Acórdão nº 126/06.7TTVNF.2.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Dezembro de 2022
Magistrado Responsável | VERA SOTTOMAYOR |
Data da Resolução | 15 de Dezembro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência, na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães I – RELATÓRIO APELANTE: AA APELADA: F... - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.
Tribunal da Comarca ..., Juízo do Trabalho ...
Nos presentes autos de acção especial emergente de acidente de trabalho em que é sinistrado AA e responsável F... – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.
, em 3/05/2022, veio o sinistrado deduzir incidente de revisão da pensão, alegando em resumo que as sequelas resultantes do acidente de trabalho participado nos autos no âmbito do qual lhe foi atribuída a IPP de 10% a partir de 23 de Fevereiro de 2006, agravaram-se, vindo a padecer de dores cada vez mais fortes na região lombar, que se estendem ao pescoço, braço, mão, anca, perna e pé esquerdos, tendo já recorrido ao serviço médico de urgência. Requer por isso a realização de perícia médica e formula os respectivos quesitos.
Foi solicitado ao Gabinete Médico-Legal e Forense de ... a realização de exame médico na pessoa do sinistrado, tendo os autos prosseguido a sua tramitação.
Em 22/06/2022, a juiz a quo proferiu decisão considerando caducado o direito do sinistrado a requerer a revisão da incapacidade, nos termos do artigo 25.º n.º 2 da Lei n.º 100/97, decisão essa que terminou com o seguinte dispositivo: “Face ao exposto, atendendo ao disposto no artigo 25.º, n.º 2 da Lei n.º 100/97, de 13.09 e o seu juízo de constitucionalidade, considerando que a fixação da pensão ocorreu há mais de 10 anos, sem que tenha sido alguma vez revista, indefere-se a requerida revisão da incapacidade, em face da caducidade do direito do sinistrado a requerer tal revisão.
Custas do incidente pelo sinistrado, fixando-se a taxa de justiça no mínimo legal.
Notifique.” *Inconformado com esta decisão dela veio o sinistrado interpor recurso formulando as seguintes conclusões: “1.ª - Nos termos de processo especial emergente de acidente de trabalho, o recorrente foi dado como curado com uma IPP de 10%, com efeitos a partir de 23/02/2006, em consequência do acidente de trabalho que sofreu em 08/06/2005, conforme douta sentença proferida e transitada em julgado em 10/04/2007.
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- Em 21/08/2013, o recorrente requereu a revisão da sua incapacidade para o trabalho, que veio a ser indeferida, por decisão transitada em julgado proferida em 31/01/2014, não tendo sido alterada a pensão fixada.
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- Em 03/05/2022, o recorrente voltou a requerer a revisão da sua incapacidade para o trabalho, incidente a que o presente recurso respeita.
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- Por decisão proferida nos autos deste incidente, o tribunal a quo indeferiu a requerida revisão da incapacidade, por ter julgado verificada a caducidade do direito do recorrente a requerer tal revisão, pondo fim ao incidente.
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- É desta decisão que se recorre, porque o recorrente se não pode conformar com ela, discordando da sua fundamentação jurídica e aplicação do direito, como especificamente sintetizará nas conclusões seguintes, sendo ademais sempre admissível recurso nos termos da al. b) do art. 79.º do CPT.
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- O n.º 2 do art. 25.º da Lei n.º 100/97, de 13/09, vigente à data do acidente de trabalho sofrido pelo recorrente, dispunha que a revisão da incapacidade só podia ser requerida dentro dos 10 anos ulteriores à data da fixação da pensão.
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- A lei citada foi revogada e substituída pela Lei n.º 98/2009, de 04/09, a qual, no seu art. 70.º, liberalizou o exercício do direito de revisão da incapacidade em consequência da modificação na capacidade de trabalho ou de ganho do sinistrado, tendo eliminado qualquer prazo para o efeito.
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- O n.º 1 do art. 187.º da nova Lei n.º 98/2009 consigna que o disposto no capítulo que integra o referido art. 70.º se aplica apenas aos acidentes de trabalho ocorridos após a entrada em vigor da mesma, ou seja, a partir de 01/01/2010 (art. 188.º do diploma mencionado).
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- Porém, este art. 70.º da nova Lei n.º 98/2009, de 04/09, tem de ser conjugado com o disposto no n.º 2 do art. 297.º do Cód. Civil, segundo o qual: A lei que fixar um prazo mais longo é igualmente aplicável aos prazos que já estejam em curso.
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- Tendo sido a IPP do recorrente fixada em 10/04/2007, é claro que o prazo de 10 anos marcado no n.º 2 do art. 25.º da Lei n.º 100/97, de 13/09, ainda decorria quando, em 01/01/2010, entrou em vigor o art. 70.º da nova Lei n.º 98/2009, de 04/09.
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- E este art. 70.º da nova Lei n.º 98/2009 passou a ser o aplicável à relação jurídica em mérito.
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- Se, à data da entrada em vigor da nova lei, já houvesse transcorrido o prazo de dez anos, o recorrente aceitaria pacificamente a preclusão do seu direito processual de requerer a revisão da incapacidade.
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- No entanto, no caso em apreço, esse prazo ainda não se tinha esgotado, razão por que, além do mais, a aplicação da nova lei ao prazo ainda em curso, eliminando o limite temporal de 10 anos que o n.º 2 do art. 25.º da Lei n.º 100/97, de 13/09, fixava, não abala a confiança e a certeza das relações jurídicas, a segurança jurídica.
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- Sempre que uma lei nova, fixando um prazo mais longo, passa a aplicar-se aos prazos em curso, não se pode falar de violação do princípio da segurança jurídica – é precisamente essa a solução acolhida no n.º 2 do art. 297.º do Cód. Civil.
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- De acordo com a norma expressa do n.º 2 do art. 297.º do Cód. Civil, deve ser admitido o incidente de revisão da incapacidade deduzido mais de 10 anos após a fixação da pensão, uma vez que esse prazo não estava ainda esgotado quando entrou em vigor a Lei n.º 98/2009, de 04/09.
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- Acresce que o direito à reparação dos danos decorrentes de um acidente de trabalho compreende prestações em espécie e prestações em dinheiro, incluindo-se naquelas prestações de natureza médica, cirúrgica, farmacêutica, hospitalar e quaisquer outras, seja qual for a sua forma, desde que adequadas ao restabelecimento do estado de saúde e da capacidade de trabalho ou de ganho do sinistrado e à sua recuperação para a vida activa...
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