Acórdão nº 774/21.5T8FAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Setembro de 2022
Magistrado Responsável | MARIA LUÍSA RAMOS |
Data da Resolução | 15 de Setembro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães M. A., A. T., e mulher P. T., instauraram acção declarativa sob a forma de processo comum contra P. R., formulando os seguintes pedidos: 1. ser declarado que a autora M. A., bem como os autores A. T. e mulher P. T., são donos, aquela do usufruto, estes da raiz ou nua propriedade do prédio descrito na PI; 2. ser o réu condenado a reconhecer os direitos referidos no número anterior; 3. ser declarado que o contrato de arrendamento, celebrado no dia 23 de Agosto de 1974 e oralmente, entre A. S., por um lado e N. V. e M. H., por outro lado, tendo por objeto o gozo daquele PRÉDIO, caducou no dia 15 de Janeiro de 2021, por óbito da referida M. H.; 4. ser o réu condenado a reconhecer a caducidade referida no número anterior; 5. ser a réu condenado a restituir à autora M. A. o referido PRÉDIO; 6. ser o réu condenado a abster-se da prática de qualquer ato que impeça ou diminua a utilização, pela autora M. A., desse PRÉDIO; 7. ser a réu condenado a pagar à autora M. A. uma indemnização de EUR 2.000,00 (dois mil euros), acrescida de EUR 30.00 (trinta euros), por dia, desde o dia 16 de Julho de 2021 até efetiva restituição do prédio.
Alegaram, para tanto, e em síntese, que M. A. é usufrutuária e A. T. e P. T. são proprietários de um imóvel que esteve arrendado aos pais do réu, e, tendo o contrato de arrendamento cessado em 15/01/2021 aquando do óbito da mãe do réu, este continua a ocupar ilicitamente o referido imóvel.
Regularmente citado, o réu contestou, alegando que o contrato de arrendamento se transmitiu para si aquando do falecimento da sua mãe e, por isso, a ocupação do imóvel encontra-se legitimada.
Os autores responderam às excepções invocadas na contestação, pugnando pela procedência da acção.
Realizada audiência prévia, foi proferido despacho saneador-sentença, a julgar a acção parcialmente procedente, nos seguintes termos: “Atento tudo o exposto e nos termos das disposições legais supra citadas, julgo a ação parcialmente procedente, por parcialmente provada e, em consequência: 1. Declaro que a autora M. A., bem como os autores A. T. e mulher P. T., são donos, aquela do usufruto, estes da raiz ou nua propriedade do prédio descrito no ponto 1º dos factos provados; 2. Condeno o réu a reconhecer os direitos referidos no número anterior; 3. Declaro que o contrato de arrendamento, celebrado no dia 23 de Agosto de 1974 e oralmente, entre A. S., por um lado e N. V. e M. H., por outro lado, tendo por objeto o gozo do prédio referido em 1º, caducou no dia 15 de Janeiro de 2021, por óbito da referida M. H.; 4. Condeno o réu a reconhecer a caducidade referida no número anterior; 5. Condeno o réu a restituir à autora M. A. o referido PRÉDIO; 6. Condeno o réu a abster-se da prática de qualquer ato que impeça ou diminua a utilização, pela autora M. A., desse PRÉDIO; 7. Condeno o réu a pagar à autora M. A., o valor que vem pagando a título de renda, desde o dia 16 de Julho de 2021, até efetiva restituição do prédio.
8. Absolvo o réu do demais peticionado.
Inconformado veio o Réu recorrer, interpondo recurso de apelação.
O recurso foi recebido como recurso de apelação, com subida nos autos e efeito meramente devolutivo.
Nas alegações de recurso que apresenta, o apelante formula as seguintes Conclusões: A - Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida pelo Mto. Juiz “a quo” a fls., que julgou a acção parcialmente procedente, por parcialmente provada, e em consequência, declarou que os AA. são donos, sendo a A. M. A. do respetivo usufruto e os demais AA. da raiz ou nua propriedade do prédio descrito no ponto 1º dos factos provados, condenando o R. a reconhecer tais direitos, e mais declarando a caducidade do contrato de arrendamento em causa nos presentes autos, condenando o R. a reconhecer tal caducidade e à restituição do mesmo e ainda a abster- se da prática de qualquer ato que impeça ou diminua a respetiva utilização do prédio, assim como condenou o R. ao pagamento das rendas que vem pagando a titulo de renda, até efetiva restituição do prédio.
B - Pretende-se com o presente recurso sindicar tal sentença, por ser nosso entendimento, com todo o respeito pelo vertido pelo Tribunal “a quo”, que a mesma padece do vicio de nulidade por omissão de pronuncia, bem como por desrespeito pelo dever de fundamentação, e, bem assim por erro na aplicação do direito, impondo-se a final decisão diversa.
