/2021, os requerentes juntaram aos autos acordo de pagamento aprovado por maioria dos seus credores, requerendo que fosse publicado anúncio no portal Citius, com as advertências constantes do n.º 2 do art. 222º-F do CIRE, na qual é proposto o seguinte acordo de pagamento: “A) Estado - Autoridade Tributária e Aduaneira - Nos termos do estatuído nos nºs. 3, 4, 5 e 6 do art.º 196º do CPPT e do Decreto-Lei n.º 73/99, de 16/03, os valores em dívida vencerão juros à taxa anual que vier a ser estipulada pela AT, após análise que efetuarão à renúncia dos credores privados e garantias prestadas; - Nos termos previstos na legislação acima referida, concretamente o n.º 5 do artigo 196.º do CPPT, a quantia exequenda, custas e juros de mora não perdoados, serão liquidados em regime prestacional, concretamente até 5 prestações, não podendo nenhuma delas ser inferior a 01 unidade de conta; - A primeira prestação vence-se no mês seguinte à data da sentença homologatória do Acordo de Pagamento; - Manutenção das garantias existentes nos termos do n.º 13, do art.º 199.º do CPPT; B) Estado - Instituto de Gestão Financeira e Segurança Social - O pagamento da dívida reconhecida no PEAP em 01 prestação, mensal e sucessiva, com o vencimento da 1.ª prestação a ocorrer no mês seguinte à data de aprovação do acordo de pagamento; - As ações executivas pendentes para cobrança de dívida à Segurança Social não são extintas mantendo-se suspensas após aprovação e homologação do plano de revitalização até integral cumprimento do plano de pagamento que venha a ser autorizado; - Taxa de juros de mora aplicáveis às dívidas ao Estado e outras entidades públicas; - Dispensa de garantias nos termos do artigo 199.º, n.º 13 do CPPT; C) Créditos Garantidos e Comuns - Período de carência de capital de 18 meses, iniciados após trânsito em julgado da sentença de homologação do Acordo de Pagamento; - Pagamento de 100% do capital em dívida em 150 prestações mensais iguais e sucessiva, com início após o decurso do período de carência de capital; - A primeira prestação terá vencimento no último dia do mês que decorrer o termo do período de carência que é de 18 meses; - Perdão de juros de mora, juros vencidos e vincendos; - Manutenção das garantias constituídas, referente à hipoteca sobre os bens”.
Em 09/11/2021, o administrador judicial provisório juntou aos autos o mapa de votação e os votos e, bem assim a ata de abertura destes, em que se vê que os credores Caixa ... e P. J., S.A., votaram contra a aprovação do acordo de pagamento apresentado pelos requerentes.
Por sua vez, os credores Caixa ..., CRL, Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, I.P., Cooperativa Agrícola de ..., CRL, e Administração Fiscal votaram favoravelmente à aprovação desse acordo de pagamento.
Na ata de abertura dos votos elaborada pelo administrador judicial provisório lê-se, além do mais, que “(…) tomando em consideração a totalidade de votos emitidos, aferiu-se que os votos emitidos perfazem 100% do total dos credores relacionados com direito de voto, representando os votos favoráveis 61,13% dos votos emitidos, (…). Assim, considerando o disposto na alínea b) do n.º 3 do art. 22º -F do Código da Insolvência e Recuperação de Empresas, a proposta de acordo de pagamento apresentada pelos devedores encontra-se aprovada, por se ter verificado a maioria dos votos emitidos favoravelmente nos termos das disposições legais acima citadas”.
Por sentença proferida em 15/11/2021, a 1ª Instância homologou o plano de pagamento, constando essa sentença da seguinte parte dispositiva: “Pelo exposto, ao abrigo do disposto no art. 222º-F, n.º 5, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, homologo, por sentença, o acordo de pagamento apresentado pelos devedores, ora junto aos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
*Custas pelos devedores, nos termos do art. 222º - F, n.º 9, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
Fixo à ação o valor de € 5000,01 - art. 301º, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas”.
Inconformada com o assim decidido, a credora P. J., S.A., interpôs o presente recurso de apelação, em que formula as seguintes conclusões: I.
