Acórdão nº 6395/19.5T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Dezembro de 2022
Magistrado Responsável | SANDRA MELO |
Data da Resolução | 15 de Dezembro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Apelantes: Autor e reconvindo AA Interveniente principal e reconvinda: BB Apelados Réus: CC, DD e B... - INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS, LDA, Autos de: Apelação em ação declarativa de condenação sob a forma de processo comum Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I- Relatório O Autor deduziu a presente ação declarativa de condenação sob a forma comum pedindo a condenação do Réus a: “a) Reconhecerem o Autor dono e legítimo proprietário do prédio identificado nos itens 1º e 2º da presente peça; b) Verem reconhecida resolução o contrato que celebraram com o Autor, com efeitos à data de 27 de fevereiro de 2018, data em que cessavam os 30 dias úteis concedidos pela DMUOP do Município ... para reformularem o projeto de arquitetura e que era do conhecimentos dos Réus; c) Pagarem solidariamente ao Autor da quantia de € 14.427,26 (catorze mil e quatrocentos e vinte e sete euros e vinte e seis cêntimos), acrescida de juros de mora contabilizados à taxa legal, desde a citação e até efetivo e integral pagamento.
d) Pagarem ao Autor a indemnização que vier a ser liquidada em execução de sentença” Alegou, para tanto e em súmula, que celebrou um contrato de prestação de serviços de arquitetura que os Réus não cumpriram integralmente, causando-lhe danos que pretende que sejam ressarcidos.
Os Réus contestaram, excecionando e impugnando; afirmaram que celebraram um contrato misto que incluía serviços de arquitetura, mas também de acompanhamento e gestão da obra e de empreitada, de que são atos preparatórios e demonstradores da sua existência a terraplanagem e remoção de terras do terreno e a elaboração de um mapa de acabamentos e de um mapa de quantidades que também realizaram. Aditam que elaboraram projeto de arquitetura que foi aprovado; só as respetivas alterações peticionadas posteriormente é que não tiveram a mesma sorte. Foi o Autor que incumpriu o contrato por não ter pago o mapa de quantidades, a terraplanagem e limpeza do terreno e o IVA sobre o valor dos desenhos em 3D.
Deduziram reconvenção, para o caso da ação não improceder, pedindo a condenação do A./reconvindo a pagar aos RR./reconvintes: 1. A importância de € 32.176,80 relativa aos trabalhos e serviços; 2. A importância que venha a apurar-se ser necessária para os ressarcir de todos os danos alegados, a liquidar em momento posterior; E declarar-se extinto, na respetiva proporção, o crédito que venha a reconhecer-se deter o A. sobre os RR., por efeito da compensação com o crédito que venha a reconhecer-se que estes detêm sobre o primeiro.
O cônjuge do Autor foi chamada à ação como interveniente principal ativa.
O processo correu seus termos, realizou-se audiência final e veio a ser proferida sentença com a seguinte decisão: “1..Condeno o réu CC a pagar aos autores AA e mulher BB a quantia de € 1230,00 (mil duzentos e trinta euros), absolvendo o réu dos restantes pedidos contra si formulados.
.2 Absolve-se a ré DD de todos os pedidos contra si formulados.
.3 Julga-se o pedido reconvencional deduzido parcialmente procedente por provado e, em consequência, condena-se os autores reconvindos AA e BB a pagar ao réu reconvinte CC a quantia de € 161.00 (cento e sessenta e um euro), absolvendo os autores dos restantes pedidos.
.4 Condeno as partes no pagamento das custas processuais na proporção do respetivo decaimento.” É desta sentença que o Autor apela, com as seguintes conclusões: “1. O presente recurso de apelação vem interposto da decisão que julgou apenas parcialmente procedente por provada a ação e condenou o 1º réu a pagar aos autores a quantia de € 1230,00 (mil duzentos e trinta euros), absolvendo o 1º réu dos restantes pedidos formulados, absolvendo a 2ª ré de todos os pedidos, 2. bem como da sentença na parte em que julgou o pedido reconvencional parcialmente procedente por provado, e, em consequência, condenou os autores / reconvindos a pagar ao reconvinte a quantia de € 161,00 (cento e sessenta e um euros).
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Desde logo, padece de nulidade a sentença, nos termos do artigo 615º n.º 1 do Código de Processo Civil (CPC), por condenar para além do pedido ou em objeto diverso do pedido e por excesso de pronúncia, sendo que os reconvintes, no pedido reconvencional, não pedem a condenação no pagamento da quantia de € 161,00, nem esse valor resulta da soma das quantias ali expressas, não se tratando de quantia que devesse ser liquidada posteriormente, isto é, em execução se sentença.
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Existe contradição entre os factos insertos nos pontos 8. e 9. dos factos provados, em concreto que “Em dia que não pode precisar, mas que ocorreu num dos meses de junho ou julho de 2017, o Autor contratou os serviços do 1.º Réu, como arquiteto, e este, por seu lado, aceitou conceber os projetos de arquitetura e de especialidades, no que se incluíam todas as peças escritas e desenhadas, alterações e aditamentos exigidos pela legislação vigente, para aprovação e licenciamento pela câmara Municipal ... (doravante CM...) da construção de uma moradia para habitação familiar do autor e seu agregado familiar, na parcela de terreno identificada em 1º” (facto provado 8.), que “O Autor e o 1.º Réu acordaram que a contrapartida devida ao 1.º Réu pela realização dos projetos de arquitetura e de especialidades em condições de serem aprovados e pelo subsequente licenciamento se cifraria no valor de 12.300,00 Euros (doze mil e trezentos euros), IVA incluído” (facto provado 9.) e o facto não provado no ponto 3. Dos factos provados, ou seja que “O 1º Réu vinculou-se a praticar a totalidade dos atos necessários e adequados para que todos os projetos exigidos viessem a ser aprovados e a construção da moradia licenciada pela câmara Municipal ...” (facto não provado 3.), 5. sendo certo que, sendo o pedido de licenciamento formal e tecnicamente instruído, entre outros elementos, com o projeto de arquitetura, incluindo memória descritiva, plantas, cortes, alçadas e pormenores de execução, e o projeto de especialidades, ao aceitar conceber os projetos de arquitetura e de especialidades … para aprovação e licenciamento pela câmara Municipal ... (…CM...) da construção de uma moradia para habitação unifamiliar do autor e do seu agregado familiar, ao acordar contrapartida pela realização dos projetos de arquitetura e de especialidades em condições de serem aprovados e pelo subsequente licenciamento, o 1º Réu se vinculou a praticar os atos necessários e adequados para que os projetos de arquitetura e especialidades (únicos exigidos) viessem a ser aprovados e a construção da moradia licenciada pela câmara Municipal ....
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Foi incorretamente julgado como não provado o facto inserto no ponto 8. dos factos não provados (do autor), constituindo ponto de facto concreto em relação ao qual os recorrentes entendem haver erro de julgamento, a saber: “O projeto subscrito pelo 1º Réu, sem a respetiva aprovação camarária, não reveste qualquer interesse nem serve para o Autor”, constituindo meios de prova existentes no processo e que fundamentam a sua alteração e inclusão nos factos provados, a conjugação da notificação judicial avulsa, de cujo teor os requeridos foram notificados e tomaram conhecimento integral no dia 26 de fevereiro de 2018, designadamente na parte em que ficaram cientes de que “nada serve o projeto de arquitetura elaborado pelos requeridos sem a necessária aprovação camarária” e de que, se não reformulassem o projeto, o requerente ficaria lesado, “…pelo menos, no correspondente aos valores que entregou aos requeridos por conta dos projetos de arquitetura, especialidades e alterações / aditamentos”, com as declarações de parte do autor quando, à questão colocada pelo seu mandatário (minutos 57:22 e seguintes) – “Se este projeto não fosse aprovado, com aquela informação da Câmara e uma vez que não houve retificação, este projeto servir-lhe-ia para alguma coisa? – responde “Para nada” e à questão “O senhor contratou depois outro arquiteto?”, responde “Tive que contratar porque esse projeto não me servia para nada”, bem como com as declarações da interveniente principal que, à pergunta do mandatário do autor, “O senhor arquiteto comunicou convosco e se quisessem ele até passava a autoria do projeto para outros arquitetos?”, responde “Não”, à pergunta “O que é que este projeto sem aquela alteração valeria para vocês?”, responde “Ia morrer … completamente”, à pergunta “E para vocês perdeu interesse ou vocês continuaram com interesse neste projeto?” responde “Não, perdemos interesse em termos de projeto em si” e à pergunta “Tanto assim que contrataram outro arquiteto?” responde “Contratei outro arquiteto” - (declarações à 1 hora, minuto 26:30 do seu depoimento e final à 1 hora, 27 minutos e 12 segundos), assim como com o depoimento da testemunha EE, nomeadamente quando, com início ao minuto do seu depoimento, à questão do mandatário do autor, “…aquele primeiro projeto do senhor arquiteto CC, uma vez caducado, de que é que serviria ao senhor AA?, responde “Nada”, à questão “O projeto de arquitetura … mesmo que tivesse sido aprovada a arquitetura … sem as especialidades, a pessoa poderia iniciar, sem a aprovação das especialidades, podia iniciar a construção?”, responde “O processo de licenciamento é composto por várias especialidades, uma delas é que a arquitetura”, à questão “Mas só a arquitetura pura e dura?” responde “Não” e à questão “E um projeto de arquitetura com um aditamento que não foi aprovado de que é que serve?, responde “Nada” (fim do respetivo depoimento – minuto 19:59).
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Ao contrário do decidido, impõe-se, pois, que seja alterado e dado como provado que “O projeto subscrito pelo 1º Réu, sem a respetiva aprovação camarária, não reveste qualquer interesse nem serve para o Autor” (facto constante do item 8. dos factos não provados).
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Não é unívoco na doutrina e na jurisprudência o entendimento sobre a qualificação do contrato, sempre que está em causa qualquer obra de natureza intelectual, nomeadamente, a realização de um trabalho de arquitetura.
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Segundo uma corrente, o conceito...
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