Assim; C – Nos presentes autos o tema decidendum limita-se a uma questão de Direito, a saber, se o contrato de arrendamento em causa, se transmitiu, ou não, para o R., em virtude da morte da sua mãe; D – Ou se tal contrato de arrendamento caducou, com a respetiva morte da progenitora do R.
E – Para tanto, defendem os AA. a caducidade de tal contrato, alegando a aplicação do vertido no art. 57º nº 1 do NRAU.
F – Por seu lado, o R. em sede de contestação apresentada, defende a aplicação do vertido no art. 1106º do CC, pugnando pela transmissão a seu favor do direito ao arrendamento.
G – De acordo com o estabelecido no art. 608º nº 2 do CPC, é dever do julgador apreciar todas as questões e argumentos que as partes tenham submetido á sua apreciação, de forma objetiva e criteriosa.
H – No caso concreto, o Tribunal “a quo” não apreciou de forma clara, objetiva e criteriosa os argumentos de direito apresentados pelo R.
I – De acordo com o estabelecido no art. 615º nº 1 al. d) do CPC é nula a sentença quando o julgador deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar.
J - Atento o teor de sentença ora sindicada o Tribunal “a quo” violou o disposto nos artigos 608º nº 2 e 615º nº 1 al. d) do CPC.
K – Estando assim tal sentença ferida de nulidade, que se invoca.
L – Assim o devendo ser declarado por V. Exs. Venerandos Juízes Desembargadores, ordenando a remessa dos autos ao Tribunal “a quo”, de forma a que seja suprida a apontada nulidade.
M – Por outro lado, atenta a posição das partes, o teor dos respetivos articulados e demais prova carreada, devia ter sido dado como provado pelo Tribunal “a quo” o alegado pelo R. nos arts. 5º a 11º da Contestação, o que não aconteceu.
N – Violando assim o dever de fundamentação, por omissão.
O - O que deve ser declarado por V. Exs. Venerandos Desembargadores, com as legais consequências.
Sem prescindir; P – Incorre ainda a sentença ora sindicada em erro na apreciação e aplicação do Direito.
Q – Sendo o contrato de arrendamento “intuitu personae”, em regra, caduca com a morte do arrendatário.
R – Contudo tal regra de caducidade sofre um importante regime de exceção, mormente atento o disposto nos arts. 1106º e 1107º do CC.
S -O nº 1 do art. 1106º do CC suprimiu a expressão “primitivo arrendatário”, pelo que, desta forma, por morte do arrendatário, tal contrato transmite-se aos beneficiários identificados no referido artigo.
T – Ou seja, com o novo regime do artigo 1106º do CC deixa de haver qualquer limitação ao número de transmissões por morte da posição de arrendatário.
U – Sendo esta, com todo o respeito por opinião contraria, a disciplina legal a aplicar “in casu”, por força da imperatividade da norma constante no art. 1106º do CC e das normas transitórias previstas aquando da entrada em vigor do NRAU que ordena a sua aplicação aos casos em que o contrato de arrendamento foi celebrado em momento anterior, como o caso dos autos.
V – Ao decidir conforme decidiu, com todo o respeito, incorreu o Tribunal “a quo” em erro na aplicação do direito ao caso concreto, devendo a sentença proferida ser substituída por outra na qual se declare como aplicável ao caso concreto o vertido no art. 1106º do CC, sendo a situação do R. ai enquadrável.
W – Mais se declarando como transmitido a favor do R. o direito ao arrendamento do imóvel em causa nos autos.
X – Com a consequente improcedência do peticionado pelos AA., com as legais consequências.
O recurso veio a ser admitido neste tribunal da Relação na espécie e com os efeitos e regime de subida fixados no despacho de admissão do recurso na 1ª instância.
Não foram oferecidas contra-alegações.
Cumpre decidir.
Delimitação do objecto do recurso: Questões a decidir.
Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, tal como decorre das disposições legais dos artº 635º-nº3 do Código de Processo Civil, atentas as Conclusões da apelação deduzidas, e supra descritas, são as seguintes as questões a apreciar, suscitadas pelo apelante: - invocada nulidade de decisão - reapreciação da matéria de facto - o arrendamento habitacional em referência nos autos comunicou-se ao Réu em virtude da morte da sua mãe? - sendo ao caso aplicável a norma do artigo 1106º do CC e não a norma do artigo 57º do NRAU ? FUNDAMENTAÇÃO I. OS FACTOS ( factos declarados provados, e não provados, na sentença recorrida ): 1.º) Encontra-se registado a favor da autora M. A. o usufruto e a favor dos autores A. T. e P. T. a nua propriedade do prédio urbano com n.º .., da Rua …, antes o n.º .., da Rua …, na freguesia de …, do concelho de Fafe, terreno em que está construído um edifício de rés-do-chão e andar, destinado a uma habitação que está descrito na Conservatória do Registo Predial de Fafe sob o n.º … (antes a descrição …, do Livro das Descrições Prediais n.º ..), da freguesia de Fafe e está inscrito na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artigo ...º (antes o...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO