Acórdão nº 225/20.2T8MAC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 05 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelANIZABEL SOUSA PEREIRA
Data da Resolução05 de Maio de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES:*I - Relatório (que se transcreve): A. J.

, casado, residente na Praceta …, Vila Nova de Gaia, veio instaurar a presente ação especial de prestação de contas contra A. C.

, contribuinte fiscal n.º ……… e cônjuge R. P.

, contribuinte fiscal n.º ………, residentes na Rua … Macedo de Cavaleiros.

Alegou, para tanto e em síntese, que: - É neto de B. A., que faleceu em ..-03-2004 e seu único herdeiro legitimário; - B. A. deixou instituído que a sua herança seria dividida em 3 partes iguais, uma terça parte ficaria para o réu, uma terça parte para C. G. e uma terça parte em comum para as sobrinhas A. A. e C. A.; - Instaurou ação declarativa de redução daquelas deixas testamentárias, por inoficiosidade, que correu termos no extinto Tribunal Judicial de Macedo de Cavaleiro sob o n.º 203/07.7TBMCD, onde, por sentença transitada em julgado, lhe foi reconhecido o direito de ver reduzidas, por inoficiosidade, aquelas deixas testamentárias, na medida do necessário para que a sua legítima ficasse preenchida; - Antes de falecer, B. A. constituiu o réu como procurador e mandatário; - O réu, abusiva e ilicitamente, apoderou-se de todos os bens que pertenciam a B. A., tais como valores em numerário, objetos de ouro e prata, móveis e imóveis de elevado valor; - Invocando a qualidade de mandatário de B. A., o réu efetuou, entre outros atos, vendas de vários prédios que eram propriedade daquela, celebradas no Cartório Notarial de Macedo de Cavaleiros, pelos quais recebeu, no mínimo, a quantia de 8.175.000$00, equivalente à quantia de € 40.776,73; - Há, ainda, prédios rústicos e urbanos propriedade de B. A. que estão a ser possuídos e usufruídos pelo réu; - O réu não prestou contas a B. A., nem lhe entregou qualquer quantia; - O réu apoderou-se de todos os bens e valores que B. A. guardava na sua casa de habitação e todas as peças em ouro e prata que a mesma possuía, designadamente, cordões, anéis, alianças, e outras peças de ouro, objetos decorativos como baixelas em prata e estatuetas de escultura sacra, roupas diversas como toalhas, bordados, lençóis e todo o demais recheio da casa, cujo valor era, no mínimo, à data, de 200.000$00, equivalente a € 997,60; - O réu integrou os valores identificados no património comum do casal, apropriando-se de um total equivalente a € 41.774,33, a que acrescem juros no montante de € 34.492,70; - Por carta registada de 10-02-2010, requereu ao réu que prestasse todas as informações relativas às execuções do referido mandato, e as respetivas contas, com indicação expressa de onde se encontrava o produto das vendas, o dinheiro e todos os bens que pertenciam a B. A.; - O réu, em resposta, não prestou as contas requeridas.