Não pode a ora Recorrente conformar-se com a decisão do Tribunal “a quo” de 15/11/2021 (sentença proferida nos autos com refª Citius 176050393) quanto à “aprovação do Acordo de pagamento (artigo 222º F, n.º 3 do CIRE)”.
II.
Ab initio de referir concordar a Recorrente com a douta sentença no que se refere à “Remuneração do Sr. AJP”, isto é, quanto aos pontos I. a V.
III.
A nossa discordância com a decisão do Tribunal “a quo” funda-se em aspetos sobre factos e em questões de direito que serviram de fundamento à douta sentença proferida, que aprovou a homologação do Acordo de Pagamento (“Da aprovação do Acordo de Pagamento (artigo 222ºF, n.º 3 do CIRE)”, atendendo à situação manifestamente mais desfavorável que resulta da simples e célere liquidação do ativo.
IV.
Na douta sentença foi homologado o plano de pagamento aos credores com recurso ao artigo 222.º-F, n.º 3 CIRE, alínea b) e das alíneas a) e b) n.º 4 do artigo 222º F do CIRE, isto é, in casu votaram todos os credores tendo o Plano “…recolheu o voto favorável de mais de metade da totalidade dos créditos relacionados com direito de voto, sendo que mais de metade destes correspondem a créditos não subordinados”.
V.
Assim sendo, considerou o Tribunal “a quo” estar preenchida a alínea b) do n.º 3 do artigo 222ºF do CIRE, tendo concluído por “O Acordo de pagamento foi aprovado”.
VI.
Quanto à “Homologação do Plano” remete o douto Tribunal “a quo” para os artigos 215º e 216º ambos do CIRE, concluindo e tomando como “Decisão”: (…) “…ao abrigo do disposto no art. 22ºF, n.º 5 do CIRE, homologo, por sentença, o acordo de pagamento apresentado pelos devedores, ora junto aos autos e cujo teor se dá por integralmente reproduzido”.
VII.
Contudo, salvo melhor opinião, a douta sentença é totalmente omissa quanto a outros aspetos de facto e de Direito, que, em nosso entendimento, inquinam a douta sentença.
VIII.
Desde logo, sempre se poderia considerar que o preceito legal do artigo 212º, nº2 a) e b) do ClRE não é aplicável ao processo especial de revitalização, mas antes ao plano de insolvência, pois o Dec-Lei 26/2015, de 26/2, introduziu uma nova redação no art. 17º-F, nº3, do CIRE, tendo o legislador expurgado a remissão para o art. 212° do CIRE.
IX.
Com efeito, nos termos do n.º 4 do artigo 222.º-I do CIRE é aplicável à homologação do plano de pagamentos o disposto nos artigos 215.º e 216.º do CIRE aplicável à não homologação do plano de insolvência.
X.
A douta sentença também fez tábua rasa ao disposto no artigo 216.º n.º 1 alínea a) do CIRE o qual dispõe que o juiz recusa a homologação do plano a pedido de algum credor que demonstre, em termos plausíveis, que a sua situação ao abrigo do plano é previsivelmente menos favorável do que a que interviria na ausência de qualquer plano, o que é o caso sub judice. (negrito nosso) XI.
Atendendo ao incumprimento contratual ocorrido a 21 de agosto de 2014 (contrato de mútuo com garantia hipotecária n.º ………………….00) e 7 de agosto de 2016 (cartão de crédito n.º ………………….00 de F. R.), o contrato de mútuo e de utilização de cartão de crédito consideram-se resolvidos por incumprimento definitivo, quando ocorre a falta de pagamento de uma ou mais prestações, estando por isso a dívida vencida e sendo exigível desde agosto de 2014 e agosto de 2016, respetivamente.
XII.
Ao contrato de mútuo com hipoteca (e de utilização de cartão de crédito) houve alteração das circunstâncias – resolução contratual (artigo 437.º do Código Civil) – atendendo a incumprimento definitivo, por falta de pagamento de uma ou mais prestações (artigos 432º, artigo 1142...
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