Acórdão nº 22/79.9TBFAF-D.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA AMÁLIA SANTOS
Data da Resolução15 de Dezembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: *Nos autos de processo especial de inventário instaurado por óbito de AA (em Janeiro de 2007), em que é Cabeça-de-Casal BB, veio a interessada CC requerer partilha adicional, nos termos do artigo 75.º do Regime Jurídico do Processo de Inventário, aprovado pela Lei 23/2013, de 5/3, juntando para o efeito a sentença proferida a 5/3/2014, no âmbito daquele processo.

Alega para tanto que correu termos o inventário acima referido, o qual foi julgado por sentença transitada, tendo nele figurada herdeira a agora requerente.

Sucede porém que nesse inventário não se descreveram e não foram consequentemente partilhados os seguintes bens: um depósito à ordem na Agência da Banco 1..., em ..., na importância de €15.000,00, e um depósito à ordem na Agência do Banco 2..., em ..., na importância de € 59.702,79, no valor global de €74.702,79 (Conforme, aliás, ficou provado em sede da acção de Processo Sumário, que correu por apenso aos autos principais), mas tais bens faziam parte da herança da inventariada e só não foram descritas pelas múltiplas razões aludidas no processo supra.

E não obstante a interpelação para partilha da quantia supra, as interessadas BB e CC retêm indevidamente tais montantes, não procedendo à partilha a que legalmente está incumbida a cabeça- de-casal, motivo pelo qual há que partilhá-los adicionalmente.

*A cabeça de casal veio deduzir oposição ao incidente, nos termos do artigo 1104.º, n.º 1, al. a) do CPC, alegando, em suma, que por óbito de AA já correu Inventário, no qual foi apresentada relação de bens, que não mereceu qualquer reclamação, aí tendo sido efetuada partilha, homologada por sentença, há muito transitada em julgado. Assim, no entender da cabeça de casal, nada mais há a partilhar.

Acresce que na Ação de Processo Sumário apenso, cuja cópia da sentença foi junta com a petição, não foi reconhecida a existência de quaisquer bens que devessem ser partilhados; antes pelo contrário, foi julgado improcedente o pedido de reconhecimento e declaração de sonegação de bens por parte das interessadas demandadas.

Por isso, a cabeça-de-casal não reconhece a existência das verbas acusadas pela requerente da partilha adicional, e a acusada de ser possuidora de tais verbas também não reconhece a sua existência.

Pede que seja indeferido o incidente de partilha adicional, com as legais consequências.

*Notificada do teor da oposição, veio a requerente dizer que tal não corresponde à verdade, na medida em que no inventário não foram relacionadas contas bancárias pertencentes à inventariada, cujos saldos, à data do seu óbito, eram de €15.000,00 e de € 59.702,79, respetivamente, e como consta na sentença com data de 12-03-2014, da matéria factual ali provada (factos 9 e 10), no dia 04.10.2004, a interessada/Ré, CC dirigiu-se à agência do Banco 2..., sita em ... e aí chegada procedeu ao levantamento da quantia de €15.000,00, e transferiu a quantia de € 59.702,79, para uma conta por si titulada, dinheiro esse pertencente à mãe das partes AA, e que deveria ser levado ao acervo a partilhar. Nesse sentido, é falso o alegado desconhecimento pela ora cabeça-de-casal das quantias a partilhar, porquanto tomou conhecimento da sentença supra referida, e não obstante tal verba ter sido movimentada pela herdeira CC, sempre a cabeça de casal BB tem o dever de a relacionar.

*Veio ainda a cabeça de casal asseverar, em requerimento de 13/9/2021, que o dinheiro existente no Banco 2... foi gasto em despesas, motivo pelo qual não existe e, como tal, não foi relacionado.

E conforme consta da sentença junta pela requerente, não se sabe nem ficou assente qual a quantia, ou se existe alguma quantia que não tenha sido gasta nas despesas de funeral, na aquisição do jazigo e na manutenção e conservação do imóvel da herança.

Por isso, além de não se saber se existe verba ou o seu valor, o certo é que “tal existência alegada pela requerente” sempre foi do conhecimento da requerente da partilha adicional, que não reclamou da relação de bens assente e partilhada.

Pelo que não tem a requerente qualquer fundamento para pedir a partilha adicional de um valor hipotético que não quis partilhar.

*Foi admitida a oposição e determinada a apensação dos presentes autos aos autos de inventário.