*Contestaram os réus, por impugnação e por exceção, pugnando pela improcedência da ação, tendo, nuclearmente, alegado que: - O autor sabia, desde pelo menos 10-01-2007, que C. A., C. G., A. A. eram, com o réu, co-herdeiras testamentárias de B. A., e que, nessa data, já eram pessoas de avançada idade, tendo todas falecido, entretanto; - O autor sabia, pelo menos desde 2007, que o réu tinha sido procurador de B. A. desde fevereiro de 2001 até 19-03-2004, data da sua morte; - Nas escrituras lavradas no dia 02-03-2001, B. A. estava presente no Cartório Notarial e foi ela quem recebeu os preços das vendas; - Ainda que assim não fosse, o autor teve conhecimento de todas as escrituras em que o réu teve intervenção pelo menos em 10-02-2010, data em que foi remetida a carta ao réu a que se faz referência na petição inicial; - Na escritura de 15-02-2001, o réu não outorgou como procurador de B. A., mas como comprador, tendo aquela declarado ter recebido o correspondente preço; - O autor nunca visitou B. A., nunca lhe telefonou e não veio ao seu funeral, nunca tratou dela, nem procurou saber se precisava de alguma coisa; - B. A., após a morte do pai do autor, M. B., em 15-02-1999, vivia sozinha, na aldeia de ..., freguesia de ..., Macedo de Cavaleiros, factos que o autor conhecia; - Até ao fim do ano de 1999, B. A. foi cuidada por uma senhora na aldeia de ..., a quem pagava os serviços prestados e nas restantes horas do dia era o réu que a ia ver e dela cuidar, o que também sucedia com outras vizinhas, factos que o autor conhecia; - A partir de janeiro de 2000 até morrer, B. A. passou a viver na aldeia de ..., em Macedo de Cavaleiros, em meses alternados, nas casas de C. G. e de A. A., que lhe prestavam os cuidados necessários, factos que o autor conhecia; - Também o réu cuidou de B. A. até à sua morte, tratando dos seus assuntos, primeiro sem procuração, nomeadamente do processo de investigação de paternidade junto do advogado de B. A., tendo efetuado muitas deslocações, levando-a com frequência ao médico e onde precisava ou queria ir, pagando a mando dela faturas de água, eletricidade, telefone, impostos, consultas médicas, tratamentos, medicamentos, e comprando o necessário para o cultivo dos prédios rústicos, contactando pessoas para aí trabalharem, fazendo deslocações a várias cidades, como Macedo de Cavaleiros, Bragança e Porto para tratar de assuntos, nomeadamente quando o pai do autor faleceu, e deslocou-se, ainda, ao Santuário de Fátima para pagar uma promessa a pedido de B. A.; - Não recebeu receitas relacionadas com o seu mandato, mas fez despesas por conta de B. A.; - Umas vezes B. A. dava-lhe o dinheiro para ele fazer e pagar despesas, como faturas de água, eletricidade e telefone, noutras vezes era o réu que pagava as despesas; - Nem sempre eram passados documentos das despesas e seu pagamento, como por exemplo pagamentos a trabalhadores agrícolas; - Quanto às despesas documentadas, entregou os documentos a B. A.; - Prestou contas a B. A., periodicamente, até poucos dias antes desta falecer, contas que esta aceitou e que foram dadas por liquidadas; - Depois da morte de B. A., o réu pagou as despesas do funeral e outras despesas como consumos mínimos de água, luz e telefone, relativos ao prédio urbano que constituía morada dela, que se foram vencendo depois da sua morte, tendo o réu liquidado essas despesas com dinheiro dele, que constituem dívidas da herança de B. A., a serem apresentadas em sede de partilha extrajudicial ou inventário; - Depois da morte de B. A., o réu e os restantes herdeiros testamentários encontraram alguns documentos que aquele lhe entregara, mas a maior parte deles já desaparecera; - A. A. e C. G. também tinham guardado alguns papéis relacionados com as contas de B. A., nomeadamente apontamentos que ela lhes fez de remunerações e despesas que tinham feito; - O autor, desde a resposta à carta de 2010, nunca mais pediu qualquer informação ou esclarecimento aos réus; - A partir do fim do ano de 2010, os réus ficaram convencidos de que o autor estava satisfeito com as informações e explicações dadas pelo réu e que as aceitou como verdadeiras e que, por isso, o autor tinha dado o assunto como encerrado e que não ia instaurar ação de prestação de contas; - O autor tinha a obrigação, ditada pela boa fé e bons costumes, de avisar os réus, no máximo até ao fim do ano de 2010, de que iria instaurar ação de prestação de contas contra eles; - Da atuação do autor retira-se que deixou passar propositadamente até 15 anos para dificultar ou impedir a defesa do réu relativamente aos factos por si alegados, nomeadamente que já tinha prestado contas a B. A. sem que houvesse débito à hora da morte dela; - Não se pode exigir ao réu que guardasse por mais de 10 anos documentos relativos ao seu mandato; - Com este seu comportamento, atuou o autor com abuso de direito, ao criar nos réus a legítima convicção de que não iria exercer o direito de instaurar ação de prestação de contas; - Não têm agora os réus possibilidade de arrolar como testemunhas as co-herdeiras testamentárias C. A., A. A. e C. G., porquanto já faleceram, e de juntarem a maioria dos documentos das despesas feitas, e os apontamentos de prestação de contas a B. A., imprescindíveis para a sua defesa; - Deve, por isso, ser invertido o ónus da prova; - Subsiste ilegitimidade passiva da ré mulher, uma vez que não foi procuradora de B. A.; - Atuando o autor com abuso de direito ao instaurar a presente ação, deve a mesma improceder; - Encontram-se prescritos os juros de mora.

*Terminada a fase de articulados, foi proferido despacho a determinar o prosseguimento dos autos, nesta fase, segundo a tramitação da ação declarativa comum, tendo sido agendada audiência prévia, que teve lugar em 24-05-2021.

*Na audiência prévia, foi julgada procedente a exceção dilatória de ilegitimidade passiva da ré R. P., que assim foi absolvida da instância.

*Realizou-se audiência de julgamento, que obedeceu às regras e ao ritualismo processual, declarando-se a manutenção da regularidade da instância já apreciada em despacho saneador e foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: “Nestes termos, condeno o réu a prestar as contas dos atos por si praticados que se referem ao exercício do mandato que lhe foi conferido por B. A., nomeadamente, dos negócios de compra e venda de bens imóveis que celebrou e, ainda, dos atos patrimonialmente relevantes posteriores à morte da mandante.

Valor: já indicado na audiência prévia.

Custas pelo réu, nos termos do disposto no artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil.”.

*Descontente o R.

apresenta recurso que termina com as seguintes conclusões (que se transcrevem): “1.ª - o autor não apresentou resposta tempestiva à matéria da contestação, apresentada pelo réu, no dia 04.12.2020, pelo que deveriam e devem ser considerados confessados todos os factos alegados na contestação, que não estejam em oposição com a petição, considerada no seu conjunto, como se invoca de fls. 1 (1.ª questão) até fls. 3 da motivação do presente recurso.

2.ª - Os factos, que devem ser declarados confessados por falta de resposta à contestação, aludida na 1.ª conclusão, são os discriminados de fls. 5 até 14 desta motivação, plasmados nos artigos seguintes da...

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