*Tramitados regularmente os autos foi então proferida seguinte decisão: “Nestes termos e pelo exposto, decide-se julgar totalmente improcedente, por não provada, a oposição da cabeça de casal BB, determinando-se, em consequência, que esta venha relacionar a quantia de € 74.732,79, nos termos anteriormente referidos. Custas do incidente pela opoente (artigos 527.º, n.º 1 e 2 e 539.º, n.º 1 do CPC), fixando-se a taxa de justiça em 2 UC’s, nos termos do artigo 7.º, n.º 4 do Regulamento das Custas Processuais e Tabela II anexa. Registe e notifique.”*Não se conformando com a decisão proferida, dela veio a cabeça de casal interpor o presente recurso de Apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões: “I. Nos termos das disposições conjugadas dos artigos 1104 nº 1 al d) e 1105 nºs 1 e 3 do CPC, na sua versão atual e que consagra o mesmo regime de fixação de bens a partilhar no processo de inventário, por herança, são relacionados todos os bens sujeitos a inventário, nos termos dos artigos 1098 e 1097 nº 3 al. c) do CPC.

  1. Só se admite a partilha adicional, prevista no artigo 1395 do CPC (no regime aplicável), como na atual redação do artigo 1129, “quando se reconheça, depois de feita a partilha, que houve omissões de alguns bens”.

  2. Esse requisito de omissão e do conhecimento ou reconhecimento exige o desconhecimento da existência do bem pelo requerente da partilha adicional, a verificar pelo tribunal e pelo juiz do apenso da partilha adicional; IV. Ou a verificar e reconhecer, em ação ou decisão sobre a ocultação e sonegação.

  3. No presente processo já existem duas decisões transitadas em julgado sobre o conhecimento e sobre a fixação dos bens a partilhar e, concretamente, sobre a verba de que é pretendida a partilha adicional; VI. Que são a homologação da partilha e consequente fixação da relação de bens no processo principal; VII. E o reconhecimento da inexistência de ocultação e sonegação da verba, por ser do conhecimento de todos os interessados, à data da fixação da relação de bens e da partilha.

  4. O conjunto dessas duas decisões, têm força de caso julgado, que impediam a presente decisão de admissão da partilha adicional; IX. Por estar definitivamente julgada a inexistência do requisito do “reconhecimento posterior à partilha, de omissão de alguns bens”, imposto pelo artigo 1129 do CPC.

  5. Pelo que, a decisão recorrida, viola o artigo 620 nº 1, do CPC por estarmos no âmbito do mesmo processo de inventário, de que os apensos A e B são meros incidentes; XI. E violou o artigo 625 nº 2, do C.P.C..

  6. Mesmo que se julgasse improcedente as conclusões anteriores, sempre se impunha que a decisão fosse substituída por outra que ordenasse à cabeça de casal a forma que ficava obrigada a relacionar a verba a partilhar em partilha adicional, e a quem deve atribuir a sua posse ou de quem deve relacionar como devedor à herança.

Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a decisão recorrida e se declare inexistir fundamento legal para a requerida partilha adicional…”*A recorrida (requerente da partilha adicional) veio apresentar Resposta ao recurso, na qual pugna pela manutenção da decisão recorrida.

*Tendo em consideração que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente (acima transcritas), sem prejuízo da apreciação de questões de conhecimento oficioso (artigos 635º e 639º do CPC), as questões a decidir no presente recurso (por ordem lógica de conhecimento) são as seguintes: I - A de saber se ocorreu caso julgado nos autos; e II - Se se verificam os requisitos da partilha adicional de bens da inventariada.

*Foram dados como provados na 1ª Instância os seguintes factos: “1. No dia 29 de Setembro de 2004, faleceu, no estado de viúva de DD, com quem foi casada em primeiras núpcias de ambos e sob o regime de comunhão geral de bens, a inventariada AA.

  1. Em Janeiro de 2007, foi requerido o inventário por óbito da requerida AA, tendo sido nomeada como cabeça de casal a aqui Ré BB.

  2. Aquando da apresentação da relação de bens, a cabeça de casal indicou duas verbas: a. 5/8 indivisos de três sepulturas no Cemitério Paroquial da freguesia ..., ..., aos quais foi atribuído o valor de €200; b. 5/8 indivisos de uma casa de habitação, sita no lugar de ..., freguesia ..., ...; 4. Não foi apresentada qualquer reclamação à relação de bens.

  3. Procedeu-se à partilha, tendo sido proferida...